Arquivos Brasileiros de Psicologia
ISSN 1809-5267
https://doi.org/10.36482/1809-5267.ARBP2020v72i2p.105-124
ARTIGOS
Processo transexualizador do SUS e psicologia: modos de governar populações e suas negociações
SUS transsexualization process and psychology: ways of governing populations and their negotiations
Proceso de transexualización y psicología del SUS: formas de gobernar a las poblaciones y sus negociaciones
Luis Henrique da Silva SouzaI; Anita Guazzelli BernardesII
IDoutorando. Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e Institucional. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. Estado do Rio Grande do Sul. Brasil
IIDocente. Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Saúde. Universidade Católica Dom Bosco. Campo Grande. Estado do Mato Grosso do Sul. Brasil
RESUMO
Este artigo tem como objetivo problematizar as práticas da Psicologia no campo do Processo Transexualizador, buscando entender como esses saberes vão emergindo e produzindo formas de existência e práticas sobre a população que está dentro desse dispositivo. A Psicologia é uma das responsáveis por criar esses saberes, que subjetivam essa população e apontam como ela deve ser governada. Nessas trilhas, podemos pensar como a Psicologia já ocupou o lugar que patologiza e reforçava o entendimento de anormalidade, evidenciando uma população que deve ser governada. Contudo, é também por encontrar outros saberes e até mesmo entrar em contato com os movimentos sociais que a Psicologia encontra outros caminhos para despatologizar e produzir práticas que entendam as diferentes formas de existência e as possibilidades do corpo trans.
Palavras-chave: Pós-estruturalismo; Processo Transexualizador no SUS; Psicologia.
ABSTRACT
This paper aims to problematize the practices of Psychology in the field of the Transsexualization Process, in an attempt to understand how those knowledges have emerged and produced ways of existence and practices related to the population within this device. Psychology is one of the areas that have created those knowledges, which both subjectify this population and point out the way it must be ruled. In this path, we could think about how Psychology has occupied the place that pathologizes and reinforces the understanding of abnormality, thus evidencing a population that should be ruled. However, it is also because Psychology has found other knowledges and has even been in contact with other social movements that it has found other paths to de-pathologize and produce practices by understanding different ways of existence and the possibilities of a trans body. paper aims to problematize the practices of Psychology in the field of the Transexualizing Process, in an attempt to understand how those knowledges have emerged and produced ways of existence and practices related to the population within this device. Psychology is one of the areas that have created those knowledges, which both subjectify this population and point out the way it must be ruled. In this path, we could think about how Psychology has occupied the place that pathologizes and reinforces the understanding of abnormality, thus evidencing a population that should be ruled. However, it is also because Psychology has found other knowledges and has even been in contact with other social movements that it has found other paths to de-pathologize and produce practices by understanding different ways of existence and the possibilities of a trans body.
Keywords: Post structuralism; Transsexualization process by SUS; Psychology.
RESUMEN
Este artículo tiene como objetivo problematizar las prácticas de la Psicología en el campo del Proceso de Transexualización, buscando comprender cómo está surgiendo este conocimiento y produciendo formas de existencia y prácticas sobre la población que se encuentra dentro de este dispositivo. La Psicología es una de las responsables por crear este conocimiento, que subjetiva a esta población y señala cómo debe ser gobernada. Por este camino, podemos pensar en cómo la Psicología ya ha ocupado el lugar que torna patológica, y refuerza la comprensión de la anormalidad, destacando una población que debe ser gobernada. Sin embargo, es también para encontrar otro conocimiento e incluso contactar movimientos sociales que la Psicología encuentra otras formas de despatologizar y producir prácticas que entiendan las diferentes formas de existencia y las posibilidades del cuerpo trans.
Palabras clave: Posestructuralismo; Proceso de Transexualización en el SUS; Psicología.
Processo Transexualizador do SUS: rastreios em uma política de saúde pública
Para podermos pensar o Processo Transexualizador, alguns caminhos foram feitos para abordar as rupturas e os acontecimentos que vão produzindo essa Política Pública de Saúde e as práticas que se formam dentro dela. Como marco importante, temos a questão da Lei Orgânica da Saúde, nº 8.080, de 19 de setembro de 1990 (Lei n. 8.080, 1990), que atualmente vem sendo minada e esfacelada pelo atual governo, com a implantação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) no 241 (Garcia & Calgaro, 2016), intitulada "PEC da morte". É a partir desse aparato que é posta em discussão a dinâmica do direito à saúde como algo social e coletivo, buscando uma promoção, proteção e recuperação da saúde, trazendo também uma organização e funcionamento dos serviços, além de uma regulação em todo o território nacional. Em seu art. 2°, é colocado que a saúde é um direito fundamental do ser humano, com o acesso a ela sendo assegurado e ocorrendo de forma universal e igualitária, promovendo o bem-estar físico, mental e social (Lei n. 8.080, 1990). É por formulações de políticas da saúde que esses requisitos serão assegurados.
Em um âmbito internacional, temos o marco dos Princípios de Yogiakarta, que a Comissão Internacional de Juristas e o Serviço Internacional de Direitos Humanos desenvolveram. Tem-se, então, um conjunto de princípios com bases jurídicas para serem aplicados pela legislação internacional frente às tantas violações de direitos humanos que têm por base questões de orientação sexual e a identidade de gênero. Como consta em seu documento, os Estados devem implementar os direitos humanos, assim como promovê-los e protegê-los. Existem, também, recomendações adicionais para serem aplicadas por Instituições Nacionais de Direitos Humanos, a mídia e organizações não governamentais.
As ações, princípios e diretrizes da Lei Orgânica da Saúde incidiam em quatro grandes categorias: a Vigilância Sanitária, a Vigilância Epidemiológica, a Saúde do Trabalhador e a Assistência Terapêutica Integral. Nesse jogo, percebemos que, ao mesmo tempo em que se abre um campo para um trabalho universal e integralizado das populações, o trabalho será guiado pelas diretrizes da epidemiologia para o direcionamento das ações.
Mesmo com todas essas diretrizes, 14 anos depois, é lançada a Portaria nº 2227, de 14 de outubro de 2004, que dispõe sobre a criação de um comitê para formular uma proposta de política nacional de saúde da população LGBTIQ+. Essa população foi carregada de estigmas patologizantes, pois suas práticas sexuais eram tidas como anormais e erradas; por tempos, foram designadas como homossexualismo, travestismo e transexualismo e denotadas como doenças. Só mais tarde, houve a substituição do sufixo "ismo" para "dade", como em homossexualidade, travestilidade e transexualidade, que denotam formas de ser do humano. Também há que se considerar a questão da HIV/AIDS, doença denominada como "câncer gay" ou "peste gay". Por falta de resposta do próprio Estado para com o cuidado das necessidades de saúde e assistência dessa população, dá-se a criação dos primeiros grupos e movimentos sociais de LGBTIQ+s (Facchini, 2011).
