SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.34 número86Cuidar, rezar, falar: o soropositivo, memórias e religiosidadesGravidez e dinâmica familiar na perspectiva de adolescentes índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

artigo

Indicadores

Compartilhar


Boletim - Academia Paulista de Psicologia

versão impressa ISSN 1415-711X

Bol. - Acad. Paul. Psicol. vol.34 no.86 São Paulo  2014

 

Teorias, pesquisas e estudos de casos

 

 

Família: suas expectativas e participação na formação escolar de seus filhos com cegueira

 

Family: their expectations and participation in the education of their children with blindness

 

Familia: sus expectativas y participación en el proceso de educación de niños con discapacidad visual

 

Edilena de Jesus Sousa Santos1; Silvana Maria Moura da Silva2

Universidade Federal do Maranhão (UFMA)

 

 


RESUMO

A família desempenha papel fundamental no processo de desenvolvimento e na aprendizagem, como mediadora das relações da criança com o mundo e no processo de construção do conhecimento, tornando-se, dessa maneira, o primeiro núcleo de integração escolar e social das pessoas. Desse modo, ressalta-se a importância da família na educação de pessoas com deficiência visual, apesar de algumas vezes, ela ser vista pelos profissionais como superprotetora de seus filhos com deficiência e percebida como elemento perturbador na escola. Este trabalho é resultado de uma pesquisa realizada com pais de alunos com cegueira e teve por objetivo analisar quais eram as expectativas e a participação destes no processo de escolarização de seus filhos com cegueira. Os resultados mostraram que existe uma relação positiva entre as expectativas dos pais e sua forma de acompanhamento da vida educacional de seus filhos. Os pais, mesmos aqueles que não possuem um nível instrucional maior, realizam um enorme esforço para contribuir no processo de escolarização e esperam que seus filhos tracem um percurso diferente do seu. Eles apontam que as formas de ajuda a seus filhos são basicamente relativas a deixar e buscar na escola, comprar materiais escolares e a leitura de livros em casa. Conclui-se que os pais/mães dessa pesquisa, em sua percepção e falas, participam efetivamente do processo de escolarização dos seus filhos.

Palavras-chave: Deficiência visual; escolarização; família.


ABSTRACT

The family plays a fundamental role in development and learning, as mediator of the child's relations with the world and the knowledge construction process becoming, in this way, the first core academic and social integration of people. Thus, we emphasize the importance of the family in people with visual impairment education, although sometimes the family may be seen by professionals as overprotective of their children with disabilities and perceived as disruptive in the school. This work is the result of a survey with parents of students with blindness and aimed to analyze what were the expectations and participation of them in the education of their children with the blindness process. The results showed that there is a positive relationship between parents' expectations and their way of participation in the educational lives of their children. Parents, even those without a higher instructional level, perform a huge effort to contribute to the educational process and expect their children to trace a different route than theirs. They point that the ways to help their kids are basically related to leaving and fetching at school, buying school supplies and reading books at home. It is concluded that the fathers / mothers of this research, in their perception and speeches, participate effectively in the education process of their children.

Keywords: Visual impairment; schooling; family.


RESUMEN

La familia juega un papel fundamental en el desarrollo y el aprendizaje, como mediador de las relaciones del niño con el mundo y el proceso de construcción del conocimiento, convirtiéndose de esta manera, en la primera integración del núcleo académico y social de las personas. Por lo tanto, se resalta la importancia de la familia en la educación de las personas con discapacidad visual, aunque a veces sea visto por profesionales como sobreprotectores de sus hijos con discapacidad y percibida en la escuela como perjudicial. Este trabajo es el resultado de una investigación realizada con los padres de alumnos con discapacidad visual y tiene como objetivo analizar cuáles son las expectativas y la participación de estos en el proceso de educación de sus hijos con esa discapacidad. Los resultados muestran que existe una relación positiva entre las expectativas de los padres y manera en que es acompañada la vida educativa de sus hijos. Los padres, incluso aquellos que no tienen un nivel de instrucción superior, realizan un gran esfuerzo para contribuir al proceso educativo y esperan que sus hijos puedan tener un recorrido diferente al de ellos. Comentan que las maneras de ayudar a sus hijos están relacionadas con llevarlos y buscarlos en la escuela, comprar útiles escolares y la lectura de libros en casa. Se concluye que los padres/madres participantes en esta investigación, en su percepción y discursos, demuestran que deben participar efectivamente en el proceso educativo de sus hijos.

Palabras-clave: Deficiencia visual; escolarización; familia.


 

 

Introdução

Sabe-se que a família exerce um papel fundamental no processo de desenvolvimento e na aprendizagem das pessoas, como mediadora de suas interações, nas relações da criança com o mundo e no processo de construção do conhecimento, tornando-se, dessa maneira, o primeiro núcleo de integração escolar e social das pessoas. Considera-se, portanto, relevante conhecer mais sobre as expectativas e participação da família na escolarização do deficiente visual.

Ressalta-se que a família tem mudado expressivamente sua constituição, deixando de se basear especificamente no modelo nuclear: pai, mãe e filho. Tais mudanças são reflexos de transformações ocorridas na sociedade ocidental. A participação ativa da mulher no mercado de trabalho e na política, mulheres chefes de família, legalização do divórcio, avanço tecnológico e desenvolvimento dos meios de comunicação, entre outros fatores, provocaram profundas transformações na sociedade. Essas constatações levaram a refletir sobre o papel da família frente ao processo de escolarização do seu filho com deficiência visual (Bruno, 1997, 1999; Amiralian, 2003; Siaulys, 2007).

O envolvimento dos pais de alunos com deficiência visual na escola deve ser abordado de forma ampla, pois este é um processo complexo que implica diferentes dimensões. Sendo assim, o tema "Família: suas expectativas e participação na formação escolar de seus filhos com cegueira" surgiu de indagações sobre o papel da família no processo de escolarização, uma vez que é queixa recorrente nas escolas, que o lar tem pouca participação na vida escolar de seus filhos. Sobre esse aspecto, M. G. Silva, (2009, p. 115), relata que:

[...] a escola toma como modelo ideal de participação para todos os pais, a maneira como as famílias das camadas médias da população participam e acompanham seus filhos: acompanhamento minucioso das atividades escolares da criança; comunicação frequente com os professores; oferecimento de reforço e de atividades suplementares aos conteúdos trabalhados em classe; presença constante às reuniões e encontros promovidos pela escola; atividades extracurriculares como complementação; favorecimento das atividades escolares, etc. a ausência desta forma de acompanhamento por parte dos pais cria verdadeiros impasses entre a escola e a família.

