Boletim de Psicologia
ISSN 0006-5943
ARTIGOS ORIGINAIS
Diferenças no desenvolvimento de meninos e meninas em condições de risco
Boys and girls in risk conditions development differences
Christiana Gonçalves Meira de AlmeidaI,*; Olga Maria Piazentin Rolim RodriguesII,*; Manoel Henrique SalgadoIII,*
IFaculdade de Psicologia - Universidade Federal de São Carlos - SP - Brasil
IID. de Psicologia - Fac. Ciências - Univ. Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" - SP
IIID. de Engenharia - Fac. Ciências - Univ. Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" - SP - Brasil
RESUMO
Esse estudo teve como objetivo avaliar o desenvolvimento de bebês que possuíam alguma condição de risco. Participaram do projeto 82 crianças, 42 meninos e 40 meninas. Como critérios de inclusão definiu-se: baixo-peso ao nascer, parto pré-termo ou filhos de mães adolescentes Para avaliar o desenvolvimento foi utilizado o protocolo de "Estimulação Infantil" do Inventário Portage Operacionalizado, que foi aplicado entre 30 e 59 dias de vida do bebê. Em todas as condições as meninas tiveram melhor desempenho, porém na condição de filhos de mães adolescentes não foi observada diferença significativa entre os grupos. Os dados parecem indicar que as condições de risco possuem maior probabilidade de causar danos ao desenvolvimento à população masculina que à feminina, coerentes à literatura analisada. Análises e elaboração de programas de estimulação precoce constituem-se fundamentais para minimizar os riscos de problemas de desenvolvimento nessa população.
Palavras-chave: Bebês de risco; diferenças entre gêneros; Inventário Portage Operacionalizado; desenvolvimento infantil.
ABSTRACT
This study aimed to evaluate the development of infants aged between 30 and 59 days, who presented some kind of risk factor threatening their development. Participated in the project 82 children, being 42 boys and 40 girls, presenting the following risk conditions: low birth weight, preterm birth or children of adolescent mothers. The protocol "Stimulation for kids" from "The Operationalized Portage Inventory" was administered. The girls presented a better performance in all conditions, however, no significant differences between genders were observed among the adolescent mothers' children. These results are consistent with those described in the literature and they indicate that the male population is more vulnerable to developmental damage. Public policies regarding early intervention to minimize the likelihood of future cognitive difficulties and consequently its impact in such population are essential. ok
Key words: Risk babies; difference between gender; Operationalized Portage Inventory; children development.
INTRODUÇÃO
Bebês que, ao nascer, apresentam condições pessoais que poderiam resultar em danos para seu desenvolvimento físico, emocional e cognitivo podem ser denominados bebês de risco (Sanseverino, Spritzer e Schüler-Faccini, 2001). Tais condições são determinadas por fatores que podem ser classificados como fatores de risco presentes antes, durante e depois do nascimento (Rodrigues, 2003). Nesse sentido avaliar especificidades das diferentes condições de risco é fundamental para desenvolver meios de reduzir a probabilidade de danos ao desenvolvimento.
O conceito de risco é baseado em relações probabilísticas, ou seja, considera-se que determinadas condições biológicas e/ou ambientais, têm maior probabilidade de resultar em distúrbios ou atrasos no desenvolvimento de bebês, quando comparados com seus pares que não sofreram a influência das mesmas variáveis (Nunes, 1998). Assim, como aponta Linhares (2004), tais variáveis devem ser entendidas enquanto possibilidade, e não certeza, de que essa exposição trará prejuízos para o desenvolvimento do bebê. Desse modo, cabe ao pesquisador interessado na área, questionar o que é possível ser feito para reduzir ou eliminar os prejuízos ao desenvolvimento de bebês nessas condições. Na tentativa de responder questões como essas, uma caracterização minuciosa das diversas condições de risco faz-se necessária. No presente estudo serão caracterizadas três condições de risco: prematuridade, baixo-peso e ser filho de mãe adolescente.
Bebês prematuros são aqueles nascidos com menos de 37 semanas e seis dias de gestação, calculados a partir do primeiro dia da última menstruação materna (Mota, Souza e Albuquerque, 2005). A CID-10 (O.M.S., 1997) define idade gestacional: termo - de 37 a 42 semanas de gestação (de 260 a 293 dias); pré-termo - menos de 37 semanas (menos de 259 dias); pós-termo - 42 semanas ou mais (mais de 293 dias). Pesquisadores têm apontado que uma das consequências da prematuridade é o atraso do desenvolvimento motor, dificuldades na realização de atividades de vida diária e nas atividades acadêmicas (Goyen e Lui, 2002; Hadders-Algra, 2004; Johnson, 2007; Magalhães, Wendling, Paixão, Mancini e Barbosa, 2003; Marlow, Wolke, Bracewell e Samara, 2005).