É por essa pressão dos movimentos sociais que começam a surgir algumas políticas públicas de saúde para essa população, pois ela quer assegurar sua forma de existência, sem preconceitos e discriminação. Porém, na modernidade devemos entender que essas políticas também agem como um dispositivo de segurança. A partir da modernidade, isso significa responder a uma urgência, mas sem que ela entre em uma esteira na qual se possa controlar a população, tendo-se, assim, uma gestão política de vidas. É buscando a normalidade desses novos corpos, que tensionam esse território, que técnicas de intervenção da biopolítica incidem sobre esses sujeitos. Por mais urgentes que essas questões sejam, elas entram antes nos jogos de força (Foucault, 1979; 2008; Agamben, 2009).
Criam-se, então, um tensionamento entre uma estratégia de regulação da população e, ao mesmo tempo, a necessidade dessa regulação como um mecanismo de proteção de certos grupos sociais, que acabam, por um racismo de Estado, vulneráveis a um conjunto de violências. O comitê buscou, então, assegurar aos trabalhadores da saúde não só a questão das práticas de saúde voltada a essa população, mas questões pedagógicas e de conhecimento sobre a população LGBT. Pontos importantes apresentados na portaria ganham um peso maior com a Portaria n° 2.673, de 21 de dezembro de 2004, pois ela aprova o regimento interno do Comitê Técnico de Saúde da População de Gays, Lésbicas, Transgêneros e Bissexuais. Assim, busca-se promover a universalidade do acesso e a equidade da oferta de ações e serviços de saúde à população LGBT.
O mais interessante é que o comitê aponta como uma das produções de saberes a contínua relação com a população e os movimentos sociais, pois, assim, existe a possibilidade de mais de um tipo de saber, em um jogo de forças nas produções, podendo existir uma articulação de diferentes formas de produção de verdade. Um interessante tensionador para a busca dessas políticas públicas para a população LGBT é o Programa Brasil Sem Homofobia, que agiu como um importante articulador não apenas da redução da violência frente a essa população. Por ser um programa produzido não só pelo Governo Federal da época, mas em conjunto com a sociedade civil organizada, levou os movimentos a participarem na busca de que seus direitos fossem assegurados (Conselho Nacional de Combate à Discriminação - CNCD, 2004).
Faz-se necessário, porém, sempre olhar com cuidado para essas políticas e programas, pois é entendendo a noção de direito que percebemos, em certos momentos, jogos de força, resistência e sujeições. Nessas situações, para ter acesso ao direito, os sujeitos precisam colocar-se como doentes; dessa forma, são patologizados para terem acesso a hormônios, cirurgias e atendimentos.
Nesses jogos, começa a emergir a questão do processo transexualizador/mudança de sexo/transgenitalização, uma vez que é mais uma forma de existência. Os movimentos sociais LGBTIQ+ e a população transexual e transgênero começam a trazer essa questão para que se torne uma política pública de saúde, pois essa prática já vinha se consolidando de outras formas, geralmente privadas, em caráter experimental pela medicina, e também em outros países, com técnicas mais avançadas e com uma facilidade maior. Porém, a população marginalizada e pobre acabava tendo que recorrer a práticas clandestinas para conseguir ter essa forma de existência que tanto desejava.
Temos, então, no ano de 2008, a disponibilização do Processo Transexualizador pelo Sistema Único de Saúde (SUS), de forma gratuita, o qual oferece a avaliação psicológica, o tratamento hormonal e o processo cirúrgico. A Portaria do Ministério da Saúde (MS) nº 1.707, de 18 de agosto de 2008, é responsável por instituir tal processo no âmbito do SUS. Nessa Portaria, consideram-se que as questões de orientação sexual e identidade de gênero já são saberes reconhecidos pelo MS; elas são entendidas como determinantes e condicionantes da situação de saúde. Como conceito, a portaria ainda traz a denominação "transexualismo", e não "transexualidade".
Travestis e transexuais são vistas pela medicina como seres portadores de patologia e de uma Classificação Internacional de Doenças (CID) que lhes identifica. Por isso, são sempre tratadas por códigos de doenças. Nesse sentido, seria correto utilizar o "travestismo" e o "transexualismo" (Simpson, 2015, p. 11).
Entende-se, portanto, essa forma de existência como doença, patologizando-se um desejo de viver e ser aceito na condição da pessoa do sexo oposto, tendo em vista um mal-estar e/ou sentimento de inadaptação ao sexo anatômico (Portaria n. 1.707, 2008).
A cirurgia de transgenitalização já ocorria de forma privada, algumas ainda a título experimental. Na Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) nº 1.482/1997, já existiam normas técnicas e de procedimentos para neocolpovulvoplastia e neofaloplastia, procedimentos sobre gônadas e caracteres sexuais secundários.
A implantação do Processo Transexualizador no SUS deu-se a partir de lutas e reivindicações da população Trans (transexuais e travestis) e de todo o segmento LGBTT (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis), que tensionavam os comitês e secretarias. Esse processo foi instituído pelas Portarias GM/MS 1.707, de 18 de agosto de 2008, e SAS/MS nº 457, de 19 de agosto de 2008, que estabeleceram diretrizes e implementaram a regulamentação dos procedimentos, tanto ambulatoriais quanto cirúrgicos, para as "readequações genitais" (Portaria n. 1.707, 2008).
Em 2011, com a Portaria nº 2.836, de 1º de dezembro, no âmbito do SUS, tem-se a Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (Política Nacional de Saúde LGBT). Essa portaria considera a Lei Orgânica da Saúde, priorizando o acesso universal e igualitário, e o Plano Nacional de Promoção da Cidadania e dos Direitos Humanos de LGBT, da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH/PR), que apresenta as diretrizes para a elaboração de políticas públicas. Essas ações devem ser pertinentes, pois se entende que a discriminação dessa população incide diretamente na determinação social de saúde, uma vez que existem sofrimento e adoecimento decorrentes do preconceito.
A portaria citada anteriormente dirige atenção especializada à saúde mental da população LGBT, tendo metas para um avanço social, o que é uma conquista da saúde. Nessa portaria, já constava a necessidade de ampliação do Processo Transexualizador, a fim de garantir o acesso nos moldes do SUS e o aperfeiçoamento das tecnologias usadas no processo, tanto para as mulheres quanto para os homens (Brasil, Portaria nº 2.836, 2011). Foram necessárias todas essas formas de políticas públicas para reafirmar um atendimento que é previsto no terceiro princípio - um atendimento acolhedor e livre de discriminação, com vistas à igualdade de tratamento, porém foi necessário estas implementações para que houvesse essa tentativa para que os princípios de formulação do SUS englobassem a orientação sexual e identidade de gênero como categorias não discriminatórias (Brasil, Ministério da Saúde, 2007).
O Processo Transexualizador teve, portanto, sua ampliação pela Portaria GM/MS nº 2.803, de 19 de novembro de 2013. Além disso, esta Portaria redefiniu o processo, buscando a integralidade da atenção à saúde dos transexuais e travestis, também lhes possibilitando ter acesso ao cuidado desde a atenção básica até a especializada. Esses serviços devem ser assegurados por um trabalho de equipe multidisciplinar e interdisciplinar, configurando uma rede de atenção à saúde que prioriza o acolhimento e a humanização do atendimento. O que se privilegia é que seja um local livre de discriminação e preconceito, onde os técnicos que lá trabalham e os outros usuários que transitam por esse território sejam sensibilizados e respeitem a diferença entre as pessoas (Portaria n. 2.803, 2013).
