Boletim - Academia Paulista de Psicologia
ISSN 1415-711X
Teorias, Pesquisas e Estudos de Casos
A religião do motorista que se envolve em acidente de trânsito - Revisão da Literatura
The religion of the driver who gets involved in a traffic accident – Literature Review
La religión del conductor involucrado en accidentes de tránsito – Revisión de la Literatura
Ana Maria Morini1
Universidade Metodista de Piracicaba
RESUMO
O elevado número de mortes e ferimentos graves nos acidentes de trânsito, o alto custo que eles representam, são alguns dos motivos para que sejam ampliadas as pesquisas nesta área. O uso de bebidas alcoólicas e desrespeito às normas de segurança são apontados como comportamentos de risco no trânsito.Todos os usuários do trânsito, ou seja, motoristas, pedestres, ciclistas, motociclistas, têm que ser sensibilizados para evitarem comportamentos de risco. Algumas evidências indicam que pessoas religiosas costumam manter hábitos saudáveis de vida, tais como o não uso de drogas lícitas e ilícitas, e geralmente respeitam regras e as outras pessoas. A proposta deste artigo é revisar a literatura para conferir a existência de estudos que correlacionam a religião do motorista e seu envolvimento em acidentes de trânsito. O método utilizado é a realização de levantamentos bibliográficos nas Bases de Dados Psycoinfo, Psyarticles, Portal Capes, Web of Science e Scielo. Sete pesquisas foram selecionadas por estudarem acidente de trânsito e a religião da amostra. Não foi encontrado nenhum estudo que correlacionasse especificamente a religião do motorista e seu envolvimento em acidente. As pesquisas selecionadas mostram a influência dos hábitos dos motoristas e seu comportamento no trânsito. Estudar a relação da religião nos hábitos dos motoristas pode fornecer importantes elementos para a elaboração de um programa de educação no trânsito, de prevenção de acidentes e de formação de motoristas. Observa-se a necessidade da realização de pesquisas que propiciem compreender melhor as características e hábitos das pessoas religiosas e como esses dados podem colaborar para o desenvolvimento de programas de prevenção de comportamentos de risco no trânsito.
Palavras-chave: acidente de trânsito, comportamento de risco, motorista.
ABSTRACT
The high number of deaths and serious injuries in traffic accidents, the high cost they represent to governments, are some of the reasons for searches to be expanded in this area. The use of alcohol and disregard for safety standards are seen as risky behavior in traffic. All users of the traffic, in other words, drivers, pedestrians, cyclists, motorcyclists have to be sensitized to avoid risky behaviors. Some evidence indicates that religious people tend to maintain healthy lifestyle habits, such as not using legal and illegal drugs, and generally respect the rules and others. The purpose of this article is to review the literature to check the existence of studies that correlate the religion of the driver and their involvement in traffic accidents. The method used was the literature surveys in Psycoinfo Data Bases, Psyarticles, Portal Capes, Web of Science and SciELO. Seven research projects were selected for study traffic accident and the religion of the sample. No studies that specifically correlate religion of the driver and his involvement in the accident was found. The selected research has shown the influence of the habits of drivers and their behavior in traffic. Studying the relationship of religion in the habits of drivers can provide important elements for the development of a traffic education program, accident prevention and driver training. Noted the necessity of conducting research that foster better understand the characteristics and habits of religious people and how these data can contribute to the development of prevention of risk behavior in traffic programs.
Keywords: Traffic accidents, risk behavior in traffic, driver.
RESUMEN
El elevado número de muertos y heridos graves en accidentes de tráfico, el alto costo que representan, son algunas de las razones por las que la investigación en esta área debe ser ampliada. El uso de alcohol y la violación de las normas de seguridad son vistos como comportamientos de riesgo en el transito. Todos los usuarios del tránsito, es decir, los conductores, peatones, ciclistas y motociclistas, deben ser sensibilizados para evitar conductas de riesgo. Ciertas evidencias indican que las personas religiosas tienden a mantener hábitos de vida saludables, como el no consumo de drogas licitas e ilícitas, el respeto a las normas y hacia los demás. El propósito de este artículo es revisar la literatura para comprobar la existencia de estudios que correlacionan la religión del conductor y su implicación en los accidentes de tráfico. El método utilizado es la revisión bibliográfica de las bases de datos, Psycoinfo, Psyarticles, Portal Capes, Web of Science y SciELO. Siete investigaciones fueron seleccionadas por abordar las temáticas accidente de tráfico y la religió. Sin embargo, no se encontraron estudios que correlacionan específicamente la religión del conductor y su implicación en el accidente. Las investigaciones seleccionadas demostraron la influencia de los hábitos de los conductores y su comportamiento al volante. Estudiar la relación de la religión en los hábitos de los conductores puede proporcionar elementos importantes para la elaboración de un programa de educación en la prevención de accidentes de tránsito y la formación de conductores. Se observa la necesidad de llevar a cabo una investigación que proporcione una mejor comprensión de las características y los hábitos de las personas religiosas y cómo estos datos pueden contribuir al desarrollo de programas de prevención de conductas de alto riesgo en el tránsito.
Palabras-clave: accidente de tránsito, comportamientos de riesgo, conductor.
Introdução
A Psicologia do Trânsito estuda o comportamento dos cidadãos que participam do trânsito (Rozestraten, 2003). Nasceu em 1910 quando Hugo Münsterberg, aluno de Wundt, a convite de William James, assumiu a direção do laboratório de demonstração de psicologia experimental da Universidade de Harvard. Foi o primeiro psicólogo a submeter os condutores de bondes de Nova York a uma bateria de testes de habilidade e inteligência (Rozestraten, 2003). No Brasil, antes da regulamentação da Psicologia como profissão, o engenheiro Roberto Mange exerceu um importante papel no desenvolvimento da Psicologia do Trânsito, atuando na seleção e orientação de ferroviários em São Paulo (Hoffmann & Cruz, 2003).
A Fundação Getúlio Vargas, com seu Instituto de Seleção e Orientação Profissional (ISOP), dirigido por Emilio Mira y López, começou a examinar os candidatos para obtenção da Carteira Nacional de Habilitação em abril de 1951, através de entrevistas, provas de aptidão e personalidade (Hoffmann & Cruz, 2003). Alchieri (2003) destaca o esforço da equipe do ISOP para traçar o perfil profissiográfico para diversas profissões, permitindo à Psicologia consolidar um espaço de intervenção social devido à necessidade da avaliação da atividade de dirigir.
Em 8 de junho de 1953 uma resolução do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN) torna obrigatório o Exame Psicotécnico para todos os candidatos a exercer a profissão de motorista e, em 1962, a todos os candidatos a Carteira Nacional de Habilitação. Em 27 de agosto de 1962 a Psicologia foi reconhecida como profissão no Brasil (Hoffmann e Cruz, 2003).
No final de 1981 o Conselho Federal de Psicologia (CFP) nomeou os psicólogos Reinier Rozestraten, Efrain Rojas-Boccalandro e J. A. Della Coleta para a Comissão Especial do Exame Psicológico para Condutores, com a finalidade de obter dados e critérios sobre o Exame Psicológico e oferecer ao CONTRAN uma proposta de reformulação das normas vigentes sobre o mesmo (Hoffmann & Cruz, 2003). Em 1983 o professor Reinier criou o primeiro grupo de pesquisa em Psicologia do Trânsito na Universidade Federal de Uberlândia, que realizou congressos, periódico científico, guia internacional de pesquisa na área e ofereceu as primeiras disciplinas na graduação e os primeiros cursos de especialização. A partir deles, a Psicologia passou a ser conhecida pelas pesquisas do comportamento do homem no trânsito e não apenas como avaliação de motoristas.
Rozestraten (1986) afirmou que a questão do trânsito deve ser estudada pela Psicologia Social porque o mesmo é um problema social. Cada um quer chegar ao seu destino o mais rápido possível e o outro pode tornar-se um obstáculo para este objetivo. O trânsito é um jogo social com motoristas e pedestres, com regras definidas e, se não forem respeitadas, geram os conflitos. As pessoas devem tomar consciência que as leis de trânsito possuem uma vigência internacional e visam a segurança dos indivíduos que dele fazem parte. O trânsito tem que ser visto como um bem social que pertence a todos, com direitos e deveres, e deve representar um exercício de convivência pacífica (Rozestraten, 1986).
