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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. v.7 n.2 Florianópolis dez. 2007

 

ARTIGOS

 

Adaptação e validação da escala de bases de poder do supervisor (EBPS)

 

Adaptation and validation of the supervisor's power bases scale

 

 

Maria do Carmo Fernandes MartinsI; Vanessa da Fonseca GuimarãesII

IDoutora pelo Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília. (mcfmartins@triang.com.br)
IIAluna do Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Mestrado. (ufu@ufu.br)

 

 


RESUMO

Influência social, estudada há cinco décadas pela psicologia, é exercida por meio de bases de poder, insumos utilizados por uma pessoa para influenciar outra. No contexto organizacional, bases utilizadas pelo supervisor produzem impacto em importantes variáveis da área. O objetivo deste estudo foi validar a Escala de Bases de Poder do Supervisor (EBPS). Os 20 itens foram traduzidos e adaptados. Respostas de 312 trabalhadores foram submetidas à análise fatorial (eixos principais) com rotação PROMAX. Retiveram-se 4 fatores com valores próprios > 1,0, que explicaram 59% da variância total, reuniam 16 itens com cargas > 0,30, denominados bases de poder de: perícia, coerção, recompensa e poder legítimo. A base de poder de referência não foi identificada. Cálculos de Alphas de Cronbach (0,72 a 0,85) e correlações item-total médias (0,52 a 0,64) revelaram fidedignidade adequada. Discussão comparou resultados deste estudo com outras publicações da área.

Palavras-chave: bases de poder; validação de escalas de medida; influência social.


ABSTRACT

Social influence has been studied for five decades by psychology. It is exercised through bases of power defined as inputs used by an individual in order to influence another one. In organizational context bases of power utilized by supervisors produce impact in aspects diverse. Therefore this study aim was to esteem the Bases Supervisor Power Scale factorial validity. The 20 items were translated and adapted. Responses of 312 employers were submitted to factorial analysis (principal's axis) with PROMAX rotation. Were retained 4 factors with values > 1,0, witch explain 59% of total variance, with 16 items with charges > 0,30, denominated based of power of: referent, coercion, reward and legitimate. The base of power known as referent was not identified in this sample. Cronbach's Alphas values (0,72 a 0,85) and items total correlations (0,52 a 0,64) revels adequate reliability. Discussion compared results of this study with others studies related.

Keywords: bases of power; validity of measurement scale; social influence.


 

 

1. Introdução

A forma com que o supervisor lida com seus subordinados influencia o comportamento e o desempenho do empregado no ambiente de trabalho, seja na demonstração de comprometimento com a organização (Rahim e Afza, 1993; Slocum, 1970), de satisfação com o seu supervisor (Bachman, Bowerws e Marcus 1968; Busch, 1980; Carson, Carson e Roe 1993; Slocum, 1970) e de satisfação com o trabalho (Rahim e Afza, 1993), seja na produtividade (Rahim, Antonioni, Krumov e Ilieva, 2000). Resultados de estudos publicados mostram que diferentes aspectos internos (e.i. valores pessoais, comprometimento afetivo) e externos (e.i. suporte do supervisor, clareza de objetivos) do empregado podem ser influenciados pelo tipo de base de poder utilizada pelo supervisor no seu relacionamento com ele (Podsakoff e Schriesheim, 1985).

Outros estudos têm demonstrado que as bases de poder utilizadas pelos supervisores para gerenciar afetam conflitos, distribuição e fluxo de poder nos grupos e nas organizações, produzindo impacto nos resultados do trabalho (Hinkin e Schriescheim, 1994; Rahim et al., 2000; Ward, 2001). Esses relatos permitem concluir que a forma pela qual o supervisor gerencia sua equipe exerce influência em outros aspectos importantes para a organização e para o trabalhador.

Para desempenhar suas tarefas, o supervisor exerce o poder baseado em recursos de que dispõe. Poder foi foco de estudos de filósofos e sociólogos desde Maquiavel (1515/1998) até Weber (1919/1991), sob a ótica da dominação. Talvez um dos primeiros estudiosos a focalizar o poder como a produção de efeitos intencionais envolvendo dois atores tenha sido Russel (1951/1986) que estabeleceu uma ligação entre poder e intencionalidade. Sob a mesma perspectiva, Dahl (1957) afirmava que A tem poder sobre B na extensão em que influencia B, ou seja, que o leva a fazer algo que não faria em outras circunstâncias. Dahl defendia que o exercício do poder acontece em muitas arenas e com múltiplas variedades de iniciativas e reações das pessoas nelas envolvidas. Para Dahl, nessas arenas, muitos recursos são disputados. Parece haver na proposição de recursos de Dahl uma das primeiras referências indiretas ao que French e Raven (1959) denominaram bases de poder.

Em 1959, French e Raven publicaram no livro "Studies in social power" um capítulo chamado "The bases of social power" no qual definem a influência e o exercício do poder social como resultado da utilização de bases de poder. Estes autores propuseram que a influência social aconteceria sustentada por bases de poder e apresentaram uma taxionomia de cinco bases. Estas bases foram definidas como insumos que geram dependências da outra parte (Martins, 2004). Para eles, as bases de poder permeiam as relações diádicas nas quais aconteceria o exercício da influência. No intuito de possibilitar a analise do processo de influência sobre o influenciado, os autores definiram cinco bases: poder de coerção, poder de recompensa, poder legitimo, poder de perícia e poder de referência. Estas bases seriam fontes que o agente influenciador utilizaria para influenciar a outra pessoa e, conseqüentemente, alcançar seu(s) objetivo(s).