Outra condição de risco é o baixo peso, que caracteriza os bebês nascidos a termo, mas com peso inferior à 2500g (O.M.S., 1997). Essa condição exerce efeitos negativos na sobrevida da criança, assim como em seu desenvolvimento sensório-motor (Mota, Souza e Albuquerque, 2005).
Carvalho, Linhares e Martinez (2001) apontam que bebês de muito baixo peso são mais suscetíveis a complicações em seu período neonatal com possíveis seqüelas futuras como paralisia cerebral, cegueira, surdez, deficiência mental, danos cerebrais com prejuízo neurológico e problemas relacionados ao desenvolvimento intelectual. O fator de risco "baixo peso" é uma variável que tem sido associada a prejuízos na saúde (Bismarck-Nasr, Frutuoso e Gamabardella, 2008) e no desenvolvimento geral (Goto, Gonçalves, Aranha Neto, Morcillo e Moura-Ribeiro, 2005; Halpern et al., 2008). Crianças em condições de nascimento prematuro e com baixo peso são mais propensas a apresentar deficiências cognitivas, problemas de desempenho escolar e dificuldades comportamentais, quando comparadas a crianças com peso igual ou superior a 2500g e a termo (Begega et al., 2010; Bordin, Linhares e Jorge, 2001; Johnson, 2007).
Estudos apontam que os riscos para o desenvolvimento são maiores para crianças de muito baixo peso (menos de 1900 g) e muito prematuras (abaixo de 33 semanas) (Cooke, 2006; Ortiz-Mantilla, Choudhury, Leevers e Benasich, 2008). Linnet et al. (2006) em um estudo sobre baixo peso e prematuridade como condições de risco para transtorno hipercinético observaram que crianças nascidas pré-termo, mesmo que próximas ao prazo, assim como crianças nascidas a termo com baixo peso ao nascer (1500-2499 g), têm significativamente maior risco de apresentar o transtorno que crianças a termo com peso adequado. Achados como esse são indicações à saúde pública, porque a maioria dos bebês prematuros nasce perto do prazo gestacional considerado a termo.
Sobre a condição de bebês filhos de mães adolescentes, Figueiredo, Pacheco e Magarinho, (2005) investigaram as circunstâncias em que decorre a gravidez na adolescência, comparando à gravidez entre mulheres adultas. As análises estavam relacionadas a condições demográficas, sociais, anteriores e durante a gravidez. Os resultados mostraram que a gravidez na adolescência se associa a um elevado número de condições menos favoráveis, que podem comprometer a gestação e os cuidados ao bebê, como por exemplo: desemprego, monoparentalidade, consumo de tabaco, condições adversas anteriores e gravidez não desejada. Os autores constataram que um número considerável de grávidas adolescentes vive em condições desfavoráveis, pelo que, não obstante a sua variabilidade, o grupo enquanto um todo pode ser considerado de risco, quando comparado ao grupo de grávidas adultas, aumentando a probabilidade de prejuízos para o desenvolvimento de seus bebês. Outros estudos realizados com mães adolescentes confirmam tais achados por apresentarem perfil condizente com os fatores de risco presentes nas variáveis demográficas, comumente estudadas para o desenvolvimento dos filhos, pois a maioria não tem companheiro, tem poucos anos de estudo, não trabalha, é oriunda de famílias de baixa renda e não realizou pré natal ou, se o fez, foi insuficiente (Carniel, Zanolli, Almeida e Morcillo, 2006; Gallo, Reis e Leone, 2000; Kassar, Lima, Albuquerque, Barbieri e Gurgel, 2006; Simões et al., 2003; Zambonato, Horta, Pinheiro e Tomasi, 2004).
Rodrigues (2009) realizou um estudo com 217 bebês que foram avaliados no decorrer do primeiro ano de vida. Deles, 33% eram prematuros, 28% filhos de mães adolescentes, 11% com baixo peso nascidos a termo, 3% com Síndrome de Down ou filhos de mães portadoras de HIV+ e 25% do grupo controle, sem condições de risco identificado no nascimento. Os resultados mostraram que o grupo dos prematuros apresentou desempenho significativamente diferente do grupo controle e do grupo de mães adolescentes em 68% das análises conduzidas, enquanto que para o grupo de bebês baixo peso a mesma comparação indicou diferenças significativas em somente em 10% das análises.