Chacon (2007) assevera que ainda são escassos os estudos acerca da dinâmica familiar da criança com cegueira e de como os profissionais pouco exploram a participação dos pais na escolarização do deficiente visual. Endossando esse pensamento, Amiralian (2003, p. 108) em pesquisa com pessoas com deficiência, diz que: "A família, que deveria ser o elemento nuclear, e o eixo unificador, de todos os procedimentos e intervenções indicados e propostos, é frequentemente pouco participante e raramente chamada a opinar sobre os procedimentos a serem utilizados com seu filho".

Do mesmo modo que uma família de criança sem deficiência, coma criança com cegueira deve funcionar como apoio, para auxiliar nos seus processos do seu desenvolvimento, escolarização e inclusão escolar, já que esta enfrenta inúmeras barreiras nesses processos. Partindo do pressuposto da importância de parceria da escola com a família no processo educacional do indivíduo, este trabalho aponta para algumas reflexões: quais são as expectativas e como ocorre a participação dos pais no processo de escolarização dos seus filhos com cegueira?

No Brasil, os resultados preliminares do Censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE] (2010), apontam que 14,5% dos brasileiros têm deficiência, ou seja, 45,6 milhões de pessoas declararam ter algum tipo de deficiência. Dentre as deficiências, pode-se notar que a visual (cegueira e baixa visão) foi a mais citada na pesquisa. O tema abordado fornece uma visão ampliada acerca do processo de escolarização da pessoa com cegueira, as expectativas e a participação da família, a partir da fala dos pais, dando suporte aos questionamentos abordados sobre o tema, por ser este a deficiência mais citada pelas pessoas.

Temas relativos às expectativas e participação dos pais de alunos com deficiência visual no processo de escolarização e inclusão encontram-se em debate nas mais variadas pesquisas de campo, na atualidade. Vive-se um momento de grandes discussões sobre a inclusão de pessoas com deficiências não só na escola comum, como em outros âmbitos da sociedade. Nesse sentido, compreende-se que as expectativas e participação dos pais desempenham um papel relevante na vida educacional destes.

Este trabalho tem como propósito analisar a relação entre as expectativas e a participação dos pais no processo de escolarização de seus filhos com cegueira. Apontará caminhos teóricos, no sentido de melhor compreender o distanciamento entre a escola e a família, o que dificulta o diálogo entre estas, bem como identificar possibilidades práticas de aproximação estas duas instituições tão importantes na vida da criança.

Torna-se importante ressaltar que a educação é uma forma de participação que permite à pessoa com deficiência, a sua inserção no contexto ao qual faz parte, possibilitando seu desenvolvimento e inclusão social. Discute-se sobre a relação família-escola e a participação dos pais, o processo de escolarização da pessoa com deficiência visual, bem como os resultados de pesquisa realizada com as famílias de alunos com cegueira.

 

A relação família-escola e a participação dos pais na formação escolar dos filhos com cegueira

A evolução histórica do conceito de família do final da Idade Média ao Sec. XXI, nas sociedades ocidentais, adquiriu o formato que se estabelece ainda como um núcleo ou família nuclear: pai, mãe, filho (Roudinesco, 2003; Chacon, 2007; M. G. Silva, 2009). Esta noção de família está presente nas sociedades, fundamentada na existência de um casal que lhe dá origem e sua essência, representa-se na relação pais-filhos, pois sua finalidade é gerar e criar filhos.

De acordo com Roudinesco (2003) é possível distinguir três fases evolutivas da família: a primeira fase, família tradicional serviria acima de tudo para assegurar a transmissão do patrimônio, onde a escolha era feita pelos pais e sempre regida pelo poder do pai; a segunda fase, família moderna, regida por uma lógica afetiva e romântica, ainda presente nos dias atuais, onde o casal se escolhe sem a interferência dos pais, buscando uma satisfação amorosa e sentimental, e, o poder sobre os filhos é exercido pelos pais e pelo Estado, responsável pela educação dos seus filhos. Por fim, a terceira fase, família contemporânea ou pós-moderna - aonde a transmissão de autoridade vai ficando mais complexa em função das mudanças e composições que a família foi sofrendo ao longo dos tempos.

Quanto à família de pessoas com cegueira, Amiralian (1997, p. 296) revelou: "se o filho que nasce possui alguma deficiência, a família se vê confrontada em seus sonhos e aspirações a respeito do filho que foi idealizado". Desse modo, a vida de cada pessoa da família sofre modificações para se adaptar a essa nova realidade.

Autores como Omote (1980), Leonhardt (1992), Amaral (1995), Kubler-Ross (2000) apud Chacon (2007) e Manonni (2005) citado em Chacon (2007) em seus trabalhos sobre os sentimentos da família diante de uma perda, o que pode ser vivido por pais de pessoas com cegueira, descreveram fases e etapas que a família vivencia quando um dos seus membros tem alguma deficiência ou estudam a percepção das pessoas da família diante da deficiência. No entanto, deve-se ter sempre presente que não é regra geral que todas as famílias reajam dessa forma.

Pela importância que os estudiosos delegam à família, pode-se notar que ela exerce papel fundamental no processo de desenvolvimento e aprendizagem das pessoas com deficiência visual como mediadora das interações sociais, nas formas de comunicação, nas relações da criança com o mundo externo e no processo de construção do conhecimento. A família ocupa uma posição privilegiada quando se trata da socialização da criança. Para Almeida (2012, p. 44):

A partir do momento em que a criança se insere no seio familiar começa a adquirir regras, hábitos e normas que facilitam a sua integração num mundo social mais amplo, a sociedade. É na família que se dá a chamada socialização primária, onde a criança dá os primeiros passos para poder se desenvolver como um ser responsável e ativo dentro do ambiente social, interiorizando os valores, as atitudes e os papéis que conduzem à formação da sua responsabilidade.

É oportuno afirmar, então, que as interações que se estabelecem dentro das famílias, mais especificamente entre os pais e as crianças, são fundamentais para o desenvolvimento e escolarização destas. Nesse sentido como se dão as relações entre família de crianças com cegueira e escola, quais as expectativas dos pais dessas crianças?

