Desidades
ISSN 2318-9282
TEMAS EM DESTAQUE
O lúdico em questão: brinquedos e brincadeiras indígenas
Lo lúdico en cuestión: juguetes y juegos indígenas: Juguetes y juegos tomados en serio
Rita de Cássia Domingues-LopesI; Assis da Costa OliveiraII; Jane Felipe BeltrãoIII
IUniversidade Federal do Tocantins (UFT)
IIFaculdade de Etnodesenvolvimento da Universidade Federal do Pará (UFPA)
IIIProgramas de Pós-Graduação em Antropologia (PPGA) e Direito (PPGD) da Universidade Federal do Pará (UFPA)
RESUMO
O trabalho versa sobre brinquedos, ou melhor, utensílios lúdico-infantis, encontrados no acervo etnográfico do Laboratório de Antropologia Arthur Napoleão Figueiredo, da Universidade Federal do Pará, e também no relato etnográfico sobre as brincadeiras de crianças pertencentes ao povo Xikrín. Os brinquedos são tomados como modos particulares de apropriação de objetos utilizados pelas crianças no quotidiano de cada sociedade, desempenhando muitas vezes uma tripla tarefa: divertir, educar e construir as representações e os modos de socialização das crianças. Por outro lado, o ato de brincar evidencia a liberdade das crianças indígenas no processo de (re)apropriação dos valores culturais, entre os quais, o "saber da criança" mescla-se ao "saber sobre a criança" para construir a noção nativa do "saber tornar-se criança", condições antropológicas que reclamam a tradução intercultural dos direitos voltados às crianças indígenas.
Palavras-chave: Brinquedos, brincadeiras, crianças indígenas, coleções etnográficas, direitos.
RESUMEN
El trabajo se ocupa de los juguetes, o mejor, utensilios lúdico-infantiles, que se encuentran en la colección etnográfica del Laboratorio de Antropología Arthur Napoleón Figueiredo, de la Universidad Federal de Pará, y también en el relato etnográfico sobre los niños pertenecientes al pueblo Xikrin. Se consideran los juguetes como formas particulares de apropiación de objetos utilizados por los niños en la vida cotidiana de todas las sociedades, y que a menudo desempeñan una triple tarea: divertir, educar y construir las representaciones y modos de socialización de los niños. Por otra parte, el acto de jugar destaca la libertad de los niños indígenas en el proceso de (re) apropiación de los valores culturales, entre los cuales, el "saber del niño" se mezcla al "saber sobre el niño" para construir el sentido originario de "saber hacerse niño", condiciones antropológicas que exigen la traducción intercultural de los derechos dirigidos a los niños indígenas.
Palabras-clave: Juguetes, juegos, niños indígenas, colecciones etnográficas, derechos.
Brinquedos e brincadeiras levados a sério
Brinquedos enquanto objetos lúdico-infantis oriundos de sociedades indígenas são artefatos, não necessariamente numerosos, nas coleções etnográficas de reservas técnicas de museus e universidades brasileiras. Embora não tenham sido colecionados ou coletados a partir de pesquisas que tivessem como objeto as relações sociais referentes ao mundo da brincadeira ou ao universo infantil1, espaço onde frequentemente os brinquedos se inscrevem, os artefatos encerrados nas reservas foram recolhidos dentro de propostas voltadas aos temas mais candentes da etnologia indígena no Brasil, quais sejam: os estudos sobre organização social e contatos interétnicos que marcaram as décadas de 60 e 70 do século XX.
Os artefatos sob a guarda da reserva técnica do Laboratório de Antropologia Arthur Napoleão Figueiredo, da Universidade Federal do Pará (UFPA), não fogem à regra. O reconhecimento da dificuldade referente à "limitação produzida pela coleta" não se constitui em obstáculo para levar a sério os brinquedos e correlacioná-los às brincadeiras descritas na literatura antropológica pertinente ao tema.
O diálogo com os artefatos é feito a partir do registro das peças da reserva, que abre possibilidade de exame técnico a partir do manuseio, da fotografia e do desenho de observação em detalhe tanto do objeto em si, como de partes do objeto de acordo com a necessidade de compreensão. Portanto, a reserva técnica é o local de trabalho de campo. Simultaneamente, o "campo" é estendido à literatura antropológica em busca de descrições de objetos (existentes na reserva ou peças similares). Parte-se da obra dos profissionais que constituíram as coleções para, no momento seguinte, alcançar as referências etnográficas presentes nos registros de acervos localizados em páginas de instituições pertinentes na internet e nos trabalhos de etnologia indígena e, até mesmo, não indígena, rastreando imagens e descrições do quotidiano das sociedades que possam indicar a confecção e/ou o uso dos objetos tomados a exame ou de objetos similares.