Revisão da literatura da área (Hinkin e Schriescheim, 1989, 1994; Peiró e Meliá, 2003; Podsakoff e Schriesheim, 1985; Schriesheim, Hinkin e Podsakoff, 1991; Rahim et al., 2000; Raven, 1993; Ward, 2001) confirma que a taxonomia de bases de poder proposta por French e Raven (1959) é a mais popular entre os estudiosos. Rahim; Antonioni, Psenicka (2001) afirmam que diferentes tipologias de bases de poder foram apresentadas depois da teoria de French e Raven (1959), mas que esta é a mais utilizada nos estudos publicados. Mintzberg (1983) apresentou uma tipologia de bases de poder organizacional, mas afirmou que a melhor abordagem deste assunto foi a de French e Raven. Segundo Gaski (1986), todas as tipologias apresentadas posteriormente à obra de 1959, representam aspectos já capturados anteriormente pela teoria de French e Raven. A popularidade desta tipologia também é confirmada por Podsakoff e Schrieschein (1985) em revisão sobre o assunto e por Hinkin e Schriescheim (1989) em artigo sobre a medida do construto. Apesar disto, autores como Yukl (1989), têm apresentado críticas a esta tipologia. Em 1992, Yukl e Tracy propuseram uma taxionomia denominada de nove fatores: persuasão racional, atração inspiracional, sabedoria, negociação, troca, atração pessoal, colisão, legitimidade e pressão. Segundo Koslowsky e Stashevsky (2005), esta taxionomia "possui muitas aspectos da teoria de French e Raven (1959), mas parece considerar melhor a superposição potencial" (p. 24) dos conceitos das bases de French e Raven. Ainda assim, a taxionomia de French e Raven continua a ser a mais utilizada nos estudos da área.

French e Raven (1959) definiram poder como "influência potencial" que o agente "O" poderia provocar no sujeito "P". Raven (1993) afirma ainda que esta definição de poder é muito próxima à definição de Lewin (1944, 1951 apud RAVEN 1993) que o considerava como a possibilidade de induzir forças de certa magnitude em outra pessoa. Para estes autores, o fenômeno de troca de poder ocorre numa relação diádica que pode ser analisada sob duas perspectivas: (1) o que determina o comportamento do agente que exerce o poder e (2) o que determina a reação do sujeito que recebe esta influência. French e Raven basearam sua teoria "em termos do espaço de vida de "P" (p. 150), orientando sua atenção àquele ("P") que sofre as influências das bases utilizadas pelo agente influenciador ("O").

Neste processo de influência social, a mudança psicológica ocorrida em "P" só pode ser considerada como influencia social advinda de "O" quando os efeitos de outras possíveis forças existentes no meio forem eliminados. Esta teoria considera, então, apenas as mudanças primárias causadas em um sistema, produzido diretamente através de uma influencia social (French; Raven, 1959).

No capítulo de 1959, French e Raven citam uma sexta base de poder, chamada poder informacional, proposta por Deutsch e Gerard em 1955 (apud FRENCH e RAVEN, 1959). Caracterizada como socialmente independente, sua eficácia derivaria apenas dos argumentos externos apresentados pelo "agente influenciador" e não de suas características pessoais. Para French e Raven (1959), o poder informacional é derivado das bases de poder de referência ou perícia porque depende da credibilidade do influenciador. Por isto, no capítulo de 1959, esta foi considerada por French e Raven como um tipo de base de poder secundária porque é dependente de outras.

Em resposta às críticas sofridas pela taxionomia de 1959, Raven (1993) apresentou "um modelo mais compreensivo" (p.227) das bases de poder no qual revê a tipologia de 1959 levando em conta aspectos como motivação do agente, preferências pessoais, valores e normas, efetividade potencial das bases, manipulação, ferramentas de fortalecimento dos recursos do agente disponíveis, dentre outros. Dentre os pontos sobre os quais o autor discorre, é interessante destacar que Raven revela uma divergência entre ele e French referente à teoria de 1959. Raven relata que informação poderia ser classificada como uma base de poder distinta das outras cinco e que poderia ser denominada poder informacional. Todavia, segundo Raven (1993), French não concordava que o "termo 'poder' fosse apropriado" (p. 232) para designar o papel da informação no processo de influência. Raven discutiu ainda no artigo de 1993 que as bases poderiam ser classificadas em três grupos distintos quanto à mudança social e à vigilância. Para ele, coerção e recompensa seriam formas mais pessoais de poder, socialmente dependentes, onde a vigilância do influenciado seria importante para o resultado da influência. Poder legítimo, de perícia e de referência, bases devidas a posições formais ocupadas pelos agentes de influência, também seriam socialmente dependentes, mas a vigilância do alvo da influência não seria importante, ou seja, a influência exercida não dependeria da vigilância do alvo. Para Raven, a 'base de poder informacional' ou de persuasão, cuja proposição agora não dependia mais da concordância de French, comporia uma terceira categoria distinta das duas anteriores: seria socialmente independente e a vigilância não seria importante. Além disso, poder informacional foi classificado como direto, "baseado em informações e argumentos lógicos que o agente pode apresentar ao alvo para implementar mudanças" (Raven, 1993, p. 235) e indireto, quando o agente influencia por meio de sugestões para não mobilizar defesas no alvo. Raven também propôs que as outras cinco bases diferenciassem-se em subclassificações (Quadro 1).

A posição de French e Raven (1959) quanto ao papel da informação como base de poder socialmente importante e dependente de vigilância foi reconhecida por Peiró e Meliá (2003), que afirmam, entretanto, que "se o alvo da influência não reconhecer poder de referência ou de perícia no agente, a base de poder informacional não se transforma em influência" (p. 17). A base de poder informacional também é admitida por Alanazi e Rodrigues (2003) e por Rodrigues e Assmar (2003).

