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Psicologia para América Latina
versão On-line ISSN 1870-350X
Psicol. Am. Lat. no.32 México nov. 2019
Avaliação da adaptação ao ensino superior
Evaluation of adaptation to higher education
Evaluación de la adaptación a la enseñanza superior
Anita Castellani HonórioI; Fernanda OttatiII; Felipe Augusto CunhaIII
IUniversidade São Francisco (USF)
IIUniversidade São Francisco (USF)
IIIUniversidade São Francisco (USF)
RESUMO
A adaptação ao ensino superior pode trazer diversos desafios aos estudantes e por isso, a não adaptação e evasão no ensino superior, têm apresentado altos índices em estudantes universitários, demonstrando a importância de se entender como se dá a adaptação acadêmica. A pesquisa teve como objetivo avaliar a adaptação ao contexto universitário em alunos de diferentes cursos e semestres. Participaram 239 estudantes universitários, dos cursos de Administração (n= 19), Ciências Contábeis (n= 28), Engenharia Civil (n= 23), Engenharia de Produção (n= 26), Fisioterapia (n= 50), Pedagogia (n= 42) e Psicologia (n= 51), com idades média de 22,5 e 65,8% eram mulheres. O instrumento utilizado foi o Questionário de Adaptação ao Ensino Superior (QAES). Os resultados indicaram que os estudantes obtiveram médias maiores nas dimensões projeto carreira, adaptação institucional e adaptação social, demonstrando boa adaptação na universidade e escolha de curso.
Palavras-chave: adaptação acadêmica; experiências acadêmicas; vivências universitárias; evasão; estudantes universitários
ABSTRACT
The adaptation to higher education can bring several challenges to students and therefore, non-adaptation and avoidance in higher education, have presented high rates in university students, demonstrating the importance of understanding how academic adaptation occurs. The research had as objective to evaluate the adaptation to the university context in students of different courses and semesters. A total of 239 university students attended the courses of Administration (N = 19), Accounting (N = 28), Civil Engineering (N = 23), Production Engineering (N = 26), Physiotherapy (N = 50), Pedagogy = 42) and Psychology (N = 51), with mean ages of 22.5 and 65.8% were women. The instrument used was the Adaptation to Higher Education Questionnaire (QAES). The results indicated that the students obtained higher averages in terms of career design, institutional adaptation and social adaptation, demonstrating good university adaptation and course choice.
Keywords: academic adaptation; academic experiences; university experiences; evasion; university students.
RESUMEN
La adaptación a la enseñanza superior puede traer diversos desafíos a los estudiantes y por eso, la no adaptación y evasión en la enseñanza superior, han presentado altos índices en estudiantes universitarios, demostrando la importancia de entender cómo se da la adaptación académica. La investigación tuvo como objetivo evaluar la adaptación al contexto universitario en alumnos de diferentes cursos y semestres. (n= 23), Ingeniería Civil (n= 23), Ingeniería de Producción (n= 26), Fisioterapia (n= 50), Pedagogía (n= 42) y Psicología (n= 51), con edades promedio de 22,5 y 65,8% eran mujeres. El instrumento utilizado fue el Cuestionario de Adaptación a la Enseñanza Superior (QAES). Los resultados indicaron que los estudiantes obtuvieron promedios mayores en las dimensiones proyecto carrera, adaptación institucional y adaptación social, demostrando buena adaptación en la universidad y elección de curso.
Palabras clave: adaptación académica; experiencias académicas; vivencias universitarias; la evasión; estudiantes universitarios.
Introdução
A passagem do ensino médio para o Ensino Superior (ES) gera grandes expectativas para os estudantes. Esse processo único é acompanhado de sentimentos diversos, como alegria, tristeza, angústia, felicidade, assim como, é mais simples para alguns do que para outros. Esta transição acarreta diversas transformações na vida do aluno e exige um desenvolvimento emocional e psicossocial (Anjos & Silva, 2017).
O contexto universitário se contrasta e se difere do que foi vivido no ensino médio e se associa a maior autonomia e independência pessoal, bem como, a maiores responsabilidades, proporcionando o desenvolvimento de novas relações, demonstrando assim, como se dá a adaptação acadêmica em diferentes e novos contextos, para cada estudante. Estes contextos são os novos hábitos de estudo e criação de vínculos, adequação aos professores universitários e ambiente físico, por conta do método de ensino do ES se diferenciar ao da escola (Zanon, Rosin, & Teixeira 2014).