O trânsito reflete os conflitos na sociedade em que está inserido, onde facilmente podemos observar a competição por um espaço, o consumismo, as diferenças de classes, a falta de solidariedade, lembra Machado (2003), que, seguindo a mesma linha de pensamento de Rozestraten, também observou que o trânsito é uma questão social, fruto da sociedade, e, se esta é desigual, hierarquizada, desorganizada, carente de valores éticos e morais, assim será seu trânsito. Para este autor, o trânsito expressa uma forma de violência urbana que impõe empecilhos aos cidadãos para chegarem aos seus destinos, desrespeitando seus direitos de ir e vir. A violência se expressa no trânsito pelas situações de competição, brigas, assassinatos, desafios às autoridades, desrespeito à legislação e aos semelhantes.
Da Matta (2010) apontou que o carro representa um instrumento de liberdade e autonomia e oferece a sensação de onipotência de uma ilimitada mobilidade. A falta de transporte coletivo de qualidade permite que o carro forneça a seu usuário uma individualidade que é indicadora de sucesso e superioridade social. Oferece ao condutor a sensação de ter a própria casa na rua e na estrada. O grande conflito vivenciado pelas pessoas no trânsito, observou DaMatta, é que as vias públicas são espaços igualitários e os pedestres e motoristas atuam com expectativas hierárquicas, como estão acostumados em suas vidas cotidianas. Cada qual tem o seu objetivo e acha que este é mais importante que o das outras pessoas. O motorista que está atrasado acha que todos os outros só estão passeando e atrapalhando a sua mobilidade
De uma maneira didática para tentar explicar a raiz dos conflitos no trânsito, Corassa (2011) explica como o carro pode ser considerado a extensão de sua casa. Uma pesquisa de sua autoria revelou que as pessoas não têm consciência deste fato, porém, elas buscam no carro o conforto e a segurança que encontram em suas casas. A autora dá exemplos simples em que os motoristas parecem transformar seus veículos em ambientes de sua residência. A sala de estar, por exemplo, é identificada quando os jovens ou as famílias passeiam com os amigos, tornando o trajeto mais interessante e divertido, com bate-papo animado, piadas, confissões pessoais, etc. Os motoristas que usam o banco do veículo como cama para tirar um cochilo depois do almoço, ouvir música e relaxar, sentem-se como se estivessem em seus quartos. A falta de tempo faz com que muitas pessoas só consigam ouvir suas músicas preferidas enquanto dirigem, trazendo a sua sala de som para dentro de seus carros. A copa/cozinha e despensa são facilmente reconhecidas quando algumas pessoas costumam comer em drivethru, ou levar uma garrafa de água e uma bolacha no porta-luvas de seus carros. Algumas pessoas carregam consigo livros, apostilas, cadernos e, muitas vezes, resolvem negócios usando celular, como se estivessem em seus escritórios. Não é raro presenciarmos mulheres usando o retrovisor do carro para maquiaremse enquanto o farol está fechado. Os caminhoneiros há muito tempo utilizam seus veículos como extensão de suas residências, uma vez que chegam a ficar muito tempo viajando a trabalho.
Utilizar o carro como uma extensão de sua casa pode fazer com que o condutor comporte-se no espaço público com referências do espaço privado, com tendência a seguir as próprias normas, acrescenta Corassa (2011). Se alguém bate no carro, pode ser interpretado como batendo em sua casa, ou seja, ameaçando sua segurança e sobrevivência. O motorista pode se achar no direito de reagir com agressividade, provocações e ameaças de invadir o espaço dos outros, que poderão, por sua vez, reagir da mesma maneira. E assim surgem os conflitos do trânsito, que podem gerar sérias consequências.
Neuza Corassa (2011) em seu livro Seu carro: sua casa sobre rodas citou um levantamento realizado pelo Conselho de Segurança Nacional dos Estados Unidos sobre o perfil de motoristas sem acidentes, vencedores do prêmio "motorista do ano". Foi revelado que os ganhadores também apresentavam papéis exemplares em sua vida pessoal, ou seja, eram considerados maridos e pais responsáveis, dignos de confiança, sóbrios, econômicos, cautelosos, empregados leais e esforçados e indivíduos não agressivos (Corassa, 2011). Este levantamento ilustra como as pessoas tendem a reproduzir no trânsito o comportamento que costumam apresentar em outras áreas de sua vida.
Três elementos são essenciais no trânsito: o homem, o veículo e a via, segundo Rozestraten (2003). O carro é um ambiente que protege o motorista que, por sua vez, se desloca em outro ambiente, que é a via. Esta apresenta condições e normas, porém, por si só, não garantem os comportamentos que os motoristas apresentarão. A tomada de decisão perante as condições adversas, inusitadas ou emergentes são fundamentais para a segurança viária. Se o motorista fizer uso de substâncias psicoativas, dirigir estressado, com forte emoção, fadiga ou sonolência, sua tomada de decisão poder ficar seriamente comprometida.
Para dirigir um veículo adequadamente no trânsito, três condições se fazem necessárias, conforme demonstrou Rozestraten (1988): estímulos ou situações passíveis de serem observados e percebidos, um organismo em condições de perceber e reagir adequadamente a esses estímulos e uma aprendizagem prévia das normas e regras para que este organismo comporte-se adequadamente no trânsito.
Seguindo a mesma linha de raciocínio de Rozestraten, Hoffmann e Gonzáles (2003) enumeram cinco processos psicológicos necessários na condução de um veículo: correta capacidade perceptiva e de atenção, correta interpretação e avaliação das situações, tomada de decisão sobre a ação ou manobra mais adequada às situações, capacidade de resposta (conjunto de atividades sensóriomotriz e psicomotora que determinarão o controle sobre o veículo e sua trajetória), processos e variáveis individuais (personalidade, inteligência, estilos cognitivos, motivação, aprendizagem, experiência, memória) que modulam os processos psicológicos envolvidos no ato de dirigir.
Rozestraten (1988) define o acidente como sendo uma desavença não intencionada, envolvendo um ou mais participantes do trânsito, implicando algum dano e noticiada à polícia diretamente ou através dos serviços de Medicina Legal. O acidente é o resultado final de um processo encadeado por diversos eventos, condições e comportamentos, observaram Hoffman e Legal (2003), para quem, uma complexa rede de interações entre o motorista, o veículo e a via, em determinadas situações ambientais e culturais, pode determinar a ocorrência ou não de um acidente. Os autores enumeram três categorias de erros mais importantes que antecedem um acidente: erros de reconhecimento e identificaçãopercepção; erros de processamento e tomada de decisão-inteligência, conhecimentos ou atitudes e erros na execução de manobra. Hoffman e Legal (2003) também apontam as falhas humanas mais comuns, simples ou combinadas: causas físicas (fadiga, falta de energia, defeitos sensoriais); causas psíquicas (pressa, falta de atenção, agressividade, competividade); busca intencional de risco e de emoções intensas; condutas interferentes e as distrações; a experiência (muita ou pouca) do veículo ou caminho; estados psicofísicos transitórios (álcool, fármacos, sono, depressão, estresse).
Segundo o Relatório Mundial sobre a segurança rodoviária, em 2013, da Organização Mundial da Saúde, 1,24 milhões de pessoas morrem por ano em todo o mundo em acidentes de trânsito. Destas vítimas fatais 59% têm entre 15 e 44 anos e 77% são homens. No Brasil, de acordo com o mesmo relatório, tem morrido cerca de 20 pessoas a cada 100 mil habitantes desde 2004.
Ao optar pelo incentivo do transporte terrestre de cargas, através dos caminhões, e pelo transporte individual, com os automóveis, o Brasil, deixou de investir no transporte fluvial, marítimo e ferroviário e no transporte público. Como consequência, o trânsito caótico e complexos problemas de mobilidade urbana podem ser observados nas grandes metrópoles brasileiras. Sergio Ejzenberg (2013), mestre em Engenharia de Transportes pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), observou que, entre 2002 e 2013, o preço do diesel e do ônibus (o veículo) aumentou consideravelmente em relação aos carros novos e a gasolina. Agindo assim, o governo brasileiro tem incentivado continuamente o transporte individual.
A Seguradora Líder, responsável por Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Via Terrestre - Dpvat, um seguro obrigatório pago pelos proprietários de veículos no Brasil, levantou que 60 mil pessoas morreram e 352 mil ficaram com invalidez permanente em 2012. A maioria destas vítimas tinha entre 18 e 40 anos, ou seja, em idade ativa, representando um custo de 12 bilhões para a Previdência. Um estudo realizado pelo Ministério da Saúde em 71 hospitais de todas as capitais brasileiras e do Distrito Federal ouviu 47 mil pessoas em 2011. O estudo revelou que o consumo de bebidas alcoólicas tem forte impacto nos atendimentos de urgência e emergência do Sistema Único de Saúde - SUS, apontando que uma em cada cinco vítimas de acidentes de trânsito haviam ingerido bebida alcoólica. Os homens com idades entre 20 e 39 anos representam as principais vítimas.
