Estudos Interdisciplinares em Psicologia
ISSN 2236-6407
Resenha
Marilda Aparecida Dantasi
Universidade Estadual de Campinas
Azzi, R. G.,& Gianfaldoni, M. H. T. A. (2011). Psicologia e Educação. São Paulo: Casa do Psicólogo.
Psicologia e Educação é o primeiro livro de uma coleção da Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (ABEP). Foi idealizado e organizado por Roberta Gurgel Azzi e Mônica Helena Tieppo Alves Gianfaldoni, integrantes da diretoria dessa Associação nas gestões 2007-2009 e 2009-2011, respectivamente.
Este livro está dividido em três partes com diferentes temáticas inter-relacionadas. A primeira parte, composta por três capítulos, aborda a trajetória histórica da Psicologia e Educação. A segunda parte, que reúne seis capítulos, proporciona discussões apoiadas em aproximações das abordagens teóricas da Psicologia na Educação. Por fim, a terceira e última parte, com quatro capítulos, apresenta debates sobre os desafios cotidianos nos contextos educativos.
Os autores dos capítulos, em sua maioria psicólogos, são profissionais experientes e renomados da área, visto a sucinta descrição deles ao final do livro, que contribuem de forma importante para repensar e discutir a Psicologia na Educação. A seguir, um breve apanhado do que cada capítulo oferece para que o leitor se aproxime da obra.
No Capítulo 1, escrito por Antunes, é apresentada uma retrospectiva histórica no que tange às esferas da Psicologia e Educação, abordando os pensamentos filosóficos. A particularidade desse capítulo é que a retrospectiva leva em consideração o campo nacional, em que, dividida em períodos históricos, essa retrospectiva torna possível visualizar o momento embrionário da área, com apontamentos característicos e associados a contextos sociais ligados a pessoas responsáveis pelo crescimento da área. A autora observa o amadurecimento da Psicologia Educacional e Escolar, sendo possível identificar a progressão diante das pesquisas e dos estudos desenvolvidos que fundamentam a base teórica da Psicologia Educacional e a prática da Psicologia Escolar. Antunes ainda evidencia que a área ainda requer desenvolvimento, tendo como fator de reconhecimento o fenômeno histórico-social que se insere estendido para além do educando, o que representa um dos desafios da atualidade.
O Capítulo 2, de autoria de Campos, descreve como ocorreu o processo de iniciação de laboratórios de Psicologia no Brasil. A autora apresenta um panorama das iniciativas quanto ao estabelecimento de laboratórios em “parceria” com os interlocutores europeus em diversas regiões do país, com destaque para os Estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Pernambuco. Retrata as tentativas de reprodução de modelos de experiências já realizadas no Velho Continente e a construção de um novo conhecimento, abordando tanto a contribuição da área escolar quanto o manuseio de experimentos na área de saúde mental. Sobre as atividades dos laboratórios, há um espaço reservado para a adaptação e padronização de testes psicológicos. Com a observação empírica, historicamente houve uma contribuição na construção de conhecimentos sistemáticos sobre o cenário das escolas públicas e do sistema de saúde no Brasil, considerando as variáveis psicológicas e psicossociais.
No terceiro capítulo, Conde aborda a temática da construção do currículo escolar e a inclusão da disciplina “Psicologia” na educação brasileira. Apresenta o histórico dessa disciplina em diversos cursos, desde o século XIX até o XXI. Chama a atenção quanto às condições externas às quais a Psicologia esteve vinculada nas escolas secundárias e normais. Na contemporaneidade, firma a necessidade de uma Psicologia articulada ao contexto social. Conde finaliza esse capítulo indagando-se sobre a contribuição da pesquisa psicológica para a educação e sobre quais respostas ela pretende oferecer a esse campo.
No Capítulo 4, Macedo inaugura a segunda parte do livro com a aproximação entre as abordagens da Psicologia na Educação, tendo como base parte da Teoria Piagetiana. O autor descreve diversos aspectos da abstração reflexionante e da ação reflexionante como processos importantes nas atividades relacionadas à aprendizagem. Este texto se subdivide em várias conceituações, em que algumas delas são exemplificadas com experimentos com crianças realizados por Piaget e, outras, com reflexões sobre o contexto escolar. No conteúdo desse capítulo transparece a condição de se compreender, por meio dessa teoria, os processos envolvidos no aprender e ensinar.
No Capítulo 5, Almeida e Mahoney apresentam uma segunda aproximação entre Psicologia e Educação, tendo como temática as contribuições da teoria de Henri Wallon para a Educação. Esse capítulo contempla uma breve biografia do teórico e, em seguida, retrata como parte dessa teoria descreve os estágios de desenvolvimento abordados de acordo com suas características quanto a aspectos da aprendizagem. São descritas também indicações da psicogenética Walloniana em documentos que nortearam a educação francesa em um período pós-guerra e são apontados reflexos dessa abordagem, assim como orientações e identificações, no contexto educativo atual. Esse capítulo traz, ainda, indicações de leitura sobre as obras de Wallon e links de assuntos relacionados.
O Capítulo 6, dos autores Facei e Eidtt, trata da formação do psicólogo para atuar no contexto escolar. Este texto remete a discussão a aspectos relacionados à compreensão do processo do fracasso escolar, bem como ao modo como o psicólogo tem realizado suas atividades. Os autores chamam a atenção para a amplitude do fenômeno em questão, ao considerarem aspectos da sociedade em sua total dimensão, e direcionam o saber do psicólogo frente a tais implicações. Neste texto, as análises realizadas são justificadas pelos pressupostos da Psicologia histórico-cultural, e são propostos eixos de intervenção do trabalho do psicólogo no contexto escolar que primem pela coletividade.
