Revista Psicologia Política
ISSN 2175-1390
ARTIGO ORIGINAL
O pessoal e o político na produção conceitual em orientação profissional e de carreira
The personal and the political conceptual production in career guidance and counseling
El personal y lo político en la producción conceptual en la orientación profesional y de carrera
Professor Associado do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho e do Programa de Pós-graduação em Psicologia Social do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil. marcelopsi@uol.com.br
RESUMO
Os enfoques teóricos no campo da orientação profissional e de carreira (OPC) adotados no Brasil são baseados em amostras que correspondem a 15% dos brasileiros/as, o que coloca um dilema para pesquisadores/as e profissionais da OPC: entender e ajudar esta pequena porção de pessoas ou procurar expandir pesquisas e intervenções para toda a população? Assim, este artigo teve três objetivos interconectados: discutir as relações entre poder e produção de conhecimento; discutir a discrepância entre teoria e realidade no campo da OPC; e propor alguns princípios para ampliar o poder explicativo dos enfoques teóricos de OPC. Inspirados/as pelo construcionismo social e fundamentados/as em três princípios (psicossocial, diálogo intercultural e hibridismo), concluímos que a produção de conhecimentos na OPC deve ser contextualizada, visando reconstruir conceitos, o que requer uma ação política buscando processos contra-hegemônicos de globalização que priorizem o diálogo intercultural.
Palavras-chave: Epistemologia; Justiça social; Atitudes políticas; Orientação vocacional; Construcionismo social.
ABSTRACT
Brazilian career guidance and counseling studies (OPC) theoretical approaches are based on samples that correspond to 15% of Brazilians, which poses a dilemma for OPC researchers and profesionals: Should they understand and assist this small group or should they seek to expand research and interventions to the entire population? Thus, this article had three interconnected objectives: to discuss the relationship between power and knowledge production; discuss the discrepancy between theory and reality in OPC studies; and to propose some principles to expand the explanatory power of the theoretical approaches of OPC. Inspired by social constructionism and based on three principles (psychosocial, intercultural dialogue and hybridism), we conclude that the production of knowledge in the OPC studies must be contextualized, aiming to reconstruct concepts, which requires political action seeking counter-hegemonic processes of globalization that prioritize intercultural dialogue.
Keywords: Epistemology; Social justice; Political attitudes; Vocational guidance; Social constructionism.
RESUMEN
Los enfoques teóricos en el campo de la orientación profesional y de carrera (OPC) adoptados en Brasil se basan en muestras correspondientes al 15% de los brasileños, lo que plantea un dilema para los investigadores y profesionales de la OPC: ¿deben permanecer entendiendo y ayudando a este pequeño grupo o deben buscar ampliar la investigación y las intervenciones a toda la población? Este artículo tuvo tres objetivos interconectados: discutir la relación entre poder y producción de conocimiento; discutir la discrepancia entre la teoría y la realidad en el campo de la OPC; y proponer algunos principios para ampliar el poder explicativo de los enfoques teóricos de la OPC. Inspirándonos en el construccionismo social y con base en tres principios (psicosocial, diálogo intercultural e hibridez), concluimos que la producción de conocimiento en las OPC debe contextualizarse, buscando reconstruir conceptos, lo que exige una acción política que busque procesos de globalización contrahegemónica que prioricen el diálogo intercultural.
Palabras clave: Epistemología; Justicia social; Actitudes políticas; Orientación vocacional; Construccionismo social.
INTRODUÇÃO
Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA, 2019) e a Organização Internacional do Trabalho (International Labor Organization [ILO], 2019), dados recentes sobre a população economicamente ativa (PEA) brasileira mostraram que 56% dos/as trabalhadores/as ocupavam trabalhos formais (trabalhadores/as com carteira nos setores público e privado, militares, estatutários/as e os/as por conta própria e empregadores/as com Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica [CNPJ]), 32,4% trabalhavam em empregos desprotegidos e não regulamentados, e 11,6% estavam desempregados/as. No que diz respeito à educação, 15,3% das pessoas possuíam ensino superior, 51% dos/as jovens não possuem diploma do ensino médio e 23% eram NEET (não estavam estudando, nem empregados/as, nem em treinamento). No Brasil, a construção da carreira da maioria é caracterizada por trajetórias descontínuas informais e não restritas ao emprego (Antunes, 2012).
Em geral, as pesquisas e as intervenções em Orientação Profissional e de Carreira [OPC] tem como base um grupo minoritário composta por jovens de classe média e alta em no momento de escolha de uma profissão e consequente ingresso no ensino superior, universitários/as em crise, e adultos/as graduados/as com trajetórias predominantes em trabalhos formais, buscando planejar ou fazer transições em suas carreiras. Apenas, 10% dos trabalhos tem se dedicado a pensar outras populações distintas das citadas, entre elas, jovens de classe baixa, trabalhadores/as informais ou com baixa qualificação, pessoas com deficiência, mulheres negras, entre outros/as (Lassance & Ambiel, 2018; Melo-Silva, Leal, & Fracalozzi, 2010). Portanto, é importante reconhecer que essa população-alvo tradicional da OPC não corresponde à maioria dos/as jovens e trabalhadores/as adultos/as do Brasil, como apontam os dados apresentados pela Organização Internacional do Trabalho - OIT (ILO, 2019) e pelo IPEA (2019).
Além disso, as teorias são geralmente desenvolvidas no norte global, focadas nas pessoas com cunho mais psicologizante e baseadas em amostras de pessoas brancas e de classe média, cuja construção de carreira é caracterizada principalmente por caminhos contínuos realizados em trabalhos formais, como indicaram Leong e Pearce (2011). Isso não se encaixa nem em grupos vulnerabilizados do norte global, nem na maioria das pessoas do sul global. O campo de estudos e práticas em OPC é, portanto, caracterizado por teorias desenvolvidas no norte global que foram importadas e aplicadas nos países do sul global.