Para Rabinovich (s/d), presidente da Associação das vítimas de trânsito - Avitran e do Centro de Psicologia Aplicada ao Trânsito – Cepat, o trânsito é um assunto de Segurança Nacional e o define como uma epidemia de saúde pública mundial pelo elevado número de mortes e incapacitações resultantes dos acidentes.
O indivíduo que dirige sobre os efeitos do álcool não percebe prejuízos em suas condições, pelo contrário, acredita que sua capacidade de dirigir melhora, submetendo-se a riscos e manobras perigosas que provavelmente não faria em condições normais. Hoffman e Gonzáles (2003) observaram que as bebidas alcoólicas liberam condutas agressivas e impulsivas, diminuem a responsabilidade, favorecem o descumprimento às normas de trânsito, além das alterações visuais, diminuição de capacidade de resposta, aumento do cansaço e sonolência e comprometimento da coordenação motora. As pessoas que dirigem depois de ingerirem bebida alcoólica têm a visão que o efeito dela depende de cada um e acredita que só é prejudicial aos outros e não a si mesmo, observou DaMatta (2010).
Em O futuro de um ilusão, Freud (1927) afirmou que a religião funciona como um controle dos instintos predatórios para perpetuar a cultura e que as massas precisam de líderes com exemplos de conduta para se influenciarem. Frankl (2007) discorda de Freud e valoriza a religião como sendo um fenômeno humano a ser considerado pela Psicologia, em que a pessoa é capaz de experimentar alívio psicológico ao acreditar em sua transcendência, ao encontrar o sentido último da vida em Deus ou ao sentir-se ancorada no absoluto.
Alguns estudos revelam que as pessoas que seguem uma religião apresentam hábitos de vida saudáveis, evitando comportamentos arriscados e uso de bebidas alcoólicas, respeitam as normas, aprendem a colocar limites em seus comportamentos e tendem a evitar violações no trânsito e, por consequência, não apresentam comportamentos de risco de acidentes de trânsito (Chliaoutakis e outros, 2002). Por outro lado, pessoas de religiões com crenças fatalistas, não acreditam que os acidentes podem ser evitados se forem respeitadas as normas de segurança no trânsito (Kayanil, King & Fleiter, 2012). Elas apresentam comportamentos de risco no trânsito por não relacionarem os mesmos com os acidentes, uma vez que acreditam que o destino já está traçado.
Uma pesquisa realizada em sete países da América Latina investigou o papel da religiosidade nos primeiros estágios do envolvimento com drogas através do estudo das primeiras oportunidades de tentar usar a droga e o primeiro uso real da mesma e os comportamentos de práticas religiosas, níveis de devoção e afiliação religiosa (Chen & Anthony, 2004). Os resultados apontaram que os níveis mais altos de práticas religiosas são inversamente associados com as primeiras chances para tentar o uso real do tabaco e da maconha, mas não do álcool. Práticas de comportamentos religiosos têm efeitos protetores no que se refere às primeiras oportunidades de experimentar o tabaco ou a maconha. Práticas e devoções religiosas não estão associadas com a rápida transição entre a chance de experimentar o álcool ou o tabaco e primeiro uso destas drogas.
Uma revisão da literatura para tentar identificar os principais estudos científicos sobre o papel da religião no tratamento e prevenção do consumo de drogas foi motivada devido às evidências de que existe uma correlação negativa entre a religiosidade e a espiritualidade e o consumo de drogas lícitas e ilícitas (Sanchez e Nappo, 2007). Os resultados apontaram que as pessoas que frequentam assiduamente uma igreja, praticam os conceitos propostos por uma religião e que foram educadas dentro dos preceitos de uma religião, estão mais protegidas do consumo de drogas. Como a maioria dos trabalhos pesquisados usou o método quantitativo e transversal, as autoras sugerem que sejam ampliadas as pesquisas qualitativas nesta área para investigar os processos de ação da fé religiosa na prevenção do consumo de drogas.
Uma pesquisa realizada com 926 estudantes de Ciências Biológicas de uma universidade da Cidade de São Paulo entre 2000 e 2001, verificou a correlação entre o uso de álcool, tabaco, drogas ilícitas e medicamentos e o estilo de vida e a situação socioeconômica desses jovens (Silva, Malbergier, Stempliuk, & Andrade, 2006). Os resultados demonstraram que os alunos com renda familiar alta e sem religião apresentaram maior risco de consumo de drogas e, entre os alunos que não possuíam religião, o consumo de álcool, tabaco e drogas foi superior aos com alguma religião.
O objetivo deste artigo foi realizar uma revisão da literatura para investigar a correlação da religião do motorista e seu envolvimento em acidentes de trânsito. Uma vez que diversos estudos demonstraram que dirigir sob o efeito de álcool e/ ou drogas e desrespeitar a legislação são responsáveis pela maioria dos acidentes de trânsito, e que, pessoas que seguem uma determinada religião costumam manter hábitos de vida saudáveis como não utilizar álcool, drogas, respeitar os outros e as normas, a hipótese é que elas têm menor probabilidade de causarem acidentes de trânsito. Isto se comprovando, seria um incentivo para o desenvolvimento de pesquisas que explorassem os mecanismos responsáveis por fazer com que as pessoas religiosas apresentem comportamentos considerados seguros no ato de dirigir. O conhecimento destes mecanismos pode servir de aporte para a elaboração de campanhas de educação no trânsito e prevenção de acidentes, para o desenvolvimento de um programa de formação de motoristas, assim como para a preparação de um programa pedagógico para educação no trânsito nas escolas.
Método
Foram realizados levantamentos bibliográficos nas bases de dados Psycoinfo, Psyarticles, Portal Capes, Web of Science e Scielo. As palavras-chave utilizadas, isoladamente e associadas, em português e inglês, foram: acidente de trânsito, comportamento de risco no trânsito, motorista e religião. Analisando os títulos e resumos dos artigos encontrados na busca, foram selecionados apenas aqueles que incluíam o tema religião e acidente de trânsito. Não foi encontrada nenhuma pesquisa que tenha estudado especificamente a correlação entre o envolvimento em acidente de trânsito e a religião do condutor. Sete trabalhos foram selecionados por tratarem de acidente de trânsito e a religião da amostra. Dois trabalhos foram realizados na Grécia, um no Paquistão, um em 15 países da Europa Ocidental, um no Kuwait, um no Afeganistão e dois no Brasil.
Resultados
Na ilha de Creta, Grécia, uma pesquisa investigou as possíveis ligações entre os padrões de estilo de vida e o que os autores denominaram de comportamentos aberrantes dos motoristas (Chliaoutakis, Koukouli, Lajunen, & Tzamalouka, 2005). A religião do condutor foi um dos estilos de vida estudados como preditores do comportamento no trânsito. A motivação dos autores em realizar este estudo foi que a Grécia, juntamente com Portugal e Espanha, apresenta o maior índice de acidentes fatais entre os países da Europa Ocidental, sendo esta a terceira maior causa de mortes e a primeira entre jovens de 15 a 24 anos.
Os autores incluíram o Estilo de Vida neste trabalho, pois, pesquisas anteriores conduzidas por eles, apontaram que o comportamento de dirigir é influenciado por fatores motivacionais e comportamentais regidos pelo indivíduo, e também por fatores culturais e situacionais fora da situação do trânsito. Se o motorista, por exemplo, é uma pessoa que faz uso de bebida alcoólica, drogas, ou, se é atlético e dá mais valor à saúde, provavelmente estes hábitos refletirão em seu comportamento de direção. O estilo de vida pode ser determinado por um traço agressivo ou narcisista da personalidade do condutor, que verá no trânsito uma oportunidade para exibir esse perfil aventureiro, e, correr riscos dirigindo imprudentemente lhe causa prazer.
A amostra foi composta por 324 adultos entre 18 e 65 anos, que responderam a um questionário dividido em três partes. Na primeira parte constava o perfil sociológico, experiência no trânsito e envolvimento em acidentes. Na segunda, 26 itens de um Questionário Sobre Estilo de Vida desenvolvido pelos autores que avalia os seguintes estilos de vida: Divertimento, Esportes, Religião/Tradição e Cultura. A amostra respondeu três perguntas para avaliar o padrão Dirigir sem Rumo: Quantas vezes você dirige sem objetivo específico? Quantas vezes você dirige para sentir-se melhor? Quantas vezes você dirige para aliviar o stress? Na terceira parte foram aplicados 21 itens do Questionário de Comportamento de Dirigir - DBQ, em que os respondentes relataram o grau de envolvimento em alguns comportamentos inadequados no trânsito.