A atenção básica, então, é a porta de entrada prioritária do usuário na rede. A partir disso, ele prosseguirá para a atenção especializada: conjunto de diversos pontos de atenção, com diferentes densidades tecnológicas, para a realização de ações e serviços de urgência, ambulatorial, especializado e hospitalar, apoiando e complementando os serviços da atenção básica de forma resolutiva e em tempo oportuno (Portaria n. 2.836, 2011). Frente à integralidade do cuidado do usuário ou usuária, primeiramente, há um acolhimento humanizado e respeito ao seu nome social, seguido pelo encaminhamento para a atenção especializada.
A atenção especializada possui duas modalidades de atendimento: o ambulatorial, responsável por hormonização, acompanhamento clínico e pelo pré e pós-operatório; já a modalidade hospitalar é responsável pela cirurgia e pelo pré e pós-operatório. As duas modalidades são responsáveis pelas mesmas coisas? Os ambulatórios transexualizadores devem estar associados a hospitais universitários ligados à produção de conhecimento e ensino.
O Processo Transexualizador aparece como uma forma de experimentar de maneira quase plena os saberes e a formação em Psicologia, pois ela é um dos principais agentes no processo e há necessidade de o sujeito trans estar em acompanhamento por profissional. A Psicologia é uma das responsáveis por produzir políticas públicas do atendimento à pessoa trans, sendo um dos agentes produtores de saúde.
Nesta introdução, o esforço da autoria estava em construir ao leitor o campo, onde se debruçariam para assim, no decorrer do trabalho, problematizar a Psicologia como um campo de saber que produz práticas discursivas que incidem nas políticas de saúde e nos corpos dessa população. O percurso de pesquisa leva a uma inversão da lógica onde quem é problematizado é a própria Psicologia pelo Processo Transexualizador. Essa aposta política da pesquisa, também é pelo fato que, os autores são profissionais da psicologia, sendo uma mulher hétero e um homem gay cis.
Teórico-metodologicamente trabalhamos com o pós-estruturalismo, sendo Michel Foucault o norteador para a discussão. Assim, autores que vieram dos movimentos sociais, da teoria feminista e queer também foram acionados para a discussão. As materialidades trazidas ao trabalho são as políticas públicas de saúde que forma o Processo Transexualizador e que delineiam e balizam as práticas dos profissionais e que forjam o funcionamento deste programa de saúde pública para a população trans. Foi recorrido também um retorno a trabalhos que discutem a história da Psicologia e da Medicina para demonstrar o movimento destas áreas para a produção da categorização transexualidade.
Assim, este artigo que é um dos trabalhos originados de uma dissertação de mestrado, buscou ensaiar como que a Psicologia foi sendo produzida em sua história e ocupando diferentes espaços quando se relaciona com a população trans, onde foram emergindo conceitos categorizantes sobre este grupo, e quando, no atual momento, o tensionamento se dá em uma bifurcação onde a Psicologia, mesmo com suas diferentes teorias, tem sua prática dentro do processo transexualizador pautada em uma despatologização, mas trabalhando esse grupo pela categoria sofrimento e de um outro lado articulando políticas públicas junto ao movimento social, produzindo saberes que potencializam outros modos de existir.
Psicologia: práticas possíveis
Neste momento, decidimos percorrer as trilhas de produção das práticas da Psicologia produzidas dentro do campo do Processo Transexualizador do SUS até agora. É o momento de adentrar em terras que trazem certo ar de reconhecimento, mas que podem trazer surpresas também. Estamos nos domínios da Psicologia e de suas produções. Enquanto profissionais da Psicologia, explicitamos o que esta ciência produz de conhecimento sobre o Processo Transexualizador. Estando nesse lugar, abordamos como, em nossas formações, reconhecemos um despreparo no desenvolvimento dos profissionais frente a essa temática. Aqui, historiografo a Psicologia e sua relação com o Processo Transexualizador, a partir do presente, construindo este objeto no hoje, sem o enclausuramento de que ele é uma projeção do passado (Rodrigues, 2016, p. 76), entendendo que existe um jogo historiográfico-ficcional, já que o presente se choca com o atual.
A Psicologia, no Brasil, começa a emergir dentro dos moldes do que, naquela época, meados de 1920, eram chamados de psicotécnicos. No ano de 1925, surge o Laboratório de Psicologia Experimental no Rio de Janeiro. Seu fundador foi Gustavo Riedel, um médico que voltava seus estudos para a epilepsia e a psiquiatria. Antes mesmo da fundação do primeiro curso de Psicologia no Brasil, esse saber já começava a circular em nossas terras, engendrados nesses laboratórios e conduzidos pelos agentes da medicina. Sua prática era focada em diagnosticar e esquadrinhar o que o indivíduo tinha de melhor para, assim, poder investir essa força em determinado lugar. Temos também nesses anos iniciais "o fortalecimento da Psicologia Clínica, que apontava muito mais para uma área médica do que psicológica" (Passos, 2007, p. 98). O nascimento da Psicologia no Brasil dá-se batizado pelo campo médico, que vai legitimando-a como campo de saber e entendendo-a como uma ciência.
A ciência, diz Foucault (1999), é o resultado do disciplinamento dos saberes através da organização das disciplinas em torno de critérios para distinguir o verdadeiro do falso, seleção e normalização de conteúdos, classificação hierárquica e centralização desses saberes num campo maior (a ciência) - que ele sintetiza pelas operações de seleção, normalização, hierarquização e centralização -, que "vai formular problemas específicos ao policiamento disciplinar dos saberes: problemas de classificação, problemas de hierarquização, problemas de vizinhança, etc. (Hüning, 2008, p. 25).
A profissão do psicólogo é regulamentada em 1962 (Scarparo & Guareschi, 2007). O que pautava as práxis dos profissionais eram teorias desenvolvimentistas e adaptacionistas. Tendo suas práticas configuradas por essas ideologias, entendiam-se os sujeitos de forma individualizante e fora dos contextos, o que fazia com que os que estivessem fora das normas vigentes fossem adaptados ou, então, excluídos do meio social, legitimando as desigualdades sociais. Os três principais locais e funções que o psicólogo ocupava eram o da clínica individual, o da avaliação nas organizações e dentro da escola, nas questões da aprendizagem. As autoras ainda apontam como a liberdade era algo impensável fora das paredes da individualidade (2007). Mesmo nos anos 1970, quando as práticas começaram a direcionar-se às comunidades, estas eram investidas para a diminuição das psicopatologias e com foco adaptacionista dos sujeitos ao ambiente em que se encontravam. A Psicologia encontrava-se nessa via de mão dupla: aquela que categoriza e também tem força de intervenção para colocar o sujeito no lugar de onde não deveria ter saído.