O ES exige do estudante maior autonomia, o que a nível acadêmico, cobra certo ajustamento e adaptação do aluno, tanto afetivo quanto psicológico, emocional e social. O estudante precisa, de forma integrada, aderir a novos papéis e comportamentos, e se possível, estas variáveis devem ser vividas de forma positiva, o que exige esforço e persistência, para que uma melhor adaptação ao contexto acadêmico ocorra (Barros & Moreira, 2013; Souza, Lourenço, & Santos, 2016; Tavares, 2012).
Oliveira, Santos e Inácio (2018) definem a adaptação acadêmica como a capacidade do aluno em se integrar ao ensino superior, sendo que para isso, é necessária a mobilização de processos cognitivos, sociais e afetivos. Esses processos, podem levar a diferentes situações de aprendizado, o que acarretará ganhos para sua formação profissional. O processo de adaptação acadêmica ao ES é fundamental, pois irá ajustar o aluno para a nova realidade em que está inserido, e com isso, estabelece como agirá durante a vida acadêmica. O ambiente universitário oferece desafios, portanto, o sujeito deve achar equilíbrio entre expectativas, fracassos e a nova realidade. Nestes pontos, pode surgir certa dificuldade de integrar as novas atitudes com o que o ES irá cobrar e oferecer, porém, o desenvolvimento destas, é fundamental para a adaptação a universidade, bem como, prediz o sucesso ou fracasso acadêmico (Anjos & Silva, 2017).
O processo de adaptação é visto como complexo e multifacetado, sendo assim, a vida acadêmica depende diretamente da interação entre indivíduo e meio, produzindo a experiência e vivência universitária. Segundo Oliveira, Santos e Inácio (2018), as novas experiências acadêmicas integram as expectativas inicias sobre o ingresso à universidade, com vivências anteriores, o que leva o estudante a assimilar melhor as exigências do ES, a organização pessoal e novos aprendizados, além de promover vivências satisfatórias sociais, grupais e intelectuais, além do ajustamento à nova realidade. É interessante considerar que cada indivíduo apresenta aspectos característicos únicos, que demonstram a forma como ele reagirá frente a diversas situações que a universidade pode proporcionar (Santos et al., 2013).
Conforme os problemas e desafios do ingresso a universidade foram surgindo, alguns estudos em torno da adaptação acadêmica aconteceram. Com isso, os fatores que levam a vivências satisfatórias no contexto universitário foram investigados a partir de 1999 em Portugal. Almeida, Ferreira e Soares (1999), não encontraram inicialmente, instrumentos de avaliação que envolviam as dimensões pessoais e contextuais dos indivíduos e a partir disso criaram o Questionário de Vivências Acadêmicas (QVA). Levando em conta uma linha psicológica, o QVA foi criado para investigar um conjunto de variáveis psicossociais tomando características dos indivíduos e as suas percepções dentro da universidade. Os autores chegaram à conclusão de que a adaptação à universidade gira em torno de alguns aspectos que podem ser descritos como, os estudos (hábito de estudo, dedicação ao estudo, administração de tempo), carreira (como o aluno se sente em relação ao curso e ao futuro na carreira), pessoal (bem estar emocional e físico, autoconfiança e otimismo), interpessoal (criação de vínculos, interação com colegas e novas amizades) e institucional (sentimento sobre a escolha da instituição).
Após a realização de uma revisão e criação de uma versão reduzida do QVA, o QVA-r, Araújo et al. (2014), criaram o Questionário de Adaptação ao Ensino Superior (QAES), que visa uma reestruturação do QVA e QVA-r. Como o QVA foi criado em 1999 contendo 170 itens, o QAES foi pensado de modo a integrar as versões anteriores e com isso, implementar atualizações sobre novos estudos da adaptação ao ensino superior, e também, buscou considerar a alteração das grades curriculares, criação de novos cursos, novas perspectivas culturais e econômicas, além do aumento de indivíduos ingressantes nas instituições de ES.
As universidades têm obtido um papel fundamental para oferecer conhecimento aos alunos, porém, é necessário que possam ser criadas estratégias para adaptação de novas situações acadêmicas. Há uma relação entre a satisfação acadêmica e o progresso dos alunos na universidade com os objetivos de vida. Conforme o aluno se encaixa na vida acadêmica, consegue projetar seu futuro profissional e com isso se empenhar no curso e em suas relações, desenvolvendo competências que serão levadas por toda vida (Faria, Pinto, & Taveira, 2014). Anjos e Silva (2017) dizem que, mais da metade dos estudantes mostram dificuldades no momento da transição acadêmica, o que prediz as taxas de evasão, principalmente nos primeiros anos de curso. Para que isso não ocorra, as instituições ES deveriam se preocupar com as altas taxas de abandono, promovendo suporte e condições em que o aluno possa se desenvolver ao máximo, para que mais tarde o indivíduo esteja preparado para assumir seu papel profissional na sociedade.