O trabalho de campo, como reza a tradição antropológica, foi realizado entre os Xikrín localizados na aldeia Cateté, no hoje município de Parauapebas, no estado do Pará. O procedimento indiciário (Ginzburg, 1993) que se adotou permite ensaiar uma etnografia dos objetos por meio dos quais se pode fazer uma leitura da representação e sociabilidade sociocultural dos grupos geracionais, em especial as crianças, pois os brinquedos possibilitam ir além de quem produz os objetos ou brinca com eles.
Busca-se o lúdico para fins do presente exercício acadêmico a partir do acervo etnográfico sob a guarda da UFPA, onde há 22 brinquedos num universo de 1512 artefatos. Os artefatos são oriundos de quatro sociedades indígenas: oito brinquedos Anambé, quatro artefatos Suyá, uma única peça Trumai e nove brinquedos Xikrín. Produzidos em barro, madeira ou trançado em fibras vegetais, apresentam-se como miniaturas de arcos, flechas, chocalhos, faca e remo (Quadro 1). Artefatos que, segundo a classificação museológica proposta por Berta Ribeiro (1988), se inscrevem na categoria artesanal 'objetos rituais, mágicos e lúdicos', considerados utensílios lúdicos infantis que "... compreendem a vasta gama de brinquedos socializadores ... que ensinam as crianças de cada sexo a se familiarizarem com o patrimônio cultural de cada tribo... [os] objetos [são] fabricados por adultos, ou crianças mais velhas para lazer e prazer cotidiano" (Ribeiro, 1988, p. 286).
Categorias artesanais | Coleção Frikel (1965) Xikrín2 | Coleção Galvão & Frikel (1966) Trumai3 | Coleção Galvão & Frikel (1967) Suyá4 | Coleção Figueiredo & Vergolino e Silva (1969) Anambé5 |
Armas | Brinquedo/ Miniatura de arco (Nº. 188 e Nº 211) Brinquedo/ Miniatura de flecha (Nº. 210 e Nº. 212) | Brinquedo/ Miniaturas de arcos, de flechas e de zagaias (Nº. 1110) | ||
Cerâmica | Brinquedo zoomorfo de barro (Nº. 929, 930, Nº. 931 e Nº. 932) | |||
Instrumentos musicais e de sinalização | Brinquedo/ Miniatura de chocalho (Nº. 293 e Nº. 294) | Brinquedo/ Miniatura de chocalho (Nº. 743) | ||
Objetos rituais, mágicos e lúdicos | Brinquedo zoomorfo em envira (Nº. 214 e Nº. 215) | Brinquedo de taquara (Nº. 1081, Nº. 1082 e Nº. 1083) | ||
Trançados | Brinquedo trançado (Nº. 213) | Cesto paneiriforme (Nº. 1151) | ||
Utensílios e implementos de materiais ecléticos | Brinquedo/ Faca de madeira (No. 1118) Brinquedo/ Miniatura de remo (Nº. 1123) | |||
Utensílios e implementos de madeira e outros materiais | Brinquedo/ Miniatura de vassoura (Nº. 1077) |
Na maior parte, os desenhos e artefatos lúdicos representam miniaturas de objetos culturais de comprovada importância social. A designação de miniaturas não assume a feição terminológica de reprodução fiel e passiva das formas 'normais' dos utensílios, mas da capacidade de ilustração e/ou apreensão de objetos elaborados em total respeito às especificidades infantis e para uso privilegiado por este grupo geracional. As miniaturas possibilitam a compreensão, ainda que parcial, dos materiais utilizados para a socialização e caracterização dos elementos que constituem os traços identitários da infância nativa.
É importante registrar que a expressão nativa "brincadeira" esbarra numa querela de definições, como quer Dumazedier (1979), ou numa festa de conceitos (Vianna, 1997). Nas sociedades ocidentais, brincadeira não é uma categoria rígida, tampouco é uma categoria definida de comportamento6. Ao usar a expressão, pode-se referir tanto à brincadeira em si, como ao trabalho profissional que, apesar da contradição, pode ser prazeroso. Prosseguindo, vê-se que ela abrange uma gama enorme de situações, passando, inclusive, por obrigações, como o cumprimento às obrigações familiares (visitar parentes), ir a ofícios religiosos, espaço de sociabilidade onde se encontram os amigos. Brincadeira é o termo usado para indicar interrupções na faina diária, pequenas ou longas, mas faina não indica necessariamente trabalho, pode ser estudo ou, até mesmo, a interrupção da brincadeira.
