Revista Mal Estar e Subjetividade
ISSN 1518-6148
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ARTIGOS
A psicanálise como experiência ética e o problema da cientificidade1
Daniel Omar Perez
Doutor em Filosofia pela Universidade de Campinas. Professor do Mestrado de Filosofia da Pontificia Universidade Católica do Paraná. Pesquisador do CNPq. Membro da Sociedade Kant Brasileira. Membro da Biblioteca Freudiana de Curitiba. Integra o projeto Psicanálise, linguagem e cognição (PROCAD 2009-2012 / PUCPR - UFSCar - UFES). End.: R. José Loureiro, 464, conj. 33. Curitiba - PR. CEP 80010-000. E-mail: daniel.omar.perez@pq.cnpq.br
RESUMO
O objetivo deste artigo é apresentar uma interpretação da psicanálise (Freud-Lacan) como experiência ética. Para alcançar tal fim, primeiro, mostraremos os limites de uma psicanálise entendida como ciência, indagaremos sua especificidade e interrogaremos o que compreende a sua eficácia. Em segundo lugar, articularemos os conceitos fundamentais da teoria e da prática psicanalítica (lei e desejo) não como elementos de um modelo explicativo de fenômenos naturais senão como condição de possibilidade de uma experiência do sujeito com seu próprio desejo e com as interdições que o constituem. Nesse ponto abordaremos as noções de natureza e de ideal. Será preciso ainda especificar as noções de experiência e de ética, já que a primeira não será usada no sentido de experiência perceptiva ou cognitiva, e a segunda não se referirá a um princípio ou regra ou conjunto de princípios ou regras de determinação de ação que procuram a realização ou conquista de um bem. Finalmente, concluiremos que a experiência analítica como experiência ética se produz no reconhecimento da lei que provoca um para-além-da-lei que se distingue estruturalmente do gozo absoluto. O artigo contribui com debate sobre o estatuto da psicanálise como prática teórica e clínica e com as discussões sobre ética no âmbito da filosofia em uma tradição sui generis que pode ser compreendida a partir de Kant, Heidegger e Lacan.
Palavras-chave: psicanálise, ética, desejo, Lacan, Freud.
ABSTRACT
The goal of this article is to show a psychoanalysis interpretation (Freud-Lacan) as ethical experience. To reach such end, first, we will show the limits of an interpretation of psychoanalysis as science, as well as we will investigate its specificity and will interrogate its effectiveness. In second place, we will articulate the fundamental concepts of the theory and of the psychoanalytical practice (law and desire) as condition of possibility of experience of subject with his desire and interdiction as constitutive elements. In this point we will board the notions of nature and ideal, as well as the notions of experience and ethic, the first [experience] will not be used in the sense of perceptive or cognitive experience, and the second [ethic] will not refer to a determination of principles or rules of action to search the accomplishment or conquest of something as "good". Finally, we will conclude the law recognition in the analytic experience as ethical experience provokes a to-beyond-the-law that is distinguished structurally of the absolute enjoy. The article contributes with the debate on the statute of psychoanalysis as theory and clinical practice and with the discussions about ethic in the philosophy in a sui generis tradition from Kant and Heidegger until Lacan.
Keywords: psychoanalysis, ethics, desire, Lacan, Freud.
A análise volta a privilegiar o desejo como princípio da ética. Lacan, J. "Compte rendu avec interpolations du Séminaire de l´Ethique" In Ornicar -Revue du Champ freudien. Vol. 28, Janvier 1984.,
Da ciência para a ética
Tanto em Freud quanto em Lacan encontramos os elementos de um esforço explícito para situar o estatuto da psicanálise no registro de um saber científico. Em ambos os casos a palavra ciência aparece sem ambiguidades na hora de decidir o que seria esse saber que enuncia a articulação do inconsciente e da emergência do Real.
Certamente, tal como observa a tradição, Freud mostrou que a psicanálise teria sido uma novidade que veio a questionar: (1) o alcance e os limites de um tratamento fisiológico de determinados mal-estares e (2) o lugar de privilégio do sujeito da consciência, dono das suas ações. Essa última figura, tão cara para toda a filosofia do século XVIII e XIX, encontrava sua fronteira em uma nova forma de compreender alguns estados alterados do sujeito e boa parte dos acontecimentos da nossa vida cotidiana. Porém, não se tratava de uma nova filosofia da mente, também não era a elaboração de uma inovadora técnica médica para tratar supostos sintomas sem explicação. Embora Freud nunca tenha renunciado (pelo menos por vontade própria) a apresentar suas descobertas - calorosamente rejeitadas - na sociedade de médicos, nem evitado as citações filosóficas (a não ser para não ficar muito parecido com Nietzsche2), o empreendimento psicanalítico buscava se constituir como terapia e como reflexão sobre a sociedade humana.
O saber psicanalítico seria então um tratamento das neuroses e um modo de compreender o desenvolvimento da civilização e os produtos da cultura. É exatamente esse o uso que hoje damos à psicanálise na clínica, nos meios de comunicação e na universidade. Os psicanalistas desenvolvem diferentes modos, nos quais a psicanálise se aplica ao tratamento clínico, entendendo a cura em várias perspectivas. Uma apresentação sistemática dessas diferentes modalidades pode ser vista nas diferentes instituições de formação, onde podemos encontrar freudianos, lacanianos e winnicottianos com técnicas, procedimentos e interpretações distintas e divergentes. Também os críticos literários elaboram trabalhos de análise sobre textos onde procuram articular aquilo que vem do inconsciente entre a escrita e o autor. Existem trabalhos de crítica literária em chave psicanalítica no mundo todo, mas certamente Jean Belemin-Noël (1983), com seu Psicanálise e literatura, marcou um modo e uma linha de pesquisa. Por sua vez, os críticos da cultura com seus cultural studies desenvolvem as análises dos mais diferentes objetos da sublimação. Em artigos, conferências e livros Slavoj Zizek (1994, 1998, 2003, 2004a, 2004b) ensaia essa modalidade de trabalho, especialmente recorrendo ao cinema e à televisão. As noções de prazer, desejo, gozo, objeto petit a, entre outros, servem para articular ensaios sobre fenômenos sociais e políticos contemporâneos.