A divisão mundial em dois grandes blocos, de acordo com suas características socioeconômicas e políticas, é uma proposta do Banco Mundial (World Bank, 2013) e inclui no norte global Estados Unidos, Canadá, Europa Ocidental, Austrália, Nova Zelândia e partes desenvolvidas da Ásia, e no sul global África, América Latina e países em desenvolvimento da Ásia.
É importante salientar que existe uma grande variedade de enfoques teóricos no campo da OPC que foram desenvolvidos ao longo do tempo. Desde os enfoques teóricos tradicionais (e.g., teorias de traço-fator, tipológico, de desenvolvimento e de tomada de decisão), passando por enfoques teóricos do final do século XX (e.g., sociocognitivo, contextualista da ação e sistêmico), até chegar aos enfoques teóricos forjados no século XXI (e.g., life design e psychology of working theory - PWT), é importante reconhecer que todos esses enfoques teóricos vêm do norte global. No entanto, eles têm sido utilizados em contextos em todo o mundo (Arulmani, 2007; Duarte, 2015; Maree, 2010; Ribeiro, Uvaldo, & Silva, 2015; Savickas, 2011; Sultana, 2017a).
Isso representa um dilema para pesquisadores/as e profissionais brasileiros/as: devemos entender e ajudar aproximadamente 15% da população brasileira, formada basicamente por jovens visando escolher uma profissão, universitários/as em crise e pessoas altamente qualificadas com trajetórias de trabalhos formais, ou devemos procurar expandir pesquisas e intervenções para toda a população? Em maior ou menor grau, podemos estender essa questão a todos os contextos.
Se decidirmos expandir teorias e práticas, precisamos repensar as teorias e reconstruir as práticas, contextualizando-as, de forma concreta, a fim de poder compreender e atender demandas e questões de grupos sociais que não têm sido a base dos enfoques teóricos em OPC.
Nesse caso, precisamos repensar o foco da OPC que, predominantemente, é centrado na dimensão pessoal. Isto se faz necessário, pois, como aponta Blustein (2013), a autonomia ou a capacidade de construir a vida mais centrada em si do que nos recursos sociais, está diretamente relacionada à igualdade social, ou seja, quanto mais igualitária uma sociedade, mais chance as pessoas têm de serem autônomas e, quanto mais desigual for uma sociedade, menor será esta chance. Analisar somente a dimensão pessoal pode significar, muitas vezes, invisibilizar as barreiras socioeconômicas e culturais. Os contextos desenvolvidos no norte global tendem a ser mais igualitários e a autonomia se torna uma possibilidade mais clara, por isso os enfoques teóricos acabam por construir conceitos mais centrados nos recursos pessoais do que nos sociais. No sul global marcado por desigualdades socioeconômicas e culturais, a chance de autonomia é menor e o foco nas questões psicológicas se mostra insuficiente tanto para compreender, quanto para oferecer auxílio em OPC. Guardadas as devidas proporções, este raciocínio é verdadeiro para qualquer contexto.
Na contemporaneidade, há propostas que acreditam ser a dimensão pessoal o foco para os estudos e intervenção em OPC, entretanto reconhecem a necessidade de aprimorá-las, ampliando seu escopo de análise, como o life design (Duarte, 2015; Maree, 2010; Nota & Rossier, 2015; Savickas et al., 2009). Há propostas que têm indicado a dimensão social e institucional, principalmente por meio do desenvolvimento e implementação de políticas públicas, como o foco a ser utilizado na OPC, afirmando que a dimensão pessoal individualiza e invisibiliza as questões sociais inerentes aos processos de construção de carreira, colocando toda a responsabilidade nas pessoas (Irving, 2010; McMahon, Arthur, & Collins, 2008). E há propostas que esboçam uma tentativa de articular as dimensões pessoais e sociais, como a PWT (Blustein, Kenny, Autin, & Duffy, 2019; Duffy, Blustein, Diemer, & Autin, 2016) e o movimento da OPC e justiça social (Hooley & Sultana, 2016; Hooley, Sultana, & Thomsen, 2019).
A questão central é que, apesar de parte das propostas elencadas buscarem maior contextualização, principalmente focadas em práticas de OPC que levem em conta as diferenças culturais entre orientador/a e orientando/a, elas não mudaram as teorias de base que permanecem oriundas do norte global, nem destacaram a necessidade da produção de teorias por parte de contextos não tradicionais e não dominantes, com algumas exceções, embora oriundas do norte global (e.g. Duffy et al., 2016; Hooley & Sultana, 2016; Sultana, 2018).
Acreditamos que devemos pensar as questões e demandas dirigidas e estudadas pelo campo da OPC a partir de três dimensões interconectadas, ou seja, propondo estratégias de análise e intervenção que possam atuar de forma psicossocial na articulação entre o pessoal, o social e o institucional, tendo o potencial de transcender a pessoa e incluir pessoas, contextos e relacionamentos em seus constructos que devem ser consideradas no processo (e.g., Silva, Paiva, & Ribeiro, 2016; Hooley & Sultana, 2016; Rascován, 2017; Sultana, 2017a). A proposta aqui apresentada buscou tentar ampliar o escopo de compreensão e intervenção em OPC, tomando uma ação política para incluir todos/as. Por que uma ação política? Por que questiona o instituído na produção de conhecimento em OPC, principalmente o foco psicologizante e a supremacia dos enfoques teóricos do norte global tomados como verdades, e propõe mudanças para que mais pessoas possam ser atendidas em suas demandas a partir de seus referenciais culturais e contextos, não baseadas em modelos e recursos construídos em contextos muito distintos dos seus. Isto respeitaria as epistemologias locais (Hooley & Sultana, 2016), por meio da construção de um projeto e de uma visão apropriadas específicas para suas singularidades (Sarr, 2016). Como assinalaram Alvesson e Deetz (2000), há necessidade de um enfoque local emergente ao invés de um enfoque apriorístico focado numa verdade inquestionável.