A ligação conceitual entre brincadeira e lazer, estabelecidos como antônimos do trabalho/labor, é, nas sociedades ocidentais, situação que surgiu no período moderno, com a mudança da função do ócio. Era, na Grécia e na Roma antiga, assim como também na Idade Média, uma condição privilegiada para a realização das ações políticas e militares, sentido deslocado, com a ascensão do modelo socioeconômico do capitalismo e a difusão das indústrias, para a ideia de trabalho, entendido como ação contínua de produção de determinados bens de uso/consumo com valor em si e valor de troca.
No caso das sociedades indígenas, sabe-se que não necessariamente as atividades referentes ao brincar e às brincadeiras se circunscrevem aos momentos de interrupção da rotina, posto que, como não há espaço formal para aprendizado, antes ou depois da chegada dos brancos, a aldeia e o território são espaços de sociabilidade e de educação, com os eventos sociopedagógicos acontecendo, por exemplo, a caminho do roçado, na mata, no rio; enquanto se praticam as atividades rotineiras, pois se aprende fazendo.
Da sociabilidade à identidade: ampliando a concepção de brinquedos e brincadeiras
A sociabilidade – enquanto possibilidade de estabelecimento de redes de relações sociais – se apresenta de forma singular em cada sociedade, ligada ao modo como se manifesta a organização do tempo e do espaço, condição simbólica pela qual as pessoas se localizam e se posicionam no mundo social (Nunes, 2002b). As brincadeiras representam parte deste espaço-tempo de sociabilidade socioculturalmente construída. Suas significações dimensionam não somente as dinâmicas de interação social, mas a própria lógica da representação e desenvolvimento da pessoa, pois os mecanismos de interação lúdicos podem ser traduzidos como mecanismos de gestão e ação de/sobre indivíduos operados/legitimados pela sustentação de determinados valores, interesses e finalidades.
Em diversas sociedades, contar histórias, brincar de roda, fazer casinha, jogar peteca (bola de gude), empinar papagaio (pipa, pandorga), cantar, correr, jogar, entre tantas outras opções, representam formas de interação lúdicas traduzidas interculturalmente como brincadeiras7. Talvez, ao interrogar crianças e até adultos sobre o assunto, eles não terão dificuldade alguma em enumerar os brinquedos que utilizam e as brincadeiras das quais participam, de acordo com o universo no qual estão inseridos. Os adultos, nas brincadeiras, podem constituir-se em brincantes8 ou serem integrados como coadjuvantes, supervisores, produtores de brinquedos e professores, entre os muitos papéis que assumem na hora de brincar. A brincadeira é o correspondente nativo ao lazer e, enquanto política pública, é o lazer na perspectiva do especialista popular9 ou do brincante. Entre as crianças indígenas, as brincadeiras são apresentadas nos relatos etnográficos pela comparação intercultural que acentua (quase) sempre qualificações de maior liberdade de ação e interação no grupo de pares e com os adultos10. As brincadeiras assumem funções socioculturais de cunho 'educacional', para a formação e apropriação dos referenciais locais; 'lúdico', pela diversão produzida com finalidade de integração social; e 'identitário', representando a forma como a autonomia, representação e socialização de grupos geracionais, em especial as crianças, ocorre em determinado povo indígena.
Às crianças indígenas importa reconhecer o lugar desde onde se produz o "saber sobre a criança", o "saber da criança" e o "saber tornar-se criança": a interação complexa da brincadeira com o espaço experimentado, os lugares que elegem para a realização de ações nos grupos de pares e os modos como se re-apropriam dos lugares/objetos/discursos tradicionais, as narrativas que expressam os processos "nativos" de socialização e desenvolvimento humano, porque é no espaço-tempo de determinado território e na delimitação das representações culturais sobre corpo e pessoa que se inserem as condições de possibilidade para inscrição identitária (e etnográfica) da/na infância indígena. O "saber sobre a criança" e o "saber da criança" tornam-se variantes analíticas que organizam a bidimensionalidade da eficácia simbólica dos referenciais criança/infância em determinado contexto social, cujo entrelaçamento metodológico permite a estruturação das condições históricas, políticas e culturais de produção do "saber tornar-se criança", elemento-chave para o estabelecimento dos modos de fabricação local da identidade infantil e das conexões da geração com outros marcadores sociais da diferença, como etnicidade, gênero, classe social e contexto social de vida (urbano ou rural).
Território(s) e contexto(s)
O conceito nativo brincadeira, usado originalmente pelos falantes da língua portuguesa na Amazônia, foi (re)apropriado por outros povos étnico-culturalmente diferenciados localizados na mesma região, ante o processo de colonização e as relações interétnicas decorrentes.