A Psicologia, em certos momentos, acaba tomando um caráter higienista. Pacheco (2017) traz em seu trabalho o quanto isso foi potencializado pela época de ditadura militar. Eram segregados nos hospitais as prostitutas, os travestis, os transexuais e os homossexuais, sendo a Psicologia uma das ciências contribuintes para a patologização dessas formas de existência (Pacheco, 2017).
Portanto, desde o ensino dos fundamentos teóricos, o olhar está direcionado para a psicopatologia, e não para o sujeito. O que se evidencia é uma incompatibilidade dessa perspectiva com o caráter assumido pela Psicologia, voltado para o diagnóstico preciso dos transtornos psiquiátricos, que, muitas vezes, acaba reduzindo as possibilidades de vida dos sujeitos àquilo que diz respeito à sua doença, sem um olhar para a diversidade e multiplicidade das histórias de vida e singularidades (Guareschi, Reis, Dhein, Bennemann, & Marchy, 2011, p. 199).
É nos anos 1980, com o fim da ditadura, e nos anos 1990, com o impeachment do presidente Collor e com a urgência das reivindicações das lutas dos movimentos sociais e da mudança dos paradigmas políticos, que a própria Psicologia começa a ser implodida e explodida. Primeiro, parte dos psicólogos começa a questionar quais tipos de sujeitos estavam sendo produzidos por essas teorias; segundo, era hora de rever suas práticas.
Após os anos 1970, surgem novos paradigmas na ciência, e um dos principais é a relação entre a política e sua prática. Aprofundam-se os estudos sobre populações marginalizadas, abarcando também questões de gênero, classe, etnia e culturas. Dá-se início a discussão de que não existe uma psicologia neutra e de que toda Psicologia apresenta um posicionamento político, pois as práticas têm consequências e visam a um resultado final - elas contêm uma epistemologia e uma configuração social.
As preocupações agora vão além de apenas adaptar e quantificar algo. Trata-se de analisar as relações sociais, as estruturas de uma sociedade, entendendo que elas são construções humanas e que estão em constante transformação. O interesse é por estados mentais, significados, motivos, valores, crenças e atitudes. Não existe a busca de um número, mas de análise, assimilação e compreensão das subjetividades e formas de subjetivação.
Assim, as práticas também começam a ser criticadas, uma vez que mais julgavam do que potencializavam os sujeitos, comunidades e populações. "A psicologia [surge] como um saber que se inscreve num campo de embates e transformações que envolvem outras forças para além das supostas fronteiras de pureza da ciência e da ideia do saber pelo saber" (Hüning, 2008, p. 20).
Porém, nesse campo de saber tão grande, dentro dessas imensidões de áreas e de teorias criando modos de entender os sujeitos e o mundo, qual seria o objeto de domínio da Psicologia? Frente às diferentes teorias, existe um conceito que tem certo dom de envolver o comportamento, o inconsciente, a consciência, o psiquismo, o(s) eu(s), self(s) e outros tantos objetos da ciência psicológica: a subjetividade. É pelas intervenções sobre esse objeto que a Psicologia vai fazendo seu trabalho, que muitas vezes é de controle, mas que pode ser também de potencialidades nas formas de existência do ser.
Foi da dualidade corpo-alma que a alma se tornou foco de investimento, por ser a via da razão, aquela que controla as emoções e sentimentos, as impiedosas paixões, que acabam tomando o corpo e produzindo descontroles. É pela alma e pelo controle que ela causa que, na morte, liberando-se do corpo, poderá chegar à purificação (Silva, 2007).
A subjetividade é entendida como produzida e até mesmo controlada pelos dispositivos, sejam eles de saber e/ou poder. Como técnica científica, a Psicologia é um deles.
Em nosso entendimento, ainda vemos a Psicologia operando sob uma perspectiva que se coloca sob a sombra da ciência médico-clínica, e sujeitamo-nos às imposições feitas por ela para continuarmos como uma ciência que produz saber e intervém nesse campo.
[...] é do domínio das ciências psi (Psicologia, Psiquiatria e Psicanálise) e bio-médicas a tarefa de entender e intervir nos corpos e subjetividades de sujeitos que demandam o reconhecimento (legal e social) de uma identidade de gênero diferente daquela imposta pela sociedade (Bento, 2017b, p. 46).
Pois é pela categorização e patologização do transexual como alguém que possui um transtorno de identidade de gênero que o psicólogo, com suas técnicas avaliativas, vai dizer essa verdade sobre o sujeito, muitas vezes se pautando nas questões da heteronormatividade e na cisgeneridade. Pacheco (2017) evidencia que:
As críticas ao processo de elaboração da Portaria e seus desdobramentos demonstra que esse campo permanece em disputa, no entanto, o poder de enunciação do CFM e dos médicos que participaram dos processos permanece informando que esse lugar ainda é domínio da medicina, os demais são posicionados como coadjuvantes, incluindo a Psicologia (2017, p. 37).
Acabamos carregando conosco certas modalidades de subjetivação modernas e biomédicas. Pois é o psicólogo, detentor do saber da subjetividade, que autoriza e decide se o sujeito transexual está apto para fazer a cirurgia de mudança de sexo. O desejo pessoal e a sua forma de existência acabam sendo desconsiderados quando pensados sob as lógicas biomédicas, de doença, heteronormativas e cisgêneras. Nesta esteira de produção de saberes, Teixeira (2016) indica que existe a subordinação das outras ciências frente ao saber médico quando se trata do processo transexualizador. Ela traz as indagações de Berenice Bento, pesquisadora expoente dos estudos queer, que mostra como nem os movimentos sociais e os pesquisadores da área das ciências humanas tiveram espaço no I Seminário Nacional de Saúde Integral LGBT.
As desconfianças sistematizadas por Berenice Bento naquele momento se conformariam na publicação da Portaria no. 2.803, de 19 de novembro de 2013, recebida sem questionamentos expressivos dos representantes do movimento social presentes no I Seminário Nacional de Saúde Integral LGBT. A temática da despatologização teria sido interditada, num acordo "silenciado" entre representantes do Ministério da Saúde e do movimento social. Não sem razão, as (os) pesquisadoras (es) das ciências humanas, presentes no seminário de junho, não foram convidadas (os) para o referido evento (Não paginado).
Não importa o espaço - pode ser na educação ou na clínica -, muitas vezes, se não em sua maioria, o profissional da Psicologia acaba sendo acionado para adaptar o indivíduo, avaliá-lo e categorizá-lo. Na onda de legitimidade do discurso biologizante/psicologizante/medicalizante da vida, toda forma de desvio social pode ser considerada uma doença; aliás, a própria noção de desvio já se insere no âmbito normatizador em que nos movemos (Bento, 2017a). Nikolas Rose demonstra como a Psicologia foi uma ciência que acabou se doando para as outras ciências e que se formou como uma disciplina não apenas dentro das academias e dos laboratórios, mas dentro de instituições, como fábricas, prisões, exército, salas de aulas, tribunais, manicômios e hospitais. Ela era responsável por administrar as vidas humanas; junto às autoridades, controlava as condutas humanas tanto no âmbito individual quanto no coletivo (Rose, 2008).