Um fator que parece ser relevante para atenuar ou agravar problemas de desenvolvimento em bebês prematuros e de baixo peso é o gênero do bebê. Estudos oriundos de acompanhamentos de bebês de muito baixo peso (abaixo de 1500g) apontam uma mortalidade maior para meninos que para meninas (Böhm, Lundequist e Smedler, 2010; Hintz, Kendrick, Vohr, Poole e Higgins, 2006; Stevenson et al., 2000; Wood et al., 2005).
Os meninos são mais vulneráveis a alterações pré e perinatais. São abortados espontaneamente com mais freqüência, apresentam mais intercorrências durante o parto e mais malformações congênitas (Hintz et al., 2006). Além disso, entre os bebês que sofrem complicações ao nascer, morrem mais meninos que meninas, tanto no momento do parto quanto nos primeiros anos de vida (Wood et al., 2005). Os autores descreveram, também, a presença de fatores perinatais associados com morbidade de bebês prematuros com idade corrigida, abaixo de 30 meses, no Reino Unido e na Irlanda. Concluíram, ainda, que o sexo masculino é um fator de risco generalizado para paralisia cerebral e deficiências motoras graves.
Hintz et al. (2006) investigando se o gênero pode ser considerado como desvantagem para o desenvolvimento na primeira infância, avaliaram 5.253 crianças inscritas no Instituto Nacional de Saúde e Desenvolvimento Infantil, na Escandinávia, nascidas com menos de 28 semanas entre 1997 e 2000. Dentre os principais resultados os meninos foram mais sucetíveis a problemas de desenvolvimento neurológico, paralisia cerebral grave e problemas de desenvolvimento psicomotor. Os autores apontam que há uma série de variáveis biológicas desfavoráveis ao desenvolvimento neurológico em meninos.
Considera-se que, avaliar diferenças entre gêneros, pode auxiliar o desenvolvimento de medidas terapêuticas mais adequadas para essa população. Nesse contexto, programas de estimulação precoce podem atuar como possibilidades preventivas a problemas de desenvolvimento e podem minimizar ou evitar os efeitos dos fatores de risco biológicos e psicossociais (Godoy, Nunes, Perissinoto e Nunes-Sobrinho, 2000). Autores têm considerado que os avanços científicos apontam que a plasticidade do cérebro humano é mais acentuada nos primeiros anos de vida e suscetível à estimulação (Resegue, Puccini e Silva, 2007, 2008). Esses achados fundamentam a possibilidade de evolução de crianças com prognóstico de alterações no desenvolvimento por meio de diagnóstico e intervenção precoces.
O presente estudo faz parte do projeto "Acompanhamento do desenvolvimento de bebês: avaliação e orientação aos pais", que acontece no Centro de Psicologia Aplicada de uma universidade pública no interior paulista, envolvendo pesquisa e extensão, desenvolvidos com a participação de alunos de graduação em Psicologia (Rodrigues, 2003). Dentre as inúmeras condições de risco existentes, a prematuridade, baixo peso e gravidez na adolescência receberam destaque devido ao grande número de bebês encontrados nesse projeto sob essas condições.
Para implementação de medidas efetivas de intervenção e diagnóstico, a escolha de instrumentos de avaliação adequados e o acompanhamento para conhecer as especificidades de cada caso são fundamentais (Rodrigues, 2003). Nesse sentido, a caracterização da população de risco e identificação de informações relevantes sobre o seu desenvolvimento se tornam indispensáveis à continuidade do projeto e justificam a importância do presente estudo. Os instrumentos de investigação mais utilizados nesse projeto de intervenção precoce foram a Escala de Desenvolvimento do Comportamento da Criança (EDCC) padronizado para a população brasileira com crianças sem risco para o desenvolvimento (Batista Pinto, Vilanova e Vieira, 1997) e o Inventário Portage Operacionalizado (IPO), adaptado para a população brasileira (Williams e Aiello, 2001).