Assim, este artigo teve três objetivos interconectados e apresentados de forma concomitante, a saber: discutir as relações entre poder e produção de conhecimento, bem como o papel dos/as pesquisadores/as e teóricos/as nesse processo; discutir a discrepância entre teoria e realidade na OPC; e propor alguns princípios para ampliar o poder explicativo dos enfoques teóricos de OPC de maneira contextualizada. Inspirados/as pelo construcionismo social, fundamentamos a discussão realizada em três princípios centrais que construíram nossa linha argumentativa: psicossocial, diálogo intercultural e hibridismo.
Visto de uma perspectiva psicossocial, o conhecimento nunca foi universal ou substantivo, mas sempre foi uma construção relacional e contextual que deve ser desconstruída e reconstruída quando usada em diferentes contextos, fundado por uma ontologia relacional, como o construcionismo social propôs (McNamee, 2010, 2012; McNamee & Gergen, 1999; Rasera & Japur, 2005; Spink, 2010). "Assim, o foco para os construcionistas é na ação conjunta, ou no que as pessoas fazem juntas, e o que este fazer produz" (McNamee, 2010, p. 11).
O diálogo intercultural traz a ideia de que a produção de conhecimento é sempre construída sobre o relacionamento de todos/as os/as atores/atrizes sociais envolvidos/as em um determinado contexto (por exemplo, orientadores/as e orientandos/as em uma intervenção de OPC, e pesquisadores/as e participantes da pesquisa em uma investigação em OPC), sem que um/a tenha mais peso que o/a outro/a (Santos, 2007). Este é um princípio fundamental e refere-se ao processo de interpretação (hermenêutica) realizado entre pessoas ou grupos em posições socioculturais diferentes e desiguais (di - dois e topoi - posições ou locais de produção de conhecimento) na chamada hermenêutica diatópica proposta por Santos (2003). Nessa relação, gera-se o diálogo intercultural entre conhecimentos diferentes e desiguais (e.g., produção teórica do norte global e do sul global), sendo complementares e não hierarquicamente superiores uns sobre os outros (Santos, 2007). McNamee (2010) corrobora esta proposição ao dizer que a pesquisa não tem relação com descobrir uma verdade, mas sim construir verdades por meio das relações construídas entre todos/as os/as envolvidos/as na situação.
E o hibridismo é caracterizado pela ideia de que o mundo é construído sobre a reprodução do conhecimento e sobre as formas de ser e de agir. No entanto, novos vínculos entre as formas existentes de ser e de agir podem surgir e criar híbridos, modificando o instituído e consolidando o novo, como postulou Latour (1994).
Façamos, em primeiro lugar, uma breve discussão sobre poder e produção de conhecimento para tentar compreender quem está autorizado/a a produzir conhecimento e tem sua produção legitimada social e institucionalmente.
RELAÇÕES ENTRE PODER E PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO
No que diz respeito às relações entre poder e produção de conhecimento, desde o início é necessário tentar responder quem legitima quem? Quem produz conhecimento? Quem está autorizado/a a produzir conhecimento? De uma maneira muito tradicional, a ciência produz conhecimento através de pesquisas geralmente desenvolvidas em universidades e centros de pesquisa, o que legitima que apenas acadêmicos/as e pesquisadores/as possam produzir conhecimento válido (Santos, 2007).
Nesse sentido, a ciência produz dados derivados de informações cotidianas baseadas na legitimidade científica? Ou, a ciência auxilia na produção de dados juntamente com agentes da vida cotidiana com base na legitimidade científica e diária? Qual é o papel dos/as participantes da pesquisa? São fontes de informações que serão coletadas pelo/a pesquisador/a ou são pessoas que ajudarão diretamente e de forma cooperativa na produção de conhecimento? Participantes de pesquisa são informantes ou coprodutores de conhecimento? Segundo McNamee (2010), na ciência tradicional, o conhecimento é sinônimo de verdade e os/as pesquisadores/as tem poder e controle sobre os/as participantes da pesquisa.
Deveríamos assinalar outra questão importante, ou seja, qual é o nosso principal objetivo como pesquisadores/as, principalmente em um campo aplicado do conhecimento como a OPC? Devemos apenas produzir dados? Ou devemos produzir conhecimento e propor intervenções diretas ou indiretas na realidade?
Greene (1990) nos lembrou que a tarefa do/a pesquisador/a é tridimensional e visa: (a) produzir conhecimento por meio de investigações, (b) construir conceitos, noções e teorias, e (c) apoiar as práticas direta ou indiretamente contribuindo com a resolução de problemas sociais e questões das intervenções e práticas dos/as profissionais. A função social do trabalho de pesquisa está fundamentada na articulação entre essas três dimensões.
Em geral, quem produz conhecimento diz o que é realidade, o que é verdade e o que não é verdadeiro. Santos (2007) faz algumas colocações importantes sobre a produção de conhecimentos: quem está autorizado/a a produzir conhecimento? Quem legitima sua produção de conhecimento? Que tipo de conhecimento estamos produzindo e para quem?
Por exemplo, para o campo da OPC, carreira é um conceito central, sendo uma produção epistemológica que, em geral, se fundamenta em bases universalizantes e descontextualizadas que tendem a ignorar a diversidade ao serem postuladas como uma construção neutra e baseada em uma suposta versão oficial da realidade, na qual o conceito de carreira tem relação direta com o sistema dominante. Quem teria uma carreira, então? Tomada desta maneira, a concepção de carreira tende a excluir grupos vulnerabilizados do norte global e a maioria das pessoas do sul global e somente explicar as carreiras de grupos socioeconomicamente privilegiados, na sua maioria do norte global e das elites do sul global, gerando opressões e injustiças sociais pelas vias da produção teórica (Hooley et al., 2019; Irving, 2010; Leong & Pearce, 2011; McMahon, Arthur, & Collins, 2008; Sultana, 2018).