Apesar de alguns autores adotarem seis bases de poder (Alanazi e Rodrigues, 2003; Rodrigues e Assmar, 2003), a grande maioria dos estudiosos adota o modelo das cinco bases de poder de French e Raven (como por exemplo: Aguinis, Nesler, Quigley e Tedeshi, 1994; Hinfin e Schriesheim, 1994; Podsakoff e Schriesheim, 1985; Rahim e Afza, 1993; Rahim et al., 2000), acatando o argumento de que a base informacional seria dependente das outras e que, portanto, não poderia ser tratada no mesmo nível das outras cinco. Todavia, parece que a taxionomia de French e Raven refere-se apenas às bases pessoais de poder (Koslowsky e Stashevsky, 2005)

Ao longo dos anos a teoria inicial sobre influência social de French e Raven (1959) foi aprimorada em outros estudos realizados nas áreas da Psicologia Social, Cognitiva e Organizacional (Alanzi e Rodrigues, 2003; Hinkin e Schriesheim, 1989; Podsakoff e Schriesheim, 1985; Rahim e Afza, 1993; Rodrigues e Assmar, 2003), o que colaborou para sua consolidação. A taxionomia das bases de poder de French e Raven (1959) continua sendo a mais utilizada nas pesquisas da área.

1.1. Tipos de bases de poder social

Os cinco tipos de bases de poder propostos por French e Raven (1959) funcionam como alicerce para o processo de influência social. Base de poder é definida por French e Raven (1959) como a fonte de onde se origina o poder presente em uma relação entre "O" e "P". Embora os autores concordem que existem possibilidades de haver outras bases de poder distintas, eles propõem cinco tipos principais e especialmente comuns e importantes: poder de recompensa, poder coercitivo, poder legítimo, poder de perícia e poder de referência.

Na obra de 1959, French e Raven definem o poder de recompensa como sendo um poder baseado na habilidade de recompensar. Este tipo de poder só ocorre quando o sujeito "P" percebe que o agente "O" é capaz recompensá-lo ou de retirar/diminuir punições em determinadas situações. Um exemplo comum do uso do poder de recompensa é a remuneração por produção, adotada por várias empresas para incentivar aumento no rendimento do empregado.

O poder de coerção foi apresentado nesta obra como similar ao poder de recompensa, pois também envolve a habilidade que o agente "O" possui de manipular valências importantes para o sujeito "P". Neste caso, o poder de coerção de "O" sobre "P" está baseado na expectativa que "P" possui de que será punido por "O", se falhar.

Em estudos mais atuais (Hinkin e Schriesheim, 1989; Peiró e Meliá, 2003; Rodrigues e Assmar, 2003; Ward, 2001), percebe-se que as definições de poder de recompensa e de coerção no ambiente organizacional mantêm-se fieis à teoria de French e Raven. Relacionando estes tipos de bases de poder com as dimensões os compõem, estes autores defendem que os poderes de recompensa e de coerção possuem a característica de serem públicos, ou seja, eficazes apenas quando sob supervisão ou vigilância do agente da influência e dependentes da possibilidade de o agente influenciador recompensar ou punir o indivíduo.

O poder legítimo é considerado por French e Raven (1959) a base de poder mais complexa porque tem origem em normas e estruturas sociológicas. A base de poder legítimo está relacionada com o sentimento de dever e com crenças que o indivíduo aceita e respeita. Este tipo de poder é sustentado em valores e normas internalizadas pelo sujeito "P" que determinam o legítimo direito do agente "O" influenciar "P" e, em contrapartida, a obrigação de "O" aceitar esta influência (French e Raven, 1959).

No entanto, nem sempre o poder legítimo sustenta-se somente em normas ou regras internalizadas ou pré-estabelecidas. Para French e Raven (1959), a noção de legitimidade está fundamentada em certo tipo de código de conduta aceito pelo indivíduo influenciado, por meio do qual, o agente externo "O" afirma o seu poder.

O poder de referência está baseado na identificação de "P" com "O". Para French e Raven (1959), se "O" é uma pessoa pela qual "P" se sente altamente atraída, "P" busca estar estreitamente associado a ele. Se "O" é um grupo atrativo para "P", "P" demonstrará um desejo de pertencer a ele ou um sentimento de ser membro do grupo. Se "P" faz parte do grupo, terá desejo de manter esta relação. Ou seja, quanto maior for a identificação de "P" com "O", maior é o grau de influência de "O" sobre "P" (French e Raven, 1959).

É interessante dizer que neste tipo de base de poder, French e Raven (1959) destacam que "O" exerce poder sobre "P" mesmo se "P" não tem consciência desta influência. Além disso, estes autores afirmam que quanto maior a atração de "P" por "O", maior será sua identificação com ele e, consequentemente, maior será o poder de referência.

O poder de perícia tem como base o conhecimento ou a perícia de "O" em certa área de interesse de "P". French e Raven (1959) afirmam que esta base de poder varia de acordo com o grau de conhecimento de "O" e com a competência que o sujeito "P" atribui ao agente "O" em determinada área. Os autores afirmam que "P" provavelmente avalia a perícia de "O" em determinado assunto, de acordo com o seu próprio conhecimento. Um exemplo comum de poder de perícia seria uma pessoa aceitar conselhos de um advogado sobre uma questão ou problema legal.

Através destas diferenciações, French e Raven (1959) afirmam que o poder de perícia, quando exercido, produz uma nova estrutura cognitiva que é inicialmente dependente de "O", enquanto o poder de informação produz uma estrutura independente de características pessoais do influenciador. No entanto, em ambos os casos, o grau da dependência de "P" não é afetado pela vigilância ou observação de "O".

Relacionando o poder de perícia com o poder de referência, French e Raven (1959) afirmam que a abrangência do poder de perícia é menor do que a abrangência do poder de referência. Isto porque o poder de perícia, além de estar limitado apenas a sistemas cognitivos, depende do grau de conhecimento de "O" em áreas específicas. Sendo assim o poder de perícia de "O" sobre "P" só poderá ser exercido em áreas limitadas do conhecimento, ao contrário do poder de referência, que é mais abrangente; neste caso, o influenciador funciona como modelo, o que é muito mais amplo. Constata-se em estudos mais atuais que as bases de poder que independem da vigilância e que são socialmente dependentes também mantém-se fieis aos modelos propostos inicialmente por French e Raven (1959).