Existe a questão da compulsoriedade do acompanhamento psicológico, como se o sujeito tivesse que ter o suporte do psicólogo por estar em uma situação de sofrimento psíquico. Foi pela Portaria MS nº 1.707/2008 que a psicoterapia passa a ser requerida no Processo Transexualizador.
A partir de 2003, no Brasil, dissertações e teses nos campos da medicina, psicologia, serviço social e saúde coletiva surgiram, visando analisar as experiências de cuidado nos serviços especializados na realização da cirurgia de transgenitalização. A tese de doutoramento de Bento constituiu-se em um marco, não somente por ter iniciado a discussão sobre o caráter arbitrário dos mecanismos para o diagnóstico de transexualismo como também de sua exigência como condicionante para o acesso aos cuidados em saúde para as pessoas transexuais (Raimondi, Paulino & Teixeira, 2016, p. 134).
Acabamos aderindo a essa premissa de que sabemos sobre o sujeito até mais que ele próprio, de que os sujeitos necessitam de intervenções e avaliações de sua subjetividade. Aceitamos e mantemos esse lugar de poder e saber que nos foi cedido pela medicina quando esta nos colocou, desde a primeira edição, na Resolução sobre as cirurgias de mudança de sexo (Resolução CFM n. 1.482, 1997; Resolução CFM n. 1.652, 2002; Resolução CFM n. 1.955, 2010). O próprio CFM não diz nada sobre essa compulsoriedade.
Chamo de cidadania cirúrgica ou cidadania precária, porque ele tem que estar, durante dois ou três anos, se submetendo a burocracias de sessões de psicologia, exames rotineiros para, ao final desse processo, saber se aquilo que ele quer; ele só pode fazer se tiver um laudo de transexualidade. Sem dúvida, isso é importante, mas a cirurgia tem que vir como um reconhecimento pleno da condição de sujeito das pessoas transexuais de decidir sobre as alterações corporais de seu corpo (Bento, 2017a, p. 110).
Continuando nesse caminho, é a Psicologia também um dos expoentes na despatologização da transexualidade quando formula um conjunto de diretrizes e políticas que contribuem com os movimentos sociais e a eles se alinham:
O CFP, nos anos de 2015 e 2016 lançou dois vídeos com questões relacionadas à vivência de pessoas trans e problematizam a sua patologização, a partir de um discurso da Psicologia. Concomitantemente ao lançamento dos vídeos intitulados respectivamente de "A despatologização das transexualidades e travestilidades pelo olhar da Psicologia - Parte I e A despatologização das transexualidades e travestilidades pelo olhar da Psicologia Parte II", o CFP colocou no ar um website com a mesma temática visando ampliar o diálogo com os interessados no debate (Pacheco, 2017, p. 37).
Ao mesmo tempo, disponibiliza uma Nota Técnica (Conselho Federal de Psicologia - CFP, 2013) com diretrizes, apoiando-se nas questões de Saúde Pública e na Constituição, com vistas a um atendimento sem discriminação. Esse movimento é posterior ao acontecimento global do Stop Trans Pathologization, no qual diferentes grupos e ativistas produziram um documento onde internacionalmente a pauta era a psiquiatrização da tarnsexualidade. Esse movimento tem efeitos no Brasil e a descatalogação da transexualidde do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM (Stop Trans Pathologization - STP, 2012). Define-se, dessa forma, que a Psicologia entenderá que a pessoa que não se identificar com o sexo com o qual nasceu não apresenta uma psicopatologia. Em 2018, é implantada a Resolução nº 1, de 29 de janeiro, que estabelece normas de atuação para psicólogas e psicólogos em relação às pessoas transexuais e travestis.
Art. 7º - As psicólogas e os psicólogos, no exercício profissional, não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização das pessoas transexuais e travestis.
Parágrafo único: As psicólogas e os psicólogos, na sua prática profissional, reconhecerão e legitimarão a autodeterminação das pessoas transexuais e travestis em relação às suas identidades de gênero.
Art. 8º - É vedado às psicólogas e aos psicólogos, na sua prática profissional, propor, realizar ou colaborar, sob uma perspectiva patologizante, com eventos ou serviços privados, públicos, institucionais, comunitários ou promocionais que visem a terapias de conversão, reversão, readequação ou reorientação de identidade de gênero das pessoas transexuais e travestis (Resolução CFP n. 1, 2018, não paginado).
Cabe destacar, contudo, que a Psicologia é uma ciência que não abre mão de seu lugar no processo transexualizador, em razão da dimensão do sofrimento psíquico/adoecimento. Assim, acaba-se criando no interior da própria disciplina um plano de bifurcação: um percurso voltado para a construção de políticas de acesso aos direitos e outro para a construção de políticas direcionadas para o sofrimento como dimensão patológica da experiência trans, uma postura de colhedor de informações e de controle de comportamento e do corpo da pessoa trans. Quando a Psicologia assume esse lugar crítico e acaba indo na direção das Políticas Públicas e do que os movimentos sociais têm a dizer, conseguem assim produzir um saber coletivo. Mas, seguindo os rastros colocados na Nota Técnica citada, a Psicologia ocupa essa posição em que a Medicina a colocou, sendo apenas uma intervenção junta às outras práticas e saberes.
A transexualidade e a travestilidade são categorizadas pelas normas, portarias e notas técnicas de diferentes formas; a luta de saberes sobre a transexualidade e travestilidade é violenta, sendo que esta população apenas quer produzir um cuidado de si, resistindo focando por ser uma população que possa ter autodeterminação e autonomia. Pacheco (2017) aponta o quanto os trabalhos produzidos a partir da transexualidade se colocam nos campos de Direito, Saúde, Medicina e Psicologia. Nestes campos, os saberes podem até dialogar entre si, mas partem de lugares diferentes, mediante os quais se estabelecem certos jogos de força (Castel, 2001; Facchini, 2011; Brasil, Ministério da Saúde, 2015).
Há uma necessidade de tensionar esses lugares. Percebemos que a academia é um dos lugares onde isso acontece com certa frequência. É dentro das universidades que se começa a tensionar o modo de a Psicologia enxergar a questão da transexualidade apenas como um sofrimento psíquico, considerando que todos os transexuais e travestis têm o mesmo tipo de sofrimento e, assim, singularizando e categorizando esse tipo de experiência. Teixeira (2009, p. 2) evidencia como as produções e práticas dos psicólogos no Processo Transexualizador estão em constante disputa. Ela traz a experiência de duas psicólogas e das produções acadêmicas envolvendo a Psicologia:
Comparando a participação dessas pesquisadoras na elaboração das Portarias com o impacto de suas produções no próprio campo disciplinar, identifica-se que não há um consenso sobre o papel do psicólogo nos programas que realizam a cirurgia de transgenitalização, assim como na produção teórica sobre a transexualidade. A ausência de consenso expressa a disputa entre aqueles que mantêm a transexualidade com o estatuto de patologia e outros que desejam sua despatologização. Os dilemas dos profissionais se avolumam quando visam garantir a assistência à saúde sem a atrelar à doença.
