Stylus (Rio de Janeiro)
ISSN 1676-157X
PACHECO, Raul. O real: a resposta da ciência e a resposta do psicanalista. []. , 26, pp.35-43. ISSN 1676-157X.
^lpt^aO objetivo desta apresentação é abordar a questão do que responde o analista ao mal-estar do existir na civilização, buscando-se a especificidade de sua oferta em relação à de outro campo historicamente articulado. Para isso, problematizam-se as conexões entre Psicanálise e Ciência, retomando-se como o capitalismo, liberto da necessidade de sua base religiosa, emancipou-se do pai do protestantismo puritano e passou a definir sua filosofia, ética, objetos específicos de demanda (mercadorias), sua lógica de gozo (discurso do capitalista) e sua maneira particular de produzir o seu saber: a ciência moderna, fundamentada na eliminação das singularidades do objeto de estudos, na foraclusão do sujeito, no desaparecimento do nome do autor (FOUCAULT, O que é um autor?, 1983 [1969]) e na progressiva destituição subjetiva dos próprios cientistas (SOLER, Variantes da destituição subjetiva, 2002). Interrogam-se as relações entre Psicanálise e Ciência, relembrando-se as contradições aparentes entre, de um lado, a convicção freudiana da cientificidade da psicanálise - "A psicanálise não precisa de uma Weltanschauung; faz parte da ciência e pode aderir à Weltanschauung científica" (FREUD, 1933/1980, p. 220) - defendida também por Lacan até meados dos anos 60. E, de outro, as afirmações lacanianas defendendo a sua exclusão interna do campo da ciência, mais para o final da sua obra. Propõe-se que uma busca de entendimento dessas contradições deva enfocar o modo como o avanço decisivo de Lacan para o campo do gozo (o campo propriamente lacaniano) e a delimitação rigorosa da noção de real vieram a convocar uma forma inovadora de resposta do analista, em sua tarefa de conduzir a clínica. Resposta esta congruente com a revelação de uma opacidade intransponível, que aponta um limite na busca de sentido das interpretações. Isso exigiu a formulação de uma margem de liberdade para o sujeito e de uma direção para a busca de saber, que apontam diferenças importantes em relação ao que acontece nos demais campos científicos. A opacidade do real, agora posta no interior do campo como um elemento conceitual necessário e não eliminável - uma vez que intrínseca ao próprio objeto que se trata de investigar -, não mais constitui resíduo que se possa conceber como provisório, cuja eliminação se possa esperar a partir de aperfeiçoamentos teóricos e metodológicos futuros.^len^aThe objective of this presentation is to address the issue of what the analyst responds to the uneasiness of existing in civilization, seeking the specificity of his/her offer in relation to another historically articulated field. For this, it is problematized the connections between Psychoanalysis and Science, returning to the point of how capitalism, freed from the necessity of its religious basis, emancipated itself from the father of puritan Protestantism and began to define its philosophy, ethics, specific objects of demand (goods), its logic of jouissance (the capitalist's discourse) and its particular way of producing its knowledge: modern science, based on the elimination of singularities of the object of studies, in foreclosure of the subject, the disappearance of the author's name (Foucault, What is an author?, 1983 [1969]) and in the progressive subjective destitution of scientists themselves (Soler, Variants of subjective destitution, 2002). The relationships between Psychoanalysis and Science are interrogated, reminding that the apparent contradictions between, on the one hand, the Freudian conviction of the scientific basis of psychoanalysis - "Psychoanalysis does not need a Weltanschauung, it is part of science and it can adhere to the scientific Weltanschauung" (Freud, 1933/1980, p. 220) - also advocated by Lacan up to the mid 1960s. And, on the other hand, the Lacanian statements defending the internal exclusion from the field of science, towards the end of his work. It is proposed that a search of understanding these contradictions focuses on the way how Lacan's decisive advance for the field of jouissance (the Lacanian field itself) and the precise delineation of the notion of real came to invite an innovative way of response by the analyst in his/her task of conducting the clinic. This answer, congruent with the revelation of an insurmountable opacity, points to a limit in search of meaning interpretations. Such a process required the formulation of a degree of freedom to the subject and of a direction for the pursuit of knowledge, which point to important differences in relation to what happens in the other scientific fields. The opacity of the real, now placed within the field as a conceptual element necessary and not dischargeable - once intrinsic to the object itself that it is being investigated - no more constitutes a residue that can be conceived as provisional, whose elimination can be expected from theoretical and methodological future improvements.
: .