Os falantes de línguas indígenas, como os Gavião Parkatêjê11 ou os Suruí Aikewára12, usam brincadeira tanto para se referir aos jogos de flecha praticados diariamente na aldeia, como aos rituais e às festas que celebram de acordo com suas tradições. E, ao se referirem aos não indígenas, falam em brincadeira de branco para nomear as festas de branco. Muito cedo, talvez, os membros de ambos os grupos tenham aprendido que interrupção da rotina, em português, é sempre sinônimo de brincadeira. Ou empregam o termo na expectativa de diminuir a carga de desconhecimento e preconceito dos brancos em relação aos seus costumes, pois, quem sabe, com o uso do termo brincadeira, os brancos os vejam menos exóticos e mais próximos da humanidade, que, em princípio, lhes é negada, apesar da tradução intercultural produzir perdas da significação sociocultural nativa, sobretudo nos ritos de iniciação, como o 'Pemp'13, que é realizado entre os 'Gavião Parkatêjê'. Supõe-se que a situação não seja muito diferente nas demais sociedades indígenas, dada a situação de contato/conflito interétnico.
Não são poucos os antropólogos que fornecem informações sobre a brincadeira ou o brincar em sociedades indígenas, embora seus sujeitos não sejam necessariamente as crianças14. As referências e os cuidados para coletar dados etnográficos sobre o brincar e a brincadeira estão presentes nos manuais antropológicos desde a elaboração do 'Notes and Queries on Anthropology', de 1971, e os resultados são encontrados nos itens denominados festas e rituais, classes de idades, esportes e jogos, ou brinquedos, nas monografias clássicas da etnologia brasileira, como o faz Curt Nimuendajú ao falar sobre os Apinayé:
[o]s meninos Apinayé não possuem nenhuma organização como a que têm a dos Ramkôkamekra e Xerénte. Por conseguinte também não fazem corridas de toras, e nunca os vi jogar em conjunto outra coisa a não ser peteca de palha de milho. Veem-se poucos brinquedos em suas mãos, sendo o mais comum, do quinto ano em diante, o arco e a flecha. Os maiores de dez anos, se reúnem às vezes para exercitarem-se na rua da aldeia em escorregar flechas pelo chão; aquele cuja flecha escorrega mais longe, ganha todas as flechas que ficam para trás. Os demais brinquedos são quase os mesmos dos Xerénte; a roda sonante (corrupio), o brinquedo de Cão, cuja corda entre os Apinayé tem um cabo de pau, o pião sonante, um pequeno pião de noz de tucum, figuras de pássaros e outros brinquedos de tiras de palha, figuras de fio armadas entre os dedos das mãos e pequenas figuras de cera, representando animais e gente. Falta-lhes o arco sonante dos Xerénte (Nimuendaju, 1956, p. 84).
A situação descrita por Nimuendajú, além de informar sobre os Apinayé, oferece pistas sobre outras sociedades Jê. O antropólogo refere, também, as meninas Apinayé, anotando que:
... não possuem bonecas e, por conseguinte, também poucos "trens" de brinquedo. Brincam com uma pequena abóbora alongada e, são tão felizes com esse "filhinho", como suas companheiras de idade entre os Ramkôkamekra-Canelas, com suas bonecas de talo de buriti. Não conhecem o balanço, mas havia no campo atrás da aldeia Bacaba, uma árvore fina e elástica, na qual trepavam a uma altura de três metros e depois de vergá-la com o peso do corpo, nela penduravam-se com as mãos e, dando forte impulso com os pés no chão, eram impelidas para cima com o repucho da árvore (Nimuendaju, 1956, p. 84).
As brincadeiras descritas por Nimuendajú (1956) dizem respeito ao contexto sociocultural específico, no qual, inclusive, refere o estreito laço que une as avós maternas e os netos, posto que, muitas vezes, esta mulher que, por ocasião do nascimento, foi parteira e curadora do neto transforma-se em guardiã e responsável por sua socialização, inclusive, conservando o cordão umbilical da criança num cesto, bem como os pertences que fazem parte da memória de infância do neto.
A brincadeira não aparece como um momento sem expressão, mas uma situação localizada espaço-temporalmente que compõe o cenário das relações sociais, forjando representações e sociabilidades, indicando a forma de integração e interação dos indivíduos no período inicial de vida. As informações recorrentes sobre as sociedades indígenas provocam reflexões sobre o fato de que, diferentemente da sociedade brasileira, os indígenas adultos não manifestam tanta ansiedade de transmitir, seja o que for, às crianças. A onipresença das crianças pelos quatro cantos da casa, da aldeia, entre tantos outros espaços destinados às brincadeiras, aponta a grande permissividade dos adultos aos seus comportamentos (Cohn, 2000 e Nunes, 2002b), e o ativismo das crianças no processo de apropriação e produção da significação cultura nativa por intermédio das interações nos grupos de pares e individualmente, com ou sem a presença de adultos, inseridos na construção sociocosmológica local da pessoa e do corpo, bases fundamentais para o entendimento da formação, socialização e transição geracional do universo cultural 'sobre a e da' infância.