Buscando compreender a relação existente entre a escola e a família, Polonia e Dessen (2005) refletiram sobre o impacto que ocorre na aprendizagem e no desenvolvimento do aluno quando a família se envolve na escola. Discorrem, ainda, sobre os benefícios e as implicações de uma integração entre os dois contextos, bem como descrevem os aspectos das relações estabelecidas entre ambos, que vêm sendo focalizados em várias pesquisas empíricas.

Investigações como a de Gasonato (2007), que buscou verificar as expectativas da família quanto à formação escolar de seus filhos, revela nesta, o papel complementar assumido pela escola diante da situação de fracasso escolar. Esta, em geral, tende a responsabilizar as famílias de seus alunos por não assumirem a sua parte no processo educativo escolar. Os resultados dessa pesquisa mostram que as famílias se reconhecem como não participantes, porém demonstram abertura para serem chamadas à escola. Por outro lado, ainda não sabem como se aproximar e o que a escola espera delas, depositando neste movimento suas expectativas quanto à formação de seus filhos.

Estudos de Marques (2002), Szymansky (2003) e Polonia e Dessen (2005) avaliando a posição da escola quanto ao envolvimento dos pais na educação de seus filhos, revelaram que esta acredita que pais ausentes e desinteressados possam gerar desinteresse e afastamento do aluno das atividades escolares, havendo, muitas vezes, por parte da escola, uma generalização indevida dessa explicação. É surpreendente como a responsabilização da família pelo fracasso escolar é recorrente no discurso de profissionais da educação.

Família e escola possuem como objetivos e funções de semelhança e proximidade: proteger e educar, dar autonomia à criança, buscar acertos e corrigir erros. É necessário entender que a relação mantida pelo aluno na escola tem a ver com o tipo de família e, também, com as relações que seus membros mantêm entre si. Por esses motivos, a parceria entre essas duas instituições é fundamental para que o processo de aprendizagem tenha sucesso. As dinâmicas que ocorrem em uma certamente influenciam a outra, reciprocamente. A esse respeito, Chacon (2009, p. 56) refere que:

A escola, local privilegiado de aprendizagem acadêmica e desenvolvimento social, também pode ser uma importante rede de apoio às famílias no processo educacional de seus membros. [...] A dinâmica das relações escolares, por serem estas mais transacionais do que fixas... é levada a constantes processos de adaptação, também necessários à sua sobrevivência.

Pesquisadores como Nogueira, Maria Alice, Romanelli, Geraldo e Zago, Nadir (2011, pp. 9-10) apresentaram uma série de estudos, cujos resultados oferecem pontos para reflexão e análise sobre o funcionamento do sistema escolar, enfatizando a relação da escola com as famílias. O que se pode perceber em comum nessas pesquisas é "ausência de uma tradição de estudos sobre as relações que as famílias mantêm com a escolaridade dos filhos" e um "[...] relativo consenso, entre os autores, de que se trata de uma relação complexa e, por vezes, assimétrica, no que diz respeito aos valores e objetivos entre essas duas instituições [...]". Os trechos citados ressaltaram a importância do papel que a família desempenha na vida escolar dos filhos, conclui ainda, que existe uma relação de interdependência entre as condições sociais da origem das famílias e a maneira que se relacionam com as escolas.

Nogueira e outros (2011) reuniram uma coletânea de pesquisas que ofereceram contribuições em relação ao papel da família no desempenho escolar dos filhos e, ainda, discutiram a existência de uma relação de interdependência entre as condições sociais da origem das famílias e a maneira que se relacionam com as escolas, além do fato que, são visíveis as transformações pelas quais passam ultimamente, tanto as escolas quanto às famílias, naquilo que diz respeito às suas estruturas e dinâmicas internas, revelando uma tendência crescente de conexão entre os territórios: família e escola.

Quando se busca na literatura o que seria a parceria desejável da família com a escola, percebe-se que a participação dos pais na educação, está relacionada principalmente no auxílio ao dever de casa (Santos, 2007; Fevorini, 2009) como uma estratégia de promoção de sucesso escolar, não se levando em consideração as histórias familiares e as diversidades culturais nos modos de educação.

Nogueira e outros (2011) referem que nas últimas décadas é forte a tendência dos pesquisadores em situar a família como sujeito central das pesquisas em educação, com interesse em conhecer suas dinâmicas e interações. E os pais de crianças com deficiências (auditiva, intelectual, física e visual), como estes responderiam as demanda da escola? E quanto aos pais de alunos com cegueira, que na maioria das vezes não sabem ler e escrever em Braille, como seria efetivada essa participação? Quais seriam suas percepções sobre o processo de escolarização de seus filhos?

Nas sociedades ocidentais do século XXI, percebe-se que o primeiro espaço da criança em desenvolvimento depois da família é a escola, já que ela necessitará ampliar seus espaços e interações sociais. A escola é um lugar de novas experiências e vivências sociais diferente daquela da família, no sentido, em que proporciona um leque de interações pessoais em ambientes diferentes, capazes de transformar o processo de desenvolvimento e a formação do indivíduo.

Relevante pesquisa foi realizada por S. M. M. Silva (2009) sobre o brincar na família e os benefícios dos guias de orientações para os pais de crianças com deficiência visual. Nesta pesquisa, foram analisadas as expectativas das mães de crianças com deficiência visual. As principais expectativas das mães antes das orientações realizadas pela pesquisadora compreenderam os seguintes aspectos: a) preocupação com o futuro e a educação dos filhos, manifestada pelo desejo de que eles estudassem em uma escola apropriada ao seu problema visual; b) para as de baixa visão, alcançar melhor desenvolvimento da visão com o aumento da acuidade visual; c) vontade de que seus filhos alcancem independência e autonomia nas atividades diárias; d) preocupação de o filho, com tal deficiência, ter uma profissão e cursar uma universidade, demonstrando que a visão dele não se restringia apenas à educação na escola, mas à formação em nível superior com a escolha de uma profissão, sendo que um deles associou essa escolha à deficiência visual e à de músico, profissão que é bastante citada pelo fato de a pessoa com deficiência visual ter aprendido a utilizar mais a audição na ausência da visão.

