Revista Psicologia Organizações e Trabalho
ISSN 1984-6657
RESENHA
Medidas do comportamento organizacional no Brasil: novos rumos para a pesquisa e intervenção em POT
Gardênia da Silva Abbad
Doutora em Psicologia Social e do Trabalho. Professora titular do instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB). (gardênia@unb.br)
Resenha do Livro: SIQUEIRA. M. (org.). Medidas do comportamento organizacional: ferramentas de diagnóstico e de gestão. Porto Alegre: Artmed, 2008.
O livro organizado por Mirlene Siqueira deve ser lido por todos os pesquisadores e profissionais de POT, pois descreve 20 instrumentos de medida de comportamentos organizacionais. Trata-se de um grande esforço de construção e validação de escalas brasileiras, aplicáveis à nossa realidade, tanto em pesquisas como em intervenções profissionais em organizações e trabalho. O livro é dirigido a todos aqueles que precisam produzir novos conhecimentos, realizar diagnósticos e planejar intervenções e mudanças organizacionais. Isto inclui alunos de graduação e pós-graduação e profissionais de psicologia e administração.
O livro contém vinte capítulos de fácil leitura, apesar da grande complexidade e variedade de temas que aborda. Cada capítulo está estruturado de forma simples, uniforme e de acordo com cinco seções: uma parte introdutória, que apresenta uma breve revisão e análise da literatura sobre o tema; a segunda, que relata as fases da construção e validação estatística dos instrumentos de medida; a terceira, que oferece orientações ao leitor sobre como aplicar, analisar e interpretar os resultados da aplicação da(s) escala(s) de medida; a quarta, que apresenta as referências bibliográficas relacionadas ao tema; e a quinta e última parte, que traz os instrumentos na sua íntegra (instruções, itens, escalas). Ao final de cada capítulo, o leitor se sentirá capaz de escolher, aplicar e interpretar resultados provenientes da aplicação das escalas descritas no livro.
Os temas e as medidas apresentadas no livro são pertencentes a uma área bastante ampla de estudos sobre comportamento organizacional. Entretanto, para a nossa alegria, os autores conseguiram tratar desses temas com simplicidade e profundidade! O que é algo admirável e muito difícil de realizar. Em nenhum capítulo, houve o emprego de linguagem excessivamente técnica, acadêmica. Os autores preferiram divulgar conhecimentos científicos relevantes
em linguagem acessível a todos. Inclusive as descrições das características psicométricas e das análises estatísticas envolvidas na validação das medidas foram redigidas pelos autores com a precisão necessária, mas sem tecnicismos exagerados. O livro cativará todos os tipos de leitores, inclusive aqueles que, ainda não dominam habilidades de aplicação de técnicas estatísticas multivariadas ou não gostam de realizar pesquisas apoiadas em abordagens quantitativas.
Os vinte capítulos abordam questões ligadas ao indivíduo e à organização. Todas as medidas apresentadas são perceptuais, sendo algumas das quais auto-avaliações e muitas delas avaliações do tipo "ecológicas", isto é, avaliações feitas pelo indivíduo sobre o ambiente organizacional. Essa característica é típica das medidas de comportamento organizacional. Algumas escalas, apresentadas no livro, como a Escala de Bases de Poder do Supervisor (EBPS), Escala de Clima Organizacional (ECO), Escala de avaliação do contexto de trabalho (EACT), Instrumento Brasileiro para Avaliação da Cultura Organizacional (IBACO), Escala de Percepção de Suporte Social no Trabalho (EPSST), Escala de Percepção de Suporte Organizacional (EPSO) são instrumentos de medida de características do ambiente organizacional. Enquanto outras medidas, como as Escalas de Comprometimento organizacional afetivo (ECOA), calculativo (ECOC), normativo (ECON) e de bases do comprometimento organizacional (EBACO) são focadas em auto-avaliações feitas pelo indivíduo. As primeiras possibilitam a investigação de percepções individuais e, além disto, do quanto as pessoas compartilham ou discordam entre si sobre diversos aspectos e processos da organização. A identificação dessas concordâncias e discordâncias são muito úteis em estudos diversos estudos organizacionais, entre os quais aqueles relativos a aprendizagem, cognição e mudança em organizações.