Assim, podemos entender como a sociedade de consumo se parece à exacerbação de um colecionador insaciável. Aquilo que é objeto de satisfação se torna, por sua vez, causa de desejo. Numa lógica que não é a da identidade o objeto é simultaneamente alvo e motor. Jacques-Alain Miller cita o caso da Coca-Cola: "ao mesmo tempo em que dá uma satisfação, aprofunda a ´falta em gozar'" (Miller, 2004, p. 256). Bebemos Coca-Cola porque temos sede, mas de algum modo aparece a sede de Coca-Cola. O cartaz da publicidade é claro: Enjoy Coca-Cola. No filme de desenho animado A era do gelo3, dirigido pelo animador brasileiro Carlos Saldanha, um esquilo pré-histórico corre o tempo todo atrás da sua castanha, quando parece que vai conseguir pegar de jeito o objeto, e então poder comer e se satisfazer, algo acontece, a castanha escorrega e ele continua fazendo as coisas mais estranhas para voltar a pegá-la. A cena do esquilo é uma verdadeira recriação do que acontece com o sujeito e seu objeto. A castanha é o objeto a, causa do desejo, do esquilo pré-histórico de Saldanha. O esquilo desenha a sua vida acidentalmente, buscando aquilo que deseja (como em toda a vida). Impulsionado pelo desejo o esquilo entra no meio da maior revolução geológica do planeta, mas é seu desejo de castanha - e não de qualquer castanha, mas daquela castanha - o que o torna parte da história do planeta. Algo similar ocorre no filme 10.000 a.C.4. O protagonista (D´Leh), membro de uma tribo pré-histórica, fica apaixonado (desde criança) por Evolet, uma moça bonita de olhos azuis, mas cada vez que o rapaz está próximo de realizar seu desejo algo acontece e afasta a moça do seu alcance. Uma tribo estranha sequestra Evolet e D´Leh sem dúvida vai atrás, em busca dela. Quanto mais seu objeto de desejo se afasta, mais D´Leh se esforça em continuar sua "odisséia" entrando, por acidente, nas histórias mais inusitadas das outras tribos por onde vai passando. Assim, D´Leh torna-se o herói que derruba um Império, mas não porque ele tenha algúm tipo de compromisso revolucionário ou projeto político conspirativo, senão porque lá está seu objeto a. O filme, artisticamente questionável, mostra que a história humana pode estar guiada por um objeto que acena desde certa distância e mobiliza o sujeito. A história acaba quando D´Leh consegue ter Evolet nos seus braços.
Assim como os cultural studies, também o uso clínico e universitário do saber psicanalítico é tão contemporâneo nosso quanto seu questionamento. Isso faz com que o estatuto da psicanálise não cesse de ser interrogado dentro e fora das instituições analíticas e universitárias. Enfim: o que é a psicanálise? Rejeitada por uns como um discurso sem sentido, é elogiada por outros por pensar o impensado, e até mesmo o impensável, a psicanálise não cessa de se reinscrever talvez como um significante, provavelmente como um modo de gozo. Seja como for, a aparição da prática analítica criou um mal-estar desde o ponto de vista epistemológico, que pode ser constatado inclusive em publicações atuais, como os trabalhos de Alan Sokal (1999)5 ou O livro negro da psicanálise (que não discutiremos aqui) (VVAA, 2005). Físicos e profissionais cognitivistas das ciências da saúde se esforçam em mostrar que nem nos textos de Lacan nem nos textos de Freud encontra-se algo parecido com a matemática, a física ou as ciências biomédicas. Certamente, poderíamos avançar nessa linha e afirmar que as citações de Freud referentes à biologia ou à filosofia não transformam o pensador em biólogo ou filósofo, também em Lacan as referências à lógica ou à matemática não lhe dão o estatuto de formalista fregeano.
Entretanto, poderíamos considerar outra linha de trabalho e sustentar que a questão da psicanálise é bem outra que aquilo que possibilita a um determinado saber poder fazer parte ou não das ciências formais ou naturais. Tanto a obra de Freud quanto a de Lacan servem de documento para mostrar que a sexualidade deixou de ser uma questão que possa simplesmente ser tratada na superfície das normas (morais, religiosas ou sociais) para se transformar em uma categoria de trabalho que estaria na base do tratamento das histerias, da explicação das guerras e da criação artística. Não é que a psicanálise tenha sido a primeira das práticas ou das teorias a tratar a sexualidade, mas certamente contribuiu e contribui para pensar a sexualidade como uma questão fundamental na constituição do próprio sujeito e do seu modo de agir, e não como mera característica ou atributo do ser humano. Tratar-se-ia de algo que estaria na base daquilo que podemos pensar como sujeito. Dito explicitamente: não se trata de sexo entendido do ponto de vista moral, também não se trata do sexo entendido como função biológica, trata-se sim da sexualidade na constituição da subjetividade. Isto não é obvio e deve ser cuidadosamente trabalhado. Por isso, nem Freud nem Lacan queriam que esse saber fosse entendido como um discurso de mera opinião. Não se trata de uma objetificação matemática de um objeto, mas também não é um discurso produzido por juízos de percepção subjetiva. Assim, eles buscavam um lugar no qual o novo saber fosse reconhecido e acolhido. Freud não queria ser confundido com um sexólogo nem com um pansexualista, sua declaração explicita se encontra na sua Autobiografia de 1924-25 (Freud, 1986c, vol. 15, p. 2791). Lacan não queria ser entendido como um terapeuta na busca do bem-estar, isso já aparece desde O Seminário 2 na sua tentativa de se diferenciar do trabalho que, em geral, se fazia entre analistas da época (Lacan, 1985, p. 61). O que eles queriam (e isso está escrito nos seus textos em todas as épocas) era produzir uma "ciência" onde a sexualidade e a morte não fossem tratadas apenas como elementos da biologia ou do direito. Sem desconhecerem esses aspectos, eles oferecem outra abordagem.
Se na primeira tentativa de justificação cientificista se buscava uma ciência da natureza (e Freud não só articulou várias tentativas, ele também repetiu isso explicitamente em vários momentos), na segunda se procurou uma formalização (sob o modo das fórmulas, matemas e grafos). Esse último foi o modo lacaniano de articular aquilo que Freud tentava construir com uma linguagem que passava da literatura ao fisicalismo.
Entretanto, do mesmo modo que os epistemólogos de início do século XX denunciavam a forma e os critérios não científicos da psicanálise freudiana - estou me referindo aos julgamentos de Karl Popper (1981) e outros -, qualquer matemático dirá hoje que aquilo que aparece nos seminários e escritos de Lacan nada tem a ver com o que eles entendem por formalização. Todos terão razão. A psicanálise não podia ser uma ciência da natureza, como não pode ser um modo da matemática, porque seu objeto, seu método e seus conceitos não fazem sentido no quadro da demarcação epistemológica atual.
Porém, de Freud para Lacan há uma diferença que está para além da escolha do modelo de cientificidade. Por um lado, com a noção de pulsão (Trieb), Freud tinha em suas mãos um elemento que exigia a desconstrução da relação de oposição mentecorpo. A pulsão é justamente aquilo que não pode ser reduzido a instinto (Instinkt), na medida em que não responde apenas à causalidade das reações fisico-químicas, mas também aos mecanismos da represão. No artigo O Inconsciente (1915), referindo-se aos atos psíquicos como ideias, Freud escreve:
"A questão é difícil, pois transcende o puramente psicológico e aborda as relações do aparato psíquico com a anatomia. Sabemos apenas, em linhas gerais, que tais relações existem. As pesquisas demonstram, de modo inquestionável, que a atividade psíquica está vinculada à função do cérebro, em um nível de proximidade maior do que a qualquer outro órgão. Mas as pesquisas científicas foram além - embora não saibamos até onde isso nos levará - e puderam estabelecer uma não equivalência no papel das diversas partes do cérebro em sua relação especial com determinadas partes do corpo e com certas atividades psíquicas. No entanto, todas as tentativas de adivinhar a localização exata dos processos psíquicos, todos os esforços de pensar as ideias como estando arquivadas em células nervosas específicas e de conceber as excitações como transitando sobre determinadas fibras nervosas fracassaram redondamente. Uma teoria que, por exemplo, reconhecesse no córtex a posição anatômica do sistema Cs - o da atividade psíquica consciente - e que quisesse transferir os processos inconscientes para as partes subcorticais do cérebro, certamente teria o mesmo destino frustrante. Há aqui um hiato que no momento não temos como preencher, e que também não é tarefa da psicologia." (Freud, 1986a vol. 11, p. 2066)
O texto mostra, sem ambiguidades, a distância que Freud observa entre suas hipóteses de trabalho e o horizonte no qual se encontram os estudos de biologia. Corpo e funcionamento do aparato psíquico na psicanálise não são noções que possam ser traduzidas ou reduzidas à anatomia e exitações nervosas. Assim sendo, a dicotomia mente-corpo não se sustenta numa abordagem psicanalítica ou, desde outra perspectiva, não há como colocar a psicanálise no interior de uma epistemologia pautada por aquela relação antagônica, senão apenas como um equívoco ou uma falsa ciência. É o modo como procederam Popper (1981) e seus seguidores.