O primeiro instrumento é composto por 64 comportamentos, que são avaliados mês a mês, de acordo com o sexo da criança. Os comportamentos avaliados são organizados como: aparecimento, quando o comportamento apareceu pelo menos para uma das crianças da amostra; normalização, quando o comportamento ocorreu para a média das crianças da amostra e estabilização, quando o comportamento ocorreu para a maioria das crianças da amostra. O segundo instrumento é composto por 580 comportamentos distribuídos em cinco áreas: Linguagem, Desenvolvimento Motor, Autocuidado, Cognição e Socialização e separados por faixa etária de zero a seis anos e uma área específica para bebês de zero a quatro meses, o protocolo de Estimulação Infantil do Inventário Portage Operacionalizado (IPO). O primeiro instrumento possui a vantagem de já considerar diferenças de gênero, mas possui uma quantidade menor de comportamentos observados e sua utilização é restrita apenas ao primeiro ano de vida. Já o segundo, embora não possua análise por gênero, tem aplicabilidade maior por ser utilizado em crianças até seis anos de vida e permite uma avaliação mais detalhada.
Batista Pinto (2009) utilizou a EDCC para avaliar o comportamento de 21 bebês prematuros (de 33 a 36 semanas de gestação), de um a 12 meses. Os resultados mostraram que a partir do terceiro mês houve recuperação importante no ritmo de desenvolvimento do comportamento. Contudo a amostra ainda apresentou fator de risco de comportamentos não-normalizados até 12 meses incompletos. De forma geral, o sexo feminino apresentou um desenvolvimento do comportamento em ritmo mais rápido do que o sexo masculino, com diferença estatisticamente significante nas freqüências de normalização e estabilização de alguns comportamentos. A forma de organização de tal escala se mostrou útil para detecção de elementos que podem favorecer o acompanhamento do processo de desenvolvimento do comportamento destas crianças e na detecção precoce de atrasos ou possíveis distúrbios neste processo.
Taques e Rodrigues (2006) aplicaram o protocolo de Estimulação Infantil do IPO em 40 bebês durante os quatro primeiros meses de vida e analisaram os resultados dos desempenhos, considerando a categorização dos comportamentos com base nos critérios de aparecimento, normalização e estabilização propostos em Garrett (1974), e também, considerando os gêneros, ou seja, foi utilizada a estrutura de organização da Escala de Desenvolvimento do Comportamento da Criança (EDCC). Os resultados mostraram que há diferenças entre os gêneros e que alguns comportamentos ocorrem tipicamente a cada mês, sugerindo adequações na escala. As autoras concluem que um número menor de comportamentos avaliados a cada mês facilitaria o processo de avaliação de bebês e orientação de pais. Contudo, ressaltam que, apesar da ausência dessa estruturação, o Inventário Portage Operacionalizado tem-se mostrado um instrumento importante de avaliação de desenvolvimento de bebês por possuir um maior detalhamento de comportamentos a serem observados, se comparado a outros instrumentos.
O presente estudo partiu da proposta de análise de Taques e Rodrigues (2006), em uma população maior e teve como objetivo avaliar o desenvolvimento de bebês, considerando as variáveis condições de risco (prematuridade, baixo peso e filhos de mães adolescentes) e sexo.
MÉTODO
Participantes
Participaram do projeto 82 crianças, sendo 42 meninos e 40 meninas, com idade entre 30 e 59 dias por ocasião da avaliação. Todos os bebês eram oriundos de uma maternidade que atende majoritariamente usuárias do Serviço Único de Saúde e eram identificados por informações obtidas no Banco de Leite Humano, de uma cidade de médio porte do interior paulista. Os critérios utilizados para inclusão das crianças no mesmo foram os seguintes: peso igual ou inferior 2.500 g em nascimentos a termo; idade gestacional inferior a 37 semanas e filhos de mães adolescentes (de 10 a 17 anos).
A Tabela 1 mostra que a maioria (55%) dos participantes eram filhos de mães adolescentes e o restante dividiu-se em bebês pré-termo (24%) e com baixo peso ao nascer (21%), sendo 55% meninos.
Instrumentos
Foi utilizado o protocolo de "Estimulação Infantil" do Inventário Portage Operacionalizado (Williams e Aiello, 2001), que contém 45 itens, com espaço para anotação do desempenho da criança (Tabela 2), além de brinquedos e outros aparatos previstos no manual de aplicação do instrumento.
Local
Os participantes eram atendidos em uma sala do Centro de Psicologia Aplicada da referida universidade. Nesta sala havia mesa e cadeiras utilizadas na entrevista com os pais e uma cama alta onde os bebês eram avaliados.
