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Psicologia da Educação

versão impressa ISSN 1414-6975versão On-line ISSN 2175-3520

Psicol. educ.  no.46 São Paulo jan./jun. 2018

 

10.5935/2175-3520.20180009 ARTIGOS

 

Por uma educação para a autonomia de sujeitos situados no mundo

 

For an education that promotes autonomy of subjects situated in the world

 

Por una educación para la autonomía de los sujetos situados en el mundo

 

 

Osterne Nonato Maia FilhoI; Hamilton Viana ChavesII; Pablo de Sousa SeixasIII

IORCID 0000-0003-4636-1912 Programa de Pós-Graduação em Educação Universidade Estadual do Ceará
IIORCID 0000-0003-4959-8173 Programa de Pós-Graduação em Educação Universidade Estadual do Ceará Curso de Psicologia Universidade de Fortaleza
IIIORCID 0000-0002-7718-064X Curso de Psicologia - Campus Santa Cruz Universidade Federal do Rio Grande do Norte

 

 


RESUMO

Autonomia, em sentido etimológico, significa autoria na forma de lidar com a lei e pode ser traduzida como capacidade de autogovernar-se. O desenvolvimento da autonomia humana tem sido ponto de debate milenar de diversos saberes tais como a filosofia, a educação e a psicologia. Seria o desenvolvimento da autonomia o objetivo de toda formação humana? Eis a pergunta de que partimos na busca de contribuir com esse debate. O objetivo desta reflexão foi de localizar, de uma forma sistêmica, diversas contribuições do pensamento científico visando uma formação para a autonomia, mas não numa perspectiva meramente gnosiológica ou epistemológica e sim considerando também as determinações ontológicas e sociais mais amplas. Na condição de ensaio teórico realizamos incursões na interface entre diversos campos de saberes, especialmente psicologia e educação. Trata-se do que denominamos aqui de sujeitos autônomos situados no mundo. A título de ilustração descrevemos, de modo exploratório, a relação entre a formação de professores no Brasil e uma educação para autonomia.

Palavras-chave: ética, desenvolvimento moral, autonomia, ontologia, educação.


ABSTRACT

Autonomy in the etymological sense means authorship in the form of dealing with the law and can be translated as the capacity to self-govern. The development of the human autonomy has been the point of an old debate of diverse knowledge fields such as philosophy, education and psychology. Is the development of autonomy the goal of all human training? That is the question that we follow in order to contribute to this debate. The purpose of this reflection was to locate, in a systemic way, several contributions of the human thought in the formation for autonomy, not in a purely gnosiological perspective but also considering the broader ontological and social determinations. In the condition of a theoretical essay, we explored the interface between several fields of knowledge, especially psychology and education. That is what we called here autonomous subjects located in the world. To illustrate the situation, we describe, in an exploratory way, the relationship between the teacher formation in Brazil and an education for autonomy.

Keywords: ethics, moral development, autonomy, ontology, education.


RESUMEN

Autonomía en el sentido etimológico significa autoría en la forma de lidiar con la ley y puede ser traducida como capacidad de autogobernarse. El desarrollo de la autonomía humana ha sido punto de debate milenar de diversos conocimientos como la filosofía, la educación y la psicología. ¿Sería el desenvolvimiento de la autonomía el objetivo de todo saber humano? Ésta es la pregunta de la cual partimos con el intento de contribuir con ese debate. El objetivo de esta reflexión fue localizar, de manera sistémica, distintas contribuciones del pensamiento científico para la formación de la autonomía, pero no en una perspectiva meramente gnoseológica o epistemológica y si considerando también las determinaciones ontológicas y sociales más amplias. En la condición de ensayo teórico se realizaron también incursiones en la interface entre diversos campos de pensamiento, especialmente la psicología y educación. Se trata de lo que denominamos acá de sujetos autónomos situados en el mundo. Así deseamos describir, de manera exploratoria, la relación entre la formación de profesores en Brasil y una educación para autonomía.

Palabras clave: ética, desarrollo moral, autonomía, ontología, educación.


 

 

Autonomia, entendida como autodeterminação ou capacidade de autogovernar-se, tem sido mote de um debate exaustivo ao longo da história. É um construto polissêmico que se expressa em seus vários usos tanto no cotidiano quanto no espaço acadêmico. A humanidade se debruça sobre o tema pelo menos desde Platão - passando pelos céticos, pensadores renascentistas, por Kant, entre outros - um percurso de pelo menos 2000 anos - e suas diferentes formas de expressão têm sido apropriadas e usadas por vários campos disciplinares do conhecimento, como filosofia, política, educação e psicologia (Martins, 2002).

Essa temática passa, então, por uma série de ressignificações como, por exemplo, de um construto filosófico idealista, suporte para a racionalidade kantiana, para uma objetivação nas crianças, sob a forma de consciência moral, em Piaget. Ela adquire contornos específicos ao longo da história, respondendo aos diferentes modos de articulação nas relações produtivas, até assumir um formato último nos moldes de produção capitalista e da cultura burguesa. Se a autonomia já foi considerada numa perspectiva filosófica especulativa, resgatada pela racionalidade iluminista e sua concepção de modernidade, sua conspecção interna se reorganiza em cenários mais recentes.

Entende-se, então, que se por um lado a autonomia era mais vinculada ao aspecto reflexivo herdeiro da tradição humanista na história, após o desenvolvimento do capitalismo, já no século XIX, adquire escopo vinculado às participações políticas, frutos de profundas mudanças culturais, econômicas e sociais, expressando seu sentido entre as duas grandes concepções societárias do mundo moderno: liberal versus socialista.

Nesse sentido, os processos históricos que organizam o debate ao longo do tempo têm demonstrado que a apropriação política tem sido feita, nos últimos anos, por uma defesa de modelos societários, pós-revolução burguesa e emergência da consciência de classe, representados por uma divisão entre ideias liberais e socialistas de organização da sociedade. A influência liberal, que vincula autonomia ao conceito de liberdade de escolha e de ação, acaba por deslocar o conceito de um âmbito social e coletivo por um aspecto de foro individual. A fim de corroborar essa perspectiva, os campos disciplinares apropriados ou cooptados, que refletem a visão de mundo burguesa, notadamente diversas áreas da Psicologia e a da Pedagogia, passam a refletir sobre o tema da autonomia num âmbito cognitivo e moral, efetivando o referido deslocamento.

Nesse empenho há a mudança da concepção de autonomia, como perspectiva política representada pelas ideias socialistas, para sua assunção essencialmente linguística, especialmente pós-revolução informacional, como configuração de um fenômeno psicológico-individual, oriundo de várias perspectivas teóricas, com destaque para o construtivismo piagetiano (Castañon, 2004). Essa nova roupagem reapresenta o conceito psicológico, despolitizando seu conteúdo, sob o rótulo de uma "competência", assim tornando-se um construto teórico mais operacional, podendo ser aplicado em contextos sociais reais, como a educação.

Em contraposição às ideias liberais é possível perceber, a partir de um resgate histórico, que para os socialistas, a começar pelos ditos utópicos tais como Saint-Simon, Charles Fourier e Pierre-Joseph Proudhon, a autonomia referia-se a uma maior possibilidade de participação na sociedade com fins à socialização dos meios de produção representada pela autogestão dos processos coletivos. Após a passagem do socialismo utópico para o científico, com Marx e Engels, vigora a compreensão de que a autonomia dos sujeitos só passaria a existir plenamente com o controle dos processos produtivos, marcados pela ideia do trabalho associado e da autogestão das formas de produção. Por estabelecer uma inversão ontológica em direção a uma materialidade histórica, Marx situa a autonomia numa posição relativa à situação social: "Os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua livre vontade; não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e, sim, sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo passado", afirma Marx (1997, p. 21).

O cenário de rápidas mudanças ocorridas na sociedade dos séculos XVIII e XIX, em função da revolução industrial e da consolidação dos estados nacionais na Europa, provocaram densas transformações nas formas de organização social e cultural, o que resultou alterações na concepção de trabalho e na estruturação familiar. Embora essas instâncias sejam indissociáveis, uma análise dedutiva de suas relações poderá fornecer indícios sobre os modos de interação entre os sujeitos no aspecto autonomia.

É no bojo dessa emergente revolução que Durkheim (1999, p. 7) a qualificava como "triste espetáculo". O que o torna mais audaz é certa sensação acerca do esgarçamento das relações sociais em função da falta de um apoio, como diria Arquimedes, que poderia mover o mundo em função de um senso de individuação solidária com fins à coletividade (Türcke, 2014). A esse estado de quase desfazimento das relações coletivas, da ausência de um ponto de apoio ou do esmaecimento das regras sociais o pensador francês denominou anomia, processo que em Marx (2007), por outra perspectiva de análise, ganhou o nome de alienação social.

Nas palavras de Girola (2005), Durkheim identificou a anomia como a situação produzida pela falta de regras na vida industrial e comercial derivada das rápidas e excessivas mudanças ocasionadas pela industrialização. Na esteira de Hegel, mas numa interpretação ontológica e existencial, Marx, por sua vez, visualiza a alienação como o processo em que cabe ao outro, ao mundo externo, a determinação pelo que o sujeito faz, alienando-se de si.

Marx e Engels (1997) pareceram antever essa crise que se anunciava com o avanço da irracionalidade e da alienação, imanentes à ascensão do capitalismo e da modernidade (Harvey, 2000), em sua famosa sentença síntese acerca do que nos aguardava: "tudo que é sólido se desmancha no ar". De fato, o cenário previsto por Marx de acentuada destruição construtiva, propiciado pela consolidação dos ideais da modernidade, ascensão da burguesia e transformações da sociabilidade tem se revelado particularmente preocupante nos dias atuais. Mas afinal, o que tal conjuntura tem a dizer sobre a necessidade impostergável de uma educação para a autonomia?

Ora, esse debate se torna relevante na medida em que a resposta oferecida por diferentes campos da ciência atual como a sociologia, a educação, a psicologia e a economia política têm se mostrado insuficientes para encontrar uma saída para tal dilema, especialmente quando ignoram uma solução que mais alimenta a divisão entre as áreas e não sua convergência.

Considerando esse contexto, o objetivo desta reflexão é procurar localizar, de uma forma mais sistêmica e ecológica, as diversas contribuições desses campos para uma formação da autonomia que considere, além das determinações sociais mais amplas, o sujeito humano como capaz de emitir juízos próprios e vivenciar seus desejos e afetos; que sofre determinações da sociabilidade, mas é o sujeito único capaz de transformá-la como sujeito social e singular. Nessa direção, discutiremos brevemente a contribuição desses campos para uma formação da autonomia. Na condição de ensaio teórico realizamos incursões na interface entre esses campos, especialmente entre Psicologia e Educação uma vez que se tratam de ofícios estreitamente entrelaçados (Adorno, 1994; Maia Filho & Chaves, 2016).

 

CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA À FORMAÇÃO DO SUJEITO AUTÔNOMO

Como uma espécie de contributo às revoluções sociais propiciadas pela modernidade (revolução francesa, industrial, tecnológica), áreas da Psicologia se fizeram presentes na tentativa de compreender o telos do desenvolvimento moral e isso se dá, especialmente, no construtivismo piagetiano. O empenho foi em identificar a transição do estado anômico para o estado de autodeterminação ou de autonomia como resultado de juízos, em função do desenvolvimento cognitivo e moral. É nesse corolário que a teoria do desenvolvimento moral de Piaget (1999) e, mais tarde, de Kohlberg (1984), nas sendas de Kant e Durkheim, traçou a estrutura e o sequenciamento do desenvolvimento moral que os sujeitos podem alcançar.

Entre o estado de ausência de regras até aquele organizado pela autorregulação, o sujeito experimentaria diversas formas de lidar com decisões diante de variados imperativos e determinações da realidade e, posteriormente, de si mesmo. Talvez a forma mais marcante delas fosse aquela de alienar responsabilidades, atribuir ao outro ou a um estranho (aliens) a capacidade de governo. Piaget (1999) chega a identificar esse estado da evolução individual da ação moral como corolário do próprio desenvolvimento ontogenético da sociabilidade ao longo da história humana.

Essa discussão, no campo da Psicologia, insere-se também no projeto moderno de racionalidade iluminista do qual, de certa forma, ela também é herdeira. Nesse caso, certos discursos da Psicologia colaborariam com a sempre e insistente tentativa de explicação da realidade moral, ao passo que acabaria por reforçar o telos de um indivíduo autônomo e universal forjado na razão; nesse caso reforçando uma perspectiva gnosiológica ou epistemológica.

É fato que, no pensamento filosófico e sociológico, tentativas nesse sentido também foram encetadas. Particularmente na filosofia uma saída encontrada foi diferenciar moral e ética, a primeira de caráter mais coletivo, visto que em sua origem morus em latim significa costume, e a segunda de estirpe mais individual, visto que o ethos resultaria de uma escolha do sujeito acerca de como deveria agir, uma certa independência da determinação social. Na filosofia, o debate ganha também os contornos de uma tipologia, como, por exemplo, entre uma moral e ética da convicção, resultante da escolha entre imperativos para guiar o como devemos agir; e uma moral e ética da responsabilidade que poria na equação as determinações da realidade nesse processo decisório (Freitag, 1992).

A título de ilustração pode-se apontar o esforço de Piaget em estabelecer parâmetros empíricos para resolver tão complexa e interdisciplinar questão (ao mesmo tempo filosófica, sociológica e psicológica), a partir do legado de James Mark Baldwin, com respeito ao estado de desenvolvimento moral de crianças (Edwards & Carlo, 2005). No caso do estudo do desenvolvimento moral, Piaget (1999) propunha certos dilemas que exigia do sujeito um posicionamento epistemológico como resposta à tarefa. A análise mais adensada dos turnos de fala dava indicativos genéticos do desenvolvimento moral e possível da autonomia da criança. Em princípio, o pesquisador procurou mostrar como a seleção do juízo moral estava "apegada" às condições mais imediatas de sensorialidade à passagem de um esquema mais elaborado o qual era respaldado por uma decisão lógica operatória.

Nessa esteira gnosiológica e descritiva, Kohlberg (1984) propõe certos avanços no estudo do desenvolvimento moral ao expandir os estágios de sua evolução. Aborda aspectos mais meticulosos, considerando a orientação moral de cada estágio pelos quais passa o sujeito, desde uma concepção hedonista até a perspectiva sociomoral mais apurada. Nesse derradeiro limiar, pensava o autor, o sujeito alcançaria um estado de princípios éticos universais.

Essas teorias, afirmam Bataglia, Morais e Lepre (2010, p. 26), sofreram várias críticas no âmbito da ciência psicológica, sobretudo por valorizar "a moralidade masculina baseada na justiça" e na cognição em detrimento dos aspectos mais afetivos e emocionais. Reside nessa polêmica a possibilidade de consideração de "outro sujeito" para além daquele do labor cognitivo e epistemológico. Nesse caso, o ponto de inflexão, como sugere o argumento anterior, seria a transição de uma epistemologia para uma ontologia que possa dar indícios dos possíveis significados existenciais do comportamento moral de sujeitos situados no mundo.

Obviamente que as contribuições da Psicologia não se resumem a teorias e reflexões aqui brevemente expostas, assim como seria impossível aprofundar seus argumentos no espaço dessa reflexão. Interessa-nos, em particular, acentuar os espaços de convergências. Para evidenciar as contribuições do campo educacional, iniciaremos a próxima seção ilustrando a contradição presente na formação por uma autonomia no modelo educacional brasileiro.

 

FORMAÇÃO PARA A AUTONOMIA: UM DILEMA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA?

Quando se considera o modelo educacional, é visível que a formação de professores no Brasil é um dos seus problemas basais. Tal fato, absurdamente evidente e ignorado merece não só ser objeto de uma profunda reflexão, mas igualmente de rigorosas investigações que permitam ao país enfrentar os desafios que essa questão envolve e de, até mesmo, aprendermos com a experiência histórica de outros países que enfrentaram esse problema.

Pode parecer no mínimo audaz, como já nos posicionamos, colocar essa querela em tais termos, afinal o país tem uma política delineada para esta área (Freitas, 2007). Há uma previsão legal para a formação de professores capazes de responder aos desafios educacionais nos diferentes níveis da educação brasileira: o pedagogo para os primeiros anos de ensino; o licenciado para o nível fundamental e ensino médio, e o pós-graduado para o ensino superior. No entanto, um exame mais detalhado da realidade brasileira nos coloca alguns questionamentos. Afinal, por que caberia ao pedagogo, e somente a ele, ensinar as crianças nas primeiras séries, contribuindo para o desenvolvimento inicial de sua autonomia? Como se trata de um professor generalista, ele teria a formação adequada para o ensino das ciências específicas como a matemática, a língua mãe e as ciências naturais? Por sua vez o professor licenciado, apto para atuar no ensino médio, tem mostrado capacidades pedagógicas e psicológicas para lidar com o aluno dessa faixa de ensino para além de uma formação técnica? E por fim o professor universitário cujo pré-requisito de formação é a pós-graduação que, por sua vez, no país, tem se mostrado mais interessada na formação do pesquisador do que na formação do professor, prepararia docentes? Tão naturalizada reside essa situação no país que parece estranho que problemas tão óbvios não sejam merecedores de uma profunda preocupação de autoridades e de pesquisadores da área da educação, compatível com sua importância para o sistema educacional brasileiro, sobretudo quando envolve o aspecto desenvolvimento da autonomia.

Tomando como ponto de partida os elementos históricos, é fácil concluir que a demora para se instaurar no Brasil uma educação baseada em uma pedagogia científica, mais correlata à modernidade, ao desenvolvimento de sujeitos autônomos e à evolução do próprio sistema capitalista de produção, denuncia o tipo de colonização a que foi submetido o país e o seu papel pouco expressivo na divisão internacional do trabalho, do comércio e da produção do conhecimento.

Mesmo que se questione a heterogeneidade e o caráter técnico dos diversos indicadores econômicos, sociais e educacionais, a reflexão que está em jogo aponta para um longo caminho que deve ser percorrido para que sejamos capazes de obter a qualidade e o tipo de educação que realmente deve nos interessar: uma ampla e necessária formação para a autonomia.

A função social da educação pode ser visualizada em duas grandes dimensões interconectadas. É ela que permite o acesso das novas gerações à cultura acumulada, o que muitas vezes nos faz ver o processo educacional de forma limitada, como um mero veículo de transmissão de uma herança, uma tradição, e a confundir com a tão conhecida educação tradicional. Mas, mais que isso, é ela, por vez, uma das condições necessárias e locus para a produção do novo, o que não é, necessariamente, sinônimo de escolanovismo (Coll, 1996).

Nessa direção, é sabido que não se produz o novo sem acesso à cultura já produzida, pois ele não surge do nada, mas o simplório acesso à tradição pode resultar em uma educação pautada apenas no reprodutivismo, na ideologização e na submissão do sujeito aos ideais sociais, na mera adaptação à realidade e ao status quo, portanto produtora de sujeitos sem autonomia. Por sua vez, não nos iludamos com a situação mais efêmera. O fato de que uma educação preocupada apenas com o processo e com a inovação pode facilmente cair no tecnicismo, no cientificismo e na manipulação, projeto igualmente de dependência e de relações sociais anômicas e alienadas, como bem diriam Durkheim (1999) e Marx (1998), embora haja também uma produção do "novo" como resultado desse processo.

Aquilo que nos parece essencial é que a dimensão fundamental da educação é a produção de sujeitos autônomos, sujeitos às determinações do mundo, mas não assujeitados a elas. Autores da cultura, legisladores do mundo, produtores livres da riqueza, autogestores de si e não dependentes da heteronomia do outro, tampouco alheio às regras sociais como destaca Girola (2005). Ora, uma educação para autonomia passa, obviamente, pela autonomia da escola, do professor, do aluno. Mas como produzi-la?

Obviamente que a questão se coloca na base, a formação da criança. Pois se o sujeito não é formado para a autonomia e a capacidade de criar e encontrar soluções para os problemas da realidade desde a infância (Portugal, 1998), tais capacidades poderão brotar espontaneamente de seu interior como um milagre dos deuses? Eis a descoberta que irmanou, no século XIX, a Psicologia e a Educação: a descoberta da infância, "a criança é o construtor do homem", como nos lembrava Montessori (1971, p. 10).

Tal descoberta, que levou vários anos para ser incorporada ao sistema educacional brasileiro com a introdução das normalistas e do ensino científico no Brasil em pleno século XX, já era realidade bem mais avançada, há mais de cinco décadas, em vários países europeus e nos Estados Unidos (Pfromm Netto, 2008). Isso nos coloca diante de um enorme desafio: não é possível separar a qualidade do ensino superior do ensino infantil, visto que o formador da criança recebe sua formação exatamente na universidade.

De uma forma indissociável, compreende-se que apenas haveria qualidade na educação se ela permear todo o sistema educacional. Pois como sujeitos, sem autonomia política, de pensamento e de vida, podem propiciar o desenvolvimento dessas capacidades às novas gerações? De modo óbvio nos parece que tais questões dizem respeito à própria autonomia do país na sua relação com as demais nações.

Todos nossos argumentos até agora se comprometem com a ideia da complexa macroestrutura que envolve a sociedade e seus movimentos; o trabalho e a família, quando em seu conjunto apontaria para a premente necessidade de formação para autonomia. Trata-se, assim, de uma questão que envolve a produção de sujeitos autônomos, com todos os desafios do processo de individuação solidária, eis a categoria que queremos explorar.

Como destaca Wallon (2008), o processo de formação humana não ocorre espontaneamente de dentro para fora ou por mera injunção heterônoma: a maior dependência social ocorre exatamente no infans, mas a individuação e a autonomização não é mera separação do outro, e, sim, uma nova forma de colocar o laço solidário. Ora, o que se ressalta com o resgate do pensamento de Wallon é que o processo de individuação produz também o sujeito de conhecimento, daí a necessidade de se empenhar na análise mais apurada dessa última expressão - o sujeito de conhecimento como sujeito situado no mundo, em que mundo, mente e corpo não se separam.

A pedagogia moderna, com seus tentadores métodos ativos de ensino, faz recorrência demasiada aos modos de aprendizagem e, mais recentemente, um apelo à "ensinagem" (Anastasiou & Alves, 2005). É claro que, para a atividade pedagógica dita satisfatória, são importantes os processos de ensino e de aprendizagem, mas o foco nesses processos e estratégias põe em lugar secundário o que há de mais elementar: os sujeitos em relação. Isso nos sugere que quando se fala na instauração de um sujeito de conhecimento, o que envolveria processos de ensino e aprendizagem, determina-se o foco em uma epistemologia. Para pensarmos na formação de formadores poderíamos refletir sobre algo mais basilar, pois o sujeito de conhecimento é, antes de tudo, sujeito do mundo e nele está situado.

 

FORMAÇÃO DE FORMADORES DE SUJEITOS SITUADOS NO MUNDO

Foi na década de 1990 que a educação brasileira se viu impactada pelo famoso relatório capitaneado pelo pedagogo francês Jacques Delors (2003): Educação: um tesouro a descobrir. Uma das substanciais contribuições trazidas pelo relatório foi agregar a teorias das competências à educação, sobretudo quando incorporou a reflexão sobre a dimensão existencial como necessária à formação humana. Além de se considerar a aprendizagem de conhecimentos teóricos, práticos e de habilidades, em suas realizações no campo das interações humanas, recomendava-se uma profunda reflexão sobre a própria condição afetiva e existencial dos sujeitos.

Em uma primeira análise, ao que nos parece, o relatório promovia grandes avanços se comparado à educação tradicional tão difundida no meio educacional brasileiro. Mas um exame mais detalhado apontou também problemas, como diriam Maia Filho e Jimenez (2004), sonoramente ignorados pelos idealizadores de uma suposta educação que romperia com o modelo então vigente.

Um exame crítico e que vai às entrelinhas do texto mostra que há um aparente deslocamento para uma proposta de educação mais condizente com o contexto contemporâneo, ao mesmo tempo em que revela o estratagema de manutenção de uma formação para a dependência, ou mesmo para alienação e anomia, como projeto maior da política encetada. Exatamente porque alguns problemas crônicos da educação no contexto de crise do capital parecem ser ignorados, senão relegados a uma discussão difusa e aparentemente secundária.

Uma das maiores debilidades do texto do pedagogo francês e seus colaboradores é, justamente, não abordar a formação humana que acometa aspectos mais amplos da sociabilidade, sobretudo quanto ao aspecto economia e sua base produtiva. Como formar sujeitos autônomos se não é posto em questão as formas de acumulação do capital e de enfrentamento de suas crises inerentes ao seu funcionamento?

Os apelos recorrentes do texto de Delors (2003) e demais intelectuais que tratam do ensino e da aprendizagem seriam abordar as formas de produção de conhecimento para a sociedade atual que está em constantes mudanças. O sujeito da aprendizagem estaria imerso em uma rede de informações que se renovariam em intervalos de milissegundos. Percebe-se a sedução ou abdução a que nos submetemos sem que isso nos provoque estranhamento, sem a promoção de uma análise mais cuidadosa a qual não nos faltam advertências.

A esse respeito, ainda em 1949, a médica e educadora italiana Maria Montessori (1971, p. 9) fazia referência ao fato de que "do ponto de vista psíquico o gênero humano está abaixo do nível que a civilização apregoa ter atingido". Sua declaração foi feita no contexto do pós-guerra com todas as nuanças que o regime fascista lhe permitiu. Isso se deu desde 1924, quando em encontro com Benito Mussolini a "reunião resultante conduziu ao primeiro reconhecimento oficial e ao estabelecimento generalizado do sistema Montessori pelo governo italiano, um fato incrivelmente irônico considerando a natureza desse sistema e desse governo" (Kramer, 1988, p. 281), até seu rompimento com líder italiano em 1934 (Marazzi, 2000).

Em meados da década de 1960, foi a vez de Adorno (1995) fazer um forte apelo e profunda reflexão para que Auschwitz não voltasse a se repetir. Sua análise é derivada do pensamento freudiano a partir do qual afirmaria o paradoxo de que a civilização fortaleceria o anticivilizatório. Segundo o autor, a ambiguidade identificada por Freud seria originária da própria instalação do mal-estar na cultura e que poderia, empiricamente, ser analisada a partir da Psicologia de massas quando é verificada a lógica de heteronomia entre o líder e os seus seguidores. O caso de Auschwitz por mais que se tente responder por uma concepção austera e rígida de organização social, caminharia muito mais em direção a relações sociais anômicas e alienadas, transvestida de uma racionalidade instrumental, contraditoriamente irracional e inumana.

O desenvolvimento moral pode ser mais bem apreendido se levarmos em consideração o sujeito na sua condição mais originária - o sujeito e tudo que suas sensações lhe possibilitam. Como manifesta Türcke (2014), o que nos faz sujeitos não é a revelação do mundo a partir apenas do cogito, mas, também, a capacidade de existir a partir das próprias sensações - sentio, ergo sum.

No percurso da evolução humana o confronto com o mundo dito do conhecimento provoca certas inquietações no sujeito, de tal modo que a sensação é gradualmente reduzida ao acontecimento espetacular. É neste momento que a inscrição da cultura na sua relação com o psiquismo, algo provocado pelo traço educacional, fará um forte apelo aos processos de ensino e de aprendizagem, ao mesmo tempo em que negligenciará o sujeito que ergo sum.

A escola, nesse processo de busca pela autonomia, vai criando um processo no qual o aluno busca respostas a suas próprias perguntas. O aluno, portanto, nessa formação para a autonomia, precisa de elementos construídos e produzidos pela humanidade, disseminados pela escola, para ter subsídios a partir dos quais as respostas serão baseadas. O conhecimento adquirido dialogicamente com a escola permitiria a formação de uma autonomia estudantil. Esse processo de autogestão pedagógica do aluno vai, em maior ou menor grau, conflitar com o modelo pedagógico adotado pelas instituições educativas vigentes, em direção, inclusive, a modelos de educação antiautoritários, devedores das reflexões socialistas desde finais do século XIX.

Numa perspectiva dita "progressista", a formação de autonomia seria um resgate na educação, da perspectiva política, que inclui necessariamente uma dimensão coletiva. Essa dimensão coletiva da autonomia, defendida por alguns teóricos da educação como Paulo Freire (2000), não necessariamente se alinha com a perspectiva de educação liberal trabalhada em muitas das escolas atuais. Nessas últimas, o termo "autonomia" é apropriado pelas doutrinas liberais, que, materializados numa educação neoconservadora, com ares tecnicistas, reaparece na forma de qualificação para o trabalho, assumindo uma dimensão cognitiva-pessoal, sob o manto de ser uma "competência", ou habilidade, dos sujeitos individuais, retirando, portanto, o caráter coletivo (Ramos, 2003).

É importante notar que a assunção de uma autonomia nos diversos modelos pedagógicos assume características distintas nas suas variações teóricas e históricas. Os modelos escolanovistas, que partem de uma pressuposição total da liberdade do aluno, apesar de incentivarem uma participação nas gestões coletivas, tanto da escola quanto do processo de aprendizagem, o fazem sempre levando em conta os interesses pessoais e específicos de cada estudante. Nesses modelos, já vastamente discutidos na literatura, o papel dos professores é absurdamente minimizado, reforçando modelos societários de caráter amplamente individualistas. Vários outros modelos construtivistas, apesar de não partirem de pressupostos idênticos para o papel do professor e do aluno, também reforçam, em determinada medida, os mesmos modelos societários liberais. Dessa forma, o mesmo processo dialético das práticas pedagógicas ditas progressistas, representadas nas pedagogias atuais, como pedagogias ativas ou construcionistas, poderiam, simultaneamente, tanto estimular movimentos de participação democrática direta, refletindo acerca dos modelos de redistribuição e representação de poder na sociedade, quanto retirar o caráter coletivo de suas ações, gerando uma sociedade hedonista e tecnicista, cujos interesses individuais sobrepujassem demandas e articulações coletivas. Nessa última perspectiva, o foco pedagógico seria apenas na construção de sujeitos flexíveis, adaptáveis para as novas demandas do mercado de trabalho contemporâneo, representado na máxima educacional atual do "aprender a aprender" do influente Relatório de Jacques Delors.

É fato que, no campo educacional, a teoria crítico-reprodutivista produziu uma série de críticas que levou à condenação da escola atual, por entender sua limitação estrutural de apenas formar para o modo de produção capitalista, e, portanto, incapaz de promover a autonomia ampla e política dos alunos. Paradoxalmente, porém a interpretação marxiana estruturalista da realidade, com forte viés mecanicista e economicista, passou a ignorar o indivíduo e sua referida produção de autonomia, sob o argumento de que as escolas burguesas produziriam apenas sujeitos burgueses, completamente subservientes ao sistema e, portanto, não autônomos (Althusser, 1985).

No entanto, após a década de 1970, pensadores críticos, ao tentarem resgatar a práxis da autonomia, reavaliaram o papel da escola por meio de uma revisita às reflexões marxianas. Eles defenderam a possibilidade de estabelecer um pensamento autônomo e progressista efetivo dentro da escola atual, refletindo sobre sua contradição inerente, consequência da contradição social (Salm, 1980). Nas palavras de Martins (2002, p. 23):

Nesse sentido, as intenções expressas na pedagogia autogestionária podem servir como elemento de revelação política de uma sociedade fundada na desigualdade, pois é justamente o teor de suas críticas profundas que constitui a possibilidade de renovação radical e global das relações sociais e políticas, mas não devem ser vistas como a panaceia dos males que atingem as instituições de ensino.

Desse modo, a própria escola deveria construir um projeto de autonomia em que ela pudesse questionar sua própria estrutura e função social, servindo como espelho crítico da realidade em que está inserida. Não se trata de defender uma opção pedagógica idealista, desarticulada do mundo real, no qual a escola pudesse servir como o grande agente libertador dos males sociais, mas propor um projeto pedagógico que estivesse articulado com as lutas políticas já presentes na sociedade e, assim, respondesse a um projeto ético-político mais amplo.

Essa autonomia defendida na escola seria, portanto, relativa. Não porque impossibilitada de promover uma consciência autogerida crítica e coletiva, mas por se assentar em uma análise total e ontológica da realidade e ter, igualmente, consciência dos seus limites dentro dos marcos de produção social, dentro dos marcos impostos pelas funções das instituições que a incentivaram a serem geradas (Pitano & Ghiggi 2009). Temos assim de um lado a autonomia sendo tratada como "competência", foro individual, alinhada aos interesses burgueses, e por outro como possibilidade de transformação coletiva.

Na direção da transformação coletiva da realidade, a autonomia estaria ligada indissociavelmente à produção do conhecimento, portanto do "novo", fruto das interações sociais, fundadas sob as formas de reprodução material da humanidade, mas também sob a lógica da mudança social. Como articular a autonomia como instância coletiva e individual simultaneamente?

A divisão filosófica e política do conceito de autonomia não ocorre pela concepção da mesma como atributo interno dos homens ou como efetividade de uma prática social, como atributos e dimensões separadas do sujeito da autonomia. Como a autonomia não faz sentido sem a práxis (Castoriadis, 1987), ela estará limitada pelas condições materiais de existência em sua relação com as formas de expressão superestruturais da sociedade capitalista.

O fato é que a retomada da noção de autonomia pós-revolução informacional, entre as décadas de 1970-1980, nos faz refletir para além da mudança de paradigma de regulação produtiva, do fordismo para o toyotismo, mas considerando outros marcos políticos, econômicos e culturais importante como o fim da Rússia soviética; a retomada do liberalismo clássico, sob a forma de neoliberalismo; e a aparente vitória dessa forma de organização societária diante da proposta socialista real. A já aludida retirada do seu caráter coletivo e a sua devida apropriação pela intelectualidade burguesa, como já destacado, faz com que a autonomia ressurja como "competência" (Delors, 2003), estratégia elaborada para legitimar as mudanças no mundo do trabalho decorrentes desse contexto, e a produção do trabalhador flexível compatível com a chamada terceira revolução industrial.

Nesse cenário, a autonomia, como construto racional, deixa de ser demanda apenas da burguesia pós-revolução industrial. No entanto, na prática, o conhecimento, elemento necessário para desenvolvimento da autonomia, repassado e representado pela escola moderna, volta a ser cada vez mais privilégio das elites, mesmo após a demanda por democratização do acesso ao ensino. De fato, no início do século XX, a escola moderna, voltada para a capacitação do trabalhador, retira os componentes humanistas da sala de aula, e imprime uma função tecnicista à escola, afastando a possibilidade de desenvolvimento amplo da autonomia, objetivo humanista vinculado ao ideário iluminista, e apagado e "recalcado" pós-revolução industrial. O tema da autonomia só retornará como objetivo da escola depois de atrelado ao modelo de competências que passa a dominar os currículos escolares como proposta de um novo modelo educacional. Esse modelo se tornou hegemônico após a inserção das ideias liberais nos espaços formativos contemporâneos.

De questão moral, advinda da proposição piagetiana, a autonomia passa a ser vista como uma competência a ser trabalhada. O que é a autonomia, então? De um processo emancipatório humano, vetor de construção do "novo", produtor de uma individualidade plena, ela se desloca, com a retomada das ideias e técnicas libertadoras, para ser um produto, a ser atingido via escolarização formal, como uma dentre várias competências a serem desenvolvidas, em detrimento dos conteúdos previamente veiculados nos ambientes escolares. O desenvolvimento da autonomia, que depende, dentre outras coisas, do acesso ao conhecimento, está, dentro do capitalismo, limitado à sua forma de reprodução. Portanto, corroborando o projeto burguês, o acesso desigual ao conhecimento se constitui como obstáculo atual ao desenvolvimento da autonomia.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Autonomia, como capacidade de governar-se, é uma decorrência da formação humana. O longo processo de reflexão acerca da autonomia, um processo que sempre disse do humano, se torna particularmente patente quando este progressivamente se liberta das barreiras naturais e se assenhora do mundo e de si, reflexo que é agora representação.

As divergências de concepções e de áreas de estudo acerca do tema não configuraram apenas diferenças, mas também convergências e constatações: autonomia não se restringe a um constructo gnosiológico, mas responde primeiramente por um sujeito situado no mundo, por uma individuação solidária. É aí que entra o lugar inalienável da educação e da escolarização: locus da humanização do homem, lugar de confirmação de sua condição humana, pois produz seres que transformam intencionalmente o mundo, seres autônomos, mas que precisam ser educados. Daí porque é vital a formação de formadores autônomos, senão incapazes de formar sujeitos verdadeiramente dotados de autonomia, de sujeitos situados no mundo, que não só o reproduz, mas são capazes de transformá-lo.

De fato, a autonomia não pode se reduzir a um tentador constructo psicológico, uma competência a ser desenvolvida pela educação, especialmente no processo de escolarização; não se basta como constructo meramente filosófico ou sociológico, mas resulta somente de um sujeito fruto de uma convergência, que por sua ação no mundo foi capaz de conhecê-lo e transformá-lo, na medida em que também transforma a si mesmo.

O sujeito plenamente desenvolvido e humanizado como ser genérico é o único sujeito capaz de exercer uma autonomia no sentido amplo, num processo de individuação que só pode ocorrer efetivamente na relação com o outro, na práxis, que o remeterá de sua singularidade à condição de contribuir com a universalização da condição que o tornou distintivamente humano. Um sujeito capaz, em sua integralidade, de produzir o "novo" sem as amarras dos limites da reprodução do capital, sistema que ele historicamente produziu. Este sujeito está, sem dúvida, no horizonte de sociedade sem classes, projeto que ainda estamos por construir. Pois o mundo moderno atual, como nos lembra Marx, é apenas o da "pré-história" da humanidade.

 

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