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Acta Comportamentalia

versão impressa ISSN 0188-8145

Acta comport. vol.19 no.2 Guadalajara  2011

 

 

Educação terapêutica para a pacientes com dermatite atópica e seus cuidadores: uma revisão sistemática

 

Therapeutic education for atopic dermatitis patients and their caregivers: a sistematic review

 

 

Robson Zazula, Márcia Cristina Caserta Gon, Bruna Del Giudice Machado, Lucimara Cristina Frasson Pontes, Priscila Andrade & Renata Garcia de Almeida Moraes

Universidade Estadual de Londrina Programa de Pós-graduação Strictu Senso em Análise do Comportamento

 

 


RESUMO

A dermatite atópica (DA) é uma doença crônica de pele, de etiologia desconhecida e com maior incidência na infância, o que exige o estabelecimento de rotinas de tratamento para evitar a recorrência dos sintomas. Uma difi culdade no controle adequado da doença é a baixa adesão ao tratamento pelos pacientes e seus cuidadores. Com o objetivo de obter uma melhora na qualidade de vida, programas de educação terapêutica (ET) têm sido propostos como forma efi caz de aumentar a adesão ao tratamento. O objetivo deste estudo é avaliar a qualidade das evidências científicas que dão suporte à indicação da implantação de programas de ET para crianças ou adolescentes com DA e/ou seus cuidadores. Foi realizada uma revisão sistemática de pesquisas empíricas publicadas entre 2000 e 2010, que utilizaram como estratégia de intervenção a ET com essas famílias. Nove artigos foram selecionados entre os 115 localizados. Constatou-se que diferentes variáveis, como quantidade de medicamentos utilizados, qualidade de vida e nível de conhecimento e informação sobre a doença foram investigadas. Além disso, observa-se ausência de descrições detalhadas dos procedimentos, o que difi culta a sua replicação. Apesar destas limitações, os resultados obtidos indicam eficácia de programas de ET direcionados a essa população.

Palavras chave: educação terapêutica, dermatite atópica, eczema, psicologia da saúde, programas educacionais, criança, adolescente, cuidadores, revisão sistemática.


ABSTRACT

Atopic dermatitis (AD) is a chronic skin condition of unknown etiology that commonly affects children. In last years, the AD's incidence increased in world-wide. The most common symptoms are a red, imfl amed and itchy rash in skin and can be treated by the use of topical drugs, like ointments, creams and, in some cases, systemic drugs, like injections. In order to avoid recurrences, therapy should be maintained, and it is mandatory to establish treatment routines to control symptoms. Frequently, keeping an adherence to prescribed therapy is a challenge to patients and caregivers. One strategy that has been proposed as an effective way to enhance adherence to medical prescriptions in AD is therapeutic education programs (TE). These programs consist of advice and motivation techniques applied to patients and caregivers, in order to improve compliance with medical recommendations, and give them a better quality of life. The goal of the present study is to evaluate the quality of scientifi c evidences that support these programs, especially for children and adolescents with AD and their caregivers. A systematic review of studies about TE in children and adolescents with AD, published between 2000 and 2010, was performed. From 115 articles identifi ed and analysed by the authors, nine were considered eligible for this review. In these studies, the main objective was to evaluate efficacy of intervention programs by using different variables as quality of life indexes, amount of skincare products applied to skin, and degree of knowledge and information about the disease. All studies included parents and/or caregivers and in seven studies included them and the children and/or adolescents with AD. Six studies used as research design a prospective, randomized controlled trial, one a randomized controlled multicenter trial, one a single case research design and another one didn't specify the research designed adopted. Seven studies made 1-year-follow-up assessment. This discrepancy of methods used in each study does not permit the comparison of outcomes. Furthermore, the paucity of information describing applied methods and the contents of each intervention session make any attempt of study replication by other authors a diffi cult task. Despite these limitations, outcomes from research point to the effectiveness of educational programs directed to children and adolescents with AD and their caregivers.

Keywords: therapeutic education, atopic dermatitis, eczema, health psychology, educational programs, child, adolescent, caregivers, systematic review.


 

 

A dermatite atópica (DA) é doença de pele crônica, de etiologia desconhecida, com períodos de remissão e exacerbação (Pires & Cestari, 2005; Sampaio & Rivitti, 1998). Atinge predominantemente crianças, com 90% dos casos, iniciando-se até os cinco anos de idade e quase sempre durante o primeiro ano de vida. A prevalência da DA tem aumentado nos últimos anos, acometendo, atualmente, cerca de até 20% da população mundial (Gontijo et al., 2008).

