Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia
ISSN 1983-8220
ARTIGOS
Prevenção e promoção de saúde na escola: concepções e práticas de psicólogos escolares
Prevention and promotion in health: conceptions and practices of school psychologists
Marisa Cosenza Rodrigues*; Chiara Zanzoni Itaborahy; Marina Duarte Pereira; Talita Medeiros Costa Gonçalves
Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, MG
RESUMO
A pesquisa objetivou investigar concepções e práticas de psicólogos escolares da cidade de Juiz de Fora (MG) acerca da prevenção e da promoção de saúde. Participaram do estudo 23 profissionais. Foi utilizado um roteiro de entrevista semi-estruturado submetido à análise de conteúdo. Os dados revelam uma deficitária formação teóricoprática na área de psicologia escolar; destacando-se um enfoque teórico múltiplo, além de deficiências no âmbito do estágio acadêmico. As concepções relativas à prevenção indicam uma ênfase na prevenção primária. Quanto à prática, evidenciaram-se, contraditoriamente, estratégias individuais que priorizam os próprios alunos. Em relação à promoção, a perspectiva predominante é a de favorecer o desenvolvimento de competências, geralmente com o foco em uma concepção de cunho educativo. Foram evidenciadas dificuldades relativas ao exercício profissional principalmente no que se refere à falta de apoio dos pais. Os resultados indicam concepções generalistas e superficiais, o que leva à constatação da necessidade de atualização teórico-prática dos profissionais.
Palavras-chave: atuação proativa; psicologia escolar; formação profissional.
ABSTRACT
Conceptions and practices of school psychologists about prevention and promotion in health were investigated. Participants were twenty-three professionals from Juiz de Fora (Brazil). A short semi-structured interview was used, and reports were submitted to content analysis. Results indicated flaws in theoretical and practical aspects of school psychology (with emphasis on an eclectic theoretical basis) and academic internship. Health prevention conceptions highlighted primary prevention. However, professional practice was reported as based on individual strategies with main focus on the students. Health promotion was predominantly understood as competence development, with focus on an educational perspective. Parents' lack of support was experienced as challenging to the participants' professional practice. We argue that these results indicate general and superficial conceptions, indicating the need for practical and theoretical updates in professional education.
Keywords: proactive performance; school psychology; professional education.
Nas últimas décadas, o trabalho do psicólogo que atua na educação, aqui identificado como psicólogo escolar/ educacional, vem sendo alvo de críticas cada vez mais contundentes em nosso meio. Esse movimento de crítica, conforme aponta Guzzo (2001) e Joly (2000), tem contribuído para sensibilizar os psicólogos quanto à ineficiência de determinadas práticas profissionais no contexto educativo, sobretudo, práticas eminentemente remediativas de atuação, centradas no modelo clínico de intervenção.
Como demonstram pesquisas realizadas por Rodrigues (2004), Rossi e Paixão (2003), o psicólogo que atua no contexto educativo é visto, sobretudo por professores, como sendo importante dentro da escola. Segundo a pesquisa de Escudero et al. (1996), 85% dos professores entrevistados afirmam a necessidade da presença do psicólogo: eles entendem que o mesmo contribui para a superação das dificuldades de professores e de alunos. O estudo de Rodrigues (2004) demonstra, no entanto, que há uma tendência, por parte dos professores, de associar a necessidade de atendimento às dificuldades e aos problemas, já instalados na criança, de alguma forma. Os professores consideram que o psicólogo escolar pode auxiliar tais crianças na resolução imediata de seus problemas e de suas dificuldades demanda que tem marcado historicamente os encaminhamentos e a visão tradicional de um modelo clínico, como destacam Almeida (1999) e Maluf (2003, 2005).
Como observa Cruces (2005), atualmente, os psicólogos escolares parecem estar mais preocupados com a necessidade de redimensionar sua atuação e de empreender atividades mais promotoras de saúde e de desenvolvimento humano na educação. Ainda que convivam com dificuldades de inserção e de reconhecimento profissional por parte do sistema educacional brasileiro, os profissionais vêm buscando um modelo mais próximo das estruturas escolares, bem como uma prática mais contextualizada, participativa e criativa junto aos professores e aos alunos, assim entende-se ser possível exercer sua função de mediador e de promotor de relações interpessoais.
Considerando as especificidades econômicas, socioculturais e educacionais limitadoras da realidade latino-americana, autores como Feldman (1994), Guzzo (2001) e Del Prette e Del Prette (2003) assinalam que uma perspectiva de atuação mais proativa é mais qu e necessária, é urgente e possível em nosso meio: consiste, na prática, no grande desafio a ser enfrentado pelos psicólogos escolares neste novo milênio. Senna e Almeida (2005) observam que há uma tendência dos especialistas da área no sentido de procurar desmistificar a imagem do psicólogo escolar como "salvador" dos problemas educacionais, e de promover questionamentos, oportunidades de reflexão e de escuta, além da partilha de conhecimentos psicológicos necessários para o entendimento das questões educativas. Se há uma tendência indicando expectativas docentes ainda bastante tradicionais quanto à atuação dos profissionais em questão, torna-se necessário investigar se os próprios psicólogos escolares estão comprometidos com a mudança de paradigma do ponto de vista de suas concepções e de sua prática nos contextos educativos. Para Andrada (2005), é necessário que o psicólogo escolar redimensione sua atuação, que promova transformações no âmbito das práticas cristalizadoras acerca do desenvolvimento humano no sentido de implementar estratégias mais proativas. É preciso deslocar, como afirma Guzzo (2001), o foco da doença para o da saúde, o do fracasso para o do sucesso, o dos distúrbios e dificuldades para o das competências e qualidades. A questão que motiva a presente pesquisa é: esse ideário contemporâneo reflete-se nas concepções e nas práticas dos psicólogos escolares que estão atuando nas redes de ensino público e particular de ensino?