Em 1993, Raven aprofundou e fez algumas diferenciações na tipologia de bases de poder da teoria que desenvolveu com French em 1959. Segundo Raven (1993), o poder de recompensa e o poder de coerção são considerados como uma forma pessoal de influencia. Ele afirma que, além das recompensas tangíveis e das ameaças reais, deve-se reconhecer que a aprovação pessoal de alguém que o sujeito realmente gosta pode resultar em um importante poder de recompensa, e a rejeição e a reprovação de alguém assim, pode servir como base para um poderoso poder coercitivo.

Ao discutir o poder legítimo, deve-se ir, segundo Raven (1993), além da legitimidade que resulta de um poder formal e reconhecer outras formas de poder legítimo que pode estar nas entrelinhas tais como (a) o poder legítimo de reciprocidade: "Eu fiz isto para você, então você deveria se sentir na obrigação de fazer para mim", (b) o poder legítimo da equidade: "Eu tenho trabalhado pesado, então eu tenho o direito de lhe pedir algo para compensar este esforço", e (c) o poder legítimo da responsabilidade ou da dependência, uma norma que afirma que as pessoas têm obrigação de ajudar aqueles que não podem ajudar-se, que dependem dos outros (Raven, 1993).

Em relação às bases de poder de perícia e de referência, Raven (1993) discute as formas negativa e positiva de sua utilização. Segundo ele, um subordinado pode fazer o que seu supervisor pede porque percebe que o supervisor possui um maior conhecimento, ou porque ele é uma pessoa admirada por ele. No entanto, foi observado que em alguns momentos, o subordinado pode fazer exatamente o oposto do que o agente influenciador faz ou deseja que ele faça. Isto provavelmente acontece porque, embora a perícia do supervisor seja reconhecida pelo subordinado, este entende que aquele está usando seu conhecimento a favor de seus próprios interesses ou do interesse de outros, ou então porque não gosta do agente influenciador e prefere não se identificar com ele. Assim, foi incorporado ao modelo respectivamente os conceitos de poder de perícia positivo e poder de referência negativo.

Nos anos que se seguiram, o modelo de bases de poder continuou a ser desenvolvido, beneficiado pela pesquisa e pelo desenvolvimento teórico de outros autores (Hinkin e Schriesheim, 1994; Peiró e Meliá, 2003; Hinkin e Schriesheim, 1989; Rahim et al. 2001; Rodrigues e Assmar, 2003; Ward, 2001). Alguns autores buscaram analisar as correlações entre os próprios tipos de bases de poder propostos por French e Raven (1959). Hinkin e Schriesheim (1984) encontraram que as bases de poder legítimo, de perícia e de referência são altamente correlacionadas. O poder legítimo também apresentou uma correlação significativa com o poder de coerção, e este, por sua vez, não apresentou correlação com mais nenhum outro tipo de base de poder. Vários outros estudos citados na revisão de Podsakoff e Schriesheim (1985) também constataram que algumas das bases de poder identificadas por French e Raven (1959) estavam significativamente relacionadas entre si. Eles explicam isto afirmando que os poderes provenientes de fontes pessoais tais como o poder de referência e poder de perícia são mais provavelmente percebidos juntos pelo influenciado num mesmo indivíduo influenciador. Eles justificam esta ligação pelo fato de geralmente atribuir-se conhecimento e perícia a quem se admira. Já a base de poder legítimo estaria, para estes autores, mais associada aos poderes de recompensa e de coerção.

Rodrigues e Assmar (2003) relatam que Rodrigues identificou em estudos anteriores (de 1995 e 2001 apud Rodrigues e Assmar, 2003) que as bases podem ser agrupadas em dois blocos, sendo o primeiro composto pelas bases de recompensa, informação e de referência e o segundo, pelas bases de perícia, de legitimidade e de coerção. Em estudo de Litman-Adizes, Fontaine e Raven (apud Rodrigues e Assmar, 2003), os autores verificaram que a aceitação da influência do supervisor (influenciador) é mais atribuída à vontade do empregado (atribuição mais interna) quando as bases utilizadas pertencem ao primeiro grupo e à vontade do supervisor (atribuição mais externa) quando as bases são do segundo grupo.

1.2. Problemas da Medida das Bases de Poder

Podsakoff e Schriesheim (1985) criticaram cuidadosamente as três medidas de bases de poder que identificaram até aquela data. A escala de Bachman, Smith e Slesinger (1966) era constituída por cinco itens, cada um avaliando uma base; estes itens eram ordenados pelos respondentes de modo a descrever porque eles concordavam com as exigências de seus supervisores. Na escala de Student (1968) as bases eram avaliadas pelos mesmos itens únicos, mas respondidas em escala tipo Likert de cinco pontos que variava de 'muito descrtivo' (5) a 'minimamente descritivo' (1). A escala de Thamhain e Gemmill (1974) era multi-item e também respondida em escala tipo Likert de cinco pontos, de 'discordo fortemente' (1) a 'concordo fortemente' (5). Hinkin e Schriesheim (1989), preocupados com as críticas levantadas por Podsakoff e Schieshein (1985), construíram e validaram uma Escala de Bases de Poder do Supervisor, baseada na taxionomia de French e Raven (1959). Para isto, os autores formularam itens que representavam características das cinco bases de poder propostas originalmente em 1959. Estes itens foram apresentados para juízes que tinham como função avaliar o conteúdo das frases e categorizá-los em conjuntos com aspectos semelhantes que corresponderiam às cinco bases de poder. Após este procedimento, Hinkin e Schriesheim constataram que os itens apresentaram validade de conteúdo aparente e, finalmente, o questionário foi aplicado em três grupos distintos. Os participantes foram separados em 3 amostras, sendo a primeira formada por 251 estudantes universitários que trabalhavam meio período, a segunda formada por 375 trabalhadores tempo integral de um hospital psiquiátrico e a terceira formada por 220 estudantes de MBA e que trabalhavam tempo integral também. A primeira amostra foi utilizada para validação e aperfeiçoamento do instrumento de bases de poder enquanto que na segunda e terceira amostra houve a aplicação do instrumento validado juntamente com outras escalas de suporte e satisfação, a fim de confirmar hipóteses sobre associação entre bases de poder e outras variáveis do contexto organizacional.