Considerando que o âmago da antropologia, ou a tarefa do antropólogo, é constituído pelo trabalho de campo, por meio do qual se tenta compreender e explicar o modo de vida de um determinado grupo, aqui, busca-se entender a brincadeira a partir de brinquedos de coleções etnográficas constituídas tendo como referência os Xikrín do Cateté15.
Brincando em território Xikrín
As aldeias Xikrín16 têm formato circular, assemelhando-se às aldeias Kayapó, constituídas pelas unidades residenciais, dispostas uma ao lado da outra e ao centro encontra-se 'mentorodjo' (praça), onde está situado 'ngob', a Casa dos Homens, local onde os homens se reúnem para tomar decisões, conversar e preparar as festas. Nas aldeias o 'mentorodjo' (praça) é local de festa em momentos rituais, mas quotidianamente se constitui em espaço de trânsito entre uma casa e outra, onde as famílias se reúnem ao final da tarde para conversar e as crianças – conforme a categoria de idade – brincam em pequenos grupos. Algumas correm, outras jogam futebol, da mesma maneira que os homens jovens e adultos.
Outro espaço de socialização, onde as crianças podem ser vistas, são as chamadas "cozinhas", dispostas atrás das casas, constituídas por construções feitas de troncos de madeira e telhado de palha, algumas apresentam paredes feitas de madeira ou enchimento, outras são desprovidas de paredes. As "cozinhas" seguem o formato circular da aldeia, desenhando um anel em torno das casas. Segundo Silva é lá que
... são realizadas a maior parte das atividades cotidianas. É nessas estruturas que os Xikrín costumam passar várias horas do dia, processando e consumindo alimentos, conversando, divertindo-se entre si e com seus filhos, praticando a pintura corporal e produzindo a maioria dos seus itens materiais... (2000, p. 121).
Nas aldeias Xikrín as crianças podem ser vistas reunidas em categoria de idade ou próximas aos adultos de suas famílias em momentos de trabalho e lazer. Durante a infância, as atividades que realizam são marcadas pela divisão sexual do trabalho, as 'kurere' (meninas), por exemplo, acompanham as sessões coletivas de pintura corporal realizadas pelas mulheres adultas, ficam no local observando e por vezes brincam de pintar sua própria pele, a de um bebê, ou ainda suas boneca17. Assim, o grupo estaria socializando a menina na condição de futura pintora. Mauss considera que
...em todos esses elementos da arte de utilizar o corpo humano, os fatos de educação dominam... A criança, como o adulto, imita atos que obtiveram êxito e que ela viu serem bem sucedidos em pessoas em quem confia e têm autoridade sobre ela... O indivíduo toma emprestado a série de movimentos de que ele se compõe do ato executado à sua frente ou com ele pelos outros (1974, p. 215).
A 'kurere', desta forma, ensaia para tornar-se pintora quando adulta, faz e refaz a pintura sobre sua pele, ou no papel, ou ainda em crianças de colo que costumam tomar conta. O ensaio, por mais experimental que pareça, não diminui a responsabilidade e a autonomia das participantes, tampouco desmerece o caráter educacional, lúdico e identitário das brincadeiras: a jovem mãe ensaia sobre o corpo do filho recém-nascido até adquirir prática e técnica aprimorada, atividade que demonstra também carinho por parte da mãe, que socializa a criança dentro do grupo (Vidal, 1992), e as formas de intervenção sobre o corpo para a fabricação sociocultural das crianças indígenas mulheres.
Nas escolas das aldeias as crianças desenham adornos, armas, fauna e flora da região, bem como o espaço da própria aldeia. Tais desenhos são manifestações que revelam/registram valores desenvolvidos pelo grupo, tornando-se um padrão de identificação do indivíduo diante de si mesmo e dos demais (Mauss, 1974). O grafismo é linguagem visual carregada de simbolismo18, que é socializada e apreendida por todos, dentro do grupo. Tomando o desenho feito por Mokuka Xikrín19 (Figura 1), percebe-se que cedo as crianças dominam os artefatos referentes à cultura. Na escola, as armas utilizadas na aldeia foram cuidadosamente desenhadas uma ao lado da outra: um arco, duas flechas com pontas diferenciadas e uma borduna espatulada, tais objetos são utilizados em momentos rituais como o 'Merereméi', embora muitas vezes os artesãos Xikrín elaborem miniaturas para deleite das crianças.
Figura 1: Desenho de Mokuka Xikrín: armas Xikrín
O registro permite olhar o vivido nas aldeias, sejam caçadas, pinturas, rituais, confecção de artefatos, entre outros, sempre feitos sob olhar atento de crianças e jovens que apreendem e repassam de geração a geração as referências culturais Xikrín.