Dentre os fatores precipitantes da doença, destacam-se a predisposição genética, irritabilidade aumentada da pele, substâncias aeroalergênicas, reatividade vascular alterada, maior produção de suor, poluição e coceira intensa (Willians, 2005). Além disso, em cerca de 30% dos casos, há ocorrência de correlações com outras doenças crônicas, em especial a asma e a rinite alérgica.

Os sintomas da DA são alterações cutâneas, como: prurido, lesões crostosas, infl amações, avermelhamento, coceira intensa, que muitas vezes, agravam a infl amação na pele. Por ser uma doença crônica, o principal objetivo do tratamento é o controle da doença. Este controle visa a melhora dos sintomas e prevenção das recorrências e das exacerbações, por meio do uso de medicamentos tópicos, como cremes hidratantes ou pomadas. Nos casos mais graves são usados medicamentos sistêmicos, como corticóides (Pires & Cestari, 2005).

A cronicidade da doença exige o estabelecimento de rotinas de tratamento por parte da criança e de seus cuidadores, como forma de evitar a recorrência dos sintomas. Dentre estes cuidados, é fundamental manter a hidratação da pele. Isto implica na adoção de alguns hábitos pelo paciente em relação à sua higiene diária. Para evitar o ressecamento da pele, os banhos devem ser curtos, mantendo a água em temperatura morna, os sabonetes devem ter pH neutro e não devem ser utilizados em excesso. Deve-se evitar o uso de esponjas ou buchas. Estes cuidados precisam ser seguidos pela aplicação imediata de emolientes para evitar a evaporação da água da pele. É importante também evitar fontes de calor, usar toalhas macias, sem esfregar a pele e manter as unhas curtas e limpas (Cudos & De Lucas, 2009). Outros fatores devem ser igualmente evitados, como o uso de roupas com tecidos sintéticos e sapatos fechados. Em casa, tapetes e cortinas devem ser retirados. Ter animais de estimação como gatos e cachorros não são recomendados.

No entanto, nem todas as famílias conseguem seguir ou manter por muito tempo as recomendações médicas em relação aos cuidados diários. Problemas típicos incluem uso inconsistente de medicamentos tópicos, havendo interrupção quando há diminuição da severidade dos sintomas. Há falhas em monitorar a condição da pele, de acordo com sinais precoces de recorrência da doença, além de resistência para realizar o tratamento (Czyewski & Lopes, 1998).

Segundo Lapsley (2006), a baixa adesão ao tratamento da DA é um dos principais motivos para a falha no controle dos sintomas. De acordo com o mesmo autor, a baixa adesão tem como causa principal a falta de conhecimento sobre a doença e seu tratamento. Ele afi rma que crianças ou adolescentes com dermatite e seus cuidadores têm várias necessidades educativas, que devem ser satisfeitas para que possam ter a possibilidade de assumir o controle da doença. Dentre as principais necessidades dos pacientes e/ou seus cuidadores, destacam-se: (1) compreensão da doença como um transtorno crônico e recidivante, sem cura, mas que pode ser gerenciada efetivamente, (2) oportunidades de busca por melhores tratamentos, de modo a encontrar aqueles que se adaptem às suas necessidades, e (3) conhecimento sobre a forma mais adequada de aplicação dos medicamentos tópicos.

Contudo, atender a essas necessidades se torna ainda mais difícil quando se tratam de pacientes e cuidadores atendidos em ambulatórios de serviços públicos de saúde. Nestes locais, a quantidade de pessoas que devem ser atendidas diariamente é grande e, por esta razão, o tempo das consultas não é sufi ciente para que um trabalho educativo seja desenvolvido de maneira satisfatória. Ao longo do tratamento médico padrão, os cuidadores necessitam também de acompanhamento e encorajamento. Além disso, tratamentos tópicos requerem a participação ativa do paciente e de sua família. Frequentemente, as orientações dadas ao paciente e/ou cuidador durante a consulta médica tomam muito tempo e não são sufi cientes, em muitos casos, para ajudá-los na compreensão da doença (Lapsley, 2006; Ricci, Bendandi, Aiazzi, Patrizi, & Masi, 2009).

