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Revista Mal Estar e Subjetividade

 ISSN 1518-6148 ISSN 2175-3644

     

 

EDITORIAL

 

Tempo e sofrimento da época

 

 

Este número de Mal-estar e Subjetividade agrupa os textos de nove participantes de Grupos de Trabalhos da ANPEPP, referente ao encontro realizado em Aracruz-ES, em maio de 2004, envolvendo ainda, além de ARTIGOS, quatro experiências e uma resenha.

São trabalhos que traduzem, sobretudo, a preocupação de temas atuais que afligem a sociedade e o sujeito justificando, portanto, o interesse desta editoria em publicá-los dentro da linha editorial que traçamos para a revista, na medida que expressam leituras do mal-estar e conseqüentes saídas subjetivas que se constituem como sintomas de uma época.

Tempo, subjetividade, segregação, gozo, sintoma, amor, trauma e família formam os núcleos temáticos que os ARTIGOS atravessam, organizados em uma lógica que parte do trabalho conceitual e atinge experiências que confirmam o paradigma da dessubjetivação que deixa a marca da perplexidade, capturada principalmente no olhar comovido do sujeito na sua dificuldade de formalização dos laços sociais que tenta sustentar devido às ameaças que este tempo sugere.

O tempo do sujeito, o tempo do mundo e o tempo da clínica apontam em direção ao tempo vivido pelo sujeito que se vê atravessado por estas dimensões, desafiando a escuta clínica. Desta forma, o leitor encontrará uma organização progressiva das conseqüências desse desafio, a partir do gozo visto enquanto uma satisfação pulsional que age como uma forma de segregação em que a psicanálise é chamada a operar em função de uma causa, cuja meta será a formação de laço social, efetivando uma contribuição significativa para as políticas de inclusão tão esperadas no trato com as psicoses e com o autismo. Aqui a ancoragem é tomada no tempo da palavra.

Este referencial evolui para uma análise do gozo extático, em que o sujeito é capturado pela perplexidade e pela fascinação causadas pelo vislumbre de uma cena perversa. O gozo extático se apresenta na perspectiva de um sujeito perverso tomado em um tempo subjetivo em que se vê inundado por uma cena arcaica relativa ao encontro com sua alteridade. Em suma, o tempo do êxtase aqui se faz entre os efeitos causados pelo o horror produzido sobre o outro e o gozo que o perverso contabiliza desta ação.

A constatação dessa lógica subjetiva que enseja um outro tempo para a clínica psicanalítica decorre à medida que novas realidades discursivas se apresentam. Nesta direção, o leitor acompanhará uma análise decorrente dos efeitos do discurso da tecnociência, cujo destaque é a insinuação radical da posição de encantamento do sujeito diante do objeto de consumo e os seus efeitos sobre o corpo e a renovação do mal-estar na cultura por meio do incremento das adições e do apagamento do sexo como formas constatáveis de dessubjetivação.

Derivada desta construção subjetiva que situa sua essência como uma resposta ao mal-estar da época, a provocação amorosa sobre aqueles que se encantam com os artefatos da cultura da estética do visual e do apelo ao consumo toma seu tempo na hipótese de que a publicidade amorosa toca desejos arcaicos do sujeito. Assim, o conceito de amor líquido se associa a uma função de aceitação, reconhecimento e diferenciação que ganham destaque nas relações sociais.

No espaço da estrutura familiar o tempo do trauma aparece por meio da teoria da clínica psicanalítica de orientação lacaniana na tentativa de responder a uma releitura do Édipo em tempos de transformações ocorridas nesta estrutura, no tocante aos destinos da função paterna.

As experiências apresentadas neste número mostram ainda a sua pertinência com os ARTIGOS que as antecedem, por conjugar esforços de reflexão sobre a prática no campo dos fenômenos sociais e políticos, a partir da pesquisa psicanalítica, problematizando os novos tempos e a demanda premente que se constata em uma análise da variação histórica e ideológica do sujeito e da formação de laços sociais diante dos fenômenos que tanto lhes causa mal-estar a sua existência.

Apresenta uma pesquisa sobre a questão da prevenção da saúde mental do bebê na interface da prática hospitalar, da clínica e da pesquisa em psicanálise.

Descreve sobre a prevenção e resolução de estresse em profissionais de educação e saúde a partir da formulação de um Programa de Formação Contínua, mostrando um contraponto dentro do referencial psicanalítico das produções sobre mal-estar.

O último relato no campo das investigações que jogam luz sobre o disposto neste número é uma averiguação de como anda o ensino da psicopatologia psicanalítica nos cursos de Psicologia do estado de Minas Gerais e sua relação com os desafios dessa formação no século XXI, diante das novas formas de mal-estar que os trabalhos anteriores descrevem.

Finalmente, uma resenha sobre a melancolia é apresentada destacando a importância do tema para o cotidiano por articular história, filosofia, medicina e religião, com aspectos subjetivos tais como a culpa, a identidade, a dietética, o riso, o sarcasmo e o humor, entre outros.

É desta perspectiva que nomeamos o tempo como o elemento norteador deste número, i.e., como referência para pensar a clínica, o social e o patológico, vez que eles formam um tripé de grande importância para o estudo e a reflexão do mal-estar e da subjetividade da época.

 

Henrique Figueiredo Carneiro
Editor

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