Observa-se, por meio dos desenhos (Figura 1), o registro da educação e da significação apreendidas diariamente nas aldeias. A produção de artefatos reflete, ainda, a continuidade do uso de equipamentos e matérias-primas, de acordo com crenças, valores e mitos – estes últimos oferecem, algumas vezes, a origem de pessoas e objetos atribuída aos ancestrais e/ou aos heróis mitológicos.
Na reserva técnica da UFPA, os brinquedos Xikrín totalizam nove peças entre miniaturas de 'djudjê' (arcos), 'kwakê-kakiére' (flechas), 'ngô-tói' (chocalhos), 'mekarón' (brinquedo trançado) e 'kokói' (figura de envira representando macaco-prego). Os artefatos registrados deixam nítido o cuidado das crianças com o acabamento e re-apropriação das dimensões naturais para torná-los aptos a serem manejados por crianças e jovens. Ao observar a miniatura de arco (Nº. 188) e de flecha (Nº. 210) compreendemos que se destinam aos jovens, assim como a miniatura de arco (Nº. 211) e de flecha (Nº. 212) corresponde às crianças, tais diferenciações indicam os cuidados e a maneira de socialização dos Xikrín nos últimos 50 anos.
O brinquedo antropomorfo trançado em folhas de babaçu (Nº. 213) "é uma máscara em formato pequeno, servindo de brinquedo aos meninos" (Frikel, 1968, p. 61). As partes constituintes do artefato – cabeça, tronco e membros – são produzidas separadamente e reunidas por meio de cordões de envira. Frikel (1968) nos informa que a confecção é de ordem masculina.
O brinquedo anterior da produção do 'Kokói' (Nº. 214 e Nº. 215) é masculino, os pais fabricam para os filhos. O boneco de envira que representa o macaco-prego é confeccionado com folhas de castanha e apresenta mãos e pés feitos com três dedos, segundo Frikel "[fazem] lembrar certas representações em desenhos rupestres" (1968, p. 61).
Os 'ngô-tói' (miniatura de chocalho, Nº. 293 e Nº. 294) são produzidos com o mesmo material dos chocalhos destinado aos adultos, todavia, por serem menores e destinados às crianças, não têm ponta de paxiúba e apresentam o tamanho menor da haste. Este instrumento musical de uso infantil serve para acalmar as crianças e para brincar, sendo fabricado apenas por homens, mas utilizado por todos na aldeia.
Tais brinquedos fazem parte da reserva técnica da UFPA e representam momento histórico de contato recente para o grupo Xikrín, nos idos da década de 1960. Hoje ainda é possível ver arcos, flechas e miniaturas de chocalhos sendo utilizados pelos meninos na aldeia, diferentemente do brinquedo trançado e do boneco de envira, que não são mais fabricados. Entretanto, segundo Cohn, a cultura material destinada às crianças "... foi enriquecida com novos brinquedos, inspirados em um mundo que conheceram há pouco, como as hélices de avião ou pipas [papagaio, pandorgas]" (2002, p. 117). Por isso, atualmente os Xikrín compram alguns brinquedos industrializados nas cidades próximas à área indígena.
Brinquedos e brincadeiras: seriedade que reclama direitos (d)e relativização
A reciprocidade analítica entre crianças e brincadeiras delineia o ato de brincar como direito, ou seja, condição situacional que contribui para o desenvolvimento infantil e obriga os agentes sócio-institucionais a promovê-lo ou assegurá-lo.
O direito à brincadeira (ou ao ato de brincar) está presente, na legislação internacional, desde a promulgação da Declaração Universal dos Direitos das Crianças (DUDC) de 1959, reconhecido para garantir o acesso das crianças aos jogos e às brincadeiras de caráter educativo, com a promoção do exercício ligada à exigência de materialização pela sociedade e autoridades públicas.
Na Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) de 1988, o direito à brincadeira/ ao ato de brincar ganha 'status' de direito fundamental a partir da inserção no artigo 227 da absoluta prioridade de crianças e adolescentes terem assegurados o direito ao lazer, gênero no qual a espécie brincadeira pode ser alojada, ao menos juridicamente. Da mesma forma, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei No. 8.069/90 – ECA) também recepciona, no artigo 15, o ato de brincar e de se divertir como partes constitutivas do direito à liberdade.