O tema da prevenção e da promoção de saúde na escola é bastante amplo e diversificado. De acordo com Lacerda e Guzzo (2005), a prevenção primária engloba ações voltadas a grupos amplos que ainda não apresentam dificuldades e antecedem o surgimento de problemas psicológicos; possui, pois, um caráter educativo. Tais ações objetivam romper o ciclo vicioso que gera problemas sociais, emocionais, cognitivos e comportamentais e visam ao desenvolvimento direto ou indireto de competências específicas que propiciem o bem-estar e a qualidade de vida dos sujeitos. Para os autores, a prevenção secundária, por sua vez, volta-se para populações ou para subgrupos que já exibem sinais precoces de problemas psicológicos; envolvendo um nível de atenção focalizado em grupos de risco ou em intervenções preventivas as quais inibam problemas emergentes nesses grupos. A prevenção terciária constitui o mais específico de todos os níveis, busca minimizar os efeitos, bem como reduzir as conseqüências de uma doença já instalada.
Com base na literatura internacional e em resultados empíricos, Durlak (1997) salienta que a eficácia dos programas, das ações e das intervenções preventivas conjuga estratégias desenvolvidas no âmbito dos sistemas sociais e institucionais onde os indivíduos estão inseridos, e aquelas centradas nos próprios indivíduos. O primeiro conjunto de estratégias, voltado para o sistema social, tem por objetivo eliminar as causas e os fatores agravantes dos problemas e dos desajustamentos por meio de mudanças realizadas no ambiente. Tal gama de estratégias visa à eliminação ou à minimização dos agentes estressores.
O segundo conjunto de ações, mais centrado nos próprios indivíduos, envolve estratégias direcionadas para a promoção da saúde psicossocial através do desenvolvimento de estratégias específicas que permitam a tais indivíduos, por exemplo, o aumento das habilidades interpessoais e comunicativas e o fortalecimento da auto-estima.
A promoção de saúde constitui uma estratégia fundamental no contexto escolar, parte-se da necessidade de buscar o desenvolvimento global do indivíduo, estimulando suas competências e favorecendo sua integração junto à comunidade. Contini (2001) salienta que um projeto de promoção de saúde deve ser realizado por meio de ações do psicólogo escolar que enfatizem o acesso à educação enquanto um bem cultural fundamental para a construção da cidadania das crianças e dos jovens. Durlak (1997) destaca que promover saúde é uma boa alternativa quando se almeja minimizar a ocorrência de problemas futuros, o que possibilita maior proteção à vida das crianças.
As implicações do redimensionamento do conceito de saúde no âmbito da prática dos profissionais que atuam na educação são discutidas por Martinez (1996) e Rey (1997), que destacam a escola como um espaço vital de prevenção e de promoção de saúde. Dentre as razões que contribuem para eleger crianças e jovens como foco prioritário das ações preventivas e promocionais de saúde e de desenvolvimento, Merrel (2002) observa que os jovens são mais maleáveis, flexíveis e receptivos, apresentando uma facilidade maior para modificar seus hábitos e atitudes do que os adultos. Destaca-se que tanto o redimensionamento quanto a maior abertura para a atuação do psicólogo escolar nos meios educacionais sob essa nova ótica pressupõem, então, condições estruturais e funcionais da própria instituição escolar, que, de acordo com Del Prette e Del Prette (2001), necessita assumir novas diretrizes, visando a ampliar o escopo da sua função social; ou seja, a escola necessita estender seus objetivos educacionais para além dos acadêmicos, incluindo a perspectiva mais global de desenvolver as potencialidades humanas.
Nesse delineado contexto teórico-prático, torna-se necessário buscar conhecer e contextualizar as práticas que estão sendo desenvolvidas por psicólogos escolares os quais atuam em escolas das redes pública e privada nas mais diferentes regiões do nosso país. Essa necessidade tem sido destacada, inclusive pela ABRAPEE (Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional), por ocasião dos importantes congressos nacionais realizados na área. Partindo da necessidade e da importância regional de se conhecer a prática do psicólogo escolar, a presente pesquisa objetivou investigar concepções e práticas de psicólogos escolares que estão atuando nas redes pública e privada da cidade de Juiz de Fora (MG), com foco predominante na ótica preventiva e promotora de saúde na escola. Nesse estudo, visamos a investigar se as concepções e práticas dos psicólogos entrevistados se afinam com a tendência proativa atualmente delineada para o trabalho desses profissionais.