Santos (2007) destacou que "A injustiça social global está, desta forma, intimamente ligada à injustiça cognitiva. A luta pela justiça global deve, por isso, ser também uma luta pela justiça cognitiva global" (p. 11), ou a luta pela possibilidade da produção de conhecimento ser realizada por mais pessoas e grupos, não somente do norte global.
Retomando nossa questão inicial sobre relações de poder e produção de conhecimento: Qual seria a missão da ciência? Reproduzir a realidade ou retratar e buscar modificar a realidade? Esta questão exige um posicionamento ético e político dos/as pesquisadores/as, analisando o que desejamos com um projeto de pesquisa e como ele contribuirá, ou não, para o desenvolvimento ou reconstrução da sociedade. No campo da OPC, parece ainda predominar um projeto ético-político de pesquisa centrado na compreensão desta suposta realidade postulada como verdadeira e em formas através das quais as pessoas poderiam se adaptar a esta realidade e construir suas carreiras. Um exemplo disto é a utilização no Brasil do conceito de adaptabilidade de carreira que foi forjado no norte global a partir de contextos mais estáveis e formalizados de trabalho e preconiza que as pessoas devem desenvolver recursos a fim de se adaptarem continuamente ao mundo do trabalho (Ambiel, 2014; Savickas et al., 2009), sem a menção à necessidade de contextualização conceitual, nem de mudança social, econômica e política para que a pessoa possa construir projetos de carreira com base em seus referenciais culturais.
DISCREPÂNCIA ENTRE TEORIA E REALIDADE NA OPC
Faremos, aqui, uma análise e discussão das inadequações dos enfoques teóricos em OPC comumente utilizados no Brasil. Como já apontado, predominam os enfoques teóricos do norte global, principalmente construídos nos Estados Unidos (EUA), no campo de estudos e práticas em OPC, trazendo desafios e críticas a essa tendência observada.
Em primeiro lugar, sua base epistemológica e conceitual é universalizada, descontextualizada e impõe uma maneira de produzir conhecimentos através destes enfoques teóricos (Arulmani, 2014a; Irving, 2010; McMahon et al., 2008), na qual bases culturais de alguns contextos, principalmente do norte global (abordagem êmica1), são legitimados como conceitos do mainstream (abordagem ética) e transformam as teorias em OPC em modelos éticos impostos, sendo inadequadamente aplicados a outras culturas (Berry, 1989, 2013). Isso nos traz a questão do universalismo versus particularismo. Existem conceitos universalizados que podem ser aplicados em qualquer contexto sem alterações? Ou todo conceito precisa ser contextualizado para se tornar válido? Arulmani, Bakshi, Flederman e Watts (2011) argumentaram que uma produção teórica deveria ter "uma sensibilidade às diferenças associada ao interesse em identificar conceitos unificadores ou universais" (p. 62). Assim, é importante dizer que existe uma distância entre os conceitos e a própria realidade sociocultural nos enfoques teóricos em OPC utilizados no Brasil.
Em segundo lugar, enfoques teóricos em OPC privilegiam os universalismos sobre os localismos e consideram os localismos apenas exemplos de diversidade cultural. Sultana (2018) sustentou que os principais modelos teóricos visando o universalismo são errados e perigosos. Errados, porque eles não conseguem entender as realidades locais; e perigosos, porque eles falham em ajudar no desenvolvimento das pessoas, principalmente em contextos, como os contextos do sul global.
Em terceiro lugar, enfoques teóricos em OPC são considerados como construções neutras e fundamentadas em uma suposta versão oficial da realidade que impõe um sistema simbólico dominante (Irving, 2010; Leong & Pearce, 2011; Rascován, 2005; Sultana, 2018).
Em quarto lugar, enfoques teóricos em OPC podem ser "culturalmente enviesados, criando assim barreiras no reconhecimento das necessidades dos/as orientandos/as que vêm de uma cultura diferente" (Launikari & Puukari, 2005, p. 31).
Em quinto lugar, enfoques teóricos em OPC concentram-se nas pessoas, independentemente do contexto social e cultural (Hooley & Sultana, 2016; Irving, 2010), o que chama a atenção para a questão do individualismo-coletivismo (Maree, 2010). O individualismo é definido pela independência, autonomia e agência; e o coletivismo pela primazia das tradições, integridade social e normas de grupo (e.g., familiar, comunitária ou religiosa). Em geral, o individualismo caracteriza os contextos do norte global e o coletivismo define melhor os contextos do sul global, com exceções e possibilidades de posições intermediárias entre individualismo e coletivismo (Arulmani, 2007; Fan & Leong, 2016; Lawrence, 2017; Maree, 2009, 2010; Tien & Wang, 2016).
Em sexto lugar, as diferenças e as diversidades em termos de raça/etnia, gênero/sexualidade, classe social, religião e suas intersecções não são reconhecidas e incorporadas aos enfoques teóricos (Afiouni & Karam, 2017; Arulmani, 2007, 2014b; Cole, 2009; Duffy et al., 2016; Irving, 2010; Leong & Pearce, 2011; McMahon et al., 2008; Rascován, 2005).
Sétimo, enfoques teóricos em OPC são geralmente construídos por uma amostra de pessoas brancas e de classe média (Leong & Pearce, 2011) que não se encaixam em grupos vulnerabilizados do norte global e na maioria das pessoas do sul global (ILO, 2019), ou seja, esses enfoques teóricos foram desenvolvidos em contextos socioeconômicos estáveis e seguros, distintos daqueles geralmente caracterizados por vulnerabilidade, informalidade e instabilidade (Antunes, 2012; Ribeiro et al., 2015; Blustein, 2019; Maree, 2010).
Em oitavo lugar, esses enfoques teóricos geralmente se baseiam na liberdade de escolha. Em muitos contextos, isso pode ser limitado por condições socioeconômicas, papeis de gênero, deveres com a família e valores religiosos (Arulmani et al., 2011).