É claro que existem outros modos de compreender epistemologicamente a psicanálise, exemplo disso são os trabalhos de Patricia Kitcher (1995) e Richard Simanke (2006), que buscam mostrar a pertinência do projeto de Freud nos estudos de biologia e na história das neurociências. Mas, para entender a psicanálise freudiana como uma ciência da natureza é preciso entender a noção de natureza de um modo muito diferente daquele que era utilizado pelas ciências da época (com o consequente risco de cair em um anacronismo). O que torna o trabalho um pouco complexo porque deveríamos alargar os limites do conceito natureza de modo tal que seja capaz de acolher uma prática pautada, por exemplo, pelo conceito de transferência6 no âmbito do estudo dos tecidos e da transmissão de estímulos. Certamente, não imagino como um cientista da natureza, no caso um biólogo, possa integrar nas suas ferramentas conceituais a noção de transferência e usar adequadamente isso no âmbito do laboratório. Para poder resolver essa situação deveríamos decretar a noção de transferência como absolutamente sem sentido, mas isso nos levaria a descartar também todo o trabalho clínico de Freud e reduzir a psicanálise ao texto sobre as afasias, à maior parte do texto do Projeto e a alguns outros fragmentos de textos metapsicológicos. Com esta operação poderíamos colocar Freud na pré-história das ciências cognitivas como se fosse uma peça de museu de interesse para os curiosos da história das ideias. Tudo se passa como se primeiro afirmássemos que a psicanálise é uma ciência da natureza e depois demonstrássemos que como ciência da natureza a psicanálise tem pouco ou quase nenhum valor significativo para o progresso das ciências.
Por outro lado, a busca de formas, fórmulas, formalizações, grafos, matemas e interpretações filosóficas permitiram a Lacan organizar as condições de possibilidade daquilo que entendemos por desejo. Por outras palavras, tratar-se-ia de reconstituir o circuito pulsional e de compreender a experiência analítica (experiência de tratamento) como experiência do sujeito com seu desejo e não de um cálculo algorítmico. A tentativa lacaniana de "formalização" está mais próxima de buscar "universais" (tanto quanto o complexo de Édipo pode ser denominado nesse sentido) para acolher acontecimentos singulares do que da busca de uma fórmula que nos forneça um resultado. Essa busca se inicia em Lacan (1998a, 2003) explicitamente desde a década de trinta quando, com elementos do freudismo, do hegelianismo e da antropologia de Wallon, formulou uma interpretação das noções de complexo de desmame, intrusão e Édipo para elaborar uma teoria da constituição do sujeito e, específicamente, do Eu no estádio do espelho. A partir daí Lacan não cessou de buscar elementos na antropologia, na linguística, na literatura e na filosofia para poder articular sua interrogação sobre o sujeito.
Assim sendo, a psicanálise não deveria ser entendida como um saber ôntico ou de uma região do ente, tal como seria o caso de uma metafísica ou uma ciência particular como a psicologia ou a matemática. Uma psicanálise se compreende como uma experiência do sujeito onde os conceitos servem para articular um fenômeno que não é da ordem das ciências naturais ou formais. Dito sem rodeios, a psicanálise é entendida como experiência da relação do sujeito com o próprio desejo e com as barreiras que separam um do outro.
Deste modo, pretendemos realizar a dupla operação de localizar a psicanálise fora do terreno da ciência e nos deslocar de uma questão que consideramos alheia ao problema fundamental. Uma interrogação foucaultiana é aqui pertinente: para quê a psicanálise se preocuparia em ganhar o estatuto de cientificidade? Qual seria o interesse de achar um lugar no interior dos discursos validados epistemologicamente? Michel Foucault coloca esta questão explícitamente em vários momentos da sua obra não apenas em relação com a psicanálise senão também com o marxismo. Todo o trabalho de Foucault mostra como a justificação dos discursos (científicos) está associada às necessidades dos jogos de saber e poder e o estatuto de cientificidade não seria outra coisa que um modo do exercício do poder (Foucault, 1979). Seria acaso isso o que se procuraria satisfazer quando se tenta indagar a cientificidade da psicanálise? Se não é, então proponho que mudemos a pauta da "cientificidade" por outra mais psicanalítica: eficácia. O problema não seria tanto satisfazer a demanda de cientificidade quanto de nos interrogarmos pela eficácia da psicanálise. Problema que ocupou tanto a Freud quanto a Lacan. Trata-se menos de saber o que a psicanálise explica e prova, do que onde ela é eficaz e qual é a estrutura dessa eficácia. O deslocamento do problema da cientificidade para o da eficácia nos coloca a questão do rigor em psicanálise. Este deslocamento seria acaso um sinônimo de afroxamento da rigorosidade? Neste ponto, é pertinente lembrar um fragmento de Martin Heidegger do texto A época da imagem do mundo:
"O rigor da ciência matemática é a exatidão. Nela todos os processos - para que possam entrar na representação como processos naturais -- têm de ser determinados previamente como magnitudes de movimento espaço-temporal. Essa determinação se opera na medição com ajuda do número e do cálculo. Porém, a investigação matemática da natureza não é exata porque conte exatamente, mas deve contar desse modo porque a vinculação ao seu campo de objetos tem o caráter de exatidão. Pelo contrário, todas as ciências do espírito, e ainda todas as ciências do vivo, precisamente para permanecerem rigorosas têm de ser necessariamente inexatas. Sem dúvida alguma pode também se conceber o vivo como magnitude de movimento espaço-temporal, porém já não se capta o vivo. O inexato das ciências históricas não é um defeito, mas o cumprimento de um requisito essencial para esta classe de investigações." (Heidegger, 1960, pp.70-71)
Nesse texto Heidegger mostra que o rigor de um determinado saber não se reduz à exatidão matemática do contar, mas se realiza na relação com seu objeto. Esse é o caso da diferença entre História e Matemática. Essa advertência é uma herança de Dilthey que Heidegger radicalizará na sua obra. Na sua dissertação de mestrado, intitulada Dilthey e Freud: a psicanálise frente à epistemologia das ciências do espírito, Sérgio Felipe de Lima Lage (2003) se interroga pela cientificidade da psicanálise, aproximando o trabalho de Freud à concepção diltheyana de ciências do espírito. Essa é uma opção que tem sido levada adiante por boa parte de epistemólogos e psicanalistas. Entretanto, sem querer entrar nesse debate e nem abusar das analogias, considero que seria no mínimo prudente observar a distância que existe entre aquele conjunto de noções que nos permitem construir a experiência psicanalítica e o saber com estatuto científico (tanto matemático quanto do espírito). Sem demoras, tentarei agora avançar argumentando em favor de que o fato da psicanálise não ser uma ciência não significa que não seja articulada rigorosamente (entendendo aqui que o rigor não se reduz ao contar).