Como resultado, obteve-se que as expectativas das mães após as orientações fornecidas pelos pesquisadores alcançaram três aspectos: independência e autonomia nas atividades diárias, estudo em uma escola comum e um melhor desenvolvimento da visão. O desejo de que o filho trabalhasse foi uma expectativa nova e que não havia sido mencionada antes das orientações realizadas, mas que compreendia uma consequência das duas expectativas anteriormente citadas pelas mães como estudar em uma escola, cursar uma universidade e ter uma profissão, considerando que a partir da capacitação profissional em escola ou universidade, a criança terá perspectiva de ter uma profissão e trabalhar futuramente.

Por fim, em pesquisa sobre o futuro dos filhos, realizada com pais de alunos do Ensino Fundamental, Menezes (2000) relatou que estes concentram suas expectativas em uma escolaridade prolongada e escolhas de profissões que dão oportunidade de os filhos os superarem, demonstrando o quanto cursar uma universidade representa a realização das suas aspirações em que seus filhos tenham uma profissão reconhecida e com melhor remuneração.

É possível perceber por estes estudos a importância que escola e a família apresentam para as pessoas e que ambas colaboram para o desenvolvimento e processo de escolarização das crianças com ou sem deficiência.

Nos trabalhos desenvolvidos por Szymansky (2003), Fevorini (2009), M. G. Silva, S. (2009) e Nogueira et. al. (2011), considerando todas as proposições sobre as relações da família com o processo de formação de seus filhos e como este recai sobre a escola, observa-se que as famílias, principalmente as de baixo poder econômico, esperam que a escolaridade possibilite um futuro melhor a seus filhos. Por outro lado, ao manifestar o desejo de maior participação das famílias na escola, percebe-se que estas valorizam o papel que a família desempenha na vida escolar de seus filhos, notadamente no que se refere a auxiliar nos deveres de casa. Pelo exposto acima, discorre-se a seguir sobre como ocorre o processo de escolarização do aluno com deficiência visual.

 

O processo de escolarização da pessoa com cegueira

A educação de alunos com cegueira possui o mesmo objetivo daquela voltada para alunos videntes ou com outras deficiências, que é o de serem educados para o seu desenvolvimento pleno como pessoa, segundo o Decreto nº 3.928 (1999). É de conhecimento comum que o aprimoramento da qualidade do ensino regular e a adição de princípios educacionais voltados para todos os alunos, resultarão na inclusão escolar de pessoas com deficiências no ensino regular.

Na escola, local de socialização por excelência, segundo Gil (2000, p. 9) podem ser discutidos e refletidos preconceitos e mitos relacionados à cegueira, tornando-a uma importante aliada na inclusão do aluno com tal deficiência. "Ao se tornar um espaço de inclusão, a escola promove trocas enriquecedoras para toda a equipe escolar, incluindo os alunos e suas famílias". Além da família, são a escola e a sociedade em geral que desempenham um importante papel no processo de escolarização da pessoa com cegueira. Sendo a Educação um direito de todos, no que diz respeito às leis que tratam dos direitos civis, políticos, sociais e culturais, que norteiam as políticas de inclusão escolar, pode-se observar mudanças relativas à deficiência. A respeito da educação, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência aponta que:

[...] as pessoas que passam por processos educativos, e em particular pelo sistema escolar, exercem melhor sua cidadania, pois têm melhores condições de realizar e defender os outros direitos humanos (saúde, habitação, meio ambiente, participação política, etc.). A educação escolar é base constitutiva na formação das pessoas, assim como na defesa e na promoção de outros direitos (Presidência da República do Brasil, 2007, p. 6).

A escolarização da pessoa com deficiência visual passou por muitas mudanças, principalmente, no que diz respeito aos fundamentos conceituais, baseados em paradigmas que defendem o acesso e a permanência numa escola de qualidade. A escola passou a ter, então, a responsabilidade de acolher as necessidades de todos os seus alunos. Baseado nesse pensamento, as autoras Lira e Schlindwein (2008, pp. 172-173) afirmam que:

Refletir sobre a escolaridade de alunos com diferenças visuais é buscar compreender como esses alunos vêm se constituindo ao longo do processo de inclusão. Parte-se da premissa de que uma diferença visual não representa, em si mesma, alterações nas possibilidades de aprendizagem da criança, na sua capacidade de estabelecer relações com os outros, com objetos e situações que acontecem ao seu redor. Como qualquer outra, a criança com diferenças visuais precisa de oportunidades, de convivência com seus pares, de forma que possa aprender a se relacionar com o mundo [...].

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394 (1996) defende que as pessoas com deficiências necessitam de adaptações e complementações curriculares que respeitem os seus ritmos. Nesse sentido, o deficiente visual, para sua escolarização, necessita de instrumentos e materiais especiais para sua aprendizagem. Nessa perspectiva, o uso do Sistema Braille utilizará como materiais: reglete, punção, máquina Braille e o Sorobã. O aprendizado de Manuscrito, os programas de Atividades da Vida Diária (AVD) e Orientação e Mobilidade (OM), darão suporte ao aluno em suas necessidades especiais. Desse modo serão pontuadas algumas definições acerca desses termos.

O Sistema Braille é um código universal de leitura tátil e de escrita, usado por pessoas cegas, inventado na França por Louis Braille, um jovem cego e no ano de 1825. É reconhecido como um marco dessa importante conquista para a educação e integração das pessoas com deficiência visual na sociedade (Aranha, 2005).

No que se refere ao uso do sorobã, a Portaria nº 657 de março de 2002 do MEC/SEESP instituiu às pessoas com deficiência visual que se submetem a exame onde seja necessário executar cálculos matemáticos, o uso do sorobã como recurso educativo especial. É um contador adaptado do ábaco chinês, para uso das pessoas com deficiência visual, cuja manipulação depende exclusivamente do raciocínio, domínio e destreza do usuário, de acordo com a referida Portaria.

Quanto à escrita cursiva, o aluno cego não é diferente, mesmo que domine o Braille, necessita do manuscrito para assinar documentos. "O manuscrito é um recurso importante para a pessoa cega e serve para promover sua comunicação social, autonomia e independência" (Bruno & Mota, 2001, p. 81). A escrita cursiva permite à pessoa cega agir com maior independência por torná-la apta a assinar documentos e a dominar os instrumentos da comunicação escrita que são universais.