Fazem parte das aulas de Psicopatologia, na maioria das universidades que formam psicólogos, segundo a tradição dos estudos na área de saúde mental que integram a formação da Psicologia, a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID) e o DSM.
[...] estudos epidemiológicos e nosográficos, que mais tarde deram origem aos manuais de diagnóstico, como o CID-10 e o DSM-IV. Contudo, o desenvolvimento dos estudos das psicopatologias em escolas teóricas como a Psicanálise ou a Cognitivo-Comportamental, também vai colaborar para a construção desse paradigma em que se fundamenta a entrada da Psicologia na área da saúde, que enfoca o estudo da compreensão e do tratamento de doenças, em detrimento do olhar sobre as histórias de vida dos sujeitos (Guareschi et al., 2011, p. 189).
É por ter esse foco nas questões patológicas, que carregamos hoje em dia esse estigma da transexualidade e travestilidade como patologias. Nos manuais, elas fazem parte dos ditos transtornos de identidade de gênero.
A influência do DSM segue a mesma lógica de poder que os EUA têm do mundo. Embora seja um texto provinciano (no sentido de que fala de uma realidade singular), 69,8% das organizações afirmaram que é um documento que tem poder legal e científico em seus países. Em termos práticos, este dado significa que o DSM é um documento utilizado para definir os parâmetros de quem poderá ter acesso às cirurgias de transgenitalização, e/ou tomar hormônios, e/ou pedir as alterações legais nos documentos (Bento, 2017a, não paginado).
Nas aulas de desenvolvimento humano, muitas vezes as não heterossexualidades são associadas a um desenvolvimento negativo, sendo atreladas a famílias desestruturadas (Silva & Santos, 2014).
A verdade sobre essa sexualidade natural e normal definiria também "a" família natural e normal. "Famílias desestruturadas" (não-naturais), para usar a linguagem que se fala na escola ou nos serviços de saúde e de assistência social, explicariam desvios de comportamento a serem tratados ou prevenidos (Paiva, 2008, p. 643).
Já nas aulas que envolvem questões da Psicologia Clínica, as intervenções sobre a subjetividade, as questões projetivas e introjetivas, bem como as rivalidades ocorridas na tenra infância, aparecem e, dependendo do profissional/professor, questões referentes às sexualidades que não se encaixam como normais serão tachadas como questões patológicas e carregadas de sofrimento. O sofrimento não é um produto advindo das questões ligadas a discriminações, violências e preconceitos sofridos, dos regimes de verdade pautados na heteronormativeidade e cisgeneridade, mas de desarranjos intrapsíquicos (Porchat, 2014; Teixeira, 2006).
Na psicanálise, desde Freud até os autores ligados a Lacan, a transexualidade mantém-se habitando o campo das perversões, neuroses e psicoses, categorias que estigmatizam essa população.
[...] no campo da psicanálise é pensar o transexualismo como pertencente a um grupo de casos ditos limites, os quais se situam ao mesmo tempo entre a neurose e a psicose. Desta forma, estes estados poderiam ser considerados uma "doença do narcisismo"... A linha geral dos trabalhos parte da hipótese da existência de uma relação objetal "pré-genital" bem distinta da psicótica, mas muito diferente da relação objetal neurótica, sendo que a relação com o Édipo permanece fragmentária e prescinde do recalque como recurso organizador (Aran, Zaidhaft, & Murta, 2008, p. 72).
O sexo e a sexualidade (Paiva, 2008) acabam configurando-se como esses objetos de domínio da Psicologia, sendo ela a detentora de lugar de fala sobre esse assunto, que por muito tempo ocupou um lugar banal e que deveria ficar na individualidade das casas.
[...] teóricos de diferentes disciplinas concordavam que, se a ciência produzisse teorias sobre a sexualidade e revelasse sua natureza, a humanidade seria beneficiada por um maior equilíbrio entre indivíduo e sociedade ou para relações sexuais naturais e saudáveis (Paiva, 2008, p. 243).
Porém, o sexo e a sexualidade são balizadores que influenciam e intervêm na racionalidade e na subjetividade. Por tirarem os sujeitos das linhas da normalidade imposta, muitas vezes pela heteronormatividade e cisnormatividade, a Psicologia seria essa força que colocaria a sexualidade nos trilhos corretos.
Em outras palavras, embora atuem com base em sua autoridade técnica e científica - de psicólogos, educadores, médicos, assistentes sociais, enfermeiros, professores de primeiro e segundo grau - raramente foram formados para lidar com a sexualidade em contextos que não sejam propriamente terapêuticos. Normatizam o sexo desejável, nomeando-o como "mais saudável", baseados em valores e noções pessoais que reinterpretam a sofisticada teorização sexológica do século XX (Paiva, 2008, p. 644).
É, então, o gênero que traz uma potência para se pensar não só as questões binárias do sexo, mas como a sexualidade começa a possuir um caráter múltiplo, podendo as formas de existência ir além da heteronormatividade e cisnormatividade.
[...] agenda da saúde ainda se estrutura e se legitima a partir dos já tão conhecidos binarismos que a sustentam, como o binário homem/mulher; feminino/masculino; homossexualidade/heterossexualidade; corpo são/corpo doente, só para citar alguns exemplos. Esses binarismos ainda organizam a formação, as práticas e as políticas em saúde e provocam uma série de problemas práticos para a concretização dos princípios da integralidade e da equidade em saúde e para a efetivação dos direitos sexuais e reprodutivos enquanto direitos humanos (Nardi, Rios & Machado, 2012, p. 263).
É necessário que a Psicologia estenda seu olhar para uma potência de vida nesse outro modo de ser e abra mão do lugar que normatiza a vida, pois é colocado que sexualidade é um dispositivo que não só configura nossas relações privadas e/ou familiares, mas também está em nossas relações sociais (Foucault, 2016, p. 53).
Porém, nas produções da Psicologia, perde-se uma questão importante: o lugar onde essas vivências são tomadas e sentidas - o corpo. Ele aparece como essa questão mundana, apenas como via dos afetos e sensações; na própria questão do transexual, é modificando o corpo que cessariam os incômodos e os sofrimentos da subjetividade (Silva, 2007).
Nesse percurso, o que temos é a produção de diferentes corpos dentro da Psicologia. Pensando-se em uma Psicologia geral, o corpo encontra-se como responsável pelas percepções, e não por trazer em si uma experiência vivida da subjetividade.
Psicologia e o corpo trans: entre sofrimento e potência de existência
A Psicologia, subordinando-se à medicina, encontra a via da patologia para produzir suas práticas. Por um tempo, até foi aceita pelo corpo trans, mas, no decorrer do caminho e com as tensões dos movimentos sociais, vindas dos LGBTQI+ e das feministas, os corpos começam a renunciar a esse lugar onde são controlados e julgados pelo saber científico. Esses corpos já são tratados pela saúde e agora clamam por direitos. A Psicologia, com medo de perder seu próprio status de saber, continua ainda nesse lugar de tutela frente ao corpo trans, já que não abre mão da compulsoriedade do atendimento psicoterápico a pessoas trans.