Ambiel e Barros (2018) aplicaram o QAES em 198 estudantes universitários, ambos os sexos, com idade variando de 18 a 52 anos, em várias universidades tanto públicas, quanto privadas, e em diversos semestres de 67 cursos diferentes. Em relação aos cursos, havia estudantes de Psicologia, Direito, Administração, Hotelaria e Relações Públicas. Sobre aspectos sociais, os autores identificaram que quanto maior a difi uldade de criação de vínculos, maiores as chances de abandono do curso, para isso, chamam a atenção para a necessidade de atividades integradoras. Os fatores que envolvem a satisfação com a escolha profissional, indicam que, estudantes mais satisfeitos com seu curso tendem a se organizar, se adaptar e se desenvolver melhor, além de se engajar nos métodos de ensino, gerando ótimo desempenho e minimizando a evasão acadêmica, sendo assim, vivenciando de forma plena as vivências universitárias.
Já Oliveira, Santos e Inácio (2018), aplicaram o QAES em 628 universitários, de diferentes semestres, de quatro universidades, duas públicas e duas privadas. A média de idade foi de 22,90 anos e a maioria era do sexo feminino (65,6%). O questionário foi usado nos cursos de Psicologia, Contábeis, Letras, Odontologia, Agronomia, Direito, Administração, Medicina, Arquitetura e Urbanismo e Engenharia Civil. Os resultados mostraram que a dimensão carreira foi a mais pontuada, sendo evidenciada a satisfação com a escolha acadêmica. Além do mais, esta dimensão revela uma integração com um nível satisfatório de adaptação, identificando que os alunos possuem recursos emocionais para lidar com a adaptação ao ES. Apesar do nível satisfatório de adaptação, a discussão mais relevante realizada pelos autores foi entre os cursos. As dimensões do QAES são pontuadas de diferentes formas dependendo do curso, Psicologia foi o que alcançou pontuações mais elevadas, porém, foi o curso que houve maior número de participantes, o que pode ter afetado o resultado. Ademais, os resultados mostram que os estudantes deste curso possuem maior conhecimento de si, maior adaptação ao ES, maior satisfação com suas escolhas, além de conseguirem se motivar mais e apresentarem maior facilidade em fazer novas amizades e aderir ao cronograma do curso, o que conforme destacada anteriormente, favorece a adaptação acadêmica.
É fundamental entender como os alunos se adaptam aos processos acadêmicos, como superam desafios pessoais, como lidam com emoções, com novas rotinas e como a instituição dará suporte aos estudantes. Para Anjos e Silva (2017), os métodos de ensino influenciam na maneira em que os sujeitos superarão as novas experiências. Ambiel e Barros (2018), dizem que, a escolha equivocada da profisão é um dos principais fatores para a evasão, porém em ambos os estudos, há a concordância de que as políticas educacionais, os métodos de ensino, flexibilidade de atividades e horários e a integração de todos os fatores emocionais, sociais e educacionais de um aluno, favorecem a criação de estratégias que permitirão o sucesso do aluno na adaptação acadêmica.
A evasão universitária é um fenômeno social complexo que vem preocupando as instituições de ensino. Há poucas pesquisas sobre esse tema, assim como poucos programas que combatem a evasão com ações, acompanhamentos e coletas de experiências bem-sucedidas ou não (Anjos & Silva, 2017; Ambiel & Barros, 2018). Frente a isso, é indispensável entender como a adaptação acadêmica ocorre com cada indivíduo durante a graduação, para isso o objetivo deste estudo é avaliar a adaptação acadêmica no ensino superior, verificando as diferenças da adaptação na universidade em relação ao sexo dos estudantes, idade, semestre e se o aluno trabalha.
Objetivo
Verificar as diferenças da adaptação na universidade em relação ao sexo dos estudantes, idade, semestre e se o aluno trabalha.