Sem rodeios
Nossa pretensão é trabalhar os conceitos no sentido de compreender a psicanálise como experiência ética. Existem diferentes abordagens que nos permitem caminhar nesse sentido. Christian Ingo Lenz Dunker (2006) afirma: "noções tradicionalmente ligadas à teoria do conhecimento são gradualmente trazidas para a prática clínica, assumindo, finalmente, um determinado valor ético, a partir do qual se desdobram em procedimentos clínicos" (Lenz Dunker, 2006, 219). Nos anos 1990 Alenka Zupancic (2000) escreveu um livro intitulado Ethics of the Real: Kant, Lacan que assume a tese "ética" decididamente. E, antes, no curso de Jacques-Alain Miller de 1998-99, publicado como La experiencia de lo real en la cura (2004) oferece elementos para a interpretação ética, fundamentalmente na tematização do gozo. Por outro lado, Richard Simanke escreveu, em tom de crítica, contra Lacan, que ele teria "reduzido a psicanálise a um discurso ético que, como em Espinosa, é cuidadosamente distinguido de uma moral prescritiva, o que se insinua é uma inspiração surda e subterrânea, que talvez merecesse maior atenção" (Simanke, 2002, 296). Com estas indicações e seguindo o conselho de Simanke, nosso trabalho não será o de uma exegese conceitual nem o de avaliar o alcance e os limites da literatura sobre o tema, mas de avançar na nossa perspectiva de uma psicanálise como experiência ética.
Da ética como experiência
O que seria propriamente uma psicanálise como experiência ética? Do mesmo modo que se desloca a noção de experiência do âmbito da percepção para aquilo que não é meramente percebido como objeto externo, mas experimentado como dor ou como satisfação pulsional, também é resignificado o conceito de ética como um modo de agir segundo uma regra de convivência para um modo de se relacionar com o próprio desejo. A ética da psicanálise não diz a respeito da relação com os demais ou com o Outro, não é uma tentativa de adaptação ao meio ou à sociedade, não é o modo certo de alcançar um bem. A ética da psicanálise diz respeito à relação do sujeito com suas zonas erógenas, com suas "pequenas partes do ser" (Copjec, 2006, p. 23). Tal como escreve Joan Copjec:
"... a ética da psicanálise não se preocupa com o outro - como é o caso de numerosos trabalhos contemporâneos de ética - senão com o sujeito que se metamorfoseia no momento em que se encontra com o real de um acontecimento inesperado. O imperativo ético de Lacan 'não te afastes do teu desejo' propõe-se como insistência em que cada um de nós se module de acordo com sua própria história pessoal. De outro modo, a ética da psicanálise adere ao argumento de Kant, segundo o qual o progresso ético não tem nada a ver com a forma do progresso que promove a indústria moderna - ou o 'serviço do bem´ -, senão que se trata de um assunto de transformação pessoal, da necessidade subjetiva de ir para além de si mesmo" (Copjec, 2006, p. 74).
Seguindo Copjec, a questão ética da psicanálise estaria aquém da escolha. Aquilo que entendemos por ética no senso comum se reduz a um conjunto de regras ou princípios a partir dos quais podemos julgar um determinado acontecimento. Assim, o sujeito sentencia: agiu corretamente ou não, agiu conforme o valor estipulado ou contra. Mas Lacan parece apontar para uma condição precedente: tudo se passa como se a "escolha" das regras ou princípios dependesse de uma condição anterior, muitas vezes (mas não sempre) negligenciada na história da filosofia.
No que diz respeito à noção de "experiência" a psicanálise poderia ser pensada como um protocolo que possibilitaria, eventualmente, o acesso impossível do sujeito ao Real. Trata-se, antes, de mais nada da experiência que começa com uma implicação subjetiva e que conduz à desubjetivação. Algo assim como um conjunto de regras - sem as garantias de um estudo algorítmico - que possibilitaria (eventualmente) a execução de uma experiência do confronto - nunca completa - com o Real. Isto não constituiria, propriamente falando, uma experiência científica. Não é a experiência da construção ou o reconhecimento perceptivo de um objeto qualquer porque o Real não é um objeto ou uma coisa, senão aquilo que escapa à simbolização.
Neste sentido, é preciso desconstruir outra dicotomia nomeada como ôntico-ética e reconstruir o sentido no qual podemos falar das condições de possibilidade do desejo e de uma ética do desejo. Certamente, isso não se faz apenas com uma narrativa fundacional. Embora Freud tenha recorrido a mitos para explicar aquilo que não tem referência empírica nem demonstração argumental (repetindo uma estratégia platônica), o que estava em jogo em cada caso, especialmente no Édipo, era mostrar uma estrutura que permitisse dar conta do funcionamento de fenômenos ou manifestações sintomáticas que se encontravam na clínica. De acordo com Levi-Strauss o mito não é propriamente uma explicação, muito menos científica, definitivamente não explica nada, é sim uma estrutura significante, um esboço que se articula para suportar certas "antinomias psíquicas" (Lacan, 1992, p. 178). Assim sendo, não se trata de fornecer uma explicação a ser testada do mecanismo de funcionamento fisiológico nem mesmo de hipóteses sobre fenômenos que "ainda" não são explicados pela fisiologia. Trata-se de outro registro de articulação. Com Lacan isso fica muito mais claro, já desde O Seminário 1 (Lacan 1986b), a partir da elaboração conceitual do que se entende por significante. A lógica do significante nos permite pensar o funcionamento inconsciente, evitando qualquer substancialização do fenômeno.
O inconsciente não é - nunca foi - o âmbito das trevas, o irracional, a caixa preta ou qualquer coisa que se possa reduzir a uma experiência mística ou a uma relação de oposição neutralizadora com a razão. A história da filosofia de Kant a Nietzsche marcou os limites da razão e reelaborou a dicotomia das noções de consciente-inconsciente, e nessa história Freud não indicaria para uma espécie de nu selvagem da razão, mas apontaria para o funcionamento de outro dispositivo, com outro regime de causas que aquele suportado pelo registro da consciência e da natureza. É assim que o inconsciente está estruturado como uma linguagem - dirá Lacan em 1958 (Lacan, 1998b, p. 600). E é na busca da articulação dessa estrutura que o analista precisa se comprometer, mas para ir mais longe, para poder passar do Simbólico -do inconsciente - para o Real.