E, finalmente, concluímos que enfoques teóricos do norte global parecerem desconsiderar que existem diferentes maneiras de ser humano e viver no mundo (Leong & Pearce, 2011; Sultana, 2018). Embora seja importante marcar que há uma tradição de crítica e questionamento desta tendência hegemônica, descontextualizante e universalizante em autores/as do norte global (e.g., Blustein et al., 2019; Duffy et al., 2016; Hooley et al., 2019; Sultana, 2018).
Em resumo, as epistemologias dominantes removeram os contextos culturais e políticos específicos da produção e reprodução do conhecimento da reflexão epistemológica (Santos, 2007) para "universalizar um projeto que encontrou sua origem e seu maior grau de conquista no Ocidente" (Sarr, 2016, p. 105).
Com base em Santos (2003), podemos entender os enfoques teóricos em OPC produzidos no norte global como localismos globalizados, ou seja, processo pelo qual determinado fenômeno local é globalizado com sucesso. Apesar de terem sido elaborados em contextos culturais, sociais e econômicos locais, e, portanto, muito específicos, atingiram um grande alcance e a capacidade de influenciar todos os outros contextos locais ao redor do mundo nos quais se estuda a carreira e atua em OPC.
Segundo Mazawi (2007), esse processo vem causando um déficit de conhecimento ao impedir que as pessoas do sul global falem a partir de si próprias. No campo do OPC, restringe aqueles/as que podem desenvolver teorias e conceitos e os/as força a reproduzir apenas teorias importadas e descontextualizadas do norte global.
Esse processo foi intitulado como injustiça social global por Santos (2007), injustiça epistêmica do colonialismo por Bhargava (2013), ou injustiça epistêmica por Benachir (2017) e Fricker (2007). Impede, dificulta ou desencoraja produções conceituais e teóricas do sul global devido ao processo de manutenção da hegemonia teórica e à falta de abertura a teorias emergentes pelos países do norte global (Arulmani, 2007). "Deve-se afirmar que, quando os psicólogos ocidentais veem os deles como os únicos enfoques teóricos e desprezam os métodos e sistemas que emergiram de contextos não-ocidentais, as dificuldades começam a surgir" (Arulmani, 2007, p. 80). Assim, construir enfoques teóricos a partir de contextos não tradicionais nem sempre é considerada uma possibilidade real.
Os enfoques teóricos em OPC importados do norte global, geralmente dos EUA, foram produzidos em contextos econômicos, históricos, culturais e sociais diferentes do sul global. No entanto, todo o contexto em que foram forjados não é importado junto com estas teorias.
Segundo Santos (2003), a globalização é "o processo pelo qual uma determinada condição ou entidade local consegue estender seu alcance em todo o mundo e, ao fazê-lo, desenvolve a capacidade de designar uma condição ou entidade social rival como local" (p 41). O autor propõe que existem dois modos de produção da globalização: as hegemônicas ou globalizações de cima para baixo e as contra-hegemônicas ou globalizações de baixo para cima. As globalizações hegemônicas podem ser localismos globalizados, mais comuns nos países desenvolvidos, e determinam o processo pelo qual determinado fenômeno local é globalizado com sucesso; ou globalismos localizados, mais comuns nos países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos, diz respeito ao impacto específico de práticas e imperativos transnacionais nas condições locais. Enquanto as globalizações contra-hegemônicas podem ser cosmopolitismo, quando emerge a possibilidade de organização transnacional na defesa de interesses percebidos como comuns; ou patrimônio comum da humanidade, relativos aos temas que apenas fazem sentido enquanto reportados ao globo na sua totalidade.
Conforme Santos (2003), então, podemos definir o mainstream do campo de estudos e práticas em OPC como um localismo globalizado, entendido como um fenômeno cultural local (por exemplo, produção de construções teóricas) que alcançou um alcance global, influenciando grande parte do mundo, sem cessar de ser um localismo. É originada em um local específico dentro de um sistema simbólico específico, principalmente do norte global (e.g., o mainstream dos enfoques teóricos em OPC que são produzidos no norte global e aplicados em todo o mundo).
No Brasil, os enfoques teóricos em OPC do norte global conseguem explicar somente as trajetórias de trabalho de parte daqueles/as que tem formação universitária e pertencem às classes média e alta, o que demanda uma decisão por parte dos/as pesquisadores/as e profissionais de OPC no Brasil, conforme já apontado no início do texto.
Ou se esforçam para adaptar os contextos brasileiros aos enfoques teóricos produzidos no norte global, colocando os/as trabalhadores/as e o mundo do trabalho brasileiros no lugar de faltantes, de defeituosos em sua estrutura, principalmente em função do alto índice de informalidade existente. Ou se esforçam em adaptar as teorias do norte global aos contextos brasileiros, o que gera um mal-estar pelo flagrante descompasso que os conceitos dessas teorias encontram em nossos contextos. Ou apenas estudam àqueles/as que têm contextos e condições semelhantes às das pessoas no norte global, que é o movimento que vem ocorrendo, de forma majoritária, no Brasil, conforme assinalado anteriormente. Qualquer uma dessas opções resulta em uma "incompatibilidade entre o constructo teórico e a realidade: o problema da congruência" (Lawrence, 2017, p. 130), ou seja, uma incongruência entre teorias e práticas.
Com base em Santos (2003), o movimento predominante no campo da OPC do Brasil pode ser definido como um globalismo localizado, entendido como os impactos específicos produzidos pelas práticas transnacionais e imperativos nas condições locais (Santos, 2003). Assim, podemos entender os enfoques teóricos em OPC adaptados ou reconstruídos no sul global como um conjunto de globalismos localizados, pois foram construídos sob a influência imperativa dos saberes do norte global, tendo que adaptar-se a essas teorias, como o exemplo já citado do conceito de adaptabilidade de carreira.