O DBQ identifica três tipos de comportamentos aberrantes dos motoristas: Violações, Erros e Lapsos. As Violações seriam aqueles comportamentos voluntários de transgressão das regras de trânsito (ultrapassar os limites de velocidade ou não respeitar o farol vermelho); elas podem ser agressivas (perseguir outro motorista com seu veículo), ou ordinárias (exceder os limites de velocidade, sem provocar ninguém especificamente). Os Erros são os comportamentos resultantes de falhas de julgamento (erros de cálculos nas ultrapassagens, por exemplo). Os Lapsos são as falhas de memória e atenção (se esquecer de sinalizar ao mudar de faixa).
Os resultados demonstraram que quase um terço da amostra relatou Dirigir sem um destino mais frequentemente do que raramente, seja para lidar com o stress (34%), apenas dirigir em volta (dar uma volta de carro) (34,3%) e dirigir para sentir-se melhor (43,3%). Quanto aos itens do DBQ, os dados levantados revelaram que, entre os três possíveis fatores investigados pelo questionário, ou seja, erros, lapsos e violações, 41,8% dos entrevistados responderam apresentar esses comportamentos quando dirigem, sendo que 27,6% relataram já terem cometido violações ordinárias, 7,4% cometeram erros e 6,8% cometeram violações agressivas.
A análise dos resultados do Questionário Sobre Estilo de Vida revelou quatro fatores que correspondem a 36% da variação total. O primeiro fator, Divertimento, apareceu em 17,8% das respostas e incluem dez itens que se referem à maneira como o indivíduo se diverte, como por exemplo, ir a bares, lanchonetes, festas ou shows. O segundo fator, Religião/Tradição, foi responsável por 10,4% da variância, com quatro itens sobre crenças individuais, valores religiosos e família. O estilo Esporte, que revela o envolvimento do respondente com esportes, eventos esportivos, ir à caça, a jogos de futebol, apareceu em 8,1% das respostas. Hábitos de leitura, ir a teatro fazem parte do estilo Cultura e foi responsável por 6,8% da variância.
Uma das conclusões do trabalho foi que existe relação entre o estilo Dirigir sem Rumo e as Violações Agressivas. Esse estilo apareceu com maior frequência nos respondentes jovens e foi considerado o mais perigoso para envolvimento em acidente e desvio de conduta, revelando motoristas que não usam o veículo como meio de transporte e sim para buscar sensação, relaxamento, desabafar suas emoções ou hostilidades. Os resultados também apontam uma relação negativa entre o estilo Religião/Tradição e Violações Ordinárias, confirmando outros estudos que sugerem que os valores religiosos influenciam o indivíduo a buscar um estilo de vida saudável em que evitam comportamentos arriscados e maus hábitos, como beber e fumar (Chliaoutakis, 2002). O indivíduo religioso aprende a colocar limites em seu comportamento, a obedecer a normas e respeitar as pessoas, evitando cometer infrações de trânsito, por exemplo. O estilo Cultura também foi negativamente relacionado a Violações.
Pessoas do grupo Esporte foram relacionadas a Violações Comuns e Erros. Os estilos de vida Dirigir sem Rumo e Esportes foram mais associados com comportamentos aberrantes de condução. Pessoas esportistas geralmente são mais jovens, saudáveis e muitas vezes comportam-se de maneira imprudente, pois, admiram participar de atividades arriscadas e radicais. Provavelmente se consideram "bons pilotos", interessam-se muito por carros e na atividade de dirigir, podendo cometer menos erros, porém, mais propensos a cometer violações ordinárias devido a tendências para envolverem-se em situações arriscadas. Costumam superestimar suas habilidades, mesmo em situações desfavoráveis, como dirigir após consumo de bebida alcoólica. Costumam fazer ultrapassagens perigosas e pressionar o motorista do carro da sua frente a lhe ceder o lugar na pista.
As pessoas do grupo Divertimento demonstraram que quanto mais participavam em atividades de entretenimento, menos estiveram envolvidas em Erros. É importante observar que estes respondentes não acrescentaram em suas respostas se gostavam de ficar fora até tarde da noite ou consumir álcool durante estas atividades, e que a maioria deste grupo foi formada por adultos.
A pesquisa demonstrou que o estilo de vida do motorista reflete mais nas Violações Ordinárias do que nos Erros e Violações Agressivas interpessoais. Os autores concluíram o trabalho com sugestões para que as campanhas de segurança rodoviária devam atingir principalmente os motoristas mais jovens, mostrando-lhes alternativas mais saudáveis para satisfazer seus desejos de buscas de sensações e relaxamentos e que os estilos de vida têm que ser estudados mais amplamente para maior conhecimento da relação entre eles e os comportamentos aberrantes no trânsito. Como limitação do estudo, eles apontaram que o método adotado de autorrelato pode favorecer respostas com o fator de desejabilidade social, ou seja, aquelas que o entrevistado procura dar por julgar que o tornará mais aceito pelo pesquisador. A memória também pode interferir na fidedignidade das respostas.
Uma pesquisa realizada em Atenas e outras cidades da Grécia, com a participação de dois pesquisadores do estudo anterior, investigou o impacto do estilo de vida e fatores relacionados ao sono e o envolvimento em acidentes (Gnardellis, Tzamalouka, Papadakaki, & Chliaoutakis, 2008). Uma das hipóteses dos autores é que as práticas cotidianas adotadas pelos indivíduos em cada padrão de estilo de vida desempenham um significativo papel no envolvimento dos mesmos em acidentes automobilísticos. Outra hipótese é que os fatores relacionados a distúrbios do sono aumentam o risco de provocar acidentes de carro. O estudo identificou cinco padrões de estilo de vida adotado pelos motoristas gregos e investigou a influência destes no envolvimento em acidentes de trânsito. Cada padrão foi identificado para trazer tanto uma "carga positiva ou negativa" na atividade de dirigir, conforme as práticas cotidianas envolvidas em cada um deles. Por exemplo, as pessoas que se enquadram no estilo de vida Trabalho frequentemente costumam trabalhar em excesso, fazer horas extras, vivenciam condições de muita competitividade, sendo assim esperado que transportem uma "carga negativa" para seu comportamento de dirigir, aumentando o risco de causar acidente.
Para coleta dos dados foram realizadas entrevistas que incluíram informações sóciodemográficos, experiências como condutor e a frequência e distância que costumam dirigir. O estilo de vida foi avaliado por 26 itens do Questionário Sobre Estilo de Vida com perguntas sobre a frequência de participação em diversas atividades, o mesmo utilizado na pesquisa anterior. Quanto aos fatores relacionados ao sono, os sujeitos responderam sobre situações em que estiveram perto de "cair" dormindo enquanto dirigiam durante os últimos 12 meses, denominados de adormecer ao volante. A fadiga durante a condução no ano anterior foi medida de acordo com o número de ocorrências de situações de risco, como por exemplo, não se lembrar dos últimos quilômetros, pensamentos incoerentes, dificuldades de manter a cabeça erguida, desrespeitarem os sinais de trânsito, etc. Os respondentes avaliaram suas chances de terem cochilado ou adormecido durante algumas atividades diurnas, tais como: lendo sentado, assistindo TV, sentado em um lugar público, identificado como sonolência diurna. Sintomas de distúrbios do sono no mês anterior foram medidos de acordo com a frequência em que relataram experiências tais como: pensando e se contorcendo por muito tempo na cama antes de dormir e sentirse cansado ao acordar.
A amostra foi composta por 1.366 motoristas não profissionais com idades entre 19 e 65 anos, sendo 811 homens (59,4%) e 555 mulheres (40,6%). Sei em cada dez tinha idades até 34 anos e quase metade dos respondentes (46,9%) vivia em Atenas. Metade da amostra havia concluído de 13 a 16 anos de escolaridade e quatro em cada dez era habilitado há menos de 5 anos. Mais da metade dos participantes (55,2%) já tinha causado pelo menos um acidente automobilístico.
Os resultados do Questionário Sobre o Estilo de Vida, que representou 44% da variância total, revelaram cinco tipos de estilos de vida, um a mais do que no estudo anterior, que foi o estilo Trabalho. Respostas sobre o estilo Divertimento apareceram em 13,9% dos respondentes, que incluía itens como frequentar clubes noturnos, bares, cafeterias, ir a festas e excursões. O segundo estilo analisado foi o Cultura em que 10,2% dos respondentes afirmaram frequentar teatro, shows, cinema, ler livros, engajar-se em esportes e tocar algum instrumento musical. O estilo Religião apareceu nas respostas de 7% da amostra e incluía itens como frequentar a igreja, fazer jejum e rezar. O estilo Esporte foi encontrado em 6,8% da amostra, em respostas como frequência em caça, pesca, fixação por carros, andar de bicicleta ou moto, ir a jogos ou fazer parte de equipes de jogos. O estilo Trabalho apareceu em 5,9% dos entrevistados, que afirmaram serem competitivos no trabalho, fazer uso de email e celular, fazer horas extras, usam tecnologia avançada no trabalho, assistem televisão, frequentam restaurantes e bares e apreciam passar o tempo livre em suas casas.