Portanto, como destacam Cork et al. (2003), as principais variáveis relacionadas à baixa adesão ao tratamento relacionam-se: ao pouco tempo de consulta que o especialista dispõe para explicar as condições dermatológicas e à baixa qualidade e/ou pouca quantidade de informações que são dadas ao paciente ou a seus responsáveis. Isto indica menor participação do paciente e/ou seu cuidador nas consultas, o que diminui a sua satisfação e prejudica o cumprimento do tratamento para obtenção de bons resultados.

Uma alternativa para minimizar as dificuldades de orientação médica aos pacientes com DA e seus cuidadores tem sido a criação de programas interdisciplinares estruturados, com a inclusão de profi ssionais da área da saúde (Barbarot et al, 2007; Ricci et al., 2009; Staab et al., 2006). As estratégias de intervenção que compõem estes programas são centradas no paciente e/ou em seus cuidadores, e os auxiliam a adotar ou modifi car condutas para lidar de forma efi caz com a doença, aumentando a probabilidade de adesão ao tratamento médico. Portanto, tomando-se por base o que foi apresentado, o objetivo dos autores, neste artigo, é avaliar a qualidade das evidências científicas (objetivos, método e resultados) que suportam a indicação da implantação destes programas para crianças ou adolescentes com DA e/ou seus cuidadores.

 

MÉTODO

Uma pesquisa eletrônica foi realizada nas seguintes bases de dados: (1) MEDLINE/PubMed (via National Library of Medicine), (2) SCOPUS (Elsevier), (3) Web of Science, (4) Academic Search Premier (EBSCO) e (5) PsycINFO. Utilizaram-se as palavras ou expressões-chave: education program, therapeutic education, psychoeducational intervention, atopic dermatitis, eczema.

Foram incluídos apenas os artigos que relatavam pesquisas empíricas que utilizaram como estratégia de intervenção a educação terapêutica com crianças e/ou adolescentes diagnosticados com DA e/ou seus cuidadores, publicados entre 2000 e 2010, nos idiomas em inglês, espanhol ou português.

A qualidade científica das pesquisas foi verifi cada a partir das seguintes categorias de análise: (1) objetivos da pesquisa, (2) população-alvo e idade dos participantes, (3) delineamento do estudo e utilização de grupo controle, (4) seguimento de avaliação da manutenção dos resultados da intervenção, (5) instrumentos de medidas utilizados, (6) temas abordados no programa e (7) resultados principais.

 

RESULTADOS

Após a pesquisa eletrônica com as palavras e expressões chaves selecionadas, foram localizados 115 artigos. Entretanto, apenas nove artigos relatavam pesquisas empíricas que utilizaram como estratégia de intervenção programas de educação terapêutica com crianças e/ou adolescentes diagnosticados com DA e/ ou seus cuidadores. Estes foram selecionados para revisão e análise. Os resultados serão descritos de acordo com as categorias apresentadas na seção anterior.

Quanto aos objetivos das pesquisas selecionadas, todas visaram avaliar a eficácia do programa, porém a partir de variáveis diferentes. As variáveis investigadas nos estudos estão sumarizadas na Tabela 1.

 

 

Em relação à população-alvo estudada (amostra envolvida nas intervenções realizadas), nos nove estudos houve a participação direta do cuidador, sendo que em sete estudos houve participação também das crianças. Entretanto, a idade média dos cuidadores foi descrita em apenas três estudos, as quais foram: (1) 32,7 anos (Wenninger et L., 2000), (2) 35 anos para os pais e/ou cuidadores e 37 anos para as mães e/ou cuidadoras (Ricci et al., 2009), e (3) 32,9 para os pais e/ou cuidadores do grupo intervenção e 35,8 do grupo controle (Bergmo L L., 2009). A idade média das crianças nos nove estudos foi próxima aos 6 anos (Tabela 2).

 

 

Quanto ao delineamento das pesquisas, seis estudos foram do tipo randomizado e controlado, um do tipo multicêntrico, randomizado e controlado, um de sujeito único e um estudo não especifi cou o delineamento. Os estudos randomizados e controlados (multicêntrico ou não), tiveram grupo controle formado por indivíduos que não participaram da intervenção. O número de participantes que compuseram os grupos de intervenção nos estudos variou entre 16 e 274, ao passo que o número de participantes que compuseram o grupo controle variou entre 16 e 244.