A adaptação de teorias a contextos não acontece de forma natural e isenta de conflitos, principalmente entre conceitos e contextos, e entre o ideal de carreira preconizado nestas teorias e as realidades locais de mundo do trabalho. Este processo gera, em geral, uma tentativa de modificação dos contextos e realidades locais para atender às teorias e conceitos importados do norte global, contribuindo para um aumento da injustiça social.
O movimento de questionamento dos processos de globalização hegemônicas que parecem ser predominantes no campo da OPC no Brasil não está ocorrendo de forma mais intensa, se restringindo a contribuições pontuais ou percursos mais intensos de poucos/as autores/as (e.g., Bock, 2010).
De acordo com Ribeiro e Fonçatti (2017), podemos resumir quatro maneiras pelas quais os enfoques teóricos em OPC podem ser utilizados em contextos diferentes daqueles nas quais foram produzidos, a saber: incorporação; adaptação; recusa; ou coconstrução.
Em primeiro lugar, importar teorias do mainstream construídas em um contexto e aplicá-las em outro contexto sem alterações (incorporação ou reprodução sem adaptação). Em segundo lugar, importar teorias mainstream construídas em um contexto e aplicá-las em outro contexto, com algumas mudanças para abordar singularidades locais (adaptação ou reprodução com adaptação). Em terceiro lugar, ignorar as teorias pré-existentes do mainstream e produzir novas teorias a partir de seu próprio contexto, apartadas do que é produzido no mainstream das teorias da carreira (recusa, isolamento e produção). E, finalmente, produzir teorias através de um diálogo intercultural entre o conhecimento das teorias dominantes e o conhecimento cotidiano contextualizado de suas próprias realidades (diálogo intercultural através da coconstrução).
Essas duas últimas maneiras de produzir teorias em OPC, nas quais o sul global propõe teorias, conceitos e práticas, tendem a ser invisíveis para o mainstream das teorias em OPC e suas contribuições para o campo geralmente são negligenciadas e não tomadas como base para outros trabalhos, inclusive do próprio sul global. Isso levanta a dúvida sobre se o sul global seria capaz de construir abordagens teóricas ou se a corrente principal dos enfoques teóricos em OPC tende a não reconhecê-las. Qual seria o principal problema que surge diante desta constatação de invisibilidade das produções do sul global pelo norte global a ser abordado no nível epistemológico?
Como já apontado, Santos (2007) destacou que a injustiça social global leva à injustiça cognitiva global. Justiça cognitiva é a ideia de que é necessário buscar a igualdade entre diferentes tipos de conhecimento, científicos ou não, de diferentes matrizes culturais, pois reconhece que a ciência como é produzida hoje serve para manter a injustiça social entre as nações. Portanto, é necessário reconhecer o contexto local ao construir teorias e conceitos.
A diversidade epistemológica existente no mundo é fundamental, pois evita a universalização dos enfoques teóricos em OPC, bem como práticas de OPC baseadas neles, que gera um conjunto hegemônico de conceitos e estratégias a serem adotados em todos os contextos. Podemos dizer que a diversidade epistemológica somente surge pelo estudo e análise das realidades locais através das experiências das pessoas, o que nos permitiria compreender as matrizes epistemológicas contextuais que as influenciam.
O domínio das abordagens teóricas produzidas no norte global vem impedindo este processo e deve ser entendido como resultado de posições colonialistas (Benachir, 2017; Santos, 2007; Sarr, 2016; Sultana, 2018), baseando-se em modos de produção da globalização hegemônica ou globalização de cima para baixo, como afirmou Santos (2003). Segundo Santos (2003, 2007), a saída seria a luta pela possibilidade de construção de globalizações contra-hegemônicas, ou, no nosso tema específico, enfoques teóricos e concepções propostas no sul global que possam ser legitimadas pelo norte global, deixando de ser invisíveis e se tornando um híbrido (Latour, 1994).
PRINCÍPIOS PARA AMPLIAR O PODER EXPLICATIVO DOS ENFOQUES TEÓRICOS DE OPC DE MANEIRA CONTEXTUALIZADA
Tomaremos a perspectiva psicossocial (McNamee, 2012), intercultural (Santos, 2007) e híbrida (Latour, 1994) como base para entender os enfoques teóricos em OPC e que considere a diversidade epistemológica de diferentes contextos para podermos pensar em transformações nos processos de produção conceitual no campo da OPC.
Antes de propor alguns princípios para ampliar o poder explicativo dos enfoques teóricos de OPC de maneira contextualizada, devemos retomar a discussão do início do texto e tentar responder: quem pode pesquisar no campo da OPC e produzir conhecimentos?
A ciência, enquanto um sistema simbólico e cultural, também segue processos de globalização, em geral, hegemônicos, como apontou Santos (2003). Ela pode servir como forma de reprodução das hegemonias de poder daqueles/as que atingiram a influência global sobre os/as demais, num movimento de localismo globalizado, no qual a produção teórica do norte global é a única válida no campo da OPC.
A questão que se coloca é que, por mais que o norte global continue produzindo mais teorias e as valide, elas não conseguem entender o que acontece no sul global, a não ser que levem em conta os saberes produzidos localmente, e dialoguem com a população e os/as pesquisadores/as nativos/as nestes contextos locais, numa ação conjunta entre norte e sul global (McNamee, 2010), bem como entre pesquisadores/as e agentes do cotidiano de dado contexto por meio de um diálogo intercultural (Santos, 2007).
Desta maneira, uma postura para o/a pesquisador/a do campo da OPC seria reconhecer que os saberes que tem a respeito do mundo do trabalho e das carreiras são incompletos, pois de sua posição como cientista, não consegue compreender o cotidiano de vida de trabalho das pessoas e produzir um conhecimento contextualizado. É necessário que esse conhecimento que uma pessoa tem de si e de seu contexto seja validado numa ação conjunta ou diálogo intercultural. Do contrário, o/a pesquisador será um/a representante do sistema simbólico dominante com sua própria compreensão e modelo de mundo, os quais serão oferecidos de forma compulsória para as pessoas, obrigando-as que se adaptem, mudando suas vidas de acordo com esses referenciais, e causando reprodução e adaptação, não transformação.
