Boletim - Academia Paulista de Psicologia
ISSN 1415-711X
RESENHAS DE LIVROS
Marisa Takatori1
Centro Universitário São Camilo
Faculdades Salesianas de Lins
BOMTEMPO, E.; ANTUNHA, E. G. E OLIVEIRA, V. B. (Orgs.) (2006) Brincando na escola, no hospital, na rua... Rio de Janeiro: Wak Editora, 192 p.
É fruto de estudos realizados pelo grupo de trabalho Brinquedo, Aprendizagem e Saúde do X Simpósio de Pesquisa e Intercâmbio Científico da ANPEPP (Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia) em 2003. Traz em seu bojo idéias originais decorrentes de pesquisas realizadas pelas próprias autoras e apoiadas em importantes enfoques teóricos. Compõe-se de nove capítulos que, tal qual o título nos diz, abrangem diversos contextos que fazem parte do cotidiano da criança, onde se analisam o tema do brincar.
No primeiro, Vera Barros de Oliveira e Denise Milani abordam um estudo avaliativo-interventivo lúdico com o propósito de analisar o seu processo e o seu resultado, priorizando o brincar espontâneo dos bebês no contexto da creche. Questões importantes são discutidas nesse capítulo como: a importância, nos dias atuais, de se investigar o ambiente e rotina na creche, espaço procurado em virtude das necessidades da própria criança e de suas famílias. As autoras apresentam uma visão do comportamento do bebê e seu brincar; em função do seu desenvolvimento físico, cognitivo e emocional. Dois referenciais teóricos sustentam a exposição: a perspectiva de Piaget e de Winnicott. Apresentam pesquisas sobre a avaliação dos bebês e do ambiente da creche estudada e, em decorrência, apresentou mudanças efetivas no contexto físico da instituição e no aprimoramento das educadoras.
O segundo capítulo, de Sonia Foresti e Edda Bomempo, focaliza o brincar na sala de aula de creches. Traz uma pesquisa que tem como objetivo verificar como os educadores utilizam as atividades lúdicas nessas instituições e, em decorrência, apontam para a necessidade de implementar projetos educativos destinados à formação desses profissionais quanto ao uso do brinquedo como estratégia de aprendizagem. A pesquisa em referência envolve professoras e auxiliares de diferentes creches na aprendizagem do conceito de corpo humano, com o uso de material lúdico, nesse caso, um quebra-cabeça do boneco Pinóquio. Os resultados apontam para a importância do emprego das teorias da Psicologia da Aprendizagem e do Desenvolvimento e conteúdos práticos delas decorrentes que devem ser inseridos nas disciplinas da formação dos professores, de forma a motivá-los ao uso do lúdico nas atividades escolares, nessas instituições.
No terceiro capítulo, Elsa G. Antunha aponta e discute as relações entre desenvolvimento neuronal e o comportamento lúdico. Ressalta que, para a análise do comportamento lúdico, é necessário considerar aspectos do sistema nervoso do ser humano e do desenvolvimento filogenético e ontogenético. No contexto do brincar, a autora destaca o valor dos jogos sazonais com caráter folclórico e universal tal qual os contos de fada. A tradição é garantida por esses jogos que favorecem o amadurecimento de funções cerebrais e, em conseqüência, o desenvolvimento e a aprendizagem da criança.
O quarto capítulo, das autoras Terezinha Vieira e Márcia S. Carneiro, insere a experiência do uso de um espaço para o brincar na sala de espera de um ambulatório pediátrico do Hospital das Clínicas da UFMG, com o objetivo de valorizar o significado da ludicidade nesse contexto. Um "canto do brincar" é montado em uma das salas de espera e o livre brincar é proposto às crianças e aos pais que queiram participar. Dois estudos são apresentados a partir dessa experiência, o primeiro consiste de uma análise do conteúdo do brincar de faz-de-conta nesse contexto do ambulatório; o segundo trata de investigar o impacto da introdução desse "canto do brincar" no ambiente físico-social do ambulatório, através das falas dos médicos, enfermeiros, pais e das próprias crianças. Constata-se que o brincar constitui um meio que mobiliza as forças de crescimento e expressão das crianças, oferencendo-as oportunidade de serem atuantes apesar da enfermidade que possuem.