O corpo trans não quer ter em si a patologia mental, tão estigmatizada ao longo de anos. A Psicologia, para continuar nesse lugar, encontra o sofrimento. Ela é a responsável por acolher e dar forças ao corpo trans para passar por esse momento dito difícil, uma vez que existe uma subjetividade em sofrimento. Como estratégia, é no sofrimento que a Psicologia assegura seu espaço. A própria psicanálise traz uma visão potente. Teixeira (2006) aponta como o saber médico coloca a cirurgia de redesignação sexual sendo o destaque e resposta ao desejo do corpo trans e não se pensa em uma feminilização ou masculinização do mesmo, como resposta a essa necessidade da pessoa trans, como se para ser mulher fosse necessário apenas uma vagina e para ser homem um pênis.
Mas é pelo sofrimento - no texto de Teixeira (2006), entendido como sintoma - que se tem a via pelo tratamento psicanalítico. Desse modo, as práticas psicológicas, dentro do campo trans, acabam por deslocar o patológico para aquele que sofre como condição para a própria relação da Psicologia com a experiência trans. A Psicologia se firma nesse ponto a partir do DSM e da conceitualização de disforia de gênero.
Disforia de gênero refere-se ao sofrimento que pode acompanhar a incongruência entre o gênero experimentado ou expresso e o gênero designado de uma pessoa. Embora essa incongruência não cause desconforto em todos os indivíduos, muitos acabam sofrendo se as intervenções físicas desejadas por meio de hormônios e/ou de cirurgia não estão disponíveis. O termo atual é mais descritivo do que o termo anterior, transtorno de identidade de gênero, do DSM-IV, e foca a disforia como um problema clínico, e não como identidade por si própria (American Psychiatric Association - APA, 2014, p. 251).
A Psicologia, dessa maneira, mantém-se no Processo Transexualizador, afirmando que a experiência trans é uma experiência de sofrimento, uma vez que isso é instaurado pelo DSM. Demonstra-se que se trata de uma condição associada ao sofrimento clinicamente significativo ou a um prejuízo no funcionamento social, acadêmico ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
Indivíduos com disforia de gênero apresentam incongruências acentuadas entre o gênero que lhes foi designado (em geral ao nascimento, conhecido como gênero de nascimento) e o gênero experimentado/expresso. Essa discrepância é o componente central do diagnóstico. Deve haver também evidências de sofrimento causado por essa incongruência. O gênero experimentado pode incluir identidades de gêneros alternativas além dos estereótipos binários. Em consequência, o sofrimento não se limita ao desejo de simplesmente pertencer ao outro gênero, podendo incluir também o desejo de ser de um gênero alternativo, desde que diferente do designado (American Psychiatric Association - APA, 2014, p. 453).
Ou seja, a experiência trans como campo de visibilidade e dizibilidade, na Psicologia, é capturada pelas formas de articulação da subjetividade com o sofrimento, alargando o patológico, mas situando-o na relação com problemas de saúde.
Ao situar as práticas como políticas, entende-se que se trata de jogos e tensionamentos entre verdade, poder e subjetividade, a partir dos quais a questão não diz mais respeito a uma perspectiva binária de certo ou errado, mas daquilo que produz em termos de modos de viver (Bernardes, 2017, p. 340).
A Psicologia, tensionada pelos movimentos sociais, pelas mudanças de paradigmas na formação e no fazer profissional, pela entrada de teorias críticas da modernidade, do queer e do feminismo, começa pelo menos a repensar esse seu lugar e também a tencioná-lo. Mas então, se esse não é o seu espaço, qual seria?
Essa violência-operação no corpo da Psicologia fez com que a emergência de assuntos como o sofrimento e a subjetividade fosse vista como estratégia de regulação para não se falar da experiência trans como inteligibilidade patológica. Nesse contexto, a Medicina surge como senhora soberana das outras ciências e é ela que escolhe onde cada saber ficará disponível nesse campo de guerra. O corpo trans é o terreno onde essas forças se digladiam.
Contudo, é quando a Psicologia aparece que as questões da subjetividade ganham uma força maior, uma vez que o corpo é tido como um aparato que recebe sensações. O corpo, para a Psicologia, entra também como um espaço onde ele é a representação do sexo e do gênero, onde os outros o identificarão.
Foi lendo História da sexualidade I que, com Michel Foucault, pudemos perceber que a forma como a sociedade se configura passa por mudanças; práticas vão se formalizando, e as relações entre os sujeitos acabam adquirindo também novas configurações. Foucault (1979) diz que, na história, já tivemos sociedades que se configuravam com a existência de um poder soberano, um poder em que um sujeito detinha o direito de vida e morte sobre o outro. Muitas vezes, essa morte era um castigo frente a um desrespeito às leis impostas pelo soberano ou se a vida deste soberano fosse colocada em risco. A morte era a marca do poder soberano sobre a vida.
Na medida em que a sociedade vai adquirindo novas configurações, o poder muda seu direcionamento e destina-se à maximização da produção de força dos corpos, fazendo-a crescer e ser ordenada. Isso é feito pelo controle do tempo dos sujeitos, de seus corpos, da economia, do uso de seus próprios saberes. Essa é a função das instituições de sequestro, que visam à gestão da vida pelos poderes e saberes, que acabam assumindo uma função de policiamento. Essa nova forma de gestão das vidas força o direito de morte a uma forma de poder que gere a vida.
Podemos exemplificar isso considerando países quando em guerra, que demonstram seus poderes de morte ao aniquilarem populações inteiras em nome da existência de outras. A lógica muda - passa do poder do soberano sobre a vida e configura-se pela vida de um Estado sobre outro Estado. Em um nível individual, a exemplificação dá-se pelo fenômeno da pena de morte - um fenômeno que chega ao limite, ao escândalo e à contradição frente à lógica da vida, mas é dispositivo que funciona para a sociedade, já que o sujeito é tido como risco biológico aos outros.
Esses acontecimentos demonstram formas de governo e de resistências que configuram a política de gerir a vida. Entendendo-se o corpo como máquina, um corpo que produz, esse corpo também é compreendido como espécie, que pode proliferar e trazer o nascimento, mas carrega em si a mortalidade. É produzida, assim, uma biopolítica da população a partir de intervenções e reguladores. Foucault (1979) afirma que se instaura a era do biopoder, visando as tecnologias para a sujeição dos corpos e controle das populações, e uma das formas de intervir nesses corpos é pelo dispositivo da sexualidade, que para o autor é um "dispositivo histórico" (1979, p. 100).
[...] queremos chamar a atenção para o fato de que, a partir do momento em que a população se torna um elemento fundamental para as ações administrativas que têm como gestor principal o Estado, vemos aí a inclusão de uma diversidade de tipos de vida que, no mundo antigo e medieval, não estavam incluídos previamente: crianças, loucos, velhos, pobres, mulheres, etc. passam a receber investimento do Estado (Scisleski & Bernardes, 2014, p. 132).