Sem dúvida, os conceitos jurídicos contemplam a universalidade dos destinatários em alusão ao princípio da igualdade presente no aspecto político da cidadania. No entanto, fica em suspenso, ou invisível, justamente o aspecto da diversidade dos modos de produção das brincadeiras e dos brinquedos, ou seja, a definição dos contextos particulares de onde emerge a alteridade dos modelos de representação e socialização humana. Logo, o desafio de reconhecer as situações de fato para efetividade dos direitos perpassa, no âmbito das diferenças socioculturais, pela própria capacidade de relativização das normalidades conceituais para a realização do "olhar distanciado" e compreensão das significações nativas que organizam a realidade do "saber sobre a criança" e do "saber da criança" que resultam na construção do "saber tornar-se criança".
O arcabouço teórico desenvolvido no presente trabalho deixa nítida a orientação da possibilidade de sustentação do direito de relativização às brincadeiras e brinquedos indígenas a partir do questionamento da própria forma como ocorre a construção sociocultural da pessoa e as múltiplas agências que estruturam o corpo. O lúdico indígena se entrelaça com outras dimensões sociocosmológicas nativas e também se modifica, tendo em vista os contatos interétnicos, mas o caráter universal (ou homogeneizado) dos conceitos jurídicos ocidentais e das imagens sociais estereotipadas dos povos indígenas impõe espaços de tensão que se convertem em verdadeiras barreiras para o entendimento do "outro" lúdico em termos de igualdade de condições e de valorização das diferenças, o que reclama aquilo que Warat (2000) denominou de "simbolização democrática", ou seja, a dinâmica do descentramento dos lugares comuns de significação pela resistência permanente ofertada contra os centros estabelecidos de homogeneização autoritária dos sentidos e instituição de um campo social que busque evidenciar o plural com que se formam as significações.
Mais do que criticar negativamente o etnocentrismo pós-moderno, é preciso compreender as funcionalidades e finalidades que estruturam/legitimam os paradigmas hegemônicos ocidentais, utilizando como ferramenta de leitura os referenciais teórico-metodológicos que situam brincadeiras e brinquedos na perspectiva sociocultural da formação e socialização da pessoa e do corpo. Por outro lado, a consolidação das marcas sociais da diferença entre indígenas e não-indígenas é potencializada pelas ferramentas jurídicas nacionais e internacionais relativas aos direitos coletivos dos povos indígenas, nas quais a autonomia político-cultural e cidadania diferenciada passam a representar a projeção ética da 'igualdade na diferença' e ressaltam que as lacunas das normalidades conceituais, sobretudo em relação aos direitos das crianças e dos adolescentes, são possibilidades de inscrição da "simbolização democrática" do 'ser criança indígena'.
Para tanto, as coleções e os relatos etnográficos recuperam o importante papel de 'mapeamento geopolítico das diferenças', disponibilizando o acesso a acervos e interpretações comprometidas com o ponto de vista do "outro" e a resistência aos valores hegemônicos. Sem dúvida, nem todos os relatos etnográficos se pautam nesta perspectiva, haja vista a crítica de Nunes (2002b) à historicidade do lugar epistemológico das crianças indígenas nas pesquisas antropológicas, mas a contribuição da etnologia indígena no encontro com a antropologia do direito seria justamente a de revelar as vidas que existem para além das cegueiras modernas, fazendo deste processo o termômetro da reivindicação pelo respeito à livre-determinação no diálogo (tenso) com os mecanismos de inclusão e participação social.
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Data de recebimento: 22/07/14
Data de aceitação: 15/10/14
1 Infância é aqui apreendida como noção diferente do conceito de criança. Assim, enquanto infância é a concepção ou representação social de um determinado período inicial da vida, as crianças são os sujeitos inseridos nesta condição (Ferreira, 2008).
2 Recolhidos pelo antropólogo Protásio Frikel, entre 1961 e 1962, junto aos Xikrín do Cateté, cuja entrada na Reserva ocorre em 1965. Sobre o assunto, consultar: Frikel (1968).
3 Coletado por Eduardo Galvão e Protásio Frikel em 1966.
4 Os artefatos Suyá foram recolhidos pelos antropólogos Eduardo Galvão e Protásio Frikel na década de 60 do século passado no Parque Nacional do Xingu. São brinquedos que entraram na Reserva Técnica em 1967. Sobre o tema, consultar: Galvão (1996).
5 Coletados pelos antropólogos Arthur Napoleão Figueiredo e Anaíza Vergolino e Silva, entrados na Reserva Técnica em 1969. Sobre o assunto, conferir: Figueiredo (1983 e 1984).
6 Na concepção do folclore, brincadeira é entretenimento, acompanhado ou não de melodia ou coreografia. Sobre o assunto, consultar: Câmara Cascudo (2000).