Para que a pessoa cega possa se locomover com maior independência e autonomia tornam-se necessários o uso de técnicas que a auxilie e um programa de Orientação e Mobilidade, sendo que: "A orientação é a capacidade de perceber o ambiente, saber onde estamos. A mobilidade é a capacidade de nos movimentar [...]" (Felippe, 2001, p. 5). Ele refere que, para a pessoa cega, Orientação e Mobilidade são aprendizados através da audição, tato, olfato e cinestesia para obter informações do ambiente, adquirindo desse modo, controle dos movimentos de forma mais organizada e eficaz.

Na educação da criança com cegueira, tornam-se relevantes as atividades da vida diária - AVD - "cujo objetivo é proporcionar à criança condições para que, dentro de suas potencialidades, possa formar hábitos de auto-suficiência que lhe permita participar ativamente do ambiente em que vive" (Jesus, 2005, p. 1). As autoras relatam que é através de treinamento em AVD, que a criança cega aprende, entre outras coisas: "escovar os dentes, amarrar cadarço de sapato, preparar refeições, servir-se à mesa, encher copos e garrafas, receber visitas, vestir-se adequadamente, cuidar da aparência pessoal e se prevenir contra acidentes", coisas triviais para quem enxerga.

O processo de escolarização da criança com cegueira, portanto, mostra que, dadas às condições e os recursos materiais e humanos, esta pode desenvolver-se de maneira semelhante às crianças videntes. Aliado ao aparato tecnológico, não se pode deixar de considerar o papel que a família desempenha na formação escolar da pessoa com cegueira, como mediadora das relações da criança com a educação formal. Detalha-se a pesquisa realizada com pais de alunos com cegueira.

 

As expectativas e a participação dos pais no processo de escolarização

Esta pesquisa foi realizada em São Luís - MA, mediante a seleção das famílias de adolescentes com deficiência visual, congênita ou adquirida.

A pesquisa, de cunho qualitativo e quantitativo, proporcionou a interação da pesquisadora no contexto das famílias durante a investigação. Envolveu informações sobre os sujeitos, suas famílias e descrições relativas ao processo de escolarização.

Os sujeitos desta pesquisa foram 05 famílias (pais e mães) de seis adolescentes com cegueira, sendo cinco do sexo masculino e uma do sexo feminino; na faixa etária de 12 a 15 anos; que estudavam em escolas comuns das redes federal, estadual e municipal de ensino em São Luis - MA; recebiam atendimento especializado no contraturno; sem outra(s) deficiência(s) associada(s) como física, mental ou auditiva; recebiam o benefício de prestação continuada concedido pelo governo e residiam em São Luís.

Quanto à caracterização dos sujeitos da pesquisa, os dados demonstraram que a média de idade dos pais/mães, variava entre os 30 e 43 anos (seis pais), levando a crer que uma parcela das famílias teve os seus filhos em idade jovem, como revela a mãe 4: com 17 anos. Levando-se em consideração que seus filhos têm idades entre doze e quinze anos, este grupo certamente concebeu o filho ainda jovem. Por último, uma pequena parcela de pais/mães com idade entre os 65 a 74 anos (dois pais e uma mãe adotivos).

Dos pais entrevistados teve-se como resposta a escolarização dos casais, sendo que um deles não foi informado pela companheira por desconhecimento desta, já que o envolvimento entre eles foi superficial e breve. Dois pais/mães (22,2%) não eram alfabetizados, sabendo somente a escrever o próprio nome. A quantidade de pais/mães que não completou o Ensino Fundamental (22,2%) é igual ao número de pais/mães que abandonaram seus estudos no Ensino Médio (22,2%), dos que concluíram o Ensino Médio (22,2%) foi maior do que aquele que terminou o Ensino Fundamental (11,1%). Todos esses dados refletem a precariedade dessas famílias na própria formação escolar. A renda familiar variava de um e meio a três salários mínimos.

Todas as mães eram donas de casa, uma delas já aposentada e revelou dedicar seu tempo nos cuidados com o filho cego. Um dos pais era motoboy, outro estava desempregado no momento da entrevista, mas realizava conserto de eletrônicos como forma de auxiliar no orçamento doméstico, outro pai era autônomo. Observa-se que os pais tinham em comum, empregos que exigem pouca escolaridade e teve-se, ainda, um pai aposentado.

Infere-se que em consequência da baixa formação escolar, os pais das famílias pesquisadas mantinham o sustento por meio de ocupações, que não exigem formação especializada na execução das atividades.

A seguir serão apresentados os resultados obtidos nas entrevistas com os pais/mães dos alunos com deficiência visual selecionados.

 

- Reação dos pais ao diagnóstico de cegueira dos filhos

Uma das perguntas levantadas neste estudo foi sobre a reação dos pais frente ao conhecimento do diagnóstico de cegueira dos filhos. As reações mais comuns apresentadas pelas mães sobre o diagnóstico da deficiência visual de seus filhos foram: choque e tristeza, mencionadas, por quatro mães (57,14%); choro e desespero citados por quatro mães (57,14%) choque e insegurança, referidas por quatro mães (57,14%); aceitação, aludidas por três mães (42,85%); revolta e rejeição, por duas mães (28,57%) e negação, por duas mães (28,57%). As falas menos frequentes compreenderam depressão, ressaltada por uma mãe (14,28%) e medo citado por uma das mães (14,28%).

A experiência de ter um filho com cegueira foi semelhante em várias reações: negação (a busca pela confirmação do diagnóstico e da "cura"), revolta, rejeição, depressão, choro e aceitação. Infere-se que para os pais/mães pesquisados, a cegueira estava associada à incapacidade, dependência, tristeza, impossibilidade de realizações, desconhecimento e superproteção. Pelas respostas dadas, supõese que a mãe do adolescente 2, até hoje não superou esses sentimentos, já que ela manifestou a esperança de ainda ser possível a cura "Consegui encostar ele... aposentadoria não... é só um beneficio até ele completar os dezoito anos, pra ver se ele ainda tem possibilidade de enxergar, porque os médicos falaram isso..." (Mãe 2).

Outros sentimentos apresentados como ansiedade, frustração, sentimento de culpa ou superproteção foram apontados por Bruno (1999) por exercerem influência na relação e interação entre mãe e filho, podendo ser responsáveis pela desestruturação familiar.

Comparando-se os resultados encontrados nesta pesquisa com aqueles revelados por Leonhardt (1992), Bruno (1999) e Amiralian (2003) observou-se que as reações também foram variadas entre as mães e os pais, sendo que a tristeza, choque, choro e desespero apresentaram maiores percentuais pelas mães, ao saberem do diagnóstico de deficiência visual de seus filhos.