Método
Participantes
Participaram deste estudo 239 estudantes universitários, com idade entre 17 e 49 anos (M=22,55; DP=5,85). Em relação ao sexo, 65,3% (n= 156) eram mulheres e 33,9% (n= 81) homens. Os estudantes eram dos cursos de Administração (7,9%; n= 19), Ciências Contábeis (11,7%; n= 28), Engenharia Civil (9,6%; n= 23), Engenharia de Produção (10,9%; n= 26), Fisio terapia (20,9%; n= 50), Pedagogia (17,6%; n= 42) e Psicologia (21,3%; n= 51). Dentre estes cursos 72,8% dos alunos eram do 2º semestre; 9,6% do 4º semestre; 7,9% do 8º semestre e 9,6% do 10º semestre.
Instrumento
Foi utilizado o instrumento Questionário de Adaptação ao Ensino Superior (QAES). O QAES tem como objetivo aprofundar os estudos sobre o processo de adaptação, de vivências e integração acadêmica. Este se compõe de 40 itens e é utilizada a escala Likert de cinco pontos (Cardoso, Garcia, & Schroeder, 2015). O questionário é dividido em 5 dimensões principais: (a) Planejamento de Carreira, diz respeito às percepções em relação ao curso escolhido e sua perspectiva de carreira, o que inclui a satisfação da escolha e as competências do aluno para o curso; (b) Adaptação Social, envolve as percepções do sujeito referente aos seus relacionamentos dentro da instituição de ensino, o estabelecimento de novas amizades e procura de ajuda caso necessário; (c) Adaptação Pessoal Emocional, engloba os sentimentos experimentados pelos alunos nas semanas anteriores a realização do questionário e envolve equilíbrio psicológico, autoconfiança, otimismo e bem-estar físico e psicológico; (d) Adaptação ao Estudo, indica as percepções do estudante frente ao seu desempenho e forma de estudar, como por exemplo gestão do tempo, hábitos, manejo para tarefas e preparação para provas; e por fim, (e) Adaptação Institucional, inclui os sentimentos relacionados com a instituição, além da vontade de ficar no local até a conclusão do curso (Oliveira, Santos, & Inácio, 2018; Santos et al., 2013).
Procedimento
Primeiramente, foram solicitadas as cartas de autorização dos diretores dos câmpus da universidade particular. Após isso, o projeto foi encaminhado e aprovado (CAAE: 97953318.5.0000.5514) pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade São Francisco. Posteriormente, foi feito contato com os coordenadores dos cursos para agendar as datas com os professores. Após o agendamento, o questionário foi aplicado coletivamente, tendo sido explicado aos participantes os objetivos da pesquisa e solicitado que a concordância fosse expressa por meio do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O tempo médio de aplicação foi de aproximadamente 40 minutos por turma.
Plano de análise de dados
As diferenças em relação a sexo e se já trabalha, foram verificadas por meio do Teste t de Student. Os dados foram organizados em tabelas, separados conforme as dimensões do questionário, levando em conta as variáveis sexo e se o curso foi a primeira opção, além de apresentar as médias de cada dimensão englobando todos os indivíduos.
Resultados e discussão
Inicialmente, por meio de estatísticas descritivas, foi possível verificar as pontuações médias dos alunos nas cinco dimensões do Questionário de Adaptação ao Ensino Superior (QAES). Estas informações constam na Tabela 1.
Como pode ser observado na Tabela 1, a dimensão projeto de carreira apresentou a maior média entre as dimensões (M= 32,74). Conforme Oliveira, Santos e Inácio (2018), a dimensão projeto de carreira se refere a sentimentos relacionados ao curso escolhido e a perspectiva para carreira. Desta forma, verifica-se a satisfação entre os alunos nesta dimensão, o que facilita o planejamento da carreira. Santos et al. (2013), evidenciam que a dimensão carreira também foi a que apresentou a maior média, o que mostra que a maioria dos alunos se sentem realizados com sua escolha e se percebem aptos a seguir carreira no curso escolhido.
Cardoso, Garcia e Schroeder (2015), trouxeram dados sobre a adaptação nesta mesma dimensão, o que de modo semelhante, verifica-se que os universitários estavam seguros sobre a escolha do curso. Assim, foi possível realizar uma comparação entre a satisfação do curso escolhido com a maneira em que a instituição acolhe os ingressantes. Para os autores, a instituição de ensino possui papel fundamental para amparar os alunos em sua trajetória acadêmica. Segundo os dados da Tabela 1, a dimensão adaptação institucional, possui a segunda maior média (M= 31,88), mostrando, satisfação dos alunos com a instituição, sendo possível com isso, identificar a semelhança com o estudo de Cardoso, Garcia e Schroeder (2015).