A Psicologia é reconhecida pelo meio acadêmico e social como responsável por entender, reconhecer e analisar processos inerentes às coletividades humanas, grandes e pequenas, para assim administrar indivíduos e organizações. A Psicologia Social, estando ligada à democracia, produz uma regulação de cidadãos democraticamente mediante sua relação com o outro, alinhando o governo com a dinâmica social daquilo que será governado. Sendo assim, a natureza social dos homens deve ser (re)conhecida, para que eles sejam adequadamente governados (Rose, 2008).
Existe esse investimento no corpo pela via do dispositivo da sexualidade. A Psicologia, como ferramenta de controle, começa a invenção de tecnologias de controle para que se coloquem esses corpos em maquinarias de subjetivação.
A cisgeneridade age como um regime de poder, onde quem é normal, é aquele ao qual o gênero, a forma como ele se reconhece, é a do sexo de nascimento. Assim é tido como natural o sujeito se reconhecer a partir do seu sexo biológico, sendo que os transgêneros estão nessa outra margem, dos anormais e da patologia (Vergueiro, 2015). É por essa inscrição biológica, que o psicológico deveria reconhecer e se adaptar a ele, então saberes são produzidos, uma vez que a norma é a cisgeneridade. Butler (2001) aponta como o sexo, entendido como categoria, é normativo, ou seja, é parte de uma prática regulatória que produz os corpos que governa. Toda força regulatória manifesta-se como uma espécie de poder de produzir, demarcar, diferenciar os corpos que ela controla.
A patologização de experiências ou de expressões de gênero fora da norma começou a configurar-se como um mecanismo que assegura a própria existência da naturalização das identidades (Bento, 2017b). Assim, nessa negociação, dentro desse jogo, que a própria população trans, forja seu próprio discurso, onde adentra dentro da política pública, faz uso dela, captura os saberes e lógicas produzidas nesse campo a seu favor. O movimento social é esse tensionador, uma vez que resiste e ele próprio produz saberes sobre ele próprio.
Corpos que resistem em existir
Partindo desses entendimentos que apostamos no corpo como potencializador, pois o corpo trans, o nosso e o desta pesquisa trazem em si as experiências da homossexualidade, da sexualidade e do feminismo. É pelo corpo que as filosofias e teorias podem potencializar o próprio modo de se fazer ciência e incluindo a própria psicologia, sendo assim ela própria resistência entre os saberes que governam essas vidas.
Começamos trazendo o corpo queer, esse que é estranho, diferente e esquisito (Louro, 2015). Ele quer enfrentar o que é posto como norma pelo poder, porque ele provoca e quer perturbar.
Corpos assim não são tolerados, pois profanam os dispositivos de nossa sociedade; não que eles não sejam capturados, mas resistem e transgridem. Butler (2001) explica como esses corpos perturbam, a partir do feminismo e do queer,
[...] a mobilização das categorias do sexo no interior do discurso político será assombrada, sob certos aspectos, pelas próprias instabilidades que as categorias efetivamente produzem e integram.... De fato, pode ocorrer que tanto a política feminista quanto a política queer sejam mobilizadas precisamente através de práticas que enfatizem a desidentificação com aquelas normas regulatórias pelas quais a diferença sexual é materializada. Essas desidentificações coletivas podem facilitar uma recontextualização da questão de se saber quais corpos pesam e quais corpos ainda devem emergir como preocupações que possam ter um peso crítico (p. 156).
Weeks (2001) evidencia que, como o corpo é uma via de prazer e dor, não devemos esquecê-lo. É pelo corpo, e por existirem diferentes configurações deste, que podemos pensar também em outras formas de experiência. Conforme Rose (2013), podemos pensar em cidadanias biológicas, em que passamos a nos entender mais profundamente como seres biológicos; sendo portadores de direitos e deveres, também temos formas de interagir e de nos relacionar com os outros e com nós mesmos, sendo que um dos nossos direitos que têm maior força é o de intervir livremente em nossos corpos. O autor afirma que, com esse entendimento, existe um controle absoluto sobre os processos vitais do corpo, abrindo-se um campo de processos e intervenções em que podemos modificar o corpo por nossa escolha.
Quando a Psicológico conforma-se como parte de tratamentos em saúde, por exemplo, no que se refere à qualidade de vida, não se trata apenas de um projeto político, pois implica que abordemos essa possibilidade de relação com o corpo e a existência como uma forma de pensar a saúde. Operam sobre nós mesmos certos modos particulares de existência e de relação conosco que transformam o discurso da saúde em existências saudáveis mediante práticas psicológicas e biológicas (Medeiros, Bernardes & Guareschi, 2005, p. 269).
O corpo, por ser influenciado por novas formas de poder e saber, produz outras formas de subjetividade. Menosprezar o entendimento biológico corporal e, atualmente, as intervenções possíveis no corpo é tentar apenas manter a primazia das questões do psiquismo frente ao corpo, ou a supremacia do corpo frente ao psicológico. É necessário trazer o contexto das biomedicinas às ciências sociais e humanas para potencializar algumas críticas e análises da produção da ciência. Nas questões de formas de existência e de experiência, o corpo trans é um expoente em nos presentificar com transgressões das barreiras de uma visão única das ciências, mostrando-nos como ele viaja e se multiplica, quando o vemos como sexo, escancarado nas ruas, em atos políticos, nos hospitais, nos direitos humanos e nas políticas públicas (Mol, 2008).
Foi focalizando processos e dando-lhes ênfase, seguindo os rastros que estavam sendo produzidos de campos e corpos efetivados, "forjados pelas tecnologias humanas que produzem ontologias do presente, que pudemos trazer essa outra política de pesquisa com o pós-estruturalismo" (Moraes & Bernardes, 2014, p. 7). Foi assim que trouxemos esse avesso, em que o corpo trans é o problematizador, e não mais uma vez o problematizado. Com isso, pudemos traçar as linhas pela qual a Psicologia está colocando seus saberes e práticas à disposição das demandas diretas da Medicina e, desse modo, encontrando certo conforto no sofrimento. Mas é quando é tensionada pelos movimentos sociais que ela traz a sua potência, e se coloca como resistência, nas produções junto às políticas públicas e com o trabalho de despatologização dessas formas de existência.
Foi também trazendo a teoria queer e teóricas feministas, aos quais entendem esses corpos como potência que podemos pensar e problematizar as práticas dos profissionais da Psicologia nesse campo, como também um lugar para a Psicologia se enveredar e inventar suas práticas discursivas, para olhar para o corpo trans além do sofrimento e potencializar sua existência como resistência e transgressão das normas impostas a essa população. Que a Psicologia se distancie das práticas colonizadoras do saber e se junte ao corpo trans para criar saberes que transgridam o saber médico enclausurador, sendo resistência frente aos regimes de verdade da heteronormatividade e cisnormatividade.
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Endereço para correspondência:
Luis Henrique da Silva Souza
luis.henri.que@hotmail.com
Anita Guazzelli Bernardes
anitabernardes1909@gmail.com
Submetido em: 13/03/2019
Revisto em: 20/05/2019
Aceito em: 20/06/2019