 

- As expectativas dos pais

As principais expectativas dos pais/mães compreenderam nas seguintes: todos os pais, sete (100%) relataram preocupação com o futuro e a educação de seus filhos, manifestada pelo desejo de que eles estudassem. Em relação à escolarização em si, três pais (42,85%) enfatizaram a preocupação de seu adolescente ter uma profissão e cursar uma universidade; dois (28,57%) esperavam que seus filhos fossem "alguém na vida"; dois pais (28,57%) referiram ao desejo que seu filho fosse professor; demonstrando que a visão deles não se restringia apenas à educação na escola, mas à formação em nível apropriado para a escolha de uma profissão.

Dois desses pais (28,85%) associaram a profissão de músico à deficiência visual, 14,28% manifestou a vontade de que seu filho alcançasse independência e autonomia nas atividades do dia a dia; enquanto que uma das mães (14,28%) não citou uma profissão específica, deixando a escolha por conta de seu filho.

Estes pais confiam na escola para os ajudarem a dar aos filhos um futuro melhor. Sentem confiança no sistema escolar e querem ajudá-los dentro das suas possibilidades. Em relação às expectativas, aspirações e escolaridade desejadas para os filhos, no geral estas são positivas; sendo importante que aos filhos lhes permita independência financeira e realização pessoal no futuro.

Para os pais pesquisados o futuro dos filhos, ainda, era incerto e preocupante. No entanto, consideraram que os filhos deviam fazer o que mais gostavam. Desejavam para eles um futuro e uma profissionalização superior à que tiveram.

Observou-se uma crença interiorizada por estas famílias de que a formação escolar seja capaz de promover a oportunidade de melhores condições de sobrevivência e colocação no mercado de trabalho com salários maiores do que aqueles que estavam acostumados a receber em suas atividades profissionais que, em sua maioria, não exigiam formação específica.

As expectativas quanto a um maior nível de escolarização dos filhos estão diretamente relacionadas ao que Nogueira e outros (2011) revelaram em suas pesquisas. Estes autores mostraram que uma forma de influenciar os filhos, mesmo que de modo indireto, ocorre quando os pais têm uma expectativa elevada para os filhos e almejam certos cursos que conduzam maior segurança financeira no futuro.

Dentre os pais/mães ouvidos, a mãe do adolescente 2 repetia a mesma fala em relação à deficiência visual, tecendo comparações entre este e o filho vidente no quesito escolarização, demonstrando frustração com o nível atingido por seu filho com cegueira.

O que chama a atenção para o grupo de alunos com deficiência visual pesquisado, é que embora tenham sido inseridos na escola aos cinco anos de idade em média, todos ainda se encontraram em nível defasado de escolarização. O Censo do IBGE (IBGE, 2010, não paginado) refere que: "as desigualdades permanecem em relação aos deficientes, que têm taxas de escolarização menores que a população, sem nenhuma das deficiências investigadas".

 

- Tipos de ajudas prestadas pelos pais na participação do processo de escolarização

Em relação à pergunta sobre os tipos de ajudas prestadas pelos pais na escolarização dos filhos com cegueira, disseram que para ajudarem seus filhos no processo de escolarização, utilizavam como estratégias: levar seu filho adolescente à escola, seis pais (85,71%); fazer leitura dos livros da escola, citados por três pais (42,85%); comprar livros e materiais para os filhos, referido por dois pais (28,57%). Estas falas da família evidenciaram o quanto pesa sobre sua responsabilidade as necessidades especiais de seus filhos com deficiência visual. Tais necessidades se modificavam a cada dia e pela dedicação quase exclusiva de algum membro da família para as devidas ajudas.

As falas de alguns entrevistados ilustram as respostas encontradas sobre os tipos de ajudas prestadas pelos pais na escolarização dos filhos com cegueira:

- Vou levar, buscar, compro o material que precisa. Mais é acompanhar na escola, a gente não aprendeu o Braille pra ajudar ele (Pai 1).

- A minha parte eu faço. O que é minha parte? Levar ele pra escola, não deixar ele faltar aula e também em termo dos materiais. Eu faço. Se tiver uma redação eu leio pra ele e ele faz em Braille, mas corrigir não sei... minha parte eu faço (Mãe 2).

- Vindo deixar, vindo buscar. Eu nunca mando ele vim com ninguém, eu mesmo venho buscar, eu mesmo venho deixar. Eu enfrento tudo, sol, chuva. Não peço pra ninguém (Mãe 4).

Observa-se que os pais ouvidos, apesar de suas dificuldades e limitações, contribuíam com o processo de escolarização de seus filhos, ajudando-os dentro do que podiam. Além disso, eles depositavam na escola sua confiança na educação dos filhos, como um espaço seguro, que fazia parte do cotidiano da família.

 

- Importância do acompanhamento dos pais

Mesmo não dispondo de condições que favorecessem maior participação na vida e na formação escolar dos filhos, este estudo identificou que as famílias reconheciam e valorizavam a importância de seu envolvimento e acompanhamento no processo de escolarização dos filhos. Dos investigados, três pais (42,85%) referiram que incentivavam e motivavam seus filhos na escola; outros três pais (42,85%) participavam porque gostam de saber o que se passava com seu filho na escola; dois pais (28,57%) acreditavam que quando os pais participavam na escola, o filho teria mais segurança. Por fim, dois pais (28,57%) disseram que eles ficavam mais interessados.

Todos os pais/mães possuíam a percepção da importância de sua participação na vida de seus filhos, seja em relação ao comportamento apresentado na escola ou quanto ao seu processo de formação escolar.

Os resultados apresentados indicaram que mães/pais (principalmente as mães), ao demonstrarem interesse e acompanharem os estudos de seus filhos adolescentes, acreditavam melhorar o desempenho escolar destes. Pode-se pensar que os pais que mostravam tal interesse ou que participavam da vida escolar de seus filhos criavam uma cultura familiar em prol do processo de escolarização em seus filhos.

De maneira geral os pais/mães se envolviam no cotidiano escolar de seus filhos, pois, boa parte destes, afirmou que dispunha de tempo para cumprir com suas tarefas de participarem da formação escolar de seus filhos.