Método
Participantes
A identificação dos profissionais contratados da rede particular foi realizada por meio de consulta ao CRP/4ª região, de levantamento e de posterior contato telefônico com todas as instituições de ensino da cidade, incluindo-se escolas de educação infantil, de ensino fundamental e médio e de cursos pré-vestibulares. Os profissionais que atuam na rede pública (municipal) foram identificados mediante listagem disponibilizada pela Secretaria de Educação Municipal de Juiz de Fora e de posterior contato telefônico. Participaram do presente estudo, 23 psicólogos escolares, sendo 15 (65,2%) da rede particular e 8 (34,8%) da rede de ensino público, com idade predominante entre 30 e 39 anos (43%) e entre 40 e 49 anos (35%), a maioria do sexo feminino (92%).
Instrumento
Foi feita uma pesquisa ex post facto, de tipo estudo de campo exploratória. O instrumento utilizado foi um roteiro da entrevista semiestrurado que foi pré-testado e aperfeiçoado. O roteiro foi subdividido em 5 áreas temáticas a saber: dados gerais, formação profissional, experiência profissional, atuação profissional com ênfase em questões de abordagem da ótica da prevenção e da promoção de saúde no contexto educativo, bem como dificuldades encontradas.
Procedimentos
Após os procedimentos éticos, as entrevistas foram gravadas, transcritas e analisadas por meio de análise de conteúdo temática e estrutural (Bardin, 1977). Seguindo a metodologia proposta por este autor, cada entrevista foi lida e analisada individualmente (análise vertical), delimitaram-se os trechos mais significativos e centrais das entrevistas de cada um dos profissionais para, em seguida, realizar-se a categorização dos relatos. A partir de tal procedimento, realizou-se a análise horizontal das entrevistas, avaliou-se a tendência geral dos participantes a respeito de cada temática e dos subtemas estudados (análise freqüencial).
Resultados e discussão
Quanto ao tempo de formação em Psicologia, grande parte dos entrevistados (43%) possui de 5 a 10 anos; a média girou em torno de 13 anos. Dentre os profissionais, 74% possuem especialização, 21,7% mestrado, 4 psicólogos cursam especialização e 2 cursam doutorado. Constata-se que os profissionais sentiram necessidade de uma formação complementar após a graduação. Tal necessidade também foi evidenciada no estudo do CFP (2001) onde a maioria dos psicólogos (54%) também ressalta a necessidade de uma formação continuada. Cabe ressaltar que muitas vezes, embora o psicólogo esteja atuando no contexto educativo, essa formação não ocorre necessariamente na área de psicologia escolar / educacional. Quanto à experiência profissional em psicologia escolar, a quase totalidade dos psicólogos (78%) possui menos de 10 anos, 17% possuem menos de 1 ano. Em relação ao tempo de trabalho na instituição atual, a maioria (64%) informa ter menos de 10 anos.
Paralelamente à atuação na escola, 61% dos profissionais exercem outras atividades: 22% atuam em consultório clínico, 17% atuam em consultório e realizam outra atividade, existem também psicólogos da área organizacional, da social-jurídica, psicólogo atendente do SUS e ainda, professor universitário. 39% dos profissionais não exercem outras atividades. Tais dados convergem com os obtidos por Yamamoto et al. (1997) e Almeida et al. (1995), os quais evidenciaram que um número significativo dos psicólogos e psicólogos escolares pesquisados também exercia outras atividades. Almeida et al. (1995) salientam que esse resultado pode indicar que a atuação em psicologia escolar, para tais profissionais, é secundária ou complementar, o que compromete a qualidade do trabalho do psicólogo e a visibilidade deste profissional no ambiente escolar. É interessante destacar como dado preliminar desta pesquisa que 39% dos participantes exercem, concomitantemente, atividade clínica.
Em relação à formação acadêmica, 43,5% dos profissionais indicam que a mesma foi satisfatória e 56,5% insatisfatória: destacam-se aspectos negativos, como graduação generalista e embasamento teórico superficial na área de psicologia escolar, a qual não é suficiente para a atuação no contexto educativo. Alguns fragmentos dos relatos podem exemplificar: "...a graduação nunca é suficiente porque a graduação é muito generalista, ela te apresenta um pouco de muita coisa...";"a graduação acho que foi insuficiente... a formação acadêmica ela é sempre uma formação ampla...". Esses dados revelam uma formação teórico-prática precária e inconsistente na área. Gomes (1995) e Almeida (2001) também apontaram a grande insatisfação do psicólogo escolar com a formação recebida e com a dicotomia existente entre a teoria e a prática.
No que se refere ao estágio curricular, 65% dos profissionais opinam que o mesmo foi significativo tendo sido importante para a atuação profissional, e que ele tornou possível a percepção da realidade do ambiente escolar e a aplicação da teoria à prática : "... o estágio é uma chance que a gente tem de ver as coisas acontecendo né? O que é possível, o que é mais difícil (...) o estágio ajuda muito". No entanto, para 30% dos psicólogos, o estágio foi insatisfatório com diversas lacunas, e não ofereceu subsídios para a prática atual. De modo geral, para tal parcela dos entrevistados, os estágios na área foram "... superficiais e realizados em curto período de tempo".A questão do estágio em psicologia escolar insere-se na discussão atual de vários autores, dentre eles Senna e Almeida (2005) e Torezan (1999), os quais alertam para a necessidade de mudanças urgentes nos cursos de graduação em psicologia, tanto em relação ao currículo, quanto aos estágios oferecidos, no sentido de não privilegiar apenas o enfoque clínico-terapêutico de atuação.