Há ainda um estudo que separou os grupos de intervenção e controle por faixas etárias (Staab L L., 2006). Neste foram formados três grupos de controle e três grupos de intervenção, com pacientes e/ou cuidadores, de acordo com as seguintes idades das crianças e adolescentes: até 7 anos, entre 8 e 12 anos e entre 13 e 18 anos.

Quanto à presença de avaliação de seguimento dos resultados da intervenção, sete estudos o fi zeram após um ano do término da intervenção. Os dados referentes ao delineamento e seguimento de avaliação utilizados nas pesquisas estão sumarizados na Tabela 3.

 

 

Em relação aos instrumentos de medidas, foram utilizados com maior frequência aqueles que avaliaram a qualidade de vida, as respostas de enfrentamento e o grau ou frequência da coceira nas crianças. Os estudos que mediram a qualidade de vida, o fi zeram por meio de inventários ou questionários específi cos da Dermatologia. Grillo et al. (2006), por exemplo, utilizaram para medir o impacto da doença na qualidade de vida das crianças, o Children's Dermatology Life Quality Index (CDLQI), o Infant's Dermatology Life Quality Index e o Scoring Atopic Dematitis Rating System. Para a mensuração do impacto da doença na família, os mesmos autores usaram o Dermatitis Family Impact Questionnaire. Este último instrumento foi também utilizado na pesquisa de Ricci et al. (2009), juntamente com o Infantis´ Dermatitis Quality of Life Index e o Fava Kellner Symptom Questionnaire. Os dois instrumentos objetivaram mensurar a evolução dos sintomas de DA. Blessman-Weber et al. (2008) também usaram o CDLQI. Staab et al. (2002), Staab et al. (2006) e Wenninger et al. (2000) também se propuseram avaliar a qualidade de vida de crianças com DA e, para isto, utilizaram o questionário alemão Quality of life in parents of children with atopic dermatitis.

As estratégias de enfrentamento apresentadas pelos cuidadores e/ou crianças e adolescentes foram avaliadas por meio dos questionários: Trier scales of coping (Staab et al., 2002; Wenninger et al., 2000); Coping Behavior in Parents of Children with Atopic Dermatitis (FEN) (Staab et al., 2006; Wenninger et al., 2000). Blessman-Weber et al. (2008) usaram o instrumento sobre qualidade de vida, CDLQI, para medir também o enfrentamento. Dentre as principais estratégias de enfrentamento apresentadas pelas crianças com DA e seus cuidadores nos estudos destacam-se, predominantemente, a emissão de relatos queixosos dos pais e/ou cuidadores, bem como respostas de fuga e esquiva em relação aos principais problemas relacionados ou não à doença (e.g., busca por informações, suporte social, relatos verbais relacionados à doença) (Staab et al., 2002; Wenninger et al., 2000). Além disso, em alguns estudos houve correlação positiva entre as respostas globais de enfrentamento com o comportamento de coçar (Blessman-Weber et al., 2008; Staab et al., 2006). No estudo conduzido por Staab et al. (2006), foram utilizadas duas versões do questionário Coping and Itching Questionary: uma direcionada crianças com idades entre 8 e 12 anos e outra para adolescentes com idades entre 13 e 18 anos.

As pesquisas que avaliaram os efeitos do programa sobre a severidade dos sintomas da DA foram oito. Dentre estas, sete usaram o SCORAD (Scoring Atopic Dermatitis) como indicador de severidade da DA e uma, conduzida por Cork et al. (2003), o SASSAD (Six Area, Six Sign Atopic Dermatitis Severity Score). Staab et al. (2006) compararam, ainda, os dados do SCORAD com os de uma escala subjetiva, na qual os cuidadores comparavam as lesões na pele de suas crianças com fotos das lesões apresentadas pelos facilitadores dos grupos.

Observou-se também nos estudos, a mensuração de outras variáveis, como forma de avaliar a eficácia das intervenções propostas. Destacam-se: (1) quantidade de medicamentos utilizados pelos pacientes (Staab et al., 2002), (2) nível de conhecimento ou informação sobre a doença (Ricci et al., 2009; Staab et al., 2002), (3) mudança no estilo parental (Kupfer et al., 2010) e (4) o número de visitas ao médico (Cork et al., 2003). Além disso, Bergmo, Wangberg, Schopf e Solvoll (2009), por meio de questionários e fichas de registros, propuseram verifi car como consultas realizadas por meio da internet, para pacientes com DA e/ou seus cuidadores, afetavam os comportamentos de cuidado dos pais em relação à doença. Os resultados quanto aos instrumentos de medidas estão sumarizados na Tabela 4.