A análise de regressão feita no estudo considerou a categoria de ausência de acidentes como referência da variável dependente. Três outras categorias foram usadas, comparando-se sempre com a de ausência de acidente, estimando-se o risco de envolvimento em acidentes: o de causar um acidente, de causar dois acidentes e de causar três ou mais acidentes. Os resultados a seguir foram considerados quando esteve aumentado em um ponto dentro de uma escala de 10 pontos. A categoria de causar um acidente mostra que as quatro variáveis relacionadas ao sono (adormecer ao volante, fadiga enquanto dirige, sonolência diurna, sintomas de distúrbio do sono) estão significativamente associadas com o risco de acidente de carro, sendo que um ponto aumentado na variável adormecer ao volante aumenta em 41% a chance de causar acidente de carro, um ponto aumentado em fadiga enquanto dirige aumenta em 20% e, um ponto aumentado em sintomas de distúrbio do sono aumenta o risco de acidente em 10%. A sonolência diurna, por sua vez, em um ponto aumentado, demonstrou estar negativamente associada ao risco de causar acidente de carro, diminuindo em 19% o risco de acidente. O estilo de vida Religião, entre as demais variáveis independentes, com um ponto aumentado, foi negativamente correlacionado com a probabilidade de risco de acidente, diminuindo em 19% a chance de ocasionar um acidente de carro.
A segunda categoria examinada, a de causar dois acidentes, indicou que um aumento em um ponto, em uma escala de 10 pontos em adormecer ao volante, aumentou o risco de acidente de carro em 56% e, um aumento de um ponto em fadiga aumentou em 25% a chance de causar acidente. A sonolência diurna, com um ponto aumentado, reduziu em 12% o risco de acidente, confirmando seu papel de "proteção de risco de acidente". Ao contrário do que os autores esperavam o aumento em um ponto na escala sintomas de distúrbios do sono não demonstrou associação significativa quanto ao risco de causar acidente.
O último modelo estudado, ou seja, o risco de causar três ou mais acidentes, demonstrou que a frequência de adormecer enquanto dirige e a frequência de fadiga durante a condução, estão significativamente associadas a um aumento múltiplo do risco de acidente. O aumento de uma unidade na escala de adormecer ao volante elevou em 76% o risco de causar acidente e, na escala de fadiga aumentou em 49% a chance de envolvimento em três ou mais acidentes. A sonolência diurna, aumentada em um ponto, diminuiu em 14% o risco de causar acidente. Os sintomas de distúrbio do sono não estiveram associados ao aumento do risco de causar múltiplos acidentes. Novamente, o aumento em um ponto na escala de Religião, foi o único entre os outros estilos de vida relacionados à redução de risco de causar três ou mais acidentes em 24%.
O estudo concluiu que a frequência de fadiga e adormecimento enquanto dirige aumenta o risco de causar acidentes, de forma linear quanto ao número de acidentes, ou seja, quanto maior o aumento dos valores de fadiga e adormecer, maior a probabilidade de causar múltiplos acidentes. A frequência de sonolência diurna parece diminuir o risco de acidente, enquanto os sintomas de distúrbios do sono parecem aumentar o risco de acidente apenas no caso de um único acidente. Apenas o estilo de vida Religião foi associado negativamente com o risco de causar acidente, pois, o mesmo manifesta um efeito protetor sobre ele, devendo ser levado em consideração nas campanhas de educação no trânsito, ressaltaram os autores. A fadiga e a sonolência podem estar intimamente relacionadas às práticas adotadas nos padrões dos estilos de vida dos participantes da pesquisa.
Uma limitação observada na pesquisa pelos autores foi à fórmula adotada no desenho transversal de coleta de dados e o tipo de autorrelato de entrevista, susceptíveis às respostas com desejabilidade social. O estudo não conseguiu estabelecer uma associação entre todos os estilos de vida e o risco de acidente, acreditam os autores, devido ao uso de instrumento inadequado, ou então, que as práticas de cada padrão de estilo de vida não são impactantes nos riscos de acidentes. Ressaltaram, no entanto, o efeito protetor sobre o risco de acidente demonstrado no estilo de vida Religião, e que deve ser mais explorado em estudos futuros. O envolvimento da fadiga e sonolência nos riscos de acidente pode estar intimamente relacionado, lembram os autores, aos padrões de estilo de vida dos participantes, e consideram que devem ser investigados mais profundamente. Os autores sugerem campanhas de comunicação que demonstrem os efeitos protetores de um estilo de vida com autocontenção como o das pessoas religiosas e os efeitos de risco de práticas cotidianas que aumentam a fadiga e a sonolência. Como campanhas de educação e comunicação não mudam radicalmente a vida de uma pessoa, os autores acreditam que poderia ser muito eficiente a utilização de objetivos e métodos de aprendizagem que incluíssem relatos de experiências pessoais nos cursos de formação de motoristas.
No Paquistão, em 2012, uma pesquisa estudou o fatalismo e suas implicações no uso arriscado da estrada e a receptividade às mensagens sobre segurança no trânsito (Kayanil, King & Fleiter, 2012). O objetivo da pesquisa foi estudar as crenças fatalistas entre motoristas paquistaneses e como essas tornam ineficazes as campanhas de segurança rodoviária. O Paquistão é um dos maiores países muçulmanos do mundo, considerado de baixa renda, tem uma taxa de alfabetização para pessoas acima de 10 anos de idade de 56% (69% para os homens e 31% para as mulheres).
Os autores chamam a atenção para o fato de que as atitudes fatalistas diante de situações de risco devem ser vistas em seu contexto sociocultural, um contexto complexo e ligado às atribuições de culpa. Estas características são aspectos culturais e não individuais.
Dados de 2007 retirados da Organização Mundial de Saúde revelaram que o Paquistão teve aproximadamente 41.494 mortes nas estradas, representando uma taxa de 25,3 por 100.000 habitantes. As taxas de mortalidade no trânsito no Paquistão são muito superiores a outros países do Sul da Ásia, como Bangladesh, Butão, Índia, Maldivas, Nepal e Sri Lanka e, três vezes maior que os países altamente motorizados e que implantaram regras de segurança rodoviária há muitas décadas.
Foi utilizado o método qualitativo, realizado através de entrevistas nas três principais cidades de Lahore, Islamabad e Rawalpindi. Os resultados demonstraram que as crenças fatalistas, muito presentes no Paquistão, estão fortemente ligadas à religião e são responsáveis pelo fato dos motoristas não seguirem as orientações das campanhas de segurança nas estradas, assumindo comportamentos arriscados, uma vez que acreditam que o destino já está predeterminado.
A amostra foi composta por 30 participantes com idades entre 24 a 63 anos, sendo doze motoristas profissionais (três taxistas, seis caminhoneiros e três motoristas de ônibus), cinco motoristas não profissionais, sete policiais, quatro políticos (funcionários públicos) e dois oradores religiosos. Apenas duas mulheres participaram, sendo uma motorista amadora e outra policial. Todos eram muçulmanos, com exceção de um motorista amador cristão e um policial Sikh. As entrevistas foram semiestruturadas, sendo que a questão sobre o tema destino/fatalismo só foi abordada no final da entrevista, para não influenciar as respostas dos participantes. Os principais temas abordados foram sobre fatalismo geral, causas dos acidentes de trânsito, religião e fatalismo e consequências dos comportamentos de riscos.
A maioria dos entrevistados relatou envolvimento em pelo menos um acidente de trânsito e quase todos relataram que pessoas próximas ou conhecidas foram gravemente feridas ou morreram em acidentes de trânsito. Os resultados apontaram fortes influências de crenças fatalistas no Paquistão em relação aos acidentes de trânsito e à resistência em adotar medidas preventivas. As respostas dadas revelaram que a amostra interpreta os acidentes fatais como já predestinados, apesar de não terem sido tomadas mínimas medidas de segurança. Por exemplo, muitas crianças morreram em um acidente de ônibus por estarem sentadas no teto do mesmo e a interpretação geral foi que esta fatalidade não poderia ter sido evitada, pois, estas crianças morreriam de qualquer maneira neste dia. Os oradores religiosos entrevistados também usaram o mesmo tipo de atribuições fatalistas que os outros entrevistados.
Os autores não julgaram se essas interpretações religiosas estão corretas ou não, se são válidas ou não. Eles apenas reproduziram o que a amostra respondeu e a pesquisa investigou como estas pessoas constroem suas crenças religiosas e não se elas estão corretas segundo os estudos religiosos.