Um passo importante para evitar este processo de adaptação forçada e, potencialmente, gerador de opressão e injustiça social, é o/a pesquisador/a compreender que seus conceitos e teorias são incompletos e que precisam do saber cotidiano local das pessoas para que sejam mais precisos e eficientes (Hooley & Sultana, 2016).
De acordo com McNamee (2010), "o conhecimento é construído através do que as pessoas fazem conjuntamente. Essa orientação dá origem a práticas de pesquisa como investigação colaborativa, pesquisa-ação e processos dialógicos" (p. 17).
Segundo Santos (2007), a perspectiva intercultural entende que toda produção do conhecimento é sempre incompleta e, por conseguinte, as generalizações seriam sempre falsas em função do conhecimento ser sempre contextual e coconstruído por meio das relações entre os/as atores/atrizes sociais envolvidos/as. Apesar do crescente processo de globalização do mundo, ele é formado por uma diversidade de culturas. Assim, enfoques teóricos são produções sociais e culturais e, como resultado, suas premissas e conceitos são altamente influenciados por esses fatores. Entendemos a cultura como sistemas simbólicos e organizadores da vida social através de valores, conhecimentos e práticas compartilhados (Silva et al., 2016). Além disso, cada sistema cultural configura uma visão de mundo e uma concepção de ser humano que serve como guia e quadro conceitual para nossas reflexões, decisões, ações e posições que resultam em nossas construções identitárias (Blustein, 2013).
Segundo Leong e Pearce (2011), os enfoques teóricos deveriam ser mais inclusivos, incorporando fatores como classe social, raça/etnia, gênero/sexualidade, entre outros, e buscando articular a validade cultural dos modelos do norte global com as especificidades dos contextos não dominantes do sul global. Além disso, os enfoques teóricos construídos pelos/as pesquisadores/as do sul global, onde se encontra o Brasil, devem enfrentar forças contrárias como etnocentrismo, efeito de falso consenso, reatância psicológica e uma tendência de atrair similares e rejeitar os diferentes.
A necessidade de incluir e dar a devida importância aos contextos locais, bem como relacioná-los com os contextos globais, é uma questão da qual vários/as autores/as têm estado de acordo, conforme indicado por Arulmani (2007), Ribeiro et al. (2015), Maree (2010) e Rascován (2005) do sul global; e Blustein (2013), Hooley et al. (2019) e Irving (2010) do norte global. Santos (2007) intitulou esse processo como ecologia de saberes e argumentou que todo conhecimento é sempre incompleto e deve ser construído por meio de um diálogo amplo e abrangente entre todos os/as atores/atrizes sociais envolvidos/as.
Afirmamos, portanto, que conhecimento válido é, portanto, conhecimento contextualizado. É válido quando se considera diferenças culturais e políticas. Deve ser orientado para a realidade, que é tomada como ponto de partida e de chegada (Silva et al., 2016).
As atividades de pesquisa e as práticas no campo da OPC devem, portanto, ser culturalmente reconstruídas para serem localmente relevantes (Fan & Leong, 2016). Nesse sentido, os enfoques teóricos não podem reduzir o êmico ao ético, como costuma ser feito pela produção teórica do norte global, o que vem criando modelos éticos impostos (Berry, 1989). "Quando entramos no espaço discursivo da construção social, precisamos expandir nosso foco para comunidades de coparticipantes que colaboram na construção de uma visão de mundo (não da visão de mundo)" (McNamee, 2010, p. 12).
Sarr (2016) apontou a necessidade do sul global deixar de ser informante ou objeto de estudos de caso nas investigações e assumir uma posição reconhecida e legitimada de produtores/as de conhecimento por meio de uma crítica aos discursos dominantes e de uma abordagem da realidade a partir de novas formas. Para que essa mudança seja bem-sucedida, seria necessária um processo gradativo de descentralização e ruptura epistemológica com uma consequente descolonização do conhecimento, na qual a lógica hegemônica deve ser desconstruída e ocorrer uma reinvenção do discurso para explorar outras maneiras de entender o contexto local e global, gerando verdades, não a verdade.
A interconexão entre local e global é central para se conceber propostas teóricas a partir do sul global. Assim, estas propostas teóricas devem ser, ao mesmo tempo, "universais e específicas de dada cultura para poder considerar a universalidade nas perguntas básicas e as diferenças nas respostas" (Pitkänen, 2005, p. 127), evitando o relativismo cultural que, potencialmente, impediria o diálogo entre diferentes culturas pela falta de princípios comuns (Matilal, 1991).
Isso traz a questão de como construir teorias contextualizadas capazes de associar local e global. Como princípio geral, Santos (2007) propôs a lógica do diálogo intercultural que visa impulsionar a coconstrução de teorias e práticas correspondentes por meio de uma associação entre diferentes conhecimentos e know-how de contextos distintos (por exemplo, sul global e norte global). É importante assinalar que um conhecimento não pode ser privilegiado sobre o outro e que o conhecimento resultante não deve ser automaticamente universalizado, pois a produção de conhecimento é sempre marcada pela incompletude e qualquer afirmação universalizante deve ser considerada falsa. Neste processo, faz-se necessária uma reconstrução conceitual e teórica sempre em coconstrução (Nota & Rossier, 2015) e por meio de um diálogo intercultural (Santos, 2007).