 

 

Quanto aos temas abordados (Tabela 5), houve, em todos os programas, referência às informações básicas sobre a DA (sintomas, etiologia e tratamento). Os assuntos discutidos com maior Lqüência nas intervenções foram: (1) enfrentamento à coceira, (2) dificuldades de sono, (3) cuidados com a pele e a (4) alimentação, como fator desencadeante para piora do estado da doença. Alguns programas incluíram ainda informações sobre: tratamentos adicionais e/ou alternativos (Grillo, Gassner, Marshman, Dunn, & Hudson, 2006; Staab L L., 2006; Wenninger L L., 2000), manejo do estresse (Staab L L., 2002; Staab L L., 2006), formas de amenizar a DA por meio de massagem na pele durante a aplicação dos medicamentos tópicos (Ricci L L., 2009) e efeitos da DA na rotina do cuidador e da criança (Staab L L., 2002; Staab L L., 2006).

 

 

A partir dos resultados obtidos nas pesquisas selecionadas, observou-se, logo após a intervenção que, embora tenha havido a diminuição da severidade da doença, não houve diferença estatisticamente signifi cante entre os grupos de intervenção e controle, exceto nos estudos de Grillo et al. (2006) e Ricci et al. (2009). Nestes estudos, a diminuição da severidade dos sintomas foi maior no grupo de intervenção. Ambos os grupos apresentavam enfoque psicoeducacional, com formato interdisciplinar, com a inclusão de diferentes profi ssionais (e.g., médicos, psicólogos, nutricionistas). No entanto, apenas o estudo de Ricci et al. (2009) apresenta descrição detalhada das estratégias de intervenção empregadas pela equipe de pesquisadores, que foram: o ensino de técnicas comportamentais de relaxamento e massagens, para que os pais aplicarem em seus filhos e manipulação de contingências ambientais para diminuir a ocorrência de problemas relacionados ao sono (e.g., duração e período do sono, uso de roupas e lençóis em algodão, dentre outras).

Entretanto, dentre os estudos que realizaram seguimento de 12 meses, constatou-se diminuição estatisticamente signifi cante da severidade dos sintomas nos participantes dos grupos de intervenção em relação aos controles (Cork et al., 2003; Grillo et al., 2009; Kupfer et al., 2010; Staab et al., 2006). Apenas no estudo de Wenninger et al. (2000), a diferença entre a severidade da doença entre o grupo controle e intervenção não foi estatisticamente signifi cante, tanto após o tratamento,quanto na avaliação de seguimento.

Em relação aos outros indicadores (qualidade de vida, intensidade do prurido, respostas de enfrentamento e grau de conhecimento sobre a DA), observou-se diferença signifi cante entre o grupo intervenção e o controle em todos os estudos avaliados. Por exemplo, nas pesquisas de Grillo et al. (2006) e Staab et al. (2002) a frequência de respostas de autocuidado por pacientes com DA e/ou seus cuidadores foi maior quando comparada com a dos participantes do grupo controle. Observou-se ainda menor número de visitas ao médico, menores gastos com o tratamento (Bergmo et al., 2009; Cork et al., 2003) e maior frequência no uso de medicamentos tópicos (Staab et al., 2002) no grupos de intervenção. Além disso, houve menor frequência de relatos queixosos e maior frequência de respostas de enfrentamento relacionadas à doença entre os participantes que passaram pelo programa de educação terapêutica (Kupfer et al., 2010; Wenninger et al., 2000).

 

DISCUSSÃO

Quanto aos objetivos das pesquisas selecionadas para análise, observou-se que todas visaram demonstrar a eficácia de programas de educação terapêutica na qualidade de vida dos participantes, por meio da avaliação de diferentes variáveis. Isto ocorre devido ao fato de que são muitas as variáveis que podem ser incluídas na avaliação da eficácia dos programas educacionais na área da saúde e que infl uenciam diretamente a qualidade de vida além de indicadores biológicos, como por exemplo, o nível de severidade da DA. Dentre as variáveis mais frequentemente estudadas, destacam-se a intensidade do prurido, a qualidade de vida e estratégias de enfrentamento relacionadas à doença. Contudo, esta diversidade prejudica a generalização dos resultados obtidos nas pesquisas. Além disso, há ausência de descrições detalhadas dos procedimentos empregados, o que torna difícil que replicações sejam feitas. Apesar destas limitações, os resultados obtidos nessas pesquisas mostraram a eficácia de programas de educação terapêutica direcionados a essa população. Como mencionado, seis estudos foram randomizados e controlados, o que aumenta a confi abilidade dos dados obtidos. Sobre a idade população-alvo para a qual as intervenções foram direcionadas, observou-se que em seis estudos a idade das crianças foi de até seis anos. É até esta idade que as crianças apresentam maior probabilidade de desenvolver a doença, o que justifi caria o número de estudos encontrados. Embora em menor quantidade, há relatos também de intervenções com adolescentes (Cork et al., 2003; Grillo et al., 2006; Staab et al., 2006).