 

Considerações Finais

Ao desenvolver um tema sobre a participação dos pais no processo de escolarização de seus filhos com cegueira, percebeu-se que este é mais amplo e complexo do que inicialmente parecia. A esta questão sobrepunham-se aspectos preocupantes como a constante fala dos professores de que os pais pouco participam da vida escolar de seus filhos, a ausência de relação entre família e escola, bem como o processo de escolarização do aluno com cegueira.

Constatou-se que em todas as famílias o diagnóstico de deficiência visual (cegueira) causou reações nos pais, confirmando o que diz a literatura especializada, que o nascimento de uma criança com deficiência é fator responsável por alterações na dinâmica familiar. Mesmo os pais que referiram ter aceitado a cegueira desde o início, certamente tiveram suas vidas modificadas de alguma maneira. Nesta pesquisa, verificou-se que essa situação foi mais acentuada por estar associada a não experiência por parte dos pais no enfrentamento das dificuldades relacionadas ao cuidado de um bebê com deficiência, que mostram necessidades singulares quanto ao cuidado. Pode-se perceber isto, principalmente, no caso da mãe que possuía dois adolescentes com cegueira.

Nesta pesquisa, verificou-se que as reações emocionais dos pais quando receberam o diagnóstico de cegueira variaram, porém, algumas reações como: choque, rejeição, desespero, insegurança e aceitação foram presentes na fala dos pais/mães entrevistados. Talvez essa variação possa ser explicada, devido às diferenças no conhecimento e entendimento que cada pessoa tem da deficiência visual e o grau de deficiência que a pessoa apresentava.

As famílias colocavam na escola toda sua expectativa de um futuro promissor para os filhos, apesar de muitas não se sentirem aptas a auxiliar seus filhos e não participarem do processo de escolarização deles como a escola gostaria. Para os pais, a escola era uma instituição importante para seus filhos, pois acreditavam que ela passará os conhecimentos necessários ao mundo do trabalho.

Constatou-se, portanto que, eram as mães que se envolviam mais efetivamente na criação e formação familiar dos filhos, não sendo diferente nos assuntos relacionados à formação escolar. Apesar dos pais reconhecerem a importância em auxiliar os filhos no processo de escolarização, com suas preocupações voltadas para a proteção e sustento, as responsabilidades de acompanhamento do processo de ensino e aprendizagem eram das mães, pois estas dedicavam grande parte do seu tempo e atenção para os filhos e afirmavam de maneira explícita que a ajuda dada nas atividades relacionadas à escolarização de seus filhos despertava maior interesse e empenho nos estudos, promovendo assim, um melhor rendimento escolar.

Os pais apontaram que as formas de ajuda que davam aos seus filhos eram basicamente relativas a deixá-los e buscá-los na escola, a compra de materiais escolares, a leitura de livros em casa. Consideraram esses aspectos relevantes para o processo de escolarização dos alunos com deficiência visual, mas o fato de que os pais não sabiam o Braille, pode ser um fator impeditivo para um auxílio mais efetivo.

Quase todos os pais e/ou responsáveis entrevistados apontaram que as suas expectativas estavam diretamente relacionadas ao ingresso de seu filho em uma faculdade, maior autonomia e independência e profissionalização de seus filhos com cegueira. As expectativas relativas ao ingresso em curso de nível superior estavam ligadas de forma direta à possibilidade de um bom emprego e renda melhor do que eles possuíam no momento. Outros pais declararam ainda, que esperavam que seus filhos fossem "alguém" na vida e que pudessem se realizar naquilo que desejavam.

Neste trabalho, foi possível perceber que existia uma relação positiva entre as expectativas dos pais e sua forma de participação na vida educacional de seus filhos. Os pais, mesmos aqueles que não possuíam um nível instrucional básico, realizavam um enorme esforço para contribuir no processo de escolarização e esperavam que seus filhos traçassem um percurso diferente do seu.

Por fim, pode-se relacionar as expectativas dos pais com sua forma de participar da vida escolar de seus filhos com cegueira, notando que nem sempre essas expectativas eram consonantes com a participação. Os pais podiam ter expectativas elevadas e não participavam do processo e vice-versa. Por outro lado, ter expectativas e participar não significa para os filhos necessariamente maior desenvolvimento e escolarização, porque estes também sofriam influências de fatores externos ao desejo dos pais.

Os pais/mães desta pesquisa, em suas percepções e falas, participavam efetivamente do processo de escolarização dos seus filhos. Porém, diante da ausência de condições que promovessem um envolvimento mais efetivo da família (pais e mães) na escolarização formal dos filhos, como é queixa de vários educadores, a escola necessitaria mudar de postura, com vistas a criar possibilidades que propiciem as condições necessárias para essa participação. Os pais, em geral, não sabiam claramente o que a escola esperava deles. Tanto o Estado quanto à Escola precisam considerar as dificuldades pelas quais passam essas famílias, suas realidades e necessidades, com o objetivo de orientá-las e auxiliá-las em sua tarefa formadora e no envolvimento no cotidiano escolar, de forma mais inclusiva.

Há de se ressaltar que o acompanhamento e, consequentemente, o apoio dos pais/mães na escolarização de seus filhos e na escola é importante, pode auxiliar o aluno na perspectiva de alcançar melhor rendimento (bom desempenho) na escola. No entanto, ressalta-se que o desenvolvimento escolar das crianças e adolescentes é um processo que se desenvolve na escola e deve contar com o envolvimento da família, mas, não pode ser encarado como especificidade exclusiva da família, pois a escola necessita assumir as suas responsabilidades em garantir o atendimento às necessidades individuais dos alunos, com a finalidade de promover o bom desempenho destes no processo de ensino e aprendizagem.