As respostas foram submetidas a análises fatoriais exploratórias e confirmatórias e a cálculos do alfa de Cronbach para aferir sua fidedignidade. Os autores chegaram a uma escala de 20 itens com os seguintes valores de alfa de Cronbach: 0,78 para a base de poder de recompensa; 0,84 para poder de coerção; 0,86 para poder legítimo; 0,86 para poder de perícia e 0,87 para poder de referência. A estrutura fatorial e a composição dos fatores da escala de Hinkin e Schriesheim (1989) foi confirmada em vários estudos posteriores (Aguinis e Henle, 1998; Aguinis et. al., 1994; Hinkin e Schriesheim, 1994)

Em 1991, Schriesheim, Hinkin e Podsakoff criticaram o fato de as três medidas (Bachman, Smith e Slesinger, 1966; Student, 1968; Thamhain e Gemmll, 1974) constituírem-se como medidas de escolha forçada. Isto, segundo eles, distorcia as relações entre as bases, fazendo-as tender à média ou a apresentar-se de forma negativa. Apontavam ainda problemas como a falta de clareza sobre relações entre as bases de poder e variáveis dependentes porque medidas de escolha forçada produzem padrões de correlações artificiais (Schriesheim, Hinkin e Podsakoff, 1991). Assim, Schriesheim, Hinkin e Podsakoff (1991) colocavam em dúvida os resultados da maioria das pesquisas sobre bases de poder porque elas utilizavam medidas, segundo eles, psicometricamente inadequadas. Os autores utilizaram correlações teste-reteste para verificar a estabilidade das medidas, analise fatorial confirmatória (com LISREL), multi-metodo multi-traços (MTMM) e analise de variância para analisar seus dados. Com base nos resultados, criticaram severamente as três medidas que estudaram, demontraram que sua fidedignidade era ruim e que as medidas eram convergentes com um conjunto razoável de medidas de outros construtos como satisfação geral, habilidade do supervisor e relações humanas do supervisor, conflito de papel, clareza do papel e comprometimento e "que estas medidas distorciam as relações com as variáveis resultado dos subordinados" (Schriesheim et al., p. 108). Enfim, as medidas revelaram não possuir validade discriminante.

Rahim (1988) construiu uma escala com 35 itens, específica para avaliar as cinco bases de poder de French e Raven (1959) no contexto organizacional. Depois de validada fatorialmente, a escala reteve 29 itens distribuídos em cinco fatores com índices adequados de fidedignidade que confirmavam a taxionomia de French e Raven (1959): poder de coerção, de perícia, de referência, legítimo e de recompensa. Hess e Wagner (1999) testaram a validade de construto do instrumento de Rahim para um grupo de mulheres estudantes supervisionadas por outras mulheres, confirmando a estrutura de cinco fatores encontrada por Rahim (1988). Rahim et al. (2001) confirmaram, por equação estrutural, a estrutura encontrada por Rahim (1988). Em estudo de 2001, Ward, utilizando análise fatorial dos eixos principais, identificou a mesma estrutura de cinco fatores do instrumento.

Apesar de o tema ser interessante e importante para organizações e para trabalhadores, como se tentou demonstrar anteriormente, nenhum estudo foi localizado na literatura nacional sobre medidas das bases de poder de French e Raven (1959) no contexto organizacional.

O assunto foi estudado por Rodrigues e Assmar (2003) que pretenderam replicar achados anteriores de Rodrigues (1999, 2001 apud Rodrigues e Assmar, 2003) e equalizar a força representativa de cada base da taxionomia de French e Raven (1965), adotando o modelo de seis bases de poder. As bases foram inicialmente avaliadas por participantes que respondiam "quão forte eles consideravam a tentativa de influência social descrita" (p. 194) em cada uma das 60 frases, 10 referentes a cada uma das seis bases de poder, dentre as quais foram selecionadas, a partir do valor escalar, as seis frases mais representativas das seis bases avaliadas. Assim, o instrumento final era composto por seis frases, cada uma designada para avaliar uma das bases de poder. Os sujeitos apreciavam uma situação proposta e apontavam entre as seis frases, cada uma representativa de uma das bases de poder, razões que melhor explicavam, para eles, o comportamento relatado.

Escalas com validade de construto não foram identificadas na literatura brasileira. Na tentativa de suprir este déficit, foi objetivo deste estudo adaptar semanticamente e validar fatorialmente a Escala de Bases de Poder do Supervisor de Hinkin e Schriesheim (1989) por ser esta a mais concisa e aquela cuja estrutura fatorial tem se revelado mais sólida em estudos de outros autores (Aguinis e Henle, 1998; Aguinis et. al., 1994; Hinkin e Schriesheim, 1994). Pretende-se, como resultado deste estudo, disponibilizar para a área um instrumento adaptado para o Brasil, válido e fidedigno. A seguir se passará a relatar o método.