Segundo McNamee (2010), a construção de conhecimento é concebida como
um processo relacional em que a coordenação de vários discursos (e, muitas vezes, concorrentes) está em jogo. O desafio para o/a pesquisador/a é adotar uma postura reflexiva em relação a qualquer processo de investigação, para que as práticas locais, contingentes e situadas dos/as participantes da pesquisa, bem como as que conduzem a investigação, possam dialogar entre si. (p. 9)
As informações que os contextos podem oferecer deveriam ser reconhecidas como possíveis explicações de dada realidade pelos/as pesquisadores/as, pois são estas informações que colocam em ação processos de construção, desconstrução e reconstrução de conceitos e teorias através da relação entre duas modalidades de conhecimento distintas, mas complementares: o conhecimento técnico produzido pela ciência e o conhecimento cotidiano produzido pelas pessoas em seus próprios contextos (Santos, 2003).
Essa mudança de paradigma é essencial para a análise da construção de carreira em contextos fortemente marcados por fatores de desigualdade social (desigualdade de renda, gênero e acesso a direitos básicos), como a América Latina, por exemplo; e contextos de crescente pluralidade racial e cultural, como tem acontecido na Europa Ocidental. O trabalho de desconstrução e reconstrução epistemológica auxilia na revisão de poderes e posições dos conhecimentos estabelecidos pelos enfoques teóricos existentes.
Coconstruir uma nova perspectiva, obviamente, não significa desperdiçar todo o nosso conhecimento; o que supomos é que vamos relativizar esse conhecimento e revê-lo criticamente da perspectiva da maioria da população. Não há a intenção de substituí-lo por outro conjunto de teorias, mas de ampliá-lo, para que essas teorias tenham poder explicativo em outros contextos, como o Brasil, abrindo espaço para o diálogo norte-sul e assumindo a importância de ambos os conhecimentos, mas sem se impor, em um diálogo entre diferentes saberes, um diálogo intercultural, incorporado em diferentes práticas sociais e em diferentes contextos, sem a supremacia de um discurso sobre o outro (Santos, 2007).
Santos (2003) intitulou esse processo de globalização contra-hegemônica ou ascendente (de baixo para cima), definindo-o como cosmopolitismo. Nesse modo de globalização, é promovido um espírito de abertura em relação a todos/as os/as atores/atrizes importantes e é realizada uma tentativa de construir um conhecimento transnacional na defesa dos interesses percebidos como comuns. O conhecimento deve ser sempre relacional, nunca produzido por imposição. Esse processo pode gerar híbridos (Latour, 1994) ou conhecimentos mestiços (Santos, 2007), ou seja, inovações decorrentes das relações locais e globais.
Recomendamos fortemente alguns princípios específicos para uma abordagem teórica contextualizada no campo da OPC. Primeiramente, no nível epistemológico, é importante reconstruir os principais conceitos do campo da OPC, como o conceito de carreira, para priorizar a interdisciplinaridade (Rascován, 2005; Sultana, 2018). Em segundo lugar, o contexto social e cultural deve ser incluído nas teorias e práticas de OPC (e.g., questões de interseccionalidade de gênero/sexualidade, classe social e raça/etnia), como apontaram Afiouni e Karam (2017), Arulmani (2014b), Cole (2009), Duffy et al. (2016) e Rascován (2005). Em terceiro lugar, intervenções por meio de dispositivos grupais e estratégias comunitárias devem ser somadas ao trabalho individual, a fim de atender tanto ao modelo cultural individualista, quanto ao modelo cultural coletivista (Arulmani, 2007; Ribeiro et al., 2015; Maree, 2009; Rascován, 2005; Sultana, 2017b). E, finalmente, é extremamente importante a construção de um projeto político e ético para o campo da OPC (Ribeiro et al., 2015; González Bello & Ledezma, 2009; Sultana, 2017b).
Em suma, a produção de conhecimentos deve se configurar num campo de ação política visando a transformação social ou processos contra-hegemônicos de globalização que priorizem o diálogo intercultural para esta produção. Podemos fazer isso de três maneiras.
No nível político, podemos aconselhar teórica e tecnicamente os/as profissionais de OPC e os/as formuladores/as de políticas públicas. No nível acadêmico, devemos incentivar intercâmbios e parcerias entre pesquisadores/as do campo da OPC de várias partes do globo, não apenas dos países desenvolvidos, como estamos fazendo aqui. E, no nível epistemológico, devemos revisar os enfoques teóricos em OPC com base nos contextos locais do mundo do trabalho.
Há uma agenda aberta de pesquisas, intervenções e produção de conhecimento no campo da OPC do Brasil que busque contextualização teórica e conceitual e ampliação da população investigada e atendida em OPC, democratizando a ciência e contribuindo de forma mais ampla com a sociedade como um todo, não somente os grupos mais privilegiados que representam aproximadamente 15% da população de estudantes e trabalhadores/as jovens e adultos/as.
A reflexão realizada no presente texto não teve a intenção de esgotar o assunto, nem trazer soluções definitivas, mas, antes, buscou chamar atenção para o movimento do campo da OPC de importação e utilização de enfoques teóricos do mainstream da OPC, em geral, sem a devida reconstrução epistemológica e conceitual, e a necessidade de rever esta postura para poder auxiliar, de forma mais contextualizada, um número maior de pessoas na realidade brasileira num movimento potencialmente promotor de justiça social. Para tal tarefa, nos inspiramos no construcionismo social e reconstruímos as propostas conceituais de Santos (2003, 2007) para repensar o campo da OPC em articulação com autores/as deste campo específico de produção de conhecimentos e práticas.
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Recebido em: 12/02/2020
Aprovado em: 07/03/2021
Financiamento: O autor é financiado por bolsa de produtividade em pesquisa (CNPq No. Processo 304599/2018-2)
1 De acordo com Berry (2013), a abordagem êmica refere-se à produção de conhecimento que evita a imposição de conceitos apriorísticos e procura "olhar os fenômenos através dos olhos das pessoas de uma cultura específica" (p. 58). Enquanto a abordagem ética utiliza conceitos universais, de fora de dada cultura específica pesquisada, como base para suas análises.