Procedimento
O presente projeto foi aprovado pelo do Comitê de Ética da Universidade Pública onde o projeto foi desenvolvido (Processo n° 2243/46/01/06). Após a identificação dos bebês os pais eram contatados via telefone e convidados a participar do projeto em um Centro de Psicologia Aplicada. O primeiro atendimento de cada bebê foi agendado, a partir de 30 até 59 dias após seu nascimento.
O primeiro encontro era iniciado pela apresentação do projeto de extensão que previa o acompanhamento do desenvolvimento de bebês durante o primeiro ano de vida, avaliando mensalmente o seu desenvolvimento, acrescido de orientação aos pais. Em caso de concordância, os pais assinavam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, cientes de que a sua identidade e a da criança permaneceriam em anonimato, nas apresentações dos resultados obtidos em congressos e publicação em periódicos da área, garantindo que os dados obtidos seriam trabalhados em conjunto com os de outros sujeitos.
Na segunda etapa era conduzida a primeira avaliação do desenvolvimento do bebê, de acordo com as instruções do manual de aplicação do Inventário Portage Operacionalizado (Williams e Aiello, 2001), previsto para os quatro primeiro meses. As avaliações foram conduzidas na presença dos pais que serviram como mediadores e informantes. O comportamento do bebê foi avaliado basicamente por duas formas: a) o pesquisador poderia organizar um ambiente para observar a emissão de comportamentos específicos descritos no inventário, por exemplo, emitir ruído do chocalho ao lado da criança e observar se a mesma movimentava a cabeça em direção ao som; b) pesquisador perguntava aos pais sobre comportamentos não observados durante a avaliação, tais como, a alimentação, a rotina do sono, choro, se reconhecem os membros da família.
Análise dos dados
Para organização dos resultados, cada um dos 45 comportamentos do protocolo foi categorizado com base nos critérios de a) Aparecimento, quando pelo menos 25% dos bebês apresentavam o comportamento; b) Normalização quando 26 a 75% dos bebês apresentavam o comportamento e c) Estabilização, quando 76% ou mais dos bebês o apresentavam, com base na proposta de Garrett (1974). Esses critérios foram aplicados considerando a condição de risco e o sexo do bebê.
Também foi realizada análise de variância para identificar se havia diferença estatística significativa entre a freqüência de comportamentos em aparecimento, normalizados e estabilizados nas diferentes condições de risco e entre gêneros.
RESULTADOS
A Figura 1 ilustra as diferenças entre os desempenhos de meninos e meninas, independente das condições de risco em que se encontravam. Em relação aos comportamentos estabilizados, as meninas apresentaram maior número do que os meninos. A freqüência de comportamentos normalizados foi a mesma para ambos os grupos. Já os comportamentos em aparecimento foram em maior número para os meninos do que para as meninas.
Comparando o desempenho dos bebês considerando as condições de risco (filhos de mães adolescentes, prematuridade e baixo peso ao nascer) demonstrado na Figura 2, verifica-se que os filhos de mães adolescentes, em média, apresentaram valores significativamente superiores aos bebês prematuros (p=0,001) e com baixo peso (p= 0,05) ao nascer. Os grupos de bebês prematuros e bebês de baixo, quando comparados entre si, apontaram um desempenho ligeiramente melhor para os bebês de baixo peso, porém, não estaticamente significativo.
Nas comparações quanto ao sexo, analisando as três condições, verifica-se que, em todas elas, as meninas tiveram melhor desempenho e, somente na condição de filhos de mães adolescentes não se observou diferença significativa entre meninos e meninas. Na condição de bebês pré-termo, as meninas tiveram desempenho estatisticamente superior aos meninos (p=0,05) e, no grupo de bebês de baixo peso, as meninas tiveram desempenho significativamente superior aos meninos dentro da mesma condição (p=0,001).
DISCUSSÃO
Na comparação entre gêneros dentro das diferentes categorias de freqüência de desempenhos (não aparecimento, aparecimento, normalização e estabilização), sem detalhamento das condições de risco, não foram encontradas diferenças significativas entre meninos e meninas. Observou-se que as meninas têm mais comportamentos estabilizados, o que significa que a maioria das meninas apresenta os mesmos comportamentos, enquanto para os meninos ocorre um maior aparecimento de novos comportamentos. Tais resultados apontam para uma maior variabilidade de comportamentos entre os meninos e uma consistência maior de comportamentos entre as meninas.