Quanto ao enfoque teórico na área de psicologia escolar, evidenciou-se que 56,5% dos entrevistados relataram enfoques múltiplos na sua formação (psicanálise e outros enfoques com 22%, enfoque generalista com 30%, enfoque comportamental, 4%). O embasamento na teoria cognitiva foi mencionado por 35% dos profissionais e envolve predominantemente as teorias de Piaget e de Vygotsky, o que indica que esses autores constituem referência importante na atuação psicoeducacional. Tais dados ratificam a opinião de Almeida (2001) de que um dos problemas na área de psicologia escolar é a falta de embasamento teórico consistente. Concorda-se com a autora no sentido de que tal questão é crucial na medida em que pode estar influenciando a prática desses profissionais nos contextos educativos. É preocupante destacar que 9% dos participantes não se recordam do enfoque teórico: "(...) se eu for pensar a formação acadêmica como um todo, a minha formação teórica na área de escolar ... eu assim... não consigo me lembrar de um enfoque teórico... se eu for pensar a disciplina psicologia escolar... não consigo me lembrar... Me lembro... era muito o... espera aí que eu esqueci o nome. Eu sou muito ruim pra isso...". Ronzani e Rodrigues (2006), em pesquisa realizada com psicólogos que atuam na atenção primária à saúde, também encontraram resultados semelhantes: a maioria dos psicólogos entrevistados relata que a graduação foi generalista, e que há insatisfação quanto aos subsídios fornecidos para áreas de atuação que não a clínica.
A maioria dos entrevistados (70%) destacou a importância da participação em eventos na área de psicologia escolar, corroborando o estudo de Wechsler e Guzzo (1993), os quais salientam a necessidade desta prática entre os profissionais da área. No entanto, grande parte dos psicólogos (56%) alega buscar atualização informalmente por meio de leituras, de supervisões com profissionais da área e de grupos de estudo: "Estudo por mim mesma, procuro bibliografia, internet, professores que a gente entra em contato...". Resultado semelhante foi encontrado por Senna e Almeida (2005), que constataram a realidade da capacitação informal, indicando que as falhas na formação vêm sendo parcialmente compensadas, principalmente por meio de iniciativas pessoais (p.226). A formação continuada é uma estratégia fundamental no exercício profissional, conforme salienta Maluf (1994). Não obstante, é preocupante evidenciar que 30% dos participantes desta pesquisa não buscam ainda nenhum tipo de atualização. Ressalta-se também que não foram mencionados aspectos relativos às possibilidades de prevenção e de promoção de saúde no contexto educativo tanto no âmbito dos enfoques teóricos quanto na busca por atualização na área.
Com relação à temática "atuação no contexto educativo", os relatos permitiram delimitar quatro categorias globais de atividades direcionadas: aos alunos, aos pais, aos professores e ainda junto a funcionários e à equipe pedagógica. Nas atividades direcionadas aos alunos (33%), foram delimitadas 11 categorias específicas (modalidades) de atividades, 53% de tais atividades focalizam: atendimento individual, observação, testagem, entrevistas e encaminhamentos. Tais atividades podem ser consideradas atividades tradicionais, de cunho remediativo, no âmbito da atuação do psicólogo escolar, na medida em que focalizam aspectos individuais do aluno : "a gente faz atendimento mais direcionado aos alunos, um atendimento individual (...) este é o carro-chefe do trabalho, o atendimento ao aluno, a observação de aluno e atendimento de pais". Almeida et al. (1995) e vários outros autores destacam a limitação do psicólogo escolar, que realiza ainda um trabalho de cunho terapêutico-curativo, voltado quase que exclusivamente para o indivíduo. Além disso, estas atividades voltadas somente para o aluno e para a família, deixam implícita a crença de que os problemas escolares ou emocionais da criança/adolescente têm origem e foco somente nela e em sua família, desconsiderando todas as outras influências externas que o indivíduo recebe e que podem comprometer seu desempenho na escola..
A atividades mais diversificadas como orientação de estudo, atendimento em grupo, informação profissional/vocacional, também relevantes no contexto educativo, foram relatadas apenas por 9 profissionais (18%), o que permite evidenciar que atividades de cunho mais preventivo e grupal são realizadas com menor freqüência por esse grupo de profissionais.
Relativamente às atividades junto aos pais (31%), a análise dos relatos transcritos permitiu delimitar 4 categorias específicas (atendimentos individuais, reuniões, palestras e oficinas). Novamente aqui predominam atividades de cunho individual centrado no problema, pois 80% dos entrevistados informam realizar atendimentos individuais, como orientações e aconselhamentos "Eu trabalho com orientação de pais com atendimento individual quando necessário..."; "... busco estabelecer um contato mais próximo com os pais, pra ter um atendimento mais individualizado ..."; "Eu busco ter um contato individual também com os pais... sempre quando chegam as crianças, eu gosto de estar marcando uma entrevista individual, pra estar conhecendo a criança ....". Os relatos dos profissionais acerca da realização de reuniões, de palestras e de oficinas, as quais poderiam ter um cunho mais preventivo, devido a seu caráter grupal, foram poucos (apenas 20% dos profissionais mencionaram tais atividades, as quais não foram consideradas como prioridades, mas como complementares na prática escolar).