Os cuidadores participaram de todos os estudos e em sete houve também participação das crianças. A participação do cuidador evidencia a sua importância como responsável pela realização do tratamento da DA. De acordo com Grillo et al. (2006), em tratamentos realizados com crianças menores de cinco anos, o cuidador possui papel central na adesão ao tratamento, ao passo que crianças mais velhas apresentam repertório mais amplo de autocuidado, assumindo assim um papel mais ativo no tratamento.

Entretanto, apesar do repertório de autocuidado estar mais desenvolvido nas crianças mais velhas e em adolescentes, a participação dos cuidadores em programas de educação terapêutica é também imprescindível para maior adesão ao tratamento. A interação estabelecida entre a criança que provê ou instrui a realização do tratamento e seu cuidador é extremamente importante para a adesão. Tais dados são apontados por Grillo et al. (2006), que observaram maior eficácia da intervenção realizada com crianças maiores ou adolescentes quando os seus cuidadores participaram do processo.

Outro fator que pode favorecer a maior eficácia de programas de educação terapêutica realizados com crianças mais velhas e/ou pré-adolescentes com DA e seus cuidadores é o controle verbal. Segundo Luciano e Herruzo (1992), a adesão ao tratamento é um processo comportamental controlado por regras, envolvendo a descrição de consequências não contingentes ao responder do indivíduo, trazendo consequências remotas ao responder para o momento atual. Bentall e Lowe (1987), com o objetivo de avaliar o controle exercido por instruções verbalizadas pela comunidade sócio-verbal no responder em crianças consideradas normais e com diferentes faixas etárias, concluiu que quanto mais velha a criança, maior a probabilidade de seguimento de instruções e maior a precisão para a realização de tarefa. A partir disso, pode-se hipotetizar que no caso de pacientes com doenças crônicas, em especial a DA, quanto mais velha a criança, maior o controle exercido pela comunidade sócio-verbal (e.g., instruções e orientações relacionadas ao tratamento médico, controle dos sintomas e diminuição da severidade da doença).

Apesar disso, o envolvimento dos pais e/ou cuidadores no processo de adesão, mais especifi camente no caso de adolescentes, é uma variável importante na adesão e seguimento adequado do tratamento (Luciano & Herruzo, 1992). Mesmo que cuidadores transfi ram a responsabilidade dos cuidados à saúde para as crianças à medida que fi cam mais velhas, eles devem acompanhá-los no tratamento e cuidados com a pele no dia-a-dia. Murphy et al. (1997), Skinner, John e Hampson (2000) enfatizam que mesmo após a transferência da responsabilidade dos cuidados à saúde à criança ou ao adolescente, é necessária a participação e o apoio dos cuidadores no tratamento para aumentar a probabilidade de adesão e autocuidado. Esta participação é necessária porque crianças e adolescentes não seguem o tratamento com a mesma rigidez a qual o faz seus cuidadores. Há exigência constante de monitoramento e negociação para que os filhos façam o tratamento (Ricci et al., 2009). Portanto, programas de educação terapêutica para pacientes pediátricos com DA devem incluir os seus cuidadores a fi m de alcançarem melhores resultados.

Por meio das avaliações de seguimento realizadas, constatou-se a diminuição dos sintomas de DA dos pacientes do grupo intervenção quando comparados com os do grupo controle. Este resultado demonstra que a realização de grupos de educação terapêutica para pacientes com DA e/ou seus cuidadores são efi cazes. Constatou-se em todos os estudos aumento dos indicadores comportamentais avaliados no período de seguimento, em comparação com pacientes com DA e/ou cuidadores do grupo controle. Assim, quanto mais informação sobre a doença (etiologia, sintomas e tratamento) associada a componentes psicológicos e sociais, melhor a qualidade de vida destas famílias.