 

2. Método

Participantes

Participaram deste estudo 312 trabalhadores, de modo a atender às recomendações da proporção de 10 sujeitos para cada item da escala, feitas por Tabachnick e Fidell (1996). Eram trabalhadores da região do Triângulo Mineiro, que pertenciam há mais de três meses a uma mesma equipe de trabalho, sempre composta por mais de três pessoas.

Análises descritivas do grupo de participantes mostraram que 79% possuíam escolaridade correspondente ao 2º. Grau e 21% estavam cursando ou havia completado o ensino superior. Mulheres (53%) compunham a maioria dos participantes que tinham, em média, 27 anos de idade (DP= 8).

Procedimentos

Adaptação semântica da Escala de Bases de Poder de Hinkin; Schriesheim (1989)

A EBPS - Escala de Bases de Poder do Supervisor adaptada e validada neste estudo foi construída por Hinkin e Schriesheim (1989). Era constituída por 20 itens que avaliavam as cinco bases de poder de French e Raven (1959). Os itens originais foram traduzidos, discutidos por três conhecedores das línguas inglesa e portuguesa para que fossem adaptados semanticamente à língua portuguesa. Depois disto, os 20 itens foram discutidos com trabalhadores de escolaridade correspondente ao 2º grau e modificações na redação dos itens foram feitas por sugestão desse grupo, para deixá-los mais claros e compreensíveis.

Coleta dos dados

Os participantes foram abordados em seu local de trabalho (empresas da região) ou em seu local de estudo (escolas técnicas e faculdades). Em ambos os locais após a autorização prévia da empresa, do coordenador da instituição educacional e do professor, foram expostos aos participantes os objetivos do estudo e as normas éticas às quais a pesquisa estava submetida. Foi-lhes assegurado que as respostas seriam tratadas confidencialmente e esclarecido como seriam analisados os dados. Aos que concordavam em participar foram distribuídos termos de consentimento livre e esclarecido que foram assinados pelos participantes e pela responsável pela coleta. Por isto, todos os participantes foram voluntários.

Análise dos dados

As respostas dos participantes foram codificadas numa planilha do pacote estatístico SPSS for Windows 12.0 e submetidas a análises estatísticas para verificação dos pressupostos da análise fatorial: correlações, freqüência de dados omissos e dados extremos, teste de normalidade de Kolmogorov-Smirnov (KS) e scatterplots.

A fatorabilidade da matriz foi verificada pelo índice de Keiser-Meyer-Olkin (KMO), pelo teste de esfericidade de Bartlett, pela verificação da dimensão das correlações entre os itens, pelo determinante da matriz e pelos quadrados dos coeficientes de regressão múltipla, conforme recomenda Pasquali (2005). Além disso, havia sido garantido, conforme recomendam Tabachnick e Fidell (1996) um mínimo de 10 casos por item.

Foram ainda calculadas médias e desvios-padrão e feita contagem de freqüência para descrição dos participantes.

A matriz dos dados foi submetida à análise dos componentes principais e ao scree plot para estimativa do número de componentes, e à analise fatorial com rotação Promax para a extração dos fatores.

 

3. Resultados

O tamanho da amostra pode ser considerado como "bom", conforme Tabachnick e Fidell (1996, p. 640). Havia apenas oito respostas ausentes entre as 6240 marcadas; elas foram substituídas pela média. Os resultados dos testes de KS revelaram normalidade multivariada; a linearidade foi revelada no exame visual dos scatterplots e as correlações entre as variáveis mostraram não haver singularidade. Um valor de KMO de 0,84 e o teste de esferecidade de Bartlett (2 = 2483,29, p< 0,001) demonstraram a fatorabilidade da matriz de dados. Além disso, 52% das correlações entre os itens são maiores 0,30. Pasquali (2005) afirma que "se 50% das correlações forem acima de 0,30, certamente diremos que a percentagem é boa" (p. 58). Pasquali defende ainda que um dos indicadores da fatorabilidade da matriz é o quadrado do coeficiente de regressão múltipla e indica que "quanto maior for este coeficiente, maior a grandeza da associação linear entre as variáveis, e maior a fatorabilidade da matriz R" (p. 60). Os quadrados dos coeficientes de regressão múltipla foram calculados, postando-se cada item como VD e todos os outros como VIs. Além de todos os R2 serem estatisticamente significantes, 75% deles foram maiores que 0,40, o que aponta para a boa fatorabilidade da matriz. O determinante da matriz foi da ordem de 1,798-E04.

A análise dos componentes principais foi usada como uma pré-análise para a posterior análise dos eixos principais. Os resultados revelaram a existência de quatro componentes com valores próprios maiores ou iguais a um. O exame visual do scree plot (ver Figura 1) apontava para a existência de 4 ou 5 fatores. A matriz foi, então, submetida à análise dos eixos principais. Como as correlações entre os fatores eram de valores medianos (entre 0,19 e 0,39) eles foram extraídos pelo método PROMAX.

 

 

A escolha da rotação PROMAX deveu-se à observação de que parte das correlações entre os fatores estavam muito próximas de apontarem ortogonalidade entre eles (correlações muito baixas) e que outra parte apontava para a interdependência entre os fatores (correlações médias e algumas poucas, altas), justificando segundo Nunnally e Bernstein (1995) a opção por esta rotação. Segundo estes autores, "o objetivo da promax ... é similar ao da varimax que busca maximizar a propagação (variância) dos elementos do padrão em um fator. A promax começa com uma estrutura ortogonal (por exemplo, uma rotação varimax) e logo determina um padrão ideal que tenha uma propagação maior que esta estrutura ortogonal" (p.569-570), elevando os elementos da matriz a uma potência padrão de quatro em quase todos os programas, re-escalonando as razões entre eles e tornando-os, em valores absolutos, maiores do que eram na matriz original. Num segundo passo, a PROMAX executa outra rotação, a partir da solução ortogonal, buscando a solução ideal. Isto torna os fatores reais rodados obliquamente, tão próximos quanto possível dos ideais (Nunnally e Bernstein, 1995).