Considerando-se as condições de risco, os filhos de mães adolescentes apresentaram desempenho significativamente melhor dos que as das demais condições, prematuros e baixo peso e, entre dois últimos não foram observadas tais diferenças. Na presente análise foi utilizado o mesmo instrumento de avaliação dos estudos de Taques e Rodrigues (2006) e de Rodrigues (2009), o que nos permite fazer aproximações entre os resultados que indicam para o melhor desempenho entre os filhos de mães adolescentes e desempenho pior para os bebês prematuros.
Embora essas condições possuam características diferentes, ou seja, bebês prematuros e baixo peso tenham condições de risco intrínsecas ao desenvolvimento e bebês filhos de mães adolescentes tenham condições sociais consideradas de risco, avaliar o desenvolvimento de tais bebês e comparar seu desenvolvimento, pode ser uma possibilidade útil para planejar programas de intervenção precoce. No projeto, do qual o presente estudo faz parte, essas três condições são as mais representativas da população atendida.
Sobre a elaboração de programas de intervenção precoce, Rodrigues (2003) aponta a necessidade de caracterização detalhada da população alvo. A amostra estudada se refere a um grupo sob avaliação e orientação de pais em uma cidade do interior paulista, estudos como esses podem trazer indicativos relevantes sobre quais dos grupos em atendimento se encontram em situações que parecem trazer mais prejuízos e assim podem trazer subsídios para uma intervenção mais efetiva.
Nas comparações quanto ao sexo não se observou diferenças significativas entre as meninas e meninos filhos de mães adolescentes, que de certo modo, não possuem problemas biológicos no seu desenvolvimento. Entretanto, tanto entre os bebês prematuros e os com baixo peso, as meninas apresentaram desempenho significativamente melhor. Estes dados coincidem com os obtidos por Böhm et al. (2010), Brothwood, Wolke, Gamsu, Benson e Cooper (1986), Stevenson, et al. (2000) e Wood et al. (2005). Esses estudos utilizaram instrumentos de avaliação e análises diferentes do utilizado na presente investigação, mas apontam resultados similares em relação aos riscos para o desenvolvimento de meninos.
Batista Pinto (2009) utilizou o EDCC para avaliação de bebês prematuros brasileiros, embora o instrumento de avaliação tenha sido diferente do presente estudo, a categorização de comportamentos em aparecimento, normalização e estabilização, semelhante ao presente estudo, também apontou para uma diferença significativa de alguns comportamentos normalizados e estabilizados a favor das meninas.
Levanta-se a partir desses dados, a hipótese de que a condição de prematuridade e baixo peso possam ser fatores mais agravantes para o desenvolvimento, caso o bebê seja do sexo masculino. Essa hipótese é coerente as afirmações de Hintz et al. (2006) de que há uma série de variáveis biológicas que prejudicam o desenvolvimento de meninos. Contudo, sugere-se em pesquisas futuras investigar se há diferença nas práticas parentais no cuidado de meninas ou meninos prematuros e de baixo peso, visando identificar variáveis ambientais que podem atenuar ou minimizar os efeitos de tais condições de risco.
A proposta de análise de Taques e Rodrigues (2006) para a organização dos resultados pareceu útil para caracterizar de forma geral, os diversos comportamentos avaliados do IPO, contudo, novas análises visando descrever especificamente quais comportamentos são significativamente mais difíceis de ser observados nas populações de risco.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Embora a amostra tenha sido pequena e dificulte generalizações, esta contribuiu para subsidiar intervenções específicas para a população investigada. Estudos que buscam descrever e caracterizar o desenvolvimento de bebês em diferentes de condições de risco parecem fundamentais para a elaboração de medidas para prevenção de prejuízos futuros. Dentre os diversos aspectos para caracterizar a população, identificar diferenças entre gêneros em bebês de risco ainda são escassas. Os dados parecem indicar que as condições de risco possuem maior probabilidade de causar danos ao desenvolvimento à população masculina que à feminina. Diante desse quadro, outras análises e elaboração de programas de estimulação precoce constituem-se fundamentais para minimizar os riscos de problemas de desenvolvimento nessa população.
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Recebido em 4/10/10
Revisto em 10/01/2012
Aceito em 12/01/12
* Endereço para correspondência: Christiana - Rua Bela Vista, 139, Bairro Monte Alegre. Ribeirão Preto. CEP: 14051-070. E-mail: chris_gma@hotmail.com; olgarolim@fc.unesp.br; henri@feb.unesp.br