Ainda considerando a criança e o contexto do hospital, o quinto capítulo, de Aidyl M. de Queiroz Pérez-Ramos, focaliza as conseqüências negativas da hospitalização no processo evolutivo da criança, sobretudo na primeira infância (nos dois primeiros anos de vida) e nos acompanhantes, familiares dessas crianças. Para contribuir na resolução dessa problemática, a autora apresenta o resultado de uma pesquisa sobre avaliação da criança x ambiente pediátrico, evidenciando a carência do uso de brinquedos e brincadeiras na rotina da hospitalização infantil. Recomenda a utilização de kits lúdicos pelos profissionais que atuam junto à criança internada, em especial, pelo educador. O ambiente humano e físico das unidades pediátricas hospitalares são abordados nessa discussão, como estratégias para se procederem intervenções educacionais.
Mais um capítulo, o sexto, percorre o cotidiano das crianças em situação de hospitalização. Silvana Maria M. da Silva apresenta um estudo que consiste em verificar como o brincar influencia a recuperação de crianças hospitalizadas por câncer, através da análise de entrevistas de profissionais e voluntários de um hospital e de uma casa de apoio que atendem essa população. A pesquisa utiliza a perspectiva ecológica como referencial teórico, considerando a criança no ambiente de desenvolvimento e de interações pessoais, nesse caso o hospitalar com seus profissionais. São relatados, pelos entrevistados, benefícios da atividade lúdica na recuperação dessas crianças.
No sétimo capítulo, Antônia C. P. de Azevedo aborda o contexto da brinquedoteca e o seu uso como fator de proteção à criança em situação de risco. Inclui nessa discussão o conceito de resiliência e caracteriza o que vem a ser crianças em situação de risco. Finaliza apresentando um caso de uma criança de oito anos, atendida numa brinquedoteca psicopedagógica. Aponta para conclusões sobre a função dessa unidade como fator de proteção e promoção do processo evolutivo infantil.
O oitavo capítulo, de Ilka Dias Bichara, traz a rua como contexto para o estudo do brincar. O objetivo de seu trabalho é o de investigar como as crianças delimitam os espaços abertos na situação de jogos e brincadeiras de rua. O estudo ainda verifica a relação desse espaço com as regras dos jogos e os fatores ambientais e culturais envolvidos.
Outro trabalho sobre jogos e brincadeiras de rua é apresentado no último capítulo, por Fernando Augusto Ramos Pontes, Celina Maria Colino Magalhães e, novamente, Ilka Dias Bichara. Os autores, pesquisadores há anos investigando jogos e brincadeiras de rua, apresentam algumas sistematizações e reflexões de como analisar esses comportamentos e quais aspectos teóricos e metodológicos que devem ser considerados. Descrever brincadeiras de rua de modo sistemático e minucioso contribui não só para o processo evolutivo infantil como para a preservação do patrimônio cultural. Requer, ademais, novas investigações sobre o conhecimento do desenvolvimento da criança nesse contexto.
Esse livro contempla vários trabalhos importantes e oportunos para profissionais da saúde, como o da Psicologia e da Educação, apresentando discussões sobre o brincar e o desenvolvimento da criança em diferentes contextos, que, baseados em investigações, experiências e saberes possam ser compartilhados, como evidencia o seu conteúdo.
Enviado em: 01/03/2007
Aceito em: 08/03/2007
1 Docente do Curso de Graduação em Terapia Ocupacional do Centro Universitário São Camilo e do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu das Faculdades Salesianas de Lins. Contato - E-mail: mtakatori@uol.com.br