As dimensões projeto de carreira e adaptação institucional, podem ser vistas principalmente nos ingressantes. Considerando que, 72,8% dos alunos são do 2º semestre, pode-se dizer que os alunos possuem interesse na universidade e se adaptaram bem à transição para o ensino superior, no que diz respeito a satisfação com a universidade e o curso de sua escolha. Anjos e Silva (2017) ressaltam que, conforme o aluno vai avançando de semestre, vai se adaptando mais a realidade acadêmica, se ajustando mais após a fase inicial de insegurança e mudanças, isso se dá por conta da facilidade em criar estratégias para adaptação ao novo, além da identificação com o curso escolhido.
A dimensão adaptação social (M= 31,34), apresentou uma média bem próxima das dimensões anteriores. Esta dimensão discute os relacionamentos dos indivíduos na universidade e como tem acontecido, indicando que, no geral, os alunos gostam da instituição de ensino, desejam permanecer nela até o fim do curso e que os sujeitos possuem boas percepções em seus relacionamentos com os colegas. Ambiel e Barros (2018), identificaram a dificuldade de criação de vínculos dos alunos e a associaram com a evasão escolar. Os autores descrevem que se há a dificuldade de se vincular, há maiores chances de os alunos não estarem satisfeitos com o curso escolhido e consequentemente, podem até mesmo o abandonar. Porém, é interessante observar que, segundo os autores, pessoas satisfeitas com a escolha do curso tendem a se organizar mais em seus estudos, engajando relacionamentos e apresentando boa adaptação ao ensino superior, além de criarem vínculos mais facilmente.
As dimensões estudo (M= 28,53) e pessoal emocional (M= 22,27), apresentaram médias mais baixas que as demais. Na dimensão estudo avalia-se a percepção dos alunos em relação a seu desempenho, forma de estudar e tempo de estudo. Na dimensão pessoal emocional é avaliada a experiência de sentimentos nas últimas semanas.
Levando em conta as responsabilidades que a universidade impõe, os alunos podem apresentar algumas dificuldades de adaptação, o que se identifica na dimensão estudo e dimensão pessoal emocional. Fatores internos como as emoções sentidas e postura diante das atividades propostas podem ser preditoras de uma média mais baixa nessas dimensões. É necessário com isso, que o aluno se empenhe nas situações acadêmicas e se desenvolva emocionalmente com o ambiente e os colegas, para que as vivências universitárias possam ser satisfatórias (Costa & Leal, 2005; Silva & Ferreira, 2014; Tavares, 2012).
Os dados obtidos na dimensão pessoal emocional se relacionam com os encontrados por Ambiel e Barros (2018), concluindo que há sentimentos que tem sido experienciados de forma não tão satisfatória para os alunos. Essa dimensão envolve equilíbrio psicológico, autoconfiança, otimismo e bem-estar físico e psicológico. Segundo Anjos e Silva (2017) a passagem do ensino médio para o ensino superior para estes alunos, pode ter ocorrido com algumas dificuldades, exigindo dos alunos habilidades emocionais que ainda podem estar se desenvolvendo. Por conta disso os alunos também podem apresentar dificuldades de organização para os estudos, verificado média da dimensão estudo.
Para Dias (2013), nem sempre os indivíduos já estarão estruturados emocionalmente e psicologicamente para a adaptação acadêmica, pois, a rotina, os horários, as tarefas e todo o processo de adequação levam tempo, além da motivação e otimismo do sujeito. Por conta disso, Ambiel e Barros (2018), discutem a importância de a instituição dispor de atividades que auxiliem na transição do ensino médio para o ensino superior, para que a adaptação ocorra de forma satisfatória.
Foi verificado que há diferenças estatisticamente significativas em relação à média em algumas dimensões do QAES de acordo com o sexo. Tais dados podem ser vistos na Tabela 2.
Ficou evidenciado que a dimensão projeto de carreira tem pontuação maior no sexo feminino, indicando que nessa amostra, as mulheres possuem melhor perspectiva em relação ao seu futuro profissional. Na dimensão adaptação institucional, as mulheres também apresentaram médias maiores que os homens, sendo essa diferença significativa, indicando que as mulheres estão mais satisfeitas com a instituição. Isso ocorreu também nas pesquisas de Ambiel e Barros (2018), Cardoso, Garcia e Schroeder (2015), Oliveira, Santos e Inácio (2018), Santos et al. (2013).