O fato dos ensinamentos religiosos pregarem que o destino já está predeterminado não incentiva os motoristas paquistaneses a apresentarem comportamentos mais seguros, como uso de cintos de segurança, capacetes, obediência às normas de trânsito, e nem os responsáveis pela execução das leis, de tomarem medidas mais enérgicas para prevenção de acidentes. Os autores sugeriram o incentivo de comportamentos seguros através de uma campanha educativa à população que proporcione uma maior compreensão das causas dos eventos e os fatores de risco associados às suas ações. Eles confiam que os resultados desta pesquisa sejam utilizados em futuros trabalhos de investigação da ligação entre as crenças fatalistas e os comportamentos de risco no trânsito.
Uma pesquisa comparou 15 países da Europa Ocidental em dois períodos, de 1989 a 1991 e de 1997 a 1999 com o objetivo de entender melhor a relação entre os diferentes fatores socioeconômicos e culturais, os recursos gastos em trânsito, em carros e em autoestradas, a legislação quanto à segurança no trânsito e as mortes em acidentes de trânsito (Melinder, 2007). O estudo também pretendeu caracterizar as nações quanto ao respeito à segurança. Entre as variáveis estudadas estão o índice de mortes por acidentes a cada 100.000 habitantes, o consumo de álcool em litros por adultos maiores de 15 anos e o Gross National Produt – GNP (equivalente ao Produto Interno Bruto – PIB no Brasil), a porcentagem de católicos no país, os dados coletados pelo Uncertainty Avoidance Index – UAI (Índice de Aversão à Incerteza) de acordo com o questionário Hofstede, o número de passageiros por carro a cada 1000 habitantes, a relação entre a densidade das autoestradas e a densidade populacional e os dados da segurança e legislação quanto à tolerância de ingestão de álcool e limites de velocidade.
O Índice de Aversão à Incerteza de Hofstede é avaliado através de três perguntas sobre regras de orientação, estabilidade no emprego e estresse. Este índice se propõe a medir a confiança de um povo no futuro e como conseguem lidar com o fato do futuro ser incerto. Ele tem sido aplicado em 50 países desde os períodos de 1967-1969 e 1971-1973 e complementados com a pergunta: "Geralmente falando, você diria que a maioria das pessoas pode ser confiável ou que você não pode ser muito cuidadoso em lidar com as pessoas?" Os dados utilizados neste estudo são de 1990 e1999. Hofstede descobriu que existe uma forte associação entre aversão à incerteza e o Catolicismo. As certezas apontadas pelo catolicismo, como por exemplo, a infalibilidade do papa e a singularidade da Igreja, faz com que as pessoas tenham mais dificuldades em lidar com as incertezas. Por sua vez, as culturas com baixa tolerância à incerteza apresentam dificuldades em situações que exigem improvisação e adaptação social, podendo ser fatal no trânsito.
Os dados sobre acidentes de trânsito foram extraídos da Organização Mundial de Saúde assim como o GNP e consumo de álcool em adultos maiores de 15 anos. Os dados sobre automóveis e autoestradas foram retirados da Eurostat. A densidade da autoestrada foi calculada dividindo os quilômetros de estradas de um país por sua população. Os dados sobre a religião foram consultados na Enciclopédia Nacional, considerando como católicos tanto os romanos como os ortodoxos. A autora incluiu a religião de cada país na pesquisa por entender que ela representa uma base importante para a cultura do mesmo, pois, influencia nos valores sobre segurança que o mesmo adota.
Os resultados apontaram que a média de mortes em acidentes de trânsito caiu em 24% da primeira para a segunda fase da pesquisa e que o número de passageiros por carro e a densidade de autoestradas aumentou no mesmo período. O consumo de álcool diminuiu e o GNP aumentou; a tolerâncias dos países com relação aos limites permitidos de álcool diminuíram, os limites de velocidade continuaram os mesmos e houve um declínio no nível de confiança interpessoal. Espanha, Portugal e Grécia apresentaram os maiores níveis de mortes nos dois períodos e também o menor GNP. A Itália ficou entre este grupo e o dos países católicos mais ricos, ou seja, Áustria, Bélgica e França, e seu nível de mortes aumentou mais do que seu nível econômico. A Irlanda foi o único país que passou do grupo de baixo para o de alto nível de mortes no trânsito, embora seu nível de acidentes de trânsito tenha diminuído, assim como em todos os países.
Os países católicos apresentaram muitas mortes em acidentes de trânsito e, quanto à tipologia, o catolicismo pareceu ser um importante fator. Os países católicos ricos apresentaram altos limites de álcool e velocidade na primeira fase do estudo e, em ambos os períodos, gastaram muitos recursos em trânsito nas estradas, individualmente por carros e socialmente, pela densidade de autoestradas. Na segunda fase, apesar de baixos limites de álcool, ainda apresentaram elevado nível de mortes, alto consumo de álcool, baixo nível de confiança nas pessoas e alto nível de aversão à incerteza.
Os países católicos menos ricos apresentaram o maior número de mortes em acidentes de automóvel e os mesmos valores de aversão à incerteza e confiança nas pessoas que os países ricos. Apresentaram um alto nível de acidentes fatais, altos níveis de consumo de álcool assim como de limites de velocidade ou álcool.
Um terceiro grupo é composto pelos países anglo-saxões. A Irlanda e o Reino Unido funcionaram diferentemente que os outros países; em 1990 a Irlanda não era católica e o Reino Unido apresentou um nível muito baixo de mortes no trânsito, embora tenha muitos dos supostos fatores negativos e, semelhante à Irlanda, apresentou um baixo GNP nos dois períodos estudados.
Os países ricos não católicos apresentaram baixo número de mortes, confiança nas pessoas e baixos limites de velocidade e de álcool. O Reino Unido não está entre os países ricos, sua religiosidade é mista, tem baixo nível de confiança e elevados limites de álcool, no entanto, nos dois períodos, tem quase os mais baixos índices de mortes em acidentes rodoviários.
Os países nórdicos, excluindo a Dinamarca e incluindo a Holanda, podem ser vistos como um dos grupos de mais segurança. O estudo concluiu que o tipo de religião e a riqueza do país parecem ser um dos fatores mais impactantes na segurança do trânsito. Um país ser católico ou não parece ser tão importante quanto ser rico ou não. Um país não rico católico apresenta mais acidentes de trânsito do que um país católico rico. Um país católico rico, por sua vez, apresenta mais acidentes do que um igualmente rico, porém, não católico. Os países de menores índices de mortes no trânsito foram os ricos não católicos, que confiam nas pessoas e têm baixa tolerância aos limites de velocidade e de álcool.
Foram encontradas de três a cinco categorias da tipologia de segurança viária nos países, sendo as mais "sinceras" a católica, a protestante e a mista. Cinco categorias também podem ser divididas em não católica rica, católica rica, anglo-saxão, protestante e seguro continental protestante. Os países católicos ricos parecem investir em estradas, mas não com o objetivo de aumentar a segurança nelas. No segundo período, os limites de velocidade e tolerância de álcool nos países católicos ricos diminuíram em relação ao primeiro período, porém, eles ainda apresentaram um elevado nível de mortes no trânsito.
No Kuwait, um estudo investigou a influência da religião islâmica sobre o bem-estar das pessoas traumatizadas em acidentes de carros. (Ashkanani, 2009). Embora a pesquisa não tenha abordado a influência da religião nas causas ou prevenção de acidentes, foi incluída nesta revisão pelo importante papel que ela exerce no conforto das vítimas e parentes de vítimas de acidentes. O autor escolheu este tema devido ao elevado número de mortes e ferimentos em acidentes de trânsito registrados no Kuwait, além do fácil acesso a estes dados que ficam disponíveis nos serviços públicos do país. Em 2002, segundo dados do Ministério do Interior, ocorreram 35.989 acidentes, 608 ferimentos graves, que resultaram em 300 mortes, números altos para uma população de 2.363.325 kuaitianos e 1.478.775 não kuaitianos. As pessoas jovens foram as mais afetadas pelos acidentes, sendo que, das 300 mortes, 16,7% tinham entre 11 e 20 anos de idades, 25% entre 21 e 30 anos, 20,7% entre 31 e 40 anos e 14% entre 41 e 50 anos. O autor também considerou muito importante estudar a função da religião como um fator de proteção ou mecanismo de enfrentamento para o impacto de um trauma.
Foram levantadas três hipóteses, sendo a primeira, que haveria uma relação positiva entre religiosidade do indivíduo e seu bem-estar. A segunda, que haveria uma significativa relação entre a religiosidade do traumatizado e as variáveis demográficas e o bem-estar. Por fim, que diferentes variáveis demográficas, como sexo, idade, renda, escolaridade, estado civil, status e nacionalidade, e religiosidade teriam diferentes efeitos sobre o bem-estar.