No Capítulo 7, de Gianfaldoni, Rubano e Zanatto, é discutido o processo de aprendizagem pela ótica da Análise do Comportamento. A contribuição deste texto é refletida em duas grandes variáveis desse processo: o ensinar e o aprender. As autoras ventilam o planejamento do ambiente escolar e rebatem críticas visando a um processo de individualização, e não de massificação. Ainda orientam a atuação profissional quanto à formulação de objetivos educacionais adequados, ao olhar estendido a todos os envolvidos neste contexto e à necessidade da promoção do autogoverno intelectual. Também são feitas sugestões de sites para a busca de mais leituras e filmes.
No Capítulo 8, as autoras Azzi e Polydoro trabalham na abordagem da Teoria Social Cognitiva de Albert Bandura. Este texto apresenta uma breve trajetória deste autor e o processo de construção de sua teoria. O foco de discussão está direcionado ao contexto educativo, em que são abordadas temáticas basais nos processos de aprendizagem que envolvem a perspectiva agêntica apoiada em condições sociais de alunos e professores. São discutidas as crenças de Autoeficácia como mediadoras de habilidades e desempenho e os processos de Autorregulação da aprendizagem, sob a perspectiva de diferentes modelos. Os resultados de pesquisas no campo educacional ilustram a contribuição e fortalecem a abordagem.
No Capítulo 9, Rocha destaca os desafios da Psicologia e Educação pautados em uma análise macro e micropolítica. Neste contexto, a provocação fica por conta da Psicologia, na pessoa do psicólogo que se coloca na maior parte dos ambientes em busca de mudanças. Estas, muitas vezes, também ocorrem pelas ações repetidas, que sofrem novas configurações. Quanto aos desafios do psicólogo referentes a seu papel, a autora sugere movimentos por parte desse profissional, de modo que busque se deslocar do seu “entorno” a fim de buscar inovação, embora seja reconhecida a dificuldade desta lógica em função de condições de trabalho.
Ao iniciar a terceira parte do livro com o Capítulo 10, Machado problematiza seu texto por meio da descrição de cenas comuns de serem vistas e ouvidas em contextos escolares quanto às dificuldades encontradas no dia a dia. A autora debate a questão da “normalidade” como norma e o uso desta como nivelação e indaga-se sobre o modelo médico muitas vezes recorrido pela psicologia. Neste contexto, Machado discute a medicalização, a qual muitas vezes é indiscriminada, e aponta a necessidade de diálogo em campos comuns, assim como da ajuda para todos os envolvidos.
No Capítulo 11, Teixeira apresenta reflexões sobre a formação escolar de jovens e sua inserção em um mercado de trabalho alinhado a processos excludentes em relação a níveis socioeconômicos. Discute a possibilidade de inclusão dos jovens e destaca os desafios de escolarização desta demanda. Teixeira também indica a necessidade de melhor compreender os jovens para que então seja possível propor intervenções. A finalização desse texto se mostra bem-apropriada, a qual indica pontos de aproximação ao universo juvenil.
O Capítulo 12, de Guzzo, é remetido à formação do psicólogo no contexto escolar, discutindo aspectos de experiências práticas. A autora indica propostas de estrutura curricular para a formação do psicólogo na atuação escolar. Aponta a necessidade de uma análise crítica do psicólogo para que sua atuação possa contribuir com mudanças sociais e ações preventivas como processo na construção de uma psicologia histórica e cultural atual e para uma redefinição de modelo.
Para finalizar, no Capítulo 13 Bock traz uma reflexão sobre a relação entre a Psicologia e a Pedagogia, que se constroem em condições em que há interesses sociais, estando marcadas pela desigualdade social revelada no cenário da América Latina. Apresenta como crítica ideias sobre questões como diferenças individuais, capacidades e potencialidades individuais, desenvolvimento previsto como facetas de uma Psicologia que colabora para uma observação de fatores sociais da Educação. Chama a atenção para este reconhecimento e esta revisão, assim como para a produção de um novo olhar a partir do panorama da América Latina.
Este livro é indicado para psicólogos e educadores que queiram se aprofundar nesta temática e refletir sobre mudanças necessárias na área. Além do conteúdo abordado em cada capítulo, ao longo desta coletânea são sugeridas outras fontes de conhecimento, tais como filmes e sites específicos, o que enrique a obra enquanto referencial e material didático.
O texto chama a atenção do leitor para as práticas do psicólogo e o convida a rever e ampliar seus pontos de análise sobre este contexto. A ressonância da maioria dos capítulos recai sobre questões de atuação do psicólogo, em que o leitor é constantemente convocado a repensar e ampliar sua ótica no contexto escolar, de maneira a considerar o que ocorre em sua volta, além daquilo que seus olhos já enxergam na sala de aula.
A proposta deste livro também vai ao encontro da formação do psicólogo e fornece bases para a construção de sua trajetória acadêmica, principalmente neste momento em que novas Diretrizes Curriculares de Psicologia foram aprovadas, como sinalizadas pelo próprio livro.
Endereço para correspondência
e-mail marildapsi@uol.com.br
iPsicóloga, doutoranda da Faculdade de Educação da Unicamp.