As vinte medidas apresentadas no livro são provenientes de pesquisas realizadas por vinte importantes pesquisadores brasileiros das áreas de POT e Psicologia Social. Esses pesquisadores trabalham em instituições de ensino superior, públicas (Universidade de Brasília, Universidade Federal da Bahia, Universidade Federal de Uberlândia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidade Federal do Vale do São Francisco) e privadas (Universidade Metodista de São Paulo, Universidade Católica de Goiás, Universidade Católica de Brasília, Universidade Salgado de Oliveira), e têm realizado pesquisas em organizações sediadas nas três regiões do país onde residem, ou seja, no nordeste, centro-oeste e sudeste.
Este livro passa a ser leitura obrigatória para os profissionais de POT. Algumas medidas descritas no livro organizado por Mirlene Siqueira foram referidas no livro Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil, publicado em 2004 pela Artmed e apelidado carinhosamente de dragão verde por alunos de graduação e pós-graduação. Este último é referência nacional em temas concernentes a comportamento organizacional. O livro Medidas do Comportamento Organizacional também se tornará referência porque organiza uma parte significativa da produção tecnológica de instrumentos de medida em POT. A produção de escalas em POT tem crescido muito nos últimos dez anos, porém os artigos que relatam a construção e a validação de escalas encontram-se dispersos em diversas revistas científicas da Psicologia e da administração (RAC, RAE, RAUSP), bem como em dissertações de mestrado e teses de doutorado.
Pra finalizar esta resenha transcrevo a seguir um pequeno trecho do prefácio do livro Medidas do Comportamento Organizacional, que tive a honra de redigir:
"O livro é resultado de muito trabalho: grandes revisões bibliográficas, difíceis coletas de dados primários em ambientes organizacionais diversos, enorme esforço de análise, interpretação e publicação de resultados em congressos e outros eventos científicos.
As revisões bibliográficas que embasaram as discussões teórico-conceituais e a escolha das estratégias de pesquisa foram buscar artigos, livros e outras publicações em diversas outras disciplinas e áreas afins como sociologia, antropologia, economia, administração, além da psicologia social e psicologia organizacional.
As pesquisas, apesar de apresentarem temas distintos, possuem muita coisa em comum. Uma delas é a busca de referenciais teóricos consistentes que conferem um caráter científico ao constructo que originou cada instrumento. O outro é a busca de medidas baseadas na realidade de organizações e de participantes brasileiros. Outro ainda é a preocupação com a validação estatística das medidas, conforme os padrões técnicos exigidos pela psicometria moderna, aplicada ao estudo de comportamento organizacional.
Mas para que tanto esforço?
Creio que há duas grandes implicações desse esforço: a primeira delas é fornecer à sociedade instrumentos cientificamente construídos e validados para a intervenção efetiva na realidade de organizações e trabalho. A segunda implicação diz respeito ao apoio à formação de novos pesquisadores e profissionais de alto nível na área, que tomando conhecimento com a produção de conhecimentos e tecnologias de qualidade comparável à produção internacional, aplicável à realidade brasileira, ficarão estimulados a estudar os temas abordados neste livro e, quem sabe, queiram ingressar em programas de pós-graduação stricto sensu em psicologia para se unir a nós na consolidação de POT no Brasil.(p.15)
Finalizo esta resenha sugerindo que todos leiam o livro. Espero que esta obra seja um ponto de partida e de referência para novos estudos de validação e de emprego de novas técnicas de validação confirmatória de escalas, de aplicação da Teoria da Resposta ao Item, de construção de novas escalas, de aprimoramento das medidas existentes, entre outros avanços na produção de conhecimentos em POT. Estou certa de que, após a leitura, muitos profissionais sentir-se-ão mais estimulados a pesquisar e a aplicar esses e outros instrumentos, cientificamente construídos e validados, em estudos sobre organizações e trabalho. Acredito também que a produção de conhecimentos na área avançará, crescerá e se consolidará. Espero também que uma parte significativa dessa produção de conhecimentos seja veiculada por intermédio da RPOT - revista da Associação Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho, que é parte importante do esforço de muitos, rumo à consolidação de POT no Brasil.
Referências
Zanelli, J. C.; Borges-Andrade, J. E. & Bastos, A. V. B. (Eds.). Psicologia, organizações e trabalho no Brasil. Porto Alegre: Artmed (2004) [ Links ]