 

REFERÊNCIAS

Almeida, A. I. M. (2012). A família e a intervenção educativa face à criança com NEE. Dissertação de mestrado, Escola Superior de Educação Almeida Garrett, Lisboa, Portugal.         [ Links ]

Amaral, L. (1995). Conhecendo a deficiência em companhia de Hércules. São Paulo: Robel.         [ Links ]

Amiralian, M. L. T. M. (1997). Compreendendo o cego: uma visão psicanalítica da cegueira por meio de desenhos-estórias. São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Amiralian, M. L. T. M. (2003). A deficiência redescoberta: a orientação de pais de crianças com deficiência visual. Revista de Psicopedagogia, 20(62), 107- 115.         [ Links ]

Aranha, M. S. F. (2005). Desenvolvendo competências para o atendimento às necessidades educacionais de alunos cegos e de alunos com baixa visão.Brasília: MEC/SEESP.         [ Links ]

Brasil. Presidência da República. Secretaria de Direitos Humanos. Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência. (2007). Convenção sobre os direitos da pessoa com deficiência. Recuperado em 17 outubro, 2011 de http://direitoshumanos.gddc.pt/3_7/IIIPAG3_7_1.htm.         [ Links ]

Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (1996). Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília. 1996. Recuperado em 5 junho, 2010 de http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm.         [ Links ]

Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999 (1999). Regulamenta a Lei n° 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida e dá outras providências. Brasília. 1999. Recuperado em 10 outubro, 2011 de http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3298.htm         [ Links ]

Portaria nº 657, de 7 de março de 2002 (2002). Adota diretrizes e normas para uso e ensino do sorobã. Brasília. 2002. Recuperado em 8 setembro, 2012 de http://cape.edunet.sp.gov.br/cape_arquivos/outros_dispositivos.asp        [ Links ]

Bruno, M. M. G. (1997). Deficiência visual: reflexão sobre a prática pedagógica. São Paulo: Laramara.         [ Links ]

Bruno, M. M. G. (1999). O significado da deficiência visual na vida cotidiana: análise das representações dos pais, alunos e professores. Dissertação de mestrado, Universidade Católica Dom Bosco de Campo Grande, MS, Brasil.         [ Links ]

Bruno, M. M. G. & Mota, M. G. B. (2001). Programa de capacitação de recursos humanos do ensino fundamental: deficiência visual (Vol. 3). Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial).         [ Links ]

Chacon, M. C. M; Defendi, E. L. &Felippe, M. C. G. C. (2007); A família como parceira no processo de desenvolvimento e educação do deficiente visual. In Masini, E. F. S. (Org.). A pessoa com deficiência visual: um livro para educadores (pp. 129-174). São Paulo: Vetor Editora.         [ Links ]

Chacon, M. C. M. (2009). Família e escola: uma parceria possível em prol da inclusão? In Amiralian, L. T. M. (Org.). Deficiência visual: perspectiva na contemporaneidade (pp.131-174). São Paulo: Vetor.         [ Links ]

Felippe, J. Á. M. (2001). Caminhando juntos: manual de habilidades básicas de orientação e mobilidade. São Paulo: Laramara.         [ Links ]

Fevorini, L. B. (2009). O envolvimento dos pais na educação escolar dos filhos: um estudo exploratório. Tese de doutorado, Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.         [ Links ]

Gasonato, M. R. C. (2007). O sentido das expectativas das famílias em relação à escola para a formação de seus filhos. Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.         [ Links ]

Gil, M. (Org.). (2000). Deficiência visual. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação a Distância.         [ Links ]

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2010). Censo 2010: relatório preliminar. Rio de Janeiro. Recuperado em 16 novembro, 2011 de www.ibge.gov.br.         [ Links ]

Jesus, E. F. (2005). A importância da atividade de vida diária na educação e na reabilitação de pessoas com deficiência visual. Recuperado em 12 de julho, 2012 de http://www.bengalalegal.com/a-v-d.         [ Links ]

Leonhardt, M. (1992). El bebé ciego: primera atención - un enfoque psicopedagógico.(Colección de Psicopedagogía y Lenguaje).         [ Links ]

Lira, M. C. F., & Schlindwein, L. M. (2008). A pessoa cega e a inclusão: um olhar a partir da psicologia histórico-cultural. Caderno Cedes. 28(75), 171- 190.         [ Links ]

Marques, R. (2002). O envolvimento das famílias no processo educativo: resultados de um estudo de caso em cinco países. Recuperado em 7 de maio, 2011 de http://www.eses.pt/usr/ramiro/Texto.htm.         [ Links ]

Menezes, M. (2000). Projetos e práticas familiares: expectativas dos pais sobre o futuro dos filhos. Dissertação de mestrado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil.         [ Links ]

Nogueira, M. A., Romanelli, G., &Zago, N. (Orgs.). (2011). Família e escola: trajetórias de escolarização em camadas médias e populares. Petrópolis: Vozes.         [ Links ]

Omote, S. (1980). Reações de mães de deficientes mentais ao reconhecimento da condição dos filhos afetados: um estudo psicológico. São Paulo: Instituto de Psicologia da USP.         [ Links ]

Roudinesco, E. (2003). A família em desordem. Rio de Janeiro: Zahar Editora.         [ Links ]

Santos, M. J. (2007). A escolarização do aluno com deficiência visual e sua experiência educacional. Dissertação de mestrado, Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA, Brasil.         [ Links ]

Siaulys, M. O. C. (2007). O papel da família na educação e inclusão de crianças com deficiência visual. Laramara: a mudança na prática, na atitude e nas relações com a família. In Masini, E. F. S. (Org.). A pessoa com deficiência visual: um livro para educadores (pp. 175-205). São Paulo: Vetor Editora.         [ Links ]

Silva, S. M. M. (2009) Brincar na família: benefícios dos guias de orientação para pais ou cuidadores de crianças com deficiência visual na 1ª. infância em São Luís-MA. Relatório de Pesquisa. Pós-doutorado. Universidade Federal de São Carlos, São Carlo. SP. Brasil.         [ Links ]

Silva, M. G. (2009). Crianças diagnosticadas com TDA/H: expectativas e acompanhamento dos pais. São Luis: EDUFMA.         [ Links ]

Szymansky, H. (2003). A relação família/escola: desafios e perspectivas. Brasília: Plano.         [ Links ]

 

Recebido: 07/04/2014 / Corrigido: 27/04/2014 / Enviado a Parecerista: 28/04/2014 / Aceito: 30/04/2014

 

 

1 Psicóloga do Centro de Apoio Pedagógico ao Deficiente Visual (CAPDV) e Mestre em Educação na Universidade Federal do Maranhão. Contato: Rua Roberto Simonsen, 100, Santa Cruz. São Luis – MA. 65.000-000. E-mail: edilenasousa@hotmail.com
2
Profª. Drª. do Mestrado em Educação e do Departamento de Educação Física da Universidade Federal do Maranhão. Contato: Núcleo de Esportes. Avenida dos Portugueses, S/N. Campus do Bacanga. São Luís, Maranhão. 65000-000. E-mail: smouraufma@yahoo.com.br

 

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons