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Psicologia da Educação
versão impressa ISSN 1414-6975versão On-line ISSN 2175-3520
Psicol. educ. no.45 São Paulo dez. 2017
https://doi.org/10.5935/2175-3520.20170021
COMPARTILHANDO
RESENHA
Uma fenomenologia do corpo1
Marcus Vinícius Simões de CamposI; Natália Papacidero MagrinII; Marina Melo CintraII; Wagner Wey MoreiraIII
IPrograma de Pós-Graduação em Educação, Universidade Federal do Triângulo Mineiro
IIPrograma de Pós-Graduação em Educação Física, Universidade Federal do Triângulo Mineiro
IIIPrograma de Pós-Graduação em Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação Física, Universidade Federal do Triângulo Mineiro. camposmvs@gmail.com
Uma Fenomenologia do Corpo, obra da professora e pesquisadora Terezinha Petrucia da Nóbrega, proporciona ao leitor questionamentos acerca do corpo, da sensibilidade, da arte e da educação, pautando-se na fenomenologia como uma abordagem metodológica de reflexão e investigação. O livro é um dos integrantes da coleção Contextos da Ciência da Editora Livraria da Física - São Paulo/SP, 126 páginas, editado nesta segunda década do século XXI.
Terezinha Petrucia da Nóbrega é doutora em Educação pela Universidade Metodista de Piracicaba e Pós-Doutora em Filosofia pela Pontifica Universidade Católica de São Paulo e Université de Montpellier - França. Atualmente é professora associada da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e dedica seus estudos às filosofias do corpo, epistemologia e cultura de movimento, sendo líder do Grupo de Estudos Corpo e Cultura de Movimento.
Interessante, já de início, observar a incorporação da atitude fenomenológica da autora, quando a mesma, na apresentação do livro, revela sua intuição ante ao fenômeno corporeidade como noção teórica-experiencial, deixando clara a íntima relação existente entre educação e jogo criativo, essa mediada pelas "(...) razão e sensibilidade por meio da estesia do corpo e de sua comunicação sensível" (Nóbrega, 2010, p. 9).
Daí a presente publicação oriunda dos estudos e do fascínio da autora pela corporeidade e, principalmente, pela obra do filosofo francês Maurice Merleau-Ponty (1908-1961), o qual expressa a necessidade do diálogo entre a filosofia, a cultura, a história, as experiências vividas e outras formas de conhecimento mostrando sua relevância para com a educação. A autora materializa estes diálogos quando afirma que em sua atividade de ensino e pesquisa tem:
(...) refletido sobre a linguagem do corpo, sobre a racionalidade, a sensibilidade e sobre a nossa condição de seres encarnados, atados a um mundo no qual nos movemos, e, ao fazê-lo, nos experimentamos como seres humanos e assim nos educamos e educamos os outros. (Nóbrega, 2010, p. 13)
Ao findar a apresentação de seu livro, a autora nos convida a refletir, afirmando que:
Apresento uma reflexão sobre a questão da racionalidade, a partir de uma posição que considera a sensibilidade como potência de conhecimento, evidenciando que a existência é primeiramente corporal e que o corpo é a medida da nossa experiência no mundo e, portanto, referência primeira de conhecimento. (Nóbrega, 2010, p. 15)
Todo o trabalho é bem articulado, sua organização traz notas explicativas e citações em rodapé quando necessárias, sua escrita é didática, e seu conteúdo, reflexivo/explicativo.
Ao iniciar cada capítulo, Petrucia (como é mais conhecida por seus colegas acadêmicos) apresenta breve introdução sobre o que será discutido, bem como as informações principais do capítulo. Seu livro é estruturado em quatro partes: a primeira destina-se a refletir sobre os saberes do corpo e a fenomenologia; a segunda aborda o existencialismo do corpo carnal e a sensibilidade; daí a razão da terceira parte, considerando estar aberto o caminho para incorporar e deixar fluir essa mesma sensibilidade no trato do corpo arte e do corpo estético; por fim, na quarta parte, utilizando-se da transversalidade rizomática, por essa não estar atenta com fundamentos únicos do saber e nem buscar sínteses totalizantes, contextualiza as manifestações do corpo com a ciência e a educação.
O capítulo I intitula-se O corpo como sensível exemplar, e subdivide-se em "Os saberes do corpo" e "A fenomenologia como método",tratando fundamentalmente da corporeidade. Utilizando uma visão panorâmica, mostra que a compreensão mais difundida de corpo na cultura ocidental é aquela que atrela este como um instrumento da alma. Vemos isto presente na Grécia Clássica, na tradição Cristã, no dualismo de Descartes e no mundo da tecnologia cibernética do tempo presente. Comprova-se a preocupação de Merleau-Ponty quanto ao corpo-objeto.
O clímax atual desse corpo-objeto pode ser descrito pelas palavras da autora:
Para a cultura do consumo, o corpo é veículo de prazer, estando associado a imagens idealizadas de juventude, saúde, aptidão e beleza, que favorecem a expansão da indústria da moda, cosméticos, academias de ginástica e afins. (...) A percepção do corpo é dominada pelas imagens da cultura de consumo. (Nóbrega, 2010, p.23)
"Vivemos num mundo de imagens, atravessando fronteiras on-line, um processo avançado de desterritorialização das coisas, das ideias, das pessoas; o anúncio de uma cultura global. No entanto, a perda do entorno gera desculturalização" (Nóbrega, 2010, p. 24). É importante notarmos que a tecnologia é importante; no entanto, a cultura não se reduz apenas a uma realidade virtual, pois, assim sendo, corremos o risco de tê-la como mais uma ferramenta de domínio dos corpos, submissos ao poder de instituições prisionais, manicomiais, industriais e por que não escolares.
Somando as preocupações levantadas no parágrafo anterior à constatação de que as intervenções sobre o corpo ocorrem de forma fragmentada, como já nos alertaram, dentre outros, Foucault, Baudrillard, Deleuze e Guattari, identificamos a desarmonia corporal e o corpo permanentemente dividido, propiciando a concretização da disciplina corporal e a formatação de corpos dóceis.
Preocupa-nos constatar as palavras de Petrucia: "O ressurgimento do corpo na atualidade, fundado nas próteses e no modelo cibernético, traz consigo o reaparecimento do dualismo em novas bases(...)." (Nóbrega, 2010, p. 30). Constata-se que a cultura contemporânea nos apresenta um novo mentalismo, em que as funções corporais são substituídas pela virtualidade, formatando o que poderíamos chamar de corpo-objeto-cibernético.
Daí a necessidade, na proposta da autora e com a qual concordamos, de juntarmos esforços para a construção e vivência de uma teoria da corporeidade pautada na multiplicidade de sentidos dos saberes do corpo e não simplificar o fenômeno em categorias, mas permitir diversos olhares, abordagens e aproximações, partindo do diálogo e da comunicação que configuram esse amplo universo.
Dessa forma, Nóbrega inicia o segundo subitem do primeiro capítulo, "A fenomenologia como método", e é enfática ao dizer que a corporeidade é uma dimensão sensível do corpo vivido, no qual suas funções são livres de teorizações. Num primeiro olhar, essa afirmação parece uma contradição com o defendido no final o subitem anterior. Mas, na verdade, a contradição é ilusória a partir do momento em que ficou demarcada a necessidade de uma teoria da corporeidade, estando a mesma incorporada na existencialidade.
A fenomenologia busca romper com um dos principais postulados da modernidade, o racionalismo, ao colocar a experiência vivida como referência de qualquer sistematização teórica, substituindo, assim, o predomínio da razão excludente e linear pelo mundo vivido, unindo o refletido e o irrefletido, a razão e a não-razão, o visível e o sensível. "O universo da corporeidade é polimorfo, paradoxal, incerto, desafiador e poético. Um universo de imagens, cores, formas, sons, movimento, comunicação e expressão que embaralha o pensamento e as ideias que querem racionalizar, ordenar logicamente em esquemas simplificadores" (Nóbrega, 2010, p. 42).
Importante para os que estão militando na ciência através de suas pesquisas, considerar que ainda temos como matriz paradigmática o entendimento de ciência aquela que busca a explicação dos fatos, a construção de hipóteses, a verificação empírica, numa lógica de busca das generalizações de resultados. Os questionamentos que deveríamos fazer, sem constatar também a validade deste método ao logo da história para a solução de vários problemas, não seriam os seguintes: Esta é a forma mais acertada para a busca do entendimento do humano no homem? Essa forma hegemônica de conceber e realizar pesquisas atende às necessidades de investigação do universo da corporeidade explicitado anteriormente?
Está criado o pano de fundo para os argumentos do capítulo II, intitulado O corpo como conhecimento, e subdivido em "O corpo carne"e "A reflexividade do corpo". Esta seção tem por finalidade desenvolver uma reflexão sobre os saberes a respeito do corpo, especialmente desenvolvidos no século XX. Sua argumentação se origina e converge por quase todo o capítulo na fenomenologia de Merleau-Ponty e desemboca na aproximação desta com a teoria autopoiética esboçada por Maturana e Varela.
Atravessando o desenvolvimento científico das ciências como fisiologia e bioquímica ao longo dos séculos e seus modelos científicos pautados no mecanicismo e no cartesianismo, a proposta da autora no subitem "O corpo carne" é uma leitura fenomenológica do corpo a partir de Merleau-Ponty. Para esse autor, o corpo demonstra uma nova concepção do termo consciência, não mais compreendida à maneira do cogito cartesiano, mas dimensionada pelo corpo como unidade existencial, e esse apresentado da seguinte forma: "O corpo não é coisa, nem ideia, o corpo é movimento, gesto, linguagem, sensibilidade, desejo, historicidade e expressão criadora" (Nóbrega, 2010, p. 47).
Estamos diante de um novo entendimento ou conhecimento sobre termos como corpo e consciência, na superação da conjunção aditiva grafada anteriormente, pois é "(...) uma compreensão do conhecimento que supera a ordem do cogito, do eu penso, e afirma a experiência expressiva do corpo na experiência vivida" (Nóbrega, 2010, p. 49).
A noção de corporeidade ganha espaço ao superar os termos consciência de corpo ou consciência corporal, impossíveis à leitura fenomenológica, pois essa não reconhece organismo e consciência como causalidades distintas. Sensação e percepção não são elementos inferiores ao racional e, sim, estruturas imprescindíveis para o conhecimento e para a compreensão do mundo. "Na perspectiva fenomenológica, a dimensão essencial só ganha sentido se unida à dimensão existencial, ao mundo vivido" (Nóbrega, 2010, p. 54).
Fundamentando-se em Merleau-Ponty, a autora persegue o adensamento do conceito de corporeidade e se direciona a um ponto de vista de uma fenomenologia biológica, relacionando essas à teoria da autopoiese.
O diálogo entre filosofia e ciência é recorrente nessa parte do capítulo em que Nóbrega, ao levantar a quebra dos paradigmas científicos que a autopoiese permite, demonstra o corpo em constante auto-organização e em uma criação contínua, se estendendo ao conhecimento. A proposta dessa teoria ultrapassa a perspectiva estímulo-resposta, abrindo espaço para o próprio organismo como integrante da reorganização da estrutura do ser. Aproximando Merleau-Ponty de Maturana e Varela, ela desenha uma tentativa de abordar a corporeidade não como algo abstrato, mas "(...) ensaiar atitudes complexas para compreender o humano na sua condição de ser corpóreo em incessante movimento, admitindo interpretações, pautadas na circularidade e recursividade dos fenômenos" (Nóbrega, 2010, p. 63).
Mais uma vez ousamos, a partir dos argumentos apresentados na obra analisada, formular questões geradoras para nossa vida de pesquisadores: continuaremos a compreender corpo somente através dos conhecimentos anatômicos e fisiológicos, bem como dos estados neurais? Não deveríamos juntar a esses, numa unidade indivisível, aspectos simbólicos e existenciais?
Já no subitem "A reflexibilidade do corpo", a autora aprofunda e demonstra os meios pelos quais a percepção se concebe diferentemente das perspectivas passadas empiristas e intelectualistas.
Merleau-Ponty propõe uma revisão sobre o trato da percepção até então empreendido pelos cientistas. Indica que a percepção pode ser entendida a partir de alguns aspectos:
(...) o mundo percebido não é uma soma de objetos; o sujeito que percebe não é uma consciência que interpreta, decifra ou ordena a matéria sensível; toda consciência é perceptiva, depende da temporalidade e da cultura; (...) a percepção não oferece verdades, mas presenças. (Nóbrega, 2010, p. 69)
Forjada na noção de campo da Gestalt e ultrapassada a noção de causalidade estímulo-resposta, a percepção "(...) não é mais uma representação originada a partir da ordenação dos dados sensíveis, mas interpretações que envolvem o jogo dinâmico do organismo com o entorno, a história, a cultura" (Nóbrega, 2010, p. 70). Essa abordagem supera a compreensão simplista sobre as vias aferentes e eferentes dos estímulos e possibilita não uma apropriação do entorno pelo organismo, mas uma dialógica da qual o corpo cria o seu mundo, objetiva e subjetivamente.
A percepção é dinâmica, e enquanto o mundo por uma perspectiva se mostra, por outra se torna invisível. Além do mais, o corpo é criador de sentidos, donde se pode chegar a afirmar que a percepção não pode ser a representação mentalista das coisas ou do mundo, e, sim, o existencializar dos acontecimentos.
O movimento é que propicia o ato perceptivo porque temos nessa relação a intencionalidade do movimento e isso nos leva à experiência da motricidade. Melhor nas palavras da autora: "A intencionalidade não é algo intelectual, mas uma experiência da motricidade" (Nóbrega, 2010, p. 72).
Importante lembrança também nos faz Nóbrega ao enfatizar que a atitude fenomenológica de corpo em Merleau-Ponty possibilitou o desenvolvimento de estudos da complexidade, indicando autores que se propuseram a pesquisar nesta trilha como Edgar Morin, Humberto Maturana, Francisco Varela e Hubert Dreyfus, dentre outros.
Nas contribuições finais desse capítulo nos é apresentada a influência de Merleau-Ponty nas ciências neurológicas modernas e, fundamentalmente, a respeito da cognição e do conhecimento. "A cognição emerge da corporeidade" (Nóbrega, 2010, p. 79). Na interdependência entre organismo e ambiente, o conhecimento só é possível por meio da experiência, isto é, do movimento. Ao relembrar-nos o conceito de enação a autora elucida o princípio da recursividade, posto que se refere "(...) a processos em que os produtos e os efeitos são ao mesmo tempo causas e produtores daquilo que os produziu, posto que efeitos e produtos são necessários nos processos que os geram" (Nóbrega, 2010, p. 80). Supera-se, dessa forma, a lógica do pensamento linear que estabelece a relação causa/efeito.
Olhar para a unidade corpo e o ambiente como sistema complexo exige a autorreferencialidade, gerando autonomia como expresso na autopoiese, mas que também se traduz no conhecimento adquirido na experiência, isto é, na e pela corporeidade.
Apoiada em Merleau-Ponty, finda o capítulo na certeza de que:
(...) sentir e compreender constituem-se em um mesmo ato de significação, possíveis pela nossa condição corpórea e pelo acontecimento do gesto, cuja estesia inaugura a possibilidade de uma racionalidade que emerge do corpo e de seus sentidos biológicos, afetivos, sociais, históricos. Essas compreensões de percepção e de cognição são significativas para redimensionarmos o fenômeno do conhecimento, relacionando-o à experiência vivida, ao corpo e aos sentidos que a sensorialidade e a historicidade criam. (Nóbrega, 2010, p.81)
Esse ponto é fundamental para que todos nós pesquisadores e educadores, preocupados com o conhecimento, firmemos compromissos com a corporeidade existencial.
No terceiro capítulo, Nóbrega ainda nos passos de Merleau-Ponty, denomina a penúltima parte de seu livro como O corpo como obra de arte, na qual faz uma analogia do corpo/arte, sendo a arte, assim como o corpo, uma forma de linguagem, de gesto, de expressão e de percepção.
A partir da fenomenologia do sensível, a autora demonstra, por meio de pintores renomados como Van Gogh e Matisse, as variadas formas de linguagens e experiências existenciais. Ampliando o conceito do sensível, Nóbrega busca a superação do racionalismo ao utilizar os diversos modos de linguagens, como as pinturas, na busca de novas interpretações do corpo. Uma obra de arte permite sua apreciação por diferentes olhares e, nesse contexto, a linguagem sensível dinamizada pela corporeidade constitui-se em um fenômeno multidimensional (biológico e cultural).
A autora cita que a beleza é retratada de forma ampla, apreciando também o dionisíaco, indo além da figura externa, contemplando o corpo e uma obra de arte pela experimentação, sensibilidade, vivência e existência, resultando em uma reflexão corporal de acordo com os sentidos atribuídos pelo espectador.
Nas premissas de Merleau-Ponty, a sensibilidade estética apresentada pela autora proporciona aberturas infinitas para uma (re)significação da compreensão de ser humano, partindo da configuração de corporeidade e da percepção, atitudes que convidam a nova abertura ao mundo, por meio do sensível, do estético e da estesia.
A estesiologia apresentada no livro demonstra um corpo que pode ser divido por seus sentidos (olfato, tato, visão, audição, paladar), porém é de toda sua interação e complexidade, ou seja, do sujeito sensorial, que emerge a vida e o desejo, como a própria autora descreve "A carne do corpo faz compreender a carne do mundo, corpos-coisas, penetração de sensíveis" (Nóbrega, 2010, p.101). Petrucia articula a necessidade de diferentes aproximações e investimentos, como nas artes, poesia, simbologia, sensibilidade, fisiologia, para criar novas atitudes perante o corpo e de ser corpo.
Adentrando no último capítulo do livro Corpo, ciência e educação, em que a autora o subdivide respectivamente em "A transversalidade rizomática" e "Corpo e educação", encontramos um fechamento e correlação do corpo nos pressupostos da corporeidade com a ciência e com a educação, na busca de aprofundar o ser no mundo e o nosso modo de olhar o ser existencial.
Na "transversalidade rizomática", Nóbrega apresenta como a ciência foi se adaptando aos períodos de toda a história, criando o mundo observável e puramente racional, estudando cada vez mais modelos reducionistas na busca de novas respostas. Assim ela foi se organizando, com o desenvolvimento da técnica, do capitalismo, da indústria. A autora evidencia também, por meio de autores como Morin e Bachelard, a necessidade de a ciência ser renovada, buscando uma (re)significação da mesma bem como de seus pressupostos metodológicos. Esclarece que mesmo a investigação científica não pode ser tratada de modo isolado.
A transversalidade rizomática se apresenta como um modo de adequação para a ciência atual e um método para sabermos lidar com a diversidade científica. No contexto do livro, apresenta o conceito do termo previamente explicando a necessidade, a partir do século XX, de estabelecer vínculos e de fomentar diálogos entre as disciplinas, as áreas científicas e ainda destinar nosso olhar para os espaços relacionais dessas variadas disciplinas e áreas de conhecimento, estabelecendo tessituras entre as mesmas. O presente termo, sendo alocado como subtítulo, nos remete ao reconhecimento da multiplicidade, do respeito às diferenças, e uma tentativa de envolvimento de saberes entre um e outro e também para fora do conjunto.
Dá-nos conta ainda do modelo rizomático, em especial através de estudos de Deleuze e Guattari, abordando seus critérios de organização, bem como suas características, sendo estas: conexão, heterogeneidade, multiplicidade, ruptura a-significante, cartografia e decalcomania. Em linguajar claro e específico, a autora descreve cada característica, propondo ao leitor maior interação e compreensão do contexto abordado.
Tendo como foco a reflexão acerca do corpo, Nóbrega faz uma explicitação da corporeidade como saber rizomático, alertando que também a corporeidade é compreendida e estudada por diversas disciplinas e áreas do conhecimento.
Desse modo, a corporeidade como conceito não excludente a uma área pode ser um espaço para novas experiências e críticas na produção do conhecimento, havendo a necessidade de diálogo permanente, do gosto estético e sensível para a interlocução da multidisciplinaridade científica.
Com a exemplificação do valor da transversalidade rizomática, bem como o papel do corpo para esse conceito, Nóbrega parte para seu último subitem, fazendo uma reflexão sobre a educação, e demonstra a necessidade da superação da utilização instrumentalizada do corpo em práticas educativas. Realça o valor de textos poéticos, literários, como também os políticos e filosóficos, como formas de práticas educativas, podendo esses impulsionar cada indivíduo de modo assimétrico a um tipo de aprendizagem.
Os argumentos indicam não haver somente uma forma de aprender ou um conjunto de coisas a serem aprendidas. A ciência por ser um conhecimento inacabado, não nos permite estacionar em modelos ou métodos. A técnica educativa, a partir do conhecimento do ser sensível e estético, precisa permitir a modulação das experimentações do sujeito consigo mesmo, com o outro e com o mundo, a fim de uma emancipação intelectual, afetiva e política.
Profissionais das ciências humanas em geral, professores formados em cursos de licenciatura, bem como bacharéis de outras áreas que se propõem a investigar a existencialidade da corporeidade ou temas afim, encontrarão na obra de Petrucia uma discussão abrangente e profunda.
O escrito reserva uma especial leitura e reflexão sobre a produção textual de Merleau-Ponty, não se limitando a uma aplicação, mas, sim, apresentando o fenômeno corpo, na dimensão da corporeidade, como objeto de novas possibilidades de conhecimento científico através de uma preocupação de transformar conhecimento em sabedoria.
Uma Fenomenologia do Corpo, livro a servir de suporte para o entendimento da corporeidade nas áreas de ciência e de educação.
1 Este texto é uma resenha do livro Uma fenomenologia do corpo, de autoria de Terezinha Petrucia da Nóbrega, publicado pela Editora Livraria da Física, São Paulo, em 2010.