Se bem a regra que pauta a experiência analítica é "fale tudo", não se trata apenas de um semblante e de um falar qualquer coisa. A posição do analista está em algo do Real que perturba na experiência analítica como experiência ética. A fala do analisante é absolutamente articulada segundo um significante fora da ordem. Por isso não é qualquer coisa o que é falado na análise. Poderíamos dizer que, até certo ponto, se fala qualquer coisa no discurso articulado das explicações imaginárias quando damos conta da nossa posição na realidade, mas não é para esse lugar que se dirige uma análise. O cerne da experiência se inicia onde a explicação fracassa, mas não por falta de pesquisa ou de recursos conceituais, senão porque não tem como não fracassar dado que a linguagem encontra seu limite. O trabalho da experiência analítica consiste, entre outras coisas, em operar numa lógica que aparece na superfície significante onde o lapso, o esquecimento, a negação, a repetição e a contradição não são a exceção ou o erro: indicam algo que não se diz e, até mais radicalmente, algo que não pode ser dito, onde a palavra algo deveria ser riscada, porque a rigor é o Real.
Assim, separando Significante de Significado (onde os deslocamentos de sentido operam mais por homofonia - no ecoar equívoco do mesmo som - do que por etimologia) e articulando conceitos (como repetição, fantasma, Outro, objeto a, e gozo) Lacan elabora a possibilidade de uma experiência ética. No percurso dessa experiência de análise o sujeito procura um saber (na significação) como uma explicação (Imaginária): um saber a causa do seu mal-estar. A queixa que precede à entrada na análise tem como orientação buscar ser outro, buscar o que se deve ou deveria ser, buscar um saber ser outro. O desejo do analizante é desejo de verdade, mas ele vai além, encontra-se com o Real: o limite de toda explicação. O sujeito busca saber a causa e o que encontra na experiência analítica é seu proprio desejo.
O ideal contra o desejo
Se fôssemos estabelecer uma tradição poderíamos dizer que, assim como Newton conseguiu apresentar as condições de possibilidade daquilo que permite explicar o regular movimento dos planetas, também Freud e Lacan apresentariam as condições de possibilidade daquilo que permite dar conta das manifestações do inconsciente, mas na sua singularidade e não em uma regularidade normativa. Essa última diferença é decisiva para pensar a relação entre a psicanálise e o discurso científico. Além disso, Lacan, em vez de recorrer aos mitos - como é o caso de Freud -, modela construindo esboços de aparelhos em relação com a linguagem e com aquilo que ela não alcança: o gozo. Assim sendo, podemos avançar na questão do desejo.
Na experiência de análise o desejo do analista não pode ser desejo de saber, dado que não é o saber e sim o desejo o que está em questão. Embora a partir das primeiras formulações de Freud possamos pensar em um saber no "tornar consciente", mesmo nesse momento a questão é menos cognitiva do que ética. O analista deseja menos compreender e curar uma doença que suspender o recalque. O que isto significa? Para Freud, quando há incompatibilidade entre o pensamento (ou ideia) e a consciência do eu se produz uma contradição (Widerspruch), e a partir desse fenômeno o sujeito estabelece métodos de defesa. Isso permite a Freud falar da relação entre o recalque e a dureza moral do neurótico. "Nessas condições, suas intervenções (as do analista), sua técnica e a interpretação que vai propor implicam que ele se posicione acerca da questão que os filósofos sempre se colocaram: é preciso ou não renunciar aos seus desejos?" (Cottet, 1999, p. 122). A renúncia é compreendida em inúmeros casos pelos moralistas na história da filosofia como virtude. Diferentes tratados da virtude reforçam com eloquentes discursos uma ética da renúncia. O elogio do sacrifício em favor de um bem ainda maior do que os próprios desejos é o tema constante da moral ocidental. Freud propõe uma inversão de valores7. Será preciso uma resistência sim, mas ao sacrifício. Resistir ao gozo sacrificial como imperativo: Não te sacrificarás! Esse é o ponto de partida da transvaloração freudiana dos valores morais tradicionais.
Para Freud não se trataria de suturar o conflito psíquico que se expressa na relação entre o desejo e o ideal por meio de justificativas nobres, mas de aprofundar o problema. Não se trataria de dar resposta a uma renúncia daquilo que constitui o sujeito como sujeito de desejo, mas de esgotar a própria possibilidade das explicações ou álibis. O analista se encontraria na posição de não atender nem sustentar a aparição das coartadas que mascarem o problema. "Podemos então dizer que o desejo do psicanalista consiste em acentuar essa diferença em lugar de reduzir a tensão entre o ideal e o objeto do desejo" (Cottet, 1999, p. 138). É nessa angústia que não engana que acontece a experiência. Uma experiência -impossível - que se suporta no Real. Assim, está mais do que evidente que não significa que a resolução da experiência nos leve a que o recalque seja substituído por uma promessa de felicidade na forma de algum tipo de ativismo sexual ou de satisfação absoluta. Nem Freud nem Lacan anunciaram algo parecido com uma filosofia de vida ideal em qualquer uma das suas formas. É exatamente disso que o sujeito se cura. Na Introdução à psicanálise Freud escreve:
"O conselho de viver a vida sexual até seus limites nada tem a ver com a terapêutica psicanalítica, ainda que seja apenas pela razão de existir no doente, como eu lhes informei, um renitente conflito entre a tendência libidinosa e o recalque sexual, entre seu lado sensual e seu lado ascético. Esse conflito não se resolve ajudando-se um dos adversários vencer o outro" (Freud, 1986b, vol.12, 2392)
Deste modo, podemos trabalhar a relação do sujeito com o desejo como uma experiência ética, mas não decidir a priori a receita de um modo de vida liberador. Para se pôr ao trabalho da experiência Freud propõe duas estratégias em momentos diferentes: uma é a do reforço do eu, a outra é a do reinvestimento libidinal. Mesmo com todas as suas diferenças isso não é um problema da física nem da biologia ou da mecânica: é uma questão ética.
É assim também que Lacan entende a questão. Sem qualquer ambiguidade ou possível mal-entendido é de questão moral que Lacan chama àquilo que está no próprio princípio da entrada em psicanálise. Quando traduz e explica a frase freudiana Wo es war, soll Ich werden Lacan formula a pergunta que atravessa o analisante no início da análise: "Deve ele submeter-se ou não ao imperativo do supereu, paradoxal e mórbido, semi-inconsciente e que, além do mais, revela-se cada vez mais em sua instância na medida em que a descoberta analítica progride, e que o paciente vê que se enveredou em sua vida?" (Lacan, 1992, p. 16). Na implicação subjetiva não se trata senão de uma pergunta decididamente ética. Porém, não podemos nos deixar enganar: a pergunta pelo deve não se resolve numa ética do dever, muito menos numa ética da prudência ou da utilidade. Essas são as formas de uma tradição ética que não consiguiu ser o suficientemente radical como para ir ao fundo do problema.
A psicanálise entende aquelas figuras da tradição como modos de apresentação do ideal, onde a obediência ao mandamento se coloca no estatuto do valor de virtude. Assim, a queixa do sujeito está relacionada com o ideal em relação com o qual elabora seu sintoma. O recalque cria o sintoma como um compromisso entre a satisfação e a defesa. Um sintoma com o qual o sujeito não se identifica, mas goza. Neste sentido, há queixa sobre o gozo no sintoma (o que permite sua sustentação) e também há gozo em falar sobre o sintoma (o que permite um certo bem-estar). Explicarei melhor este último ponto. De acordo com Freud, o neurótico abandona alguns dos seus sintomas pela transferência com o analista. Por isso, é possível observar o desaparecimento de algumas dores, alergias e inibições já no início do tratamento, e até experimentar uma espécie de resolução do conflito. Aquilo que se nomeia comumente de sugestão não é outra coisa senão gozo no falar da queixa, um gozo no reconhecimento do Outro. Mas um gozo no sentido de uma satisfação substitutiva como o chiclete, o bife de soja ou a cerveja sem álcool. São modos de evitar o Real. O mecanismo que opera no gozo no falar da queixa funciona nas entrevistas preliminares, nas igrejas e nos programas de televisão, em que o sujeito conta sua vida miserável diante de um público o qual, invariavelmente, procurará pena e condenação.
