Revista Mal Estar e Subjetividade
ISSN 1518-6148 ISSN 2175-3644
EDITORIAL
Angústia e sujeito
O mal-estar é apontado por Freud como um sofrimento cuja origem pode surgir do corpo, do exterior e das relações entre as pessoas.
Desta forma, é pela via dos sintomas que cada sujeito tenta esquivar-se, aproximar-se e até eximir-se desta condição malévola e gozosa, inevitável aos que habitam o espaço da cultura. Sintomas que, além de exibirem uma forma mutante no cotidiano, implicam em uma constante busca de revisão de conceitos que classicamente são conhecidos na psicopatologia e espalhados pelos diversos campos do saber que tentam dar conta da paixão e do sofrimento do sujeito no seu percurso pela vida.
Neste número iniciamos mediante uma incursão histórica e através de diversas construções teóricas, uma revisão dos conceitos de ansiedade, angústia e estresse, mostrando fatores importantes a serem levados em conta na condução dos quadros sintomáticos que se imbricam com essas categorias nas clínicas da psiquiatria, psicologia e da psicanálise, como também pela possibilidade diferencial e suas conseqüências para a existência do sujeito.
Seguindo este norte revisionista, trazemos a discussão para a teoria da angústia no pensamento freudiano, considerando os períodos de 1888-1900/1900-1920/1920-1932.
Uma terceira vertente muito produtiva dentro da evolução deste número é o trabalho depurador que põe a angústia em cheque na "Perversão e na ética da clínica psicanalítica" a partir da metapsicologia freudiana, levando-se em conta o caráter perverso polimorfo e o paradigma do fetichismo.
Do conceito à estrutura, chegamos a leitura de um texto que relaciona loucura e cidadania, onde é proposta uma reflexão sobre o conceito de loucura e psicose.
Como uma forma aplicada e discursiva do que se possa entender por angústia, os rompimentos dos vínculos familiares e a conseqüente adoção das ruas como espaço doméstico utilizado por um grupo adolescentes, demonstram a partir do relato de uma pesquisa de campo, os encantos e desencantos que o "outro", como estranho, oferece.
Um segundo trabalho discursivo de uma prática profissional, traz uma experiência realizada com pacientes toxicômanos e o deslocamento da fusão identificatória da posição significante "toxicomania", para uma outra posição subjetiva, através de textos literários.
Feito este passeio pelo campo conceitual da angústia, como um verdadeiro traço do Mal-estar na Cultura, abrimos espaço para a subjetividade. No campo do tempo e da memória, podemos ler dois trabalhos importantes. Um que toma a temporalidade na narrativa de Juan Rulfo, destacando sobretudo a forma como se desenvolve a trama entre personagens e autor no que se refere a morte e o fantasma. O outro trabalho, em uma visão intercultural, analisa a idéia de tempo construído na modernidade e nas sociedades contemporâneas, culminando com as perspectivas da educação frente a questão da alteridade.
Ainda no campo do literário e do subjetivo a relação desejo e repetição aparece situada na obra "O conto da ilha desconhecida" de José Saramago. Encerramos esta referência subjetiva à escrita com uma reflexão sobre o lugar da literatura na elaboração do saber psicanalítico.
Fechamos as sessões de artigos e conferências com uma discussão em voga nas preocupações das sociedades atuais, ao examinarmos dados reflexivos sobre a civilização do lazer e do ócio, contraposta à civilização do trabalho, servindo como um contraponto ao Mal-estar na Cultura.
Como resenha, este número traz uma contribuição importante ao campo conceitual de subjetividade, ao apresentar um novo paradigma de ciência situado em uma perspectiva sistêmica.
Por último trazemos, como uma nova categoria de publicação, um comentário referente a uma obra cinematográfica editada em DVD, bastante inquietante ao relacionar consumo, comida, bebida, sexo e morte, todos eles signos iniludíveis do mal-estar contemporâneo.
Como veremos, da teoria ao conceito e da prática à revisão de conceitos, não há como deixarmos de rever constantemente o lugar da manifestação sintomática do sujeito e as formas que ele encontra para ressignificar a sua angústia.
Henrique Figueiredo Carneiro