Foram distribuídos 400 questionários, e, destes, 66,5% retornaram, totalizando 266 indivíduos, sendo 85% entre 18 e 42 anos, 88,8% kuaitianos, 55,7% homens, 44,3% mulheres, 45,4% casados, 42,1% solteiros, 3,6% viúvos e 8,9% divorciados. Quanto à escolaridade, 40,4% com nível superior, 25,4% com dois anos de estudo além do ensino médio, 22,9% com ensino médio completo e 11,4% abaixo do ensino médio. Com relação à renda, 46,3% recebiam menos que 1335 dólares mensais, 38,1% o equivalente a $1338 e 38,1% $2672 por mês, 7% entre $2675 a $3006 e 8,5% mais que $3345 dólares por mês. Para 33,8% da amostra o acidente ocorreu de 2 a 3 anos antes da pesquisa; para 17,3%, de 4 a 6 anos; para 10,4%, de 7 a 9 anos e para 17,3%, o acidente ocorreu de 10 anos ou mais, antes da realização da pesquisa.
As entrevistas foram realizadas em um Hospital, especializado em ortopedia, e a amostra foi dividida em três grupos: 109 indivíduos gravemente feridos (25,6%); 68 parentes destes gravemente feridos (41%) e 89 parentes de vítimas fatais (35%). A religiosidade foi medida através dos 10 primeiros itens da tabela Al Kandari; os últimos 5 itens foram excluídos, pois, são específicos para homens, e, a amostra foi composta por ambos os sexos. Estes 10 itens incluíram perguntas em que tinham que dar nota de 1 (nunca) a 5 (sempre), sobre práticas religiosas como rezar a oração da manhã (Fajr), jejuar voluntariamente, ler o Alcorão, rezar todas as orações, memorizar versos do Alcorão, participar de ocasiões religiosas, ouvir o Espírito Alcorão no gravador, pagar Zakat anualmente, doar para caridade e ir à Meca regularmente. O coeficiente para a medida de religiosidade foi 0,86, indicando a confiabilidade das variáveis. Quanto maior a pontuação, maior a religiosidade do respondente.
O bem-estar psicológico foi avaliado através de 84 itens do inventário de Ryff e Keyes que refletem seis áreas de bem-estar psicológico: autonomia, domínio ambiental, crescimento pessoal, relação positiva com os outros, objetivos de vida e autoaceitação. O respondente avaliou declarações em uma escala de 1 (forte desacordo) a 6 (forte concordância). A relação entre a religiosidade e as variáveis demográficas e o bem-estar foi medida pelos coeficientes de correlação de Pearson. Alguns exemplos das declarações sobre o bem-estar que os respondentes tinham que avaliar: eu tenho confiança nas minhas opiniões, mesmo sendo contrárias ao consenso geral (autonomia); em geral, sinto que estou no comando da situação em que vivo (domínio ambiental); eu acho que é importante ter novas experiências para desafiar como você pensa sobre si mesmo e do mundo (crescimento pessoal); as pessoas me descrevem como uma pessoa disposta a partilhar o meu tempo com os outros (relações positivas com os outros); algumas pessoas vagam sem rumo na vida, mas eu não sou um deles (propósito na vida); eu gosto de quase todos os aspectos de minha personalidade (autoaceitação). Uma alta pontuação em uma categoria indica que o respondente tem um domínio desta área em sua vida e, uma baixa pontuação, significa que ele se esforça para se sentir confortável nela.
Os resultados da regressão múltipla mostraram uma forte correlação positiva entre a religiosidade e o bem-estar, tanto para os homens quanto para as mulheres, sendo um pouco mais forte para as mulheres. A religiosidade apareceu como a única variável que influenciou o nível do bem-estar subjetivo para as mulheres (30%) e, para os homens, a religiosidade teve a maior influência sobre o bem-estar subjetivo, seguido pela educação.
As únicas variáveis significativamente relacionadas ao bem-estar e a religiosidade e demografia, foram a nacionalidade e a renda. Foi observada uma relação negativa entre a nacionalidade e bem-estar nos não kuaitianos, provavelmente porque os mesmos vêm ao Kuwait devido às oportunidades de trabalho não encontradas em seus países de origem e podem experimentar o sentimento de solidão por estarem longe de suas casas e familiares.
A correlação de Pearson indicando que o nível de religiosidade da amostra foi positivamente correlacionada com o bem-estar subjetivo, confirmando a hipótese principal do estudo, ou seja, existe uma relação positiva entre o nível de religiosidade do indivíduo traumatizado e o nível do seu bem-estar subjetivo. O estudo mostrou a importância da religião e religiosidade e sua relação com outros aspectos da vida das pessoas no Kuwait, como a felicidade pessoal, a estabilidade da família e coerência social. O autor concluiu a pesquisa sugerindo que futuros estudos devem observar estas variáveis quando investigarem vítimas de acidentes de trânsito no Kuwait.
Dois estudos realizados no Brasil foram incluídos no presente estudo porque levantaram dados sobre a religião das vítimas de acidentes de trânsito nos dados sociodemográficos da amostra. Não foi feita uma investigação mais profunda sobre as práticas religiosas e as crenças dos entrevistados e sua relação com o comportamento no trânsito, apenas o relato dos mesmos se tinham uma religião ou não. Um dos estudos foi em Goiânia e outro em Natal.
Em Goiânia a pesquisa procurou descrever o perfil das vítimas e das circunstâncias dos acidentes com jovens entre 15 e 24 anos, atendidos no Hospital de Urgências (HUGO), o único serviço de referência de emergência da cidade (Caixeta, Minamisava, Oliveira, & Brasil, 2010). Entre agosto de 2005 e agosto de 2006, 301 vítimas foram entrevistadas, sendo a maioria do sexo masculino. Os dados foram coletados através de entrevistas face to face com as vítimas ou familiares, no Serviço de Emergência do HUGO ou nas residências das vítimas. As variáveis sociodemográficas incluíram idade, sexo, religião, escolaridade, ocupação, com quem mora e renda e as circunstâncias do acidente, perguntas sobre dia e hora do mesmo, meio de transporte, equipamentos de segurança, atividade exercida no momento do acidente, uso de álcool/drogas, papel da vítima e uma declaração se a mesma considera que houve imprudência/negligência no momento do acidente. Sempre que possível, os dados foram checados com observação direta e em prontuários e, os dados desconhecidos pelos respondentes, foram complementados através de contato telefônico ou visita em domicílio.
A idade média era de 19,88 anos e 24% do total eram menores de 18 anos. A motocicleta foi o meio de transporte mais utilizado (67,33%) e 14,19% dos condutores deste veículo tinham menos que 18 anos. A bicicleta foi utilizada por 16,67% dos entrevistados, o automóvel por 7,97% e os pedestres representaram 5,31% da amostra. A maior ocorrência dos acidentes foi perto das 18 horas, sextasfeiras e domingos, no trajeto para atividades físicas, esportivas, escolares, lazer e entretenimento. O relato de 15,16% dos entrevistados revelou a suspeita de uso de álcool e, a maioria dos casos com suspeita ou evidência do uso de álcool e/ou drogas por pelo menos um dos envolvidos no acidente eram motociclistas. Contudo, a proporção de vítimas com suspeita ou evidência do uso destas substâncias foi maior entre ocupantes de automóveis que entre os motociclistas. Mais motociclistas do que ciclistas acharam que houve imprudência/negligência no acidente e os ciclistas foram maioria em não usarem equipamentos de segurança (95,45% contra 8,58% dos motociclistas). Dos 22 ocupantes de automóveis, 50% não usaram cinto de segurança e eram passageiros. Com relação à prática religiosa, 56,94% das vítimas responderam que tinham uma religião, sendo 68,75% entre os pedestres, 56,65% entre os motociclistas, 50% entre os ocupantes dos automóveis e 46% entre os ciclistas.
Os autores consideraram que uma limitação deste estudo foi o fato dos jovens e/ou seus familiares com possível culpa nos acidentes, com receio de que suas informações fossem repassadas às autoridades legais, podem ter omitido parte dos dados como o uso de álcool ou drogas e renda familiar. Alguns dados não foram avaliados devido à dificuldade de serem obtidos na cidade, tais como o consumo de álcool/drogas nas horas que antecederam o acidente, e os dados sobre a outra parte envolvida, nos casos de colisão.
Com base nos resultados obtidos nesta pesquisa, os autores concluíram que os acidentes com motociclistas representam um problema de saúde pública para a população estudada e sugerem que ações de combate a esses acidentes devem observar os horários de entrada e saída de escolas e trabalho, assim como os finais de semana. Ressaltaram a necessidade de aprimoramento do processo educativo dos jovens e da fiscalização com relação à habilitação dos condutores e ao uso do álcool e equipamentos de segurança.