Poderíamos ir além e dizer que a neurose aparece como semblante para tentar responder ou dar conta ou dominar o Real. E é nesse ponto que se encontra a questão: a psicanálise é uma experiência capaz de perturbar em um sujeito a defesa estabelecida contra o Real em qualquer uma das suas formas. Por isso, o analista não está para "saber" ou "entender", muito menos para explicar, mas para possibilitar um efeito perturbador. A eficácia psicanalítica é decididamente perturbadora. Esse era o efeito que produziam as falas públicas de Freud e de Lacan. As suas declarações (e até mesmo as aparições públicas) evitavam a cristalização de um saber. Nesse sentido, a interpretação do analista não é mais uma leitura entre outras, não é uma perspectiva, não é a explicação certa de uma disfunção orgânica ou mental, é um efeito que busca fazer vacilar o sentido - equívoco, mas não necessariamente equivocado - que o sujeito dava ao seu enunciado. A interpretação do analista não trata de restabelecer o enunciado correto no lugar do errado, mas de mobilizar o lugar do sujeito da enunciação. Rigorosamente falando, o analista não tem opinião própria, nem mesmo julgamento. Por isso, a noção de sujeito suposto saber não deve ser confundida com a posição do cientista, porque até nem mesmo se sustenta em um esquema que represente um processo de cognição ou auto-cognição. Tal como afirma Lenz Dunker:
"O sujeito suposto saber lacaniano, ao contrário, é uma noção totalmente inútil do ponto de vista epistemológico. Ele define um modo de relação ético, certa experiência amorosa, de desconhecimento ou alienação, mas também um modo de produção da realidade, que ultrapassa inclusive as formas ou objetos nos quais tal realidade pode ser reconhecida, simbolizada ou elaborada pelo sujeito. Ou seja, mantém-se a questão do substrato, elimina-se sua função epistemológica e se a substitui por uma atividade ética" (Lenz Dunker, 2006, p. 224).
Com efeito, a noção de sujeito suposto saber nos permite marcar o ponto da passagem de algo que na ciência se reconhece como a resposta a um problema para uma experiência do sujeito com aquilo que não tem resposta. Mas não porque faltem recursos para a pesquisa, senão porque se trata de um problema sem resolução algorítmica. É essa a experiência que se acolhe na artificialidade da análise.
A coisa e a Coisa
Assim sendo, a partir do horizonte descrito acima estamos em condições de ver com Lacan o alcance e o limite que aparece nas éticas de Aristóteles, Kant e o utilitarismo quando nos interrogamos pelo deve. Na Ética a Nicômaco, de Aristóteles, o trabalho da prudência nos permite alcançar a felicidade. Na Crítica da razão prática, de Kant, a obediência à lei nos permite alcançar a virtude. Na Teoria da ficção, de Bentham, o seguimento das regras nos permite alcançar o bem comum. Em todos esses modos de determinação do agir humano alcançamos um bem (em todos os sentidos possíveis), enfim: uma coisa. Não se trata aqui de reduzir as diferenças inquestionáveis entre as diferentes teorias filosóficas, mas de enunciar a operação que organiza os três discursos. Dito em outros termos: uma ação determinada por um mandamento considerado (em algum sentido) objetivo alcança um bem como coisa. Trata-se de um saber sobre aquela coisa a ser alcançada enquanto bem. Diante do excesso ou do defeito teríamos o mandamento da justa medida, do imperativo ou da regra que promete (senão a felicidade) pelo menos um bem que se sabe.
A psicanálise também não estaria propondo um outro bem no lugar dos anteriores, nem discute qual daqueles bens seria a melhor escolha. Lacan (1992) radicaliza a questão e, antes de indicar a relação entre o tipo de determinação e o resultado de uma ação, chama a atenção para aquela Coisa (das Ding) que é condição de que qualquer coisa ou bem da realidade possa vir a aparecer para o sujeito como objeto desejado. A Coisa anterior a qualquer coisa, estabelecida por Lacan, rememora Freud no Projeto de uma psicologia para neurólogos (1895), mas, sobretudo Heidegger.
De acordo com a leitura de Lacan, Freud refere-se a uma Coisa (das Ding) que não se encontra determinada entre as coisas (die Sache). No texto acima citado, mais precisamente no capítulo Lembrar e julgar, Freud associaria a noção de das Ding com a mãe primordial sob a forma de Nebenmensch como primeiro objeto satisfatório. Cito Freud:
"Suponhamos que o objeto que a percepção forneça seja semelhante ao sujeito, isto é, um próximo [semelhante]. Então o interesse teórico também se explica pelo fato deste objeto [semelhante - próximo] ser ao mesmo tempo, o primeiro objeto de satisfação e, ao mesmo tempo, o primeiro objeto hostil, assim como o único poder auxiliar. Por isso, através do próximo o homem aprende a reconhecer. Então os complexos de percepção que decorrem deste próximo [semelhante] serão em parte novos e incomparáveis, suas feições no domínio do visual; mas outras percepções visuais, por exemplo, os movimentos de sua mão, coincidirão no sujeito com a recordação de impressões visuais próprias, bastante semelhantes do corpo, que estão associadas com recordações de movimentos vividos por ele mesmo. Outras percepções do objeto ainda, por exemplo, quando ele grita, despertarão a recordação do próprio grito e com isso de vivências próprias da dor. E, assim, o complexo do próximo divide-se em dois elementos, um dos quais impressiona por uma estrutura constante e permanece reunido como coisa, enquanto que o outro é compreendido através do trabalho recordativo, ou seja, enquanto pode ser rastreado até uma notícia do próprio corpo" (Freud, S. 1995, 44-45, Grifo meu).
Freud estaria afirmando que o Nebensmensch tem dois componentes, um é coisa o outro é atividade da memória. Das Ding e Vorstellungen. A Coisa é a parte estranha, as representações são os modos de relembrar, reconhecer, tornar familiar aquilo que se perdeu.
Em Heidegger (1954) aquilo que A Coisa (Das Ding) é não pode nunca ser experimentado. A Coisa não se confunde com os objetos com os quais a ciência consegue a aniquilação da coisa. O coisar da Coisa como abertura, vazio, nada, como o incondicionado do risco de que algo venha a acontecer dá-se na quadrinidade (Geviert) do Céu e da Terra, dos mortais e dos divinos. Mas neste dar-se também se demora, também dura o próprio jogo da quadrinidade8.