Nas avaliações realizadas após o tratamento, observou-se maior frequência de respostas de enfrentamento ativo, obtida por meio da emissão de uma serie de respostas verbais e não verbais relacionadas ao tratamento, tal como o de autocuidado e seguimento de instruções (Ricci et al., 2009; Staab et al., 2006; Staab et al., 2002). Tais dados corroboram os de Ricci et al. (2009), que afi rmam que o principal objetivo de programas de educação terapêutica não é diminuir a severidade dos sintomas da DA, mas intervir diretamente em aspectos comportamentais relacionados à doença, como aumentar o repertório de enfrentamento ativo, qualidade de vida e frequência de comportamentos de autocuidado. Com relação aos instrumentos utilizados para avaliar intervenções, observou-se o predomínio de medidas indiretas, tal como questionários, listas de verificação ou inventários. Segundo Reitman, Hummel, Franz e Gross (1998), os instrumentos de avaliação indireta são nomeados desse modo devido ao modo indireto de coleta de dados, por meio de questionários, escalas ou listas de verificação. Porém, o uso destes instrumentos inviabilizaria a identificação das variáveis presentes na emissão do comportamento-problema, o que limita realizar análises mais detalhadas quanto à funcionalidade do comportamento avaliado.

Mesmo com esta limitação, o uso de instrumentos indiretos traz vantagens, uma vez que podem ser aplicados em populações maiores e de modo mais rápido, reduzindo o seu custo, a exemplo de pesquisas direcionadas a grupos. Por meio destas avaliações, o pesquisador pode identifi car quais os tipos de comportamentos- problema são mais prevalentes em uma determinada amostra de participantes. Essa identificação permite que estudos individualizados sejam realizados quando necessários e que análises funcionais do comportamento-alvo sejam feitas. Por esta razão, é importante o investimento de pesquisadores na elaboração de instrumentos mais precisos e direcionados à doença que se quer investigar. São vários os instrumentos elaborados para crianças com DA e sua família e que foram usados nas pesquisas encontradas sobre educação terapêutica, como CDLQI, IDLQI, DFIQ, SCORAD, entre outros. Estes podem ser validados também por pesquisadores de outros países. Ao mesmo tempo, poderiam ser feitos investimentos na criação de instrumentos nos países onde são realizadas as pesquisas uma vez que diferenças sociais, econômicas e culturais podem interferir no desenvolvimento e tratamento da DA.

Ainda, apesar da relevância científica de estudos com delineamento de sujeito único, apenas um foi encontrado. Este mostrou a necessidade de mais pesquisas com esta característica como forma de identifi car variáveis que infl uenciam na apresentação de comportamentos-problema de crianças (ou adolescentes) com DA. Além disso, possibilitariam que intervenções mais efetivas fossem conduzidas com pacientes que não apresentam melhoras dos sintomas ou que tenham difi culdade em aderir ao tratamento (Cork et al., 2003).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar de terem sido observados efeitos positivos deste tipo de programa para os participantes das pesquisas, as evidências quanto à sua eficácia ainda são inconclusivas. Isto porque há poucas pesquisas sobre o tema com qualidade metodológica e, entre aquelas existentes, os conteúdos dos programas e variáveis de mensuração dos efeitos da intervenção são heterogêneos, como mostrou esta revisão. Considera-se importante, por esta razão, que mais pesquisas e relatos de experiência sobre programas de educação terapêutica para crianças e adolescentes com DA e suas famílias sejam desenvolvidos, em especial no Brasil. Isto possibilitaria ampliar o conhecimento de pesquisadores e profi ssionais da área da saúde sobre as necessidades destas famílias e ao mesmo tempo implantar programas desta natureza adaptados à realidade brasileira.

Entende-se que o trabalho de educação terapêutica destinado a esta população, conduzido por equipe interdisciplinar / interdisciplinarmente, pode ser efi caz no auxilio ao médico especialista em dermatologia na condução do tratamento da DA. Esta proposta pode aumentar a probabilidade de pacientes pediátricos e sua família aderirem ao tratamento e ter um melhor controle sobre os sintomas por aumentar o conhecimento sobre a doença e, ao mesmo tempo, investir na relação familiar.

 

Referencias

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Received: September 10, 2010;
accepted: January 20, 2011