Já na pesquisa de Anjos e Silva (2017), os estudantes do sexo masculino obtiveram médias superiores na dimensão institucional e na dimensão projeto de carreira não houve diferenças estatisticamente significativas entre os gêneros. Apesar disso, os autores evidenciaram que as mulheres geralmente apresentam maiores competências para os estudos, são mais organizadas e desenvolvem melhor seus trabalhos e tarefas, além de participarem mais das aulas. Também foi evidenciado por eles que as mulheres apresentam maiores dificuldades em questões emocionais do que os homens por possuírem maiores expectativas quanto ao curso e suas relações sociais. As dimensões que falam sobre isso são a adaptação pessoal e emocional e adaptação ao estudo, porém, não apresentaram dados estatisticamente significativos.
Na Tabela 3, os dados mostram que a única dimensão que apresenta diferenças estatisticamente significativas é a projeto de carreira, se pensando na escolha de primeira opção do curso.
Pensando nos alunos que selecionaram que o curso escolhido foi a primeira opção, a dimensão projeto de carreira se apresenta com maior clareza para estes indivíduos do que os que disseram que não. Por isso é possível verificar que os alunos que cursam a primeira opção de curso, pensam mais em suas carreiras e tem maiores perspectivas frente ao futuro. Isso pode acontecer por conta das expectativas irreais que alunos ingressantes podem sentir e projetar no início do curso, mostrando que a satisfação da escolha, talvez não seja ainda real e sim, uma expectativa frente o que virá durante a vida acadêmica que ainda não foi experimentada. Com o tempo, essas expectativas dão lugar a realidade institucional e adaptação acadêmica (Anjos & Silva, 2017).
Conclusão
É importante ressaltar as várias dimensões relacionadas a adaptação acadêmica, e como cada uma mostra como se dá essa adaptação. Entre as maiores dificuldades deste estudo, a principal foi de encontrar dados na literatura sobre o QAES, o que demonstra a importância do aprofundamento deste questionário e estudo detalhado de suas dimensões. Este tema demonstra a importância da compreensão, não apenas do estudante, como também da instituição de ensino, de forma que, esta possa criar estratégias preventivas e até mesmo de intervenção durante o curso, para favorecer a adaptação do aluno ao longo dos anos. Anjos e Silva (2017) ressaltam que o ambiente acadêmico necessita equilibrar os desafios e os apoios que irão fornecer aos alunos, o que pode ser desafiador.
Além de um esforço individual e familiar, o meio acadêmico deve oferecer uma rede de apoio aos estudantes, para os ingressantes, como também ao longo das vivências acadêmicas, por conta das dificuldades que podem surgir, para que os alunos possam ser orientados de forma devida. A realização deste tipo de pesquisa é fundamental par fomentar a discussão sobre como as instituições de ES, além dos docentes, podem conduzir os alunos diante das dificuldades encontradas na adaptação ao ensino superior, que perduram durante toda a vida acadêmica. Estes resultados abrem a possibilidade para que futuramente possa haver outras investigações que possam explorar mais o QAES e suas dimensões, aplicando-o em mais indivíduos em semestres iguais de cursos diferentes, por exemplo, ou até mesmo de universidades diferentes e cursos iguais. As variáveis estudadas por esse questionário podem ser muitas, e como sua utilização ainda não é usual, é importante ressaltar a importância deste instrumento para ampliar os conhecimentos sobre adaptação acadêmica, contribuindo com isso, não só em prol dos alunos como também, de forma que as instituições de ES, possam compreender estes estudantes e entender toda a abrangência das vivências no ensino superior.
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Endereço para correspondência
Universidade São Francisco
Campus Itatiba
Av. Senador Lacerda Franco, 360
Centro Itatiba-São Paulo, Brasil
CEP: 13250-400
Recebido em: 06/2019
Reformulado em: 07/2019
Aceito em: 10/2019
Sobre os autores:
Anita Castellani Honório
Graduanda em Psicologia pela Universidade São Francisco (USF)
E-mail: anitacastellani_75@hotmail.com
Orcid.org/0000-0001-8535-8105
Fernanda Ottati
Psicóloga, Doutora e Mestre pelo Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco. Docente do curso de Psicologia da Universidade São Francisco.
E-mail: fernanda.ottati@usf.edu.br
Orcid.org/0000-0002-4799-2014
Felipe Augusto Cunha
Psicólogo pela Universidade São Francisco, Itatiba. Mestre e Doutorando em Psicologia pelo Programa de Pós-graduação stricto sensu da Universidade São Francisco, com ênfase em Avaliação Psicológica em Saúde Mental como bolsista CAPES
E-mail: flpcunha@terra.com.br
Orcid.org/0000-0001-7977-9712