Lacan se apropria de uma menção freudiana e de uma categoria heideggeriana e diz da Coisa: algo se organiza em torno de um vazio (Lacan, 1992, p. 169). Não há uma representação que consiga capturar o ser da Coisa. O acesso à linguagem e ao pensamento impede o acesso à Coisa irrepresentável. Assim, é possível pensar que a Coisa materna já está perdida desde sempre pela falta de um significante. De acordo com Lacan, a perda primordial da Coisa é de algum modo reparada (ou tamponada), na tentativa das diferentes éticas, pelos bens da prudência, da lei e da comunidade. Dito por outras palavras, diante da perda da Coisa o sujeito procura coisas, bens: nesse sentido produz escolhas (inclusive a de não escolher) e éticas. No entanto, esse das Ding em Lacan não pode ser ocultado atrás de um bem. Esse próximo-estranho, primeiro exterior, anterior a todo recalque, afeto primário fora-do-significado, perdido nunca perdido e impossível de retornar, Outro absoluto do sujeito em torno do que se orienta todo o seu encaminhamento e que o sujeito trata de reencontrar (Lacan, 1992, pp. 69-71) sinaliza os trajetos dessa busca que estão orientados pelo princípio de prazer - princípio de realidade. Nesse nível encontramos a lei como interdição que, na mesma medida em que está ligada à própria estrutura onde se encontra o desejo, também marca a impossibilidade da consumação última.
No entanto, as pulsões (como derivas - os americanos falam de drive - ou como Eladio Craia [2002, p. 54 e ss., 74 e ss., 106-107; 2006] chama as forças e vetores: os devires - todos eles modos lacanianos de falar do Trieb) não cessam de se orientar para esse ponto mítico impossível de ser expresso ou representado. Em suma, a "Coisa é o que do Real padece dessa relação fundamental, inicial, que induz o homem nas vias do significante, pelo fato mesmo de ele ser submetido ao que Freud chama de princípio de prazer" (Lacan, 1992, p.168). Assim, a deriva teria como direção o inorgânico, o vazio, a morte. O das Ding está, neste sentido, para além do princípio de prazer e do princípio de realidade (Lacan, 1992, p.131). O princípio de prazer guia o homem de significante em significante, mas a Coisa não é um significante. Passa-se do Simbólico para o Real. Refere, em última análise, à morte como um pulo para fora do simbólico: o Real. Neste sentido, "a questão ética - diz Lacan - articula-se por meio de uma orientação do referenciamento do homem em relação ao Real" (Lacan, 1992, p. 21). Dito em outros termos: a experiência ética do trabalho analítico "consiste em confrontar o sujeito do sintoma com o impossível do gozo" (Braunstein, 2007, p. 290). Assim, estamos no ponto limite da experiência analítica. Porém, é preciso especificar o que estamos entendendo aqui por limite. A satisfação absoluta do impossível do gozo poderia ser entendida como uma ilusão de reencontro com o objeto perdido desde sempre. No início dos seus trabalhos, mais especificamente em Os complexos familiares na formação do indivíduo (1938), falando do complexo de desmame, Lacan chamava a atenção para a "tendência psíquica para a morte", que se revela em suicídios não violentos, greve de fome da anorexia nervosa, envenenamento lento de certas toxicomanias pela boca ou o regime de fome das neuroses gástricas, mas também para uma forma mais abstrata que se encontra na nostalgia da humanidade, na ilusão metafísica da harmonia universal, na utopia social de uma tutela totalitária. Formas todas - diz Lacan - da busca do paraíso perdido e da mais obscura aspiração à morte (Lacan, 2003, pp. 41-42). O ponto limite é o que permite o salto para o Real ou a rearticulação no Simbólico e Imaginário.
Entretanto, poderíamos dizer que, a rigor, a pulsão de morte só alcança a sua satisfação quando fracassa na sua realização última, na sua satisfação absoluta. Esse fenômeno não é uma falha do sistema senão a possibilidade do seu próprio funcionamento. Como não existe uma única pulsão completa senão pulsões parciais, então a satisfação completa não se realiza. Se a pulsão parcial busca sua satisfação, então não busca um objeto determinado. A questão toda não está na especificidade do objeto e sim na satisfação pulsional do sujeito. Assim, as pulsões parciais se contentam com pequenos objetos.
Desse modo, estamos em condições de formular a pergunta fundamental: agiste em conformidade com teu desejo? (Lacan, 1992, p. 373). A pergunta não interroga pelo objeto (que, em princípio pode ser qualquer um, mas não são todos), também não busca um final feliz como garantia, até porque sabemos, desde Kant, que nada garante a felicidade, nem mesmo uma ética dos bens. O que busca a própria pergunta é um para além do dever, dos bens, da lei. O que busca é certa transgressão do desejo, não de uma lei particular, mas perante o ideal superegóico.
Se isto é aceitável, então aparentemente temos um paradoxo: na medida em que ficamos para aquém da lei e do deves do supereu estamos retidos nas vias do nosso desejo, mas na medida em que o desejo está para além da lei (do mandato superegóico) o risco de nos encontrar com nada é inevitável. Nesse sentido poderíamos afirmar que:
"... a psicanálise não poderia preconizar nenhum 'gozo sem limites', como temos visto, pois é preciso a limitação ao prazer, o que permite ao sujeito aceder ao gozo. Mas que sua renúncia ao gozo desencadeie o exercício de uma crueldade contra si próprio, eis justamente o paradoxo que Freud, e depois Lacan, levaram em consideração para justificar a busca de uma ética do desejo" (Cottet, 1999, p. 152).
Eis aqui a questão da cura, de uma cura das ilusões que retém o analisante em relação às interdições do seu desejo, mas também daquelas ilusões que dizem respeito a um gozo absoluto (Lacan, 1992, p. 267).
Certamente, o para além da lei exige mais de uma erótica do que de um ato de rebelião. Quer dizer, o sujeito do desejo enquanto ser sexuado demanda um erotismo na experiência ética - no sentido de ter que se haver com as suas zonas erógenas. Isso não acontece senão por meio da articulação do Simbólico e do Imaginário e de uma elaboração da fantasia. Aqui a fantasia sádica - entanto fantasia - nos apresenta claramente uma relação com o objeto de desejo onde o prazer pode ser realizado de todos os modos possíveis e impossíveis sem que o objeto perca a sua beleza. É como acontece nos desenhos animados de Tom e Jerry ou Perna Longa e Patolino. Tanto o coelho e o pato quanto gato e o rato se fazem todas as loucuras que conseguem realizar, explodem bombas nas mãos, jogam pianos na cabeça, atiram na cara com uma espingarda, mas na cena seguinte todos estão prontos e bonitinhos para continuar. Diferente dos desenhos da Walt Disney, onde sempre se persegue um bem: a donzela acorda com o beijo do príncipe, os bambis pulam entre as flores, a natureza aparece em equilíbrio com os desejos. Seja como for, aqui nos encontramos no registro da sublimação e é exatamente esse um dos desdobramentos do ponto limite. É na fantasia - entanto fantasia - que a erótica se realiza.
É preciso dizer claramente: o para além da lei não é uma negação ou uma desmentida dela. A negação produz neurose, a desmentida produz perversão. No caso do sadismo, o sádico realmente nega que o gozo seja impossível, e ele vai em frente, se confunde com o próprio objeto. Não há propriamente sujeito de desejo nessa situação. Um dever universal se impõe na determinação do agir do sádico: Goza!! Lacan formula o enunciado da suposta máxima sadeana do seguinte modo: Tenho direito de gozar do teu corpo, pode dizer-me qualquer um, e exercerei esse direito, sem que nenhum limite me detenha no capricho das extorsões que me dê o gosto de nele saciar (Lacan, 1998a, p. 780). A máxima sadiana não nos confronta com o desejo, é a partir do Outro que a ordem nos solicita. Em última análise o sádico é objeto do mandamento do Outro.