Junto aos professores (27%), a análise dos discursos dos participantes permitiu que fossem delimitadas 10 categorias específicas de atividades, com destaque também para o reflexo de uma intervenção reativa aos problemas já existentes, pois se sobressaem, com 45% na freqüência das respostas, orientação e acompanhamento individual no caso dos "alunos problemáticos"; atendimento individual e grupal; entrevistas (sobre o aluno). Outras atividades são mencionadas, porém com menor freqüência, tais como: capacitação, seleção, grupo de estudo e dinâmicas de grupo. Há autores como Martinez (2003) e Del Prette e Del Prette (2003), que, para além das práticas tradicionais, apontam a importância da assessoria a professores, especificamente em relação à aprendizagem como processo psicológico e ao processo de desenvolvimento integral do sujeito, ênfase mais proativa, entretanto isso não foi constatado na presente pesquisa.
Apenas 9% dos entrevistados informam desempenhar atividades junto aos funcionários e à equipe pedagógica, sendo a orientação a atividade de maior destaque (com 6 ocorrências de resposta), a seleção (com 20) e as reuniões (com 3 ocorrências). Aqui também contata-se a pouca visibilidade de tal amostra de psicólogos escolares de Juiz de Fora-MG quanto à importância e à participação da equipe pedagógica e dos funcionários numa proposta menos reativa e mais proativa de intervenção. De acordo com Guzzo (2001), o esforço no sentido de envolver todos os segmentos presentes no contexto escolar contribui para uma atuação de cunho psicoeducacional que amplia o foco de atenção para o contexto; não apenas para as dificuldades e problemas.
Questionados sobre o "Enfoque teóricometodológico de atuação", 48% dos participantes indicam, a partir de seus relatos, que adotam enfoques múltiplos, destes, 30% utilizam a psicanálise agregada a outras abordagens e três entrevistados. O trecho a seguir ilustra a utilização de enfoques múltiplos por parte de um profissional: "O psicólogo escolar ele tem que ser bem eclético porque em cada momento que a gente atua na escola você pode aplicar uma teoria. Tem hora que você tem que ser behaviorista... outra hora você tem que aplicar uma escuta psicanalítica então é muito importante você entender da psicanálise... a gestalt também ajuda muito".A abordagem sócio-construtivista (com fundamentos de Piaget e Vygotsky) foi a segunda categoria mais citada, 26% dos psicólogos escolares desta amostra indicam utilizar predominantemente tais referenciais teóricos em suas prática: "A gente trabalha na perspectiva sócio-histórica, interacionista também (...) permeia também por Piaget, mas a base do trabalho é Vygotsky".
Na terceira categoria específica delimitada (outros), é interessante destacar que 13% dos profissionais relataram não ter nenhum enfoque predominante. A opção por adotar enfoques múltiplos em sua prática é explicada pelos profissionais como uma tentativa de adaptar as diversas teorias às diferentes situações que são enfrentadas no cotidiano escolar: "Eu não acho que exista uma coisa única, né... você tem que estudar mesmo, aí você tem que ler alguma coisa, ver o que funcionou ou não... fazer tentativa ... Outro fragmento também pode exemplificar: .... eu falo muito em convergência .. eu aprendi que a gente tem que buscar vários teóricos, e pegar a prática da gente partindo desses teóricos... então assim... depende de cada situação...". No entanto essa junção entre as diferentes teorias e a dificuldade em delimitar um referencial predominante indica que tais profissionais podem encontrar, em decorrência, problemas em definir claramente seu papel na instituição. Além disso, o grande percentual de psicólogos escolares que adota a psicanálise com outras teorias na prática, demonstra a persistência de um enfoque terapêutico tradicional, o qual dificulta a implementação de estratégias mais proativas e menos reativas de intervenção. Estes e outros relatos nos levam a questionar a formação e o perfil teórico-prático do psicólogo que atua na educação uma vez que as inadequações profissionais, como ressaltam vários autores dentre eles Contini (2001), Joly (2000) e Campos e Jucá (2003), parecem decorrentes de uma formação freqüentemente insatisfatória. Os dados corroboram aqueles percebidos por Almeida et al. (1995), os quais encontraram também um levado número de psicólogos escolares que optam, em sua prática, por uma junção de orientações teóricas, muitas vezes incompatíveis com seus pressupostos teóricos e metodológicos, como na presente pesquisa. Os autores também evidenciaram um número expressivo de profissionais que indicam não seguir nenhuma orientação teórica específica.