A pesquisa realizada na cidade de Natal foi feita no em um Complexo Hospitalar, no Pronto Socorro, unidades de politrauma, reanimação, UTI e demais clínicas que atendiam vítimas de acidente com motocicleta (Farias, Barros, Rocha, Costas, & Morais Filho, 2009). O estudo foi realizado por profissionais da área de enfermagem, com o objetivo de caracterizar os condutores de motocicletas vítimas de acidente de moto, atendidos no referido hospital e, identificar as lesões de acordo com a região corpórea destas vítimas.
A amostra foi composta por 371 condutores de motocicletas atendidos nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2008, que afirmaram ter 18 anos ou mais, aceitaram ser avaliados pelo examinador até no máximo 72 horas decorridas do acidente e, os que se encontravam em coma ou sem condições de se comunicarem, estivessem acompanhados. Os dados foram coletados através de um instrumento com questões fechadas, sendo compostos na primeira parte por dados sociodemográficos que incluíam idade, sexo, escolaridade, procedência, religião, estado civil, ocupação e renda mensal. Em seguida foi feito um exame físico céfalo-podálico para identificação das lesões por região corpórea e pontuá-las de acordo com a gravidade. Três enfermeiros e três alunos de iniciação científica colaboraram com a coleta de dados.
As vítimas do sexo masculino representaram 88,40% da amostra e do sexo feminino 11,60% e a maioria encontrava-se na faixa etária entre 18 e 24 anos (39,90%). Quanto à procedência, a maioria (57,79%) era da Grande Natal e com o ensino fundamental (41,63%). Entre as vítimas, 47,98% eram casadas e 47,44% solteiras, 23,18% atuavam na área de comércio e atividades auxiliares e 75,20% ganhavam até dois salários mínimos mensais.
Com relação à religião dos condutores, 75,78% se declararam católicos, 13,75% agnósticos, 7,50% evangélicos, 1,89% espíritas e 1,08% de outras religiões. Os autores da pesquisa observaram a importância da religião na vida das pessoas, por acreditarem que esta pode influenciar os comportamentos considerados corretos ou equivocados, com a família, trabalho e nas demais áreas da sociedade. Consideram importante conhecer a religião das vítimas de acidentes de motocicletas uma vez que as igrejas podem integrar uma rede de prevenção de acidentes e também apoiar as vítimas espiritual e emocionalmente. Durante o processo de hospitalização o paciente apresenta uma necessidade de expressão religiosa, e a religião proporciona uma ligação com o Sagrado, afirmaram os autores.
Com relação ao objetivo de identificar as lesões pela região corpórea das vítimas de acidentes de motocicleta, os resultados revelaram que das 943 lesões identificadas, a superfície externa foi a mais atingida com 376 lesões (39,9%), significando que as vítimas sofreram contusões e queimaduras de 2º grau nesta área do corpo. Este dado pode revelar falta de uso de equipamentos de proteção adequados, como jaquetas e roupas apropriadas, que, juntamente com os capacetes, botas e luvas, aumentam a proteção dos motociclistas, e, estes itens devem ser incluídos nas campanhas educativas de segurança para os motociclistas. A cabeça/pescoço foi a segunda região mais atingida no corpo dos motociclistas acidentados, com 313 lesões (33,2%), esses danos poderiam ser bem menores se o uso efetivo do capacete fosse respeitado. Dentre as lesões extracranianas, a face foi muito atingida, com um percentual de 44,1%, revelando falta ou uso inadequado do capacete. Os membros/cintura pélvica representaram 22,7% das lesões, sendo as principais as contusões, entorses, fraturas e amputações traumáticas.
Os resultados demonstraram que, quanto à caracterização dos condutores de motocicleta vítimas de acidentes de moto atendidos em um Pronto Socorro, a maioria é composta por homens, jovens adultos, trabalhadores do comércio e atividades auxiliares, maioria se declarou como sendo católicos e com lesões predominantemente na superfície externa do corpo e cabeça/pescoço.
Os autores concluíram que o estudo ressaltou que a educação em saúde com maior focalização no trânsito poderá ser um elemento transformador do comportamento de dirigir, visando a diminuição do risco de acidentes e suas consequências, e acreditam, também que os resultados levantados na pesquisa sirvam de aporte para a criação de ações preventivas específicas, melhorando a qualidade da assistência na área e possam subsidiar pesquisas futuras.
Discussão
Os estudos desta revisão bibliográfica demonstraram diversos comportamentos considerados de risco no trânsito e revelaram como os hábitos, crenças e valores das pessoas religiosas podem refletir em seu comportamento no trânsito.
As pesquisas realizadas na Grécia demonstraram que as pessoas religiosas mantêm hábitos saudáveis, evitando ingestão de bebidas alcoólicas, que é um fator de risco importante no trânsito e costumam respeitar normas e evitar comportamentos de risco ao dirigir. Já as crenças fatalistas observadas no Paquistão revelaram que os motoristas não seguem medidas de segurança ao dirigir por não acreditar que isso evitaria acidentes. Acreditam que o destino já está predeterminado e que não existe relação entre dirigir sem respeito às normas de segurança e a ocorrência de acidentes. Estas crenças fatalistas tornam ineficazes campanhas de segurança no trânsito e fazem parte de um contexto sociocultural do país, sendo aspectos culturais e não individuais.
O estudo comparativo realizado nos países europeus que estudou a influência da religião dominante no país e os recursos investidos na segurança do trânsito concluiu que a religião e a riqueza do país parecem ser determinantes para a segurança no trânsito do mesmo. Segundo Melinder (2007), a religião representa uma importante base para a cultura do país, pois, influencia nos valores que o mesmo adota. A conclusão principal do trabalho foi que os países católicos não ricos apresentaram mais acidentes de trânsito do que os países católicos ricos, enquanto que estes últimos apresentaram mais acidentes do que os ricos não católicos. Os países de menores índices de mortes no trânsito foram os ricos não católicos, que confiam nas pessoas e têm baixa tolerância aos limites de velocidade e de álcool.
O estudo realizado no Kuwait foi incluído nesta revisão por mostrar o papel da religião islâmica sobre o bem-estar das pessoas traumatizadas em acidentes de carro, apesar de não investigar a influência da religião no comportamento do motorista. A pesquisa comprovou que existe uma relação positiva entre o nível de religiosidade da pessoa que sofreu um trauma no trânsito e o nível de seu bem-estar subjetivo.
As duas pesquisas realizadas no Brasil demonstraram que estudar mais profundamente a influência da religião nos comportamentos das pessoas religiosas pode acrescentar às campanhas de prevenção aos acidentes de trânsito, muitos elementos para melhorar a eficiência das mesmas. A inclusão da religião entre os dados sociodemográficos de suas amostras revelou que os pesquisadores estão reconhecendo o papel da religião na vida das pessoas e como esta pode auxiliar a ciência a atingir seu objetivo de proporcionar maior qualidade de vida aos cidadãos através de uma conscientização sobre segurança no trânsito.
Considerações Finais
O alto índice de acidentes de trânsito, o impacto que os mesmos causam nas vidas das vítimas e parentes delas, os altos custos que eles representam para os governos, são apenas alguns dos motivos para que as campanhas de segurança no trânsito sejam aprimoradas e sensibilizem os usuários das vias públicas a evitarem comportamentos de risco.
Novas pesquisas precisam ser realizadas visando maior compreensão das características e hábitos das pessoas religiosas. Estudar a relação da religião nos hábitos dos motoristas pode fornecer importantes elementos para a elaboração de um programa de educação no trânsito. Saber como e porque a religião exerce uma influência direta no comportamento de seus seguidores pode ser fundamental na formação de motoristas e pedestres mais conscientes e responsáveis.
A escassez de estudos nesta área revelada neste artigo mostra que existe um amplo campo a ser explorado para a realização de novas pesquisas e que poderão contribuir para um trânsito mais seguro para todos os envolvidos em seus ambientes.
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Recebido: 17/07/2014 / Corrigido: 12/08/2014 / Aceito: 25/08/2014.
1 Psicóloga, Perita de Trânsito pela Universidade de São Francisco, Especialista em Psicologia do Trânsito pelo Conselho Federal de Psiclologia, Especialista em Metodologia da Educação a Distância pela Universidade do Sul de Santa Catarina. Contato: Av. Tucunaré, 1140, apto. 101 bl. 2, Tamboré, Cep: 06460-020, Barueri, SP – Brasil. Telefones: (11) 4191-0090 / (11) 99140- 0718. E-mail: orini@gmail.com