Os resultados revelaram a existência de quatro fatores que anexaram os 20 itens iniciais. Como os itens da base de 'referência' da Escala original de Bases de Poder de Hinkin e Schriesheim (1989) apareceram neste estudo anexados às bases de poder 'legítimo' e de 'perícia', tentou-se nova análise fatorial, forçando 5 fatores. Nem assim a base de poder de referência apareceu.

Foram, então, retidos quatro fatores com valores próprios iguais ou maiores que 1,0, responsáveis pela explicação de 59% da variância que reuniam os vinte itens com cargas iguais ou maiores que 0,30 (Tabela 1).

A análise da fidedignidade foi feita pelo cálculo do Alpha de Cronbach e da correlação média item-total (ver Tabela 1). Ambos os índices confirmaram a retenção de 4 fatores. O primeiro reuniu 6 itens, 4 referentes ao poder 'legítimo' e dois ao de 'referência', explicou 27% do total da variância e revelou fidedignidade de 0,81 e correlação item-total média de 0,57. Como o conteúdo da maioria dos itens referia-se ao poder legítimo e reunia itens como "Meu supervisor faz-me sentir que tenho compromissos a cumprir", foi denominado base de poder 'legítimo'. Nova análise do Alpha de Cronbach,foi feita retirandose os itens originalmente pertencentes à base de poder de 'referência' e seu resultado revelou leve aumento no valor que subiu para 0,82; a correlação item-total média também foi maior, desta vez de 0,64. Assim, o fator ficou composto por 4 itens referentes à base de poder Legítimo.

O segundo ficou composto por 6 itens, sendo 4 relativos ao poder de 'perícia' e 2 itens originalmente pertencentes ao poder de 'referência', explicou 15% da variância total e teve Alpha de Cronbach de 0,84 e correlação item-total média de 0,62. Como os 4 itens da base de poder de 'perícia' (por ex.: "Meu supervisor fornece-me boas sugestões técnicas sobre meu trabalho") compunham o fator, ele foi denominado base de poder de 'Perícia'. Nova análise do Alpha de Cronbach retirando-se os itens originalmente pertencentes à base de poder de referência revelou valor de 0,80. A correlação item-total média manteve-se em 0,62. Esta composição de 4 itens foi adotada em nome da pureza conceitual do fator (ver Tabela 1).

O terceiro reteve 4 itens relativos ao poder de 'coerção' (como: Meu supervisor pode tornar meu trabalho desagradável"), explicou 10% do total da variância, revelou Alpha de 0,81 e ficou denominado base de poder de coerção. A correlação item-total média foi de 0,70.

O quarto fator ficou composto por 4 itens referentes ao poder de 'recompensa', como "Meu supervisor pode influenciar para conseguir um aumento de salário para mim", explicou 7% do total da variância total e revelou Alpha de 0,72 (ver Tabela 1). A correlação item-total média foi de 0,52. Então, a Escala das Bases de Poder do Supervisor ficou composta por 16 itens e quatro fatores.

 

4. Discussão e Conclusões

Os resultados deste estudo revelaram uma estrutura fatorial de quatro bases de poder da taxionomia de French e Raven (1959). Mesmo constituindo-se na adaptação e na validação da Escala de Bases de Poder do Supervisor de Hinkin e Schriesheim (1989), uma das bases propostas por French e Raven e identificada por Hinkin e Schriesheim não se confirmou na estrutura fatorial identificada neste estudo: a base de poder de referência, que não se mostrou sólida o suficiente para ser detectada na análise fatorial, tendo seus itens sido divididos e agrupados às bases de perícia e poder legítimo. Mesmo quando foi imposta uma solução de 5 fatores, este quinto fator (base de poder de referência) não foi revelado.

Assim, pode-se perceber que os trabalhadores participantes deste estudo não conseguiram diferenciar o poder de 'referência' do de 'legitimidade' e 'perícia'. Este achado pode ser explicado em função de diferenças culturais, emergindo daí uma necessária reflexão sobre os valores dos trabalhadores brasileiros no que tange à adoção de referenciais ou de modelos de comportamento. Pode-se ainda hipotetizar que a base de referência não tenha sido identificada devido ao fato de os supervisores avaliados não representarem modelos a serem seguidos, por serem modelos fracos, inadequados ou não admirados, segundo dimensões sistematicamente categorizadas, conforme argumentam Aguinis et al. (1994).

Todavia, a identificação da multidimensionalidade das bases de poder identificada neste estudo corroborou os estudos de Hinkin e Schriesheim (1989), validando empiricamente quatro das cinco bases de poder da taxionomia de French e Raven (1959) confirmada nos estudos de Aguinis e Henle (1998), Aguinis et al. (1994), Hinkin e Schriesheim (1994) e Rahim et al. (1999). Todavia, estes resultados também revelam as peculiaridades da estrutura das bases de poder em diferentes países, conforme destacaram Hofstede (1991), Rahim et al. (1999), Rahim et al. (2000), Hess e Wagner (1999) e Ward (2001).

Diferentes estudos (Bass, 1981; Collins e Raven, 1969; Reitz, 1971; Shetty, 1978; Yukl, 1981) têm criticado a estrutura das bases de poder social afirmando que elas confundem bases de recursos com contexto social, parecendo insinuar a diferença entre recursos ou bases pessoais e recursos ou bases contextuais. Para exemplificar, no contexto organizacional, Mintzberg (1983) afirmou que as bases de poder existentes são: recursos, habilidades técnicas imprescindíveis para a organização, conhecimentos críticos para a organização, prerrogativas legais e acesso a quem tem poder, algumas semelhantes às propostas por French e Raven (1959) como conhecimento (perícia) e prerrogativas legais (poder legítimo).