7 Para compreender as conotações de brincadeira, inclusive as noções populares, conferir: Azevedo (1983).
8 Usa-se brincante em sentido amplo, como participante de folguedos populares.
9 Assim como nas instituições responsáveis pela execução das políticas públicas denominadas de lazer ou entretenimento temos o animador cultural, em diversos espaços se encontram especialistas populares em brincadeiras, o "brincante", que pode chamar-se: João fogueteiro, puxador de ladainha, cantador de carimbó, narrador ou contador de histórias, entre tantos outros. Sobre o assunto, consultar: Lévi-Strauss (1970).
10 A apreensão da liberdade das crianças indígenas, em comparação com as crianças não-indígenas, sinaliza outra lógica de compreensão da racionalidade das pessoas nos períodos iniciais de vida, contraposta com os modelos ocidentais de incapacidade civil até os 18 anos de idade. Cohn (2000 e 2005), Nunes (2002) e Nobre (2007) estruturam parâmetros nativos e teóricos de compreensão da circulação das crianças indígenas pelo território como condição sociocultural fundamental para a aprendizagem e o amadurecimento, mas nunca de modo a subjugá-las intelectualmente aos adultos.
11 Sociedade indígena Jê que habita a Reserva Indígena Mãe Maria, no sudeste do Pará, na região do rio Tocantins, falante de língua filiada ao tronco Macro-Jê, cujo embate com os brancos data dos idos da década de 1940. Para informações atualizadas sobre o grupo, recorrer a Ricardo (2000).
12 Sociedade indígena Tupi que habita a Área Indígena Sororó, no sudeste do Pará, na região da bacia hidrográfica do Araguaia-Tocantins, falante de língua filiada ao tronco Tupi-Guarani, cuja saga de convivência com os brancos foi traumática em função da Guerrilha do Araguaia ocorrida na década de 1970 do século XX. Para informações atualizadas sobre o grupo, recorrer a Ricardo (2000). Sobre as brincadeiras entre os Suruí Aikewára, consultar: Mastop-Lima (2002).
13 O Pemp é um rito de passagem realizado pelos 'Gavião Parkatejê' e os 'Gavião Kyikatêjê', entre outros povos pertencentes ao macro-tronco Jê, como os 'Kayapó', os 'Apinayé' e os 'Timbira'. O 'Pemp' representa o auge do processo cultural de formação do corpo e da pessoa, momento de transição do "ser criança" do sexo masculino para o "ser adulto", marcado por regras e procedimentos rigorosos. As lideranças e os velhos costumam denominá-lo de "brincadeira séria" e fazem analogia com o quartel para designar a intensidade do rigor exigido durante o ritual. Investigações etnográficas que ressaltam o procedimento e a finalidade sociocultural do 'Pemp' podem ser encontradas em Nimuendaju (1956) y DaMatta (1976).
14 Sobre a forma como as crianças foram e ainda são vistas nos estudos antropológicos, consultar: Nunes (2002b) e Cohn (2005).
15 Um parâmetro da importância atribuída aos brinquedos indígenas foi a expedição feita por um grupo de pesquisadores sobre brinquedos indígenas. Os organizadores da expedição lançaram, em 04.05.2004, em Brasília, no Ministério da Educação, um 'kit' de jogos, brinquedos e brincadeiras que foi distribuído a, pelo menos, 20 mil escolas, em particular às escolas indígenas de todo o país. O 'kit' inclui um livro para crianças, um guia para professores e peças de alguns jogos, com explicações sobre como jogar. Além disso, 500 cópias do vídeo-documentário da expedição foram distribuídas. Conferir: Manchetes (2004).
16 Localizadas na área indígena Xikrín do Cateté, no sudeste do Pará, são chamadas de Cateté e Djudjê-kô. Sobre os Xikrín e, especificamente, sobre os artefatos custodiados pela UFPA, consultar: Domingues-Lopes (2002).
17 Sobre as atividades nas "cozinhas" e as pinturas de jenipapo em bonecas de plástico compradas no comércio em Marabá/PA, conferir texto e fotos de Vidal (1992).
18 Sobre linguagem simbólica, consultar: Vidal e Müller (1986) e Ribeiro (1989).
19 Discente da Escola Indígena Bep-Karoti, 14 anos, cursando a 4ª série.
I Antropóloga, mestre em Antropologia pela Universidade Federal do Pará (UFPA), professora do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal do Tocantins (UFT), Campus de Tocantinópolis. E-mail: ritalopes31@yahoo.com.br II Advogado, mestre em Direito pela Universidade Federal do Pará (UFPA), professor da Faculdade de Etnodesenvolvimento da UFPA, Campus de Altamira. E-mail: assisdco@gmail.com III Antropóloga e Historiadora, doutora em História pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), professora dos Programas de Pós-Graduação em Antropologia (PPGA) e Direito (PPGD) da Universidade Federal do Pará (UFPA). E-mail: janebeltrao@gmail.com