Na temática referente à prevenção de saúde na escola, os relatos permitiram delimitar três categorias específicas. A primeira delas aglutinou 74% das repostas dos participantes e reflete a concepção mais geral de que a prevenção direciona-se a evitar problemas. O seguinte trecho explicita tal concepção: "... é um procedimento que vai tentar minimizar, que vai tentar... não tem como você falar prevenir, né ... mas evitar que comportamentos indesejáveis situações desagradáveis negativas aconteçam...". Duas sub-categorias derivaram-se da análise dos relatos: o foco no próprio sujeito e o foco na necessidade de evitar problemas no ambiente. A primeira, focalizada no próprio sujeito, obteve a maior freqüência (44%) e expressa a preocupação dos profissionais em evitar problemas emocionais, de aprendizagem, físicos, sociais, além do uso de drogas e o surgimento de doenças: " ... quando surge alguma coisa nova, que a gente pode resolver antes que vire alguma coisa a ser tratada na criança... acho que é mais ou menos por aí.... Eu entendo por prevenção é... quando... você pode escutar o aluno, antes que a coisa comece a explodir nele, né?". Similarmente à pesquisa realizada por Ronzani e Rodrigues (2006), tem-se aqui uma concepção mais orgânica de prevenção (evitar doenças), de cunho mais clínico remediativo (tratar, escutar..) e focalizada no sujeito e não em grupos de sujeitos (alvo prioritário das ações preventivas primárias e secundárias), como informa Rodrigues (2005). A segunda categoria, focalizada no ambiente, com 30%, envolve a prevenção de problemas relacionados à instituição escolar, à família e aos professores: "...eu acho que se a escola começa a ter um olhar sobre este todo ... não só sobre as crianças que tiverem alguma dificuldade, toda a escola já vai diminuir a incidência de encaminhamentos ...";"... Eu acho que é fundamental ter um projeto político-pedagógico eficiente na escola e que a escola tenha um olhar mais amplo sobre esta criança ...". A maioria dos relatos, ainda que reflitam uma visão mais ampla do que vem a ser prevenção, expressam um cunho individual, pouco específico e intuitivo no que diz respeito às ações preventivas. Para Lacerda e Guzzo (2005), a prevenção constitui uma forma de transformar a realidade que produz o sofrimento, eliminando as causas dos problemas emocionais, sociais, cognitivos e comportamentais, com ênfase em ações antecipatórias e grupais e não com uma preocupação tradicional, reativa, voltada para o individual.A segunda categoria específica delimitada concepção generalista - (17% das respostas), reflete, novamente, idéias pouco específicas envolvendo a concepção de que prevenção seria cuidar; proporcionar bem-estar: "Prevenção eu entendo que gira em torno do bem estar da criança, de quem tá trabalhando na escola de... bem-estar se sentir naquele local e aquele contexto te fazer bem." Estes e outros relatos permitem identificar a pouca familiaridade destes profissionais em relação ao conceito de prevenção, o que confirma dados obtidos na pesquisa realizada por Contini (2001). Vale ressaltar que apenas dois profissionais vincularam o conceito de prevenção à idéia de promoção de saúde e de desenvolvimento (terceira sub-categoria delimitada na análise dos relatos). Tal dado pode sugerir que há uma escassa utilização, por parte desta amostra de psicólogos escolares, de estratégias voltadas para o desenvolvimento de competências e de habilidades específicas, estratégias estas, importantes na prevenção primária, como ressaltam vários autores dentre eles Guzzo (2001) e Rodrigues (2004, 2005).
De forma complementar e convergente com suas concepções, os profissionais relataram desenvolver atividades de cunho preventivo junto às crianças, aos pais, aos professores e à equipe pedagógica. As atividades junto às crianças/alunos predominaram com 59% de freqüência de respostas; sendo as mais ocorridas: atendimento individual, grupal, encaminhamentos, observação e palestras. Já as menos freqüentes são as mais identificadas propriamente com estratégias preventivas, como orientação vocacional/profissional, orientação de estudo e orientação sexual. Constata-se, uma vez mais, que atividades que focalizam aspectos individuais do aluno como encaminhamentos e atendimento individual foram novamente mencionadas e identificadas como preventivas. Pode-se considerar que a ênfase nas atividades realizadas reflete mais um nível de prevenção terciária, e não propriamente, como era esperado, um nível de prevenção primária, conforme definição de (Lacerda e Guzzo, 2005 e Rodrigues, 2005) e que, segundo Merrel (2002), seria mais adequado no contexto educativo.
As atividades preventivas realizadas junto aos pais totalizaram 22% das respostas, com ênfase para atendimento, orientação e acompanhamento individual (19%), o que demonstra preocupação pertinente quanto à integração família-escola: "... a gente atende a família então esta criança está sendo atendida através da família, esta família é orientada, é acompanhada por questões sociais principalmente com crianças... e o que muda são as famílias então o nosso trabalho com crianças, preventivo, eu entendo que ele é muito mais pela família do que pela própria criança ...". Embora ampliem a visão para o contexto onde a criança está inserida, as atividades continuam a focalizar o problema da criança, o qual agora passa a ser visto "preventivamente" pela ótica da família. Resultado semelhante foi encontrado por Almeida et al. (1995), em que a orientação de pais foi também identificada como forma de prevenir problemas de aprendizagem.
Somente 12% dos psicólogos relatam desenvolver atividades de cunho preventivo, direcionadas aos professores (orientação, suporte e grupos de capacitação). Apenas um dos entrevistados informa realizar atividades preventivas junto à equipe pedagógica e dois informam não desenvolver tais atividades. Esse é um dado preocupante, pois há uma tendência no cenário da psicologia escolar contemporânea (Martinez, 1996, Guzzo, 2001) no sentido de procurar atuar de forma cada vez mais indireta sobre o aluno e de trabalhar junto ao professor para que este se torne um agente de prevenção primária no contexto escolar (Hernandez-La Cruz, 1999, Maciel, 2004).