Assim, se o dever (em um sentido) seria um recalque - ou pelo menos o controle dos impulsos - pela obediência à lei, o gozo sádico não seria propriamente um para-além-da-lei, uma transgresão da lei, mas uma afirmação da lei que diz ser possível alcançar o gozo que a lei proíbe, na tentativa de regular, determinar as relações entre os sujeitos. No sádico se trata da desmentida da lei, da renegação da castração simbólica, o que dirije a pulsão (pulsão sado-masoquista) para uma tentativa de satifação que retorna no modo invertido. O Marquês não realiza seu desejo numa relação sexual com a donzela, ele quer mais, ele quer destruir o que a donzela representa como significante da virtude, e aquilo que retorna no modo invertido é o castigo que o próprio Sade padece no presídio e no hospício. Dito claramente: o Marquês goza pelo movimento pulsional que o leva para as instituições de disciplinamento.
Assim sendo, é a rearticulação significante no simbólico e no imaginário, por meio do mecanismo da sublimação, o que permite ao sujeito sustentar seu desejo. Esse será o lugar aberto para que o objeto a, causa do desejo, possa vir a acenar e se colocar como coisa com a dignidade da Coisa. Isso possibilitará ao sujeito ficar no prazer para aquém do gozo impossível. Para Lacan, a sublimação não faz desaparecer o objeto sexual, "senão todo o contrário". No texto freudiano Mal-estar na Civilização ainda é possível fazer uma interpretação da sublimação como sacrifício, como desvio em função de uma renúncia - certamente não estou dizendo que seja a minha leitura ou a mais adequada -, mas é impossível fazer essa redução em Lacan. A sublimação, em Freud como em Lacan, é pautada pela possibilidade de substituir o objeto da pulsão, que a rigor não tem objeto e, portanto, não está necessariamente fixada a nenhum em particular. Assim, o objeto primordial perdido desde sempre abre a possibilidade de que, no vazio, no irrepresentável do nada, no Real, algo possa ser contornado por uma operação significante, algo possa ser modelado e elevado à dignidade de Coisa. Para que isso possa vir a acontecer, a experiência analítica como experiência ética não pode ser vista como a oferta de uma nova ética para anexar no longo catálogo de éticas, senão como uma experiência de radicalização, que, por sua vez, não pode compreender o trabalho de análise como um percurso de saber de si ou de reconhecimento de si, do não compreendido para o explicado, mas de estranhamento do próprio sujeito. No trabalho de análise o sujeito experiencia o próprio espanto de já não mais poder se reconhecer em uma identidade, em uma coisa. Perante o próprio estranhamento do Unhemlichkeit (familiar e estranho) o sujeito rearticula, resignifica, reinveste e se dirige para outra posição de sujeito. É preciso marcar dois momentos da posição do sujeito na experiência analítica: um na entrada na análise como implicação subjetiva, passa-se da queixa ao reconhecimento da própria posição na cena; o outro no final, na mudança de posição subjetiva, onde se reinscreve o sintoma, quando há um saber fazer com o sintoma, que não é exatamente saber o que fazer, (tal como muito bem adverte Bruno de Almeida Guimarães que opõe "a beleza trágica de Antígona" e o "savoir y faire de Joyce com a língua") (Almeida Guimarães, 2006, p. 269). A nova posição do sujeito será trabalhada segundo o estilo que lhe cabe enquanto singularidade, poderá ser rebelde, como Antígona, ou calma, como o sujeito a que se refere Volteire no Cândido, quando propõe cuidarmos do nosso jardim, mas certamente, e em qualquer caso, implica um lance de risco.
Na ética da psicanálise, entendida como experiência de análise e não como conjunto de prescrições ou determinação de estilo, não há ideal, não há exemplo a ser seguido, não há certeza de que aquilo que o sujeito estiver fazendo é a coisa certa a se fazer. Já não há nem a possibilidade de colocar semelhante questão porque, fazendo eco de Lacan podemos dizer que não há garantia no Outro.
Conclusão
O resultado apresentado neste artigo pretendeu, inicialmente, problematizar a cientificidade da psicanálise para deslocar a questão do seu estatuto epistemológico em direção à reconstrução de um saber que sustenta a possibilidade de uma experiência ética. Nesse sentido, apresentou-se o que se compreende em psicanálise (freudiano-lacaniano) por experiência e por ética. Isto nos conduz a uma interpretação dos fundamentos da psicanálise sem desconsiderar os procecimentos técnicos da sua prática. Dito noutros termos, por essa via estamos em condições de abordar a metapsicologia freudiana e lacanaiana não como um discurso filosófico ou de justificação epistemológica desacoplado da prática, mas como um conjunto de elementos que permitem acolher a experiência de análise.
Notas
1. Este trabalho faz parte de uma pesquisa mais ampla desenvolvida no Programa de Mestrado em Filosofia da PUC-PR. Agradeço a gentileza de Dulce Mara Gaio, Adriane Wollmann e Silvana Aquim pelas correções e sugestões. Agradeço aos pareceristas anónimos que com as suas críticas e sugestões desinteressadamente colaboraram para tornar mais claro e preciso este trabalho, bem como contribuiram no desenvolvimento da minha pesquisa.
2. Freud confessou isso em História do Movimento Psicanalítico (1914), ele escreve: "Em anos posteriores, neguei a mim mesmo o enorme prazer da leitura das obras de Nietzsche, com o propósito deliberado de não prejudicar, com qualquer espécie de ideias antecipatórias, a elaboração das impressões recebidas na psicanálise" (Freud, 1986 vol. 10, p. 1900).
3. O título original é Ice Age e foi lançado em 2002 com tanto sucesso que teve uma segunda parte em 2006, onde o esquilo continuou buscando alcançar seu objeto a.
4. O título original é 10.000 B.C. lançado em 2008 com a direção do cineasta alemão Ronald Emmerich.
5. Sokal é um professor de física da New York University que ficou famoso não por ter feito alguma descoberta ou invenção valiosa na sua área, mas por ter escrito um artigo sem sentido que foi publicado pela revista Social Text de estudos culturais pós-modernos. De acordo com Sokal, isso demonstraria que tudo o que se publica nessa área é sem sentido, especialmente os trabalhos de Lacan, Kristeva, Deleuze entre outros. Sokal utiliza um método bastante questionável, parte da análise de alguns casos específicos e generaliza. Mesmo concedendo o argumento de que a sua análise esteja correta, nada autorizaria sua generalização. Ver Sokal, 1999.
6. Para um estudo claro e preciso da dinâmica da transferência em Freud desde seus primeiros textos e experiências clínicas ver D'Avila Lourenço, L.C., 2005.
7. Sobre esse tópico é preciso consultar dois trabalhos que contribuem diretamente: Paschoal, 2006; Almeida, 2005.
8. Para um estudo de A Coisa de Heidegger ver Loparic, Z. 2001.
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Recebido em 17 de março de 2009
Aceito em 31 de março de 2009
Revisado em 11 de maio de 2009