Como resposta às criticas levantadas, Raven (1993) afirmou que a estrutura proposta em 1959 com French tem fornecido base teórica para os estudos da área por mais de 30 anos. Estudos empíricos como os de Carson et al.(1993), Rahim e Afza (1993) e Ward (2001) têm utilizado a taxionomia das bases de poder e encontrado relações com satisfação no trabalho, satisfação com supervisão, desempenho no trabalho, comprometimento organizacional e clima psicológico. Estudos como os anteriormente citados têm identificado relações importantes com outras variáveis. Todavia, uma preocupação prevalente na literatura tem sido o desenvolvimento de instrumentos de medida para sua identificação e, como afirmaram Schriesheim et al. (1991), o poder de discriminação desses instrumentos quando comparados a outros construtos.

Vários outros instrumentos de medida têm sido desenvolvidos para avaliar as bases de poder propostas por French e Raven (1959) como os de Drean, Burner e Hensel (1993), Nesler et al. (1999), além dos três anteriormente citados (Bachman, Smith e Slesinger, 1966; Student, 1968; Thamhain e Gemmill, 1974).

Em 2003, Peiró e Meliá, baseados nas bases de poder de French e Raven (1959), propuseram e testaram o que denominaram a teoria Bifatorial de Poder. Esta teoria propõe que poder possui duas estruturas: a primeira, poder formal, inclui as bases de poder legítimo, de recompensa e de coerção e está ligada a posição hierárquica ocupada pelo influenciador; a segunda, poder informal inclui perícia e referência, ligadas a características do indivíduo, independente, portanto, da hierarquia organizacional. Os autores partem da colocação de Moscovici (1984) que afirma que poder é um fenômeno relacional de dupla via no qual o sujeito pode ser agente e alvo de influência. Esta visão afasta-se um pouco da de French e Raven (1959) que enfatizam a dependência como o principal aspecto da influência social. Isto, todavia, não significa que, para French e Raven, não haja troca de poder entre agente e influenciado, já que dependência é uma relação entre duas pessoas ou uma pessoa e um grupo, que pressupõe ida e volta, ação e reação.

Os resultados do estudo de Peiró e Meliá (2003) confirmaram o reagrupamento da estrutura das bases de poder em dois fatores. Todavia, seu estudo, por utilizar rotação Varimax na análise dos componentes principais à qual submeteram os dados, desconsiderou que as bases de poder são interdependentes e inter-relacionadas, conforme propuseram French e Raven (1959) e demonstraram os estudos de Collins e Raven, (1969), Bass (1981), Reitz (1971), Shetty (1978), Hinfin e Schriesheim (1984) e Yukl (1981). Hinfin e Schriesheim (1984) encontraram que as bases de poder legítimo, de perícia e de referência estavam altamente correlacionadas entre si. Além disso, identificaram correlações significativas entre poder legítimo e poder de coerção; este último, entretanto, não estava correlacionado com nenhum outro tipo de base de poder. Estes achados reforçam os do estudo aqui relatado, que encontraram correlações altas entre alguns fatores e baixas entre outros, o que levou os autores a optarem pela rotação PROMAX. Hinkin e Schriesheim explicaram essas correlações afirmando que existe maior probabilidade de se perceber num mesmo influenciador as bases de poder provenientes de fontes pessoais, como o poder de referência e poder de perícia porque, geralmente, atribui-se conhecimento e perícia a quem se admira. A base de poder legítimo estaria, para eles, mais associada aos poderes de recompensa e de coerção que, segundo Raven (1993) baseia-se em posições ocupadas pelo influenciador.

Rahim et al. (2001) confirmaram por equação estrutural que a base de poder legítimo determinava diretamente a base de poder de referência e explicava negativamente a base de poder de coerção. Seus resultados revelaram ainda que poder de recompensa e poder legítimo determinavam diretamente a percepção de poder de perícia. Perícia, por sua vez, produziu impacto positivo na percepção da base de poder de referência.

Os achados descritos anteriormente apontam para a inadequação de testar a estrutura fatorial das bases de poder utilizando rotação ortogonal, caso da Varimax, como fizeram Peiró e Meliá (2003). Apesar disto, os autores encontraram na composição desses dois amplos componentes, itens de cada uma das bases de French e Raven (1959). Assim, seu estudo não permite afirmar que a estrutura fatorial das bases de poder encontrada por eles seja diferente da proposta por French e Raven, confirmada em outros estudos (Bass, 1981; Collins e Raven, 1969; Hinfin e Schriesheim, 1984; Reitz, 1971; Shetty, 1978; Yukl, 1981) e neste aqui relatado.

O relato feito anteriormente revela acordos e desacordos da literatura da área acerca da estrutura das bases de poder. Apesar disso, ao considerar-se que elas foram propostas há quase 50 anos, os poucos estudos que testaram sua estrutura fatorial confirmaram-na, ao menos, em grande parte. Os achados do estudo aqui relatado, apesar de ter identificado apenas quatro tipos de bases de poder, confirmam a tendência da literatura de corroborar a taxionomia de French e Raven (1959). Além disso, parece importante adaptar e validar instrumentos de medida para culturas específicas, dado que este e outros estudos anteriormente citados demonstram que, apesar de haver estruturas transculturalmente estáveis, existem peculiaridades de cada cultura que não podem ser desprezadas. Todavia, dada a restrição da amostra deste estudo, sugere-se novos testes da EBPS em amostras mais representativas da população de trabalhadores brasileiros e novos estudos que incorporem a ampliação da taxionomia proposta por Raven em 1993. Além disso, futuros estudos poderiam analisar os dados por meio de análise fatorial confirmatória, o que poderia fornecer resultados mais seguros sobre a estrutura empírica do modelo de French e Raven (1959) e do de Raven (1993).

 

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