Sobre a temática "promoção de saúde na escola", os relatos derivaram três categorias específicas: o favorecimento ao desenvolvimento de competências/habilidades; a promoção de cunho educativo e a concepção direcionada a evitar problemas. A maior concentração de respostas (48%) vincula-se à idéia de favorecer o desenvolvimento de competências/habilidades: "... trabalhando em cima das potencialidades e não das dificuldades porque quando você trabalha onde o aluno pode chegar o que ele é capaz de fazer você trabalha de uma maneira promotora de saúde...". Esta concepção reflete uma possível atuação mais direta e eficaz visando ao desenvolvimento para promover saúde, focalizada no ambiente (30%) e no sujeito (17%). Quanto ao ambiente, foram citadas concepções como: espaço para discussões na escola, desenvolvimento de capacidades de professores e de funcionários, espaço físico adequado e espaço de expressão para aluno/família. Tais concepções ratificam a visão de Rey (1997) e Martinez (1996), que identificam a escola como espaço de promoção de saúde. Em relação ao sujeito, os profissionais relataram crenças relacionadas ao favorecimento do desenvolvimento físico e cognitivo e à ênfase nas potencialidades dos alunos, apontando uma tendência que visa a ressaltar aspectos positivos do desenvolvimento do ser humano, fortalecendo suas habilidades, mostrando que apesar de os profissionais refletirem concepções limitadoras em relação à prevenção, estão conscientes quanto à necessidade de implementar ações mais promotoras em sua prática cotidiana.
As opiniões permitiram também delimitar a idéia de promoção vinculada a um cunho educativo (30%): promoção de hábitos de higiene e alimentação ao aluno/ família (com maior destaque, 17%), direitos à família e à comunidade e campanhas de conscientização com alunos. Este trecho exemplifica tais concepções: "... ensinar os hábitos, estar no meio de outras crianças, a conscientização à higienização, o que o risco faz com a saúde física... orientando a mãe nestas questões assim de higiene... a gente oferece uma boa alimentação acho que isso é saúde...". Constata-se que alguns profissionais ainda possuem uma crença limitada quanto ao conceito de promoção de saúde vinculando-o apenas à saúde física ou simplesmente, a uma concepção orgânica, como a ausência de doenças. A crença envolvendo os direitos à família e à comunidade, evidencia uma preocupação quanto à cidadania afinando-se com a proposta de Contini (2001), que salienta a importância da inserção social do trabalho do psicólogo. Similarmente ao conceito de prevenção, registrou-se uma concepção mais generalista e pouco específica também em relação ao tema promoção de saúde: cinco profissionais entendem que seria "evitar problemas" (20%), o que sugere uma concepção intuitiva e um conhecimento superficial e pouco consistente sobre o assunto. "Promoção de saúde é quando você faz diagnósticos bem anteriores, você faz prognósticos do que possa vir a acontecer com aquela criança..." Contudo, os relatos, de um modo geral, demonstram que os psicólogos escolares estão sensibilizados quanto à necessidade de se promover saúde no contexto educativo, conforme sugerem Cárdenas (1996), Martinez (1996) e Contini (2001).
No tocante às atividades promotoras de saúde, desenvolvidas pelos psicólogos escolares, os relatos evidenciam que o principal alvo continua sendo as crianças/alunos com 52% dos registros de respostas. Dentre as atividades dirigidas a tal grupo, as mais destacadas foram campanhas e palestras de conscientização (16%), o que sugere um enfoque psicoeducacional mais direcionado e adequado quanto à prevenção e à promoção de saúde. No entanto, é necessário destacar que dentre outras atividades desenvolvidas surgem, novamente, como marco de uma atuação ainda tradicional, o atendimento individual e os encaminhamentos, indicando que ainda se fazem presentes concepções restritivas e inadequadas em relação à atividade de promoção de saúde, a qual deve ser acompanhada por uma superação do binômio saúde-doença na visão de Lacerda e Guzzo (2005), Contini (2001) e Ronzani e Rodrigues (2006). Em segundo lugar, aparecem as atividades direcionadas aos pais (com 26% das repostas): palestras de conscientização e orientação, bem como reuniões com a família. Com menor freqüência, os participantes informam atividades dirigidas aos professores (9%), aos funcionários e à equipe pedagógica (6,5%). Este dado converge com as atividades preventivas desenvolvidas, o qual tende a indicar, de modo geral, uma subestimação e uma visão restritiva dos profissionais entrevistados quanto ao papel da escola, dos professores e dos funcionários como agentes de prevenção e promoção de saúde. Persistem, de acordo com os relatos, práticas pouco consistentes e intuitivas: "a gente abre um espaço para que as coisas possam ser ditas..."; "... é a gente estar promovendo para que esse aluno, esse professor ou esse funcionário que trabalha aqui na escola, se sinta acolhido."
Quanto às dificuldades encontradas pelos psicólogos escolares em sua atuação, última temática abordada, a análise dos relatos evidencia dificuldades mais fortemente relacionadas aos pais (26%), seguidas de dificuldades vinculadas aos professores (22%) e à instituição (17,5%). Quanto aos pais, foi mencionada a falta de apoio das famílias no sentido de monitorarem a escolaridade dos filhos e de repassarem a responsabilidade para a escola: "... a maior dificuldade que encontro é a resistência dos pais (...); ( ...) cada vez mais os pais estão deixando nas mãos da escola a educação dos filhos, de educação básica mesmo... de pegar no garfo...". Quanto aos professores, evidenciaram-se alguns pontos: a resistência ao trabalho do psicólogo escolar, a insatisfação quanto à remuneração, além da falta de disponibilidade de horário. As dificuldades institucionais vinculam-se novamente à resistência ao trabalho do psicólogo, à sua desvalorização e à expectativa de um trabalho que solucione problemas. Três profissionais relatam dificuldades em relação às crianças/alunos; um profissional alega dificuldades quanto às políticas públicas e apenas um profissional alega dificuldades individuais: formação insatisfatória e falta de atualização. Resultados semelhantes também foram encontrados por Banhato e Passos (2000).
Observa-se que os profissionais atribuem suas dificuldades de atuação, em sua grande maioria, a fatores externos, como à instituição, aos professores e à família. Estes dados são similares à afirmação de Almeida et al. (1995), os quais salientam que há uma tendência dos psicólogos de atribuir a condições externas à sua própria atuação, a responsabilidade pelas dificuldades sentidas no exercício de suas funções (p. 130).
Considerações Finais
A maioria dos psicólogos escolares de Juiz de Fora tendeu a considerar a formação acadêmica em psicologia escolar como insatisfatória, entretanto, a avaliação da contribuição dos estágios para a prática profissional foi, de certa forma, positiva. Os profissionais demonstraram dificuldade em delimitar de forma específica o enfoque teórico abordado no âmbito da formação acadêmica. Nessa mesma direção, a prática desses psicólogos, é marcada também pela junção de teorias diferentes ou pela inexistência de um referencial predominante; a psicanálise aparece como uma das referências importantes. Uma possível conseqüência de tal fato é uma identidade do psicólogo escolar marcada ainda por um caráter terapêutico, remediativo, o que dificulta a construção de um perfil mais psicoeducacional e participativo no contexto educativo, tarefa que tem sido imposta para o psicólogo escolar diante dos desafios educacionais da sociedade contemporânea (Joly, 2000 e Guzzo 2001, 2005).
No que tange à prevenção e à promoção de saúde, evidenciou-se um conjunto de crenças e de práticas restritivas e limitadoras, focalizadas predominantemente em evitar problemas, porém, com estratégias reativas direcionadas de certa forma já instaladas tanto nos alunos quanto no ambiente escolar: isso configura uma concepção que se aproxima mais propriamente da prevenção terciária e não, como era esperado para o contexto educativo, para a prevenção primária que dirige-se prioritariamente a grupos devendo antecipar-se aos problemas. Há uma tendência dos profissionais entrevistados no sentido de valorizar tal nível e modalidade de atuação na escola e de implementar uma Psicologia que se propõe ser inovadora, e que busca, no âmbito da promoção de saúde, o desenvolvimento e o aprimoramento das capacidades humanas, estendendo um olhar mais amplo sobre o indivíduo e o ambiente em que ele está inserido. No entanto, condizentes com este conjunto de concepções intuitivas, as práticas e atividades desenvolvidas no âmbito da prevenção e da promoção de saúde mostram-se pouco consistentes e superficiais, revelando um planejamento assistemático quanto a uma atuação proativa no contexto educativo. Surgem ainda como estratégias preventivas e promotoras de saúde, ações tradicionais dirigidas ao atendimento individual, como testagem, diagnóstico e encaminhamentos.
Os resultados acima discutidos sugerem a necessidade de se repensarem as práticas hegemônicas da Psicologia que têm sido implementadas no contexto educativo, remetendonos à necessidade de um redimensionamento e de uma reformulação no âmbito da formação, os quais possam proporcionar melhor qualificação dos profissionais para o trabalho em Psicologia Escolar. Tal reformulação deve incluir fundamentos teóricos e, sobretudo a realização de práticas e de estágios na área, os quais possam subsidiar ações menos reativas e mais proativas conscientes e comprometidas com um modelo positivo e construtor de competências, de saúde e de desenvolvimento humano no contexto educativo. Como reportam Ronzani e Rodrigues (2006), torna-se cada vez mais necessário realçar o conceito dinâmico de educação permanente a fim de que os profissionais possam suprir as possíveis lacunas de sua formação e afinar-se com a idéia da necessidade crítica e reflexiva do aprendizado constante. Mais do que esgotar discussões, os resultados encontrados na presente pesquisa instigam a realização de outros estudos e indicam a necessidade da formação (tanto no nível da graduação quanto no nível da formação continuada) de profissionais comprometidos com uma prática contextualizada, eficaz e condizente com as tendências contemporâneas e com o compromisso social que a Psicologia Escolar deve assumir no cenário educacional brasileiro.
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Recebido em 13/10/2007
Aceite final em 01/08/2008
* Endereço eletrônico para correspondência: rodriguesma@terra.com.br