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Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva

versão impressa ISSN 1517-5545

Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.12 no.1-2 São Paulo jun. 2010

 

ARTIGOS

 

Formação de professores em análise do comportamento para manejo de comportamentos considerados violentos de alunos

 

Teacher training in behavior analysis to deal with violent student behavior

 

 

Clarissa Moreira Pereira1; Paula S. Gioia1

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Laboratório de Psicologia Experimental

 

 


RESUMO

Este trabalho propôs-se a criar e testar um procedimento de ensino de conceitos da "Análise do Comportamento" para professores, enfatizando o lidar com comportamentos considerados pelos professores como violentos de seus alunos. Participaram 18 docentes de uma escola de ensino fundamental da rede municipal de São Paulo. As fases do procedimento foram; a) Questionário sobre violência; b) Registro do comportamento dos alunos pelos professores: c) Observação em sala de aula e d) Preparação dos professores. Os resultados mostraram que: a) Ocorreu "violência" no contexto escolar pesquisado; e b) Uma intervenção, como a proposta, pôde alterar o comportamento do professor de consequenciar adequadamente o comportamento de seu aluno, mas o relato do que ocorreu em sala de aula, continuou o mesmo, após a preparação do docente.

Palavras-chave: Educação; Análise do comportamento; Formação de professores; Violência.


ABSTRACT

The objective of the present work was to create and test a procedure for teaching concepts of Behavior Analysis to teachers, with an emphasis on how to deal with violent student behavior. The study was conducted using 18 members of the teaching staff at a public elementary school in Sao Paulo. The stages of the procedure consisted of: a) a questionnaire about violence; b) a record of teachers" and students" behavior; c) observation in the classroom and, d) teacher training. The results show that: a) violence does occur within the medium being studied, and b) an intervention like the one proposed could alter the teacher"s behavior in adequately predicting the outcome of the behavior of his/her students, but the reporting of what happened in the classroom continued as before, even after the training.

Keywords: Education; Behavior analysis; Teacher training; Violence.


 

 

De acordo com a concepção skinneriana, a educação tem que atuar como pilar para a sobrevivência da cultura, incluindo, no sistema educacional, o conhecimento dos problemas culturais, o conhecimento de que comportamentos contribuem para a solução desses problemas e o conhecimento das técnicas que gerarão esse comportamento. A educação teria, por fim, que se dedicar ao estabelecimento de comportamentos que sejam vantajosos para o indivíduo e para o grupo no futuro (Luna, 1998).

Skinner (1968/1975) define o ensinar como "arranjar contingências de reforço" (p. 04). Assim, o ensino eficaz pode ser entendido como aquele no qual o educador propõe as contingências mais adequadas para a emissão e o reforçamento do comportamento do seu educando. Um bom programa de ensino deve descrever o que espera do aluno (o que ele fará), em quais condições essa resposta deve ser emitida e quais as possíveis (e mais adequadas) consequências a seguirem a esta resposta (Luna, 1998).

O processo deve, também, levar em conta que educandos são indivíduos, com repertórios únicos, e medidas normativas de avaliação não serão eficazes, visto que apenas o indivíduo pode ser usado como controle do seu próprio comportamento (metodologia do sujeito único).

Se partirmos da idéia de que o ensino é determinado pelo conjunto de contingências de reforço utilizado pelo professor, podemos afirmar também, que o sucesso ou fracasso no aprendizado, advém do arranjo dessas contingências. Portanto, nessa perspectiva, tiramos a "culpa" do indivíduo por seu desempenho, e a colocamos nas mãos daqueles (ou da instituição) que têm como papel educar.

Além de ser equivocado admitir que o aluno é diretamente responsável por esse fracasso, é também uma visão simplista dizer que o professor é único culpado por esse "mau desempenho". Os fatores sociais, econômicos, políticos, familiares, entre outros, atuam na aquisição de repertório do indivíduo, assim como sua escola, que terá papel fundamental no processo de aprendizagem.

Nesse sentido, práticas educativas que, de alguma forma, "previnam" o aparecimento de comportamentos considerados problemáticos para o indivíduo e para a cultura, como o comportamento caracterizado como "anti-social", são propostas como via de solução, para que este não apareça como consequência da história do sujeito.

Um estudo, desenvolvido ao longo de três anos, realizado por Mayer, G. R., Butterworth, T, Nafpaktitis, M., & Azaroff, B. S. (1983), propôs a implementação de um treino de professores, para prevenir vandalismo dos alunos. A proposta consistia em aumentar o valor reforçador do ambiente escolar, acabando desta forma, com os eventos prévios que estão presentes na ocorrência do vandalismo.

O programa implementado treinava os professores e a variável medida era o custo (gastos) da escola com vandalismo. O treino compreendia abordar aspectos da teoria comportamental com os professores e discutir a aplicabilidade desses conceitos no contexto em que se inserem.

Os resultados demonstraram reduções estatisticamente relevantes de custos com vandalismo. Além disso, comportamentos dos alunos considerados inadequados foram reduzidos, tais como não executar a tarefa, indisciplina, falta de cooperação e problemas de relacionamento.

Em seu artigo "Preventing anti-social behavior in the schools", Mayer (1995) discute o comportamento anti-social presente no repertório dos alunos e como os professores poderiam lidar com esse comportamento, prevenindo sua ocorrência na situação de ensino. O comportamento anti-social foi descrito por ele, como sendo um conjunto de respostas que envolvem, geralmente, "agressão, vandalismo, infrações às regras, desrespeito à autoridade adulta e violação de normas sociais e morais da sociedade", (p. 467). Sua discussão aponta, principalmente, para o fato de que o comportamento adequado deveria ser ensinado como qualquer outro comportamento, e a ênfase deveria ser dada na instalação de novos repertórios, e não simplesmente na eliminação dos comportamentos indesejáveis. Para isso, o autor salienta como principais tarefas a serem levadas em conta pelo professor: a) A seleção de comportamentos a serem instalados; b) A identificação do repertório acadêmico existente nos indivíduos; c) A definição de procedimentos de mudança desses repertórios; e d) A seleção de contingências de reforçamento individuais para aumentar a frequência dos comportamentosalvo. Dessa forma, o professor ajudaria a evitar a promoção de um ambiente favorável à violência.

Em estudo que se propunha a investigar, principalmente, em que âmbito o agente educador se relaciona com a violência nas escolas, Alfano (1998) discutiu as posições em que se colocam órgãos públicos, diretores, coordenadores e professores do ensino estadual de São Paulo. Os principais questionamentos sugeridos se referiam a: a) A escola está desvinculada do contexto social? ; b) A responsabilidade pelo fracasso escolar é do educador ou do educando? ; c) O que deve ser corrigido: o aluno ou educação a ele oferecida? e ; d) A escola é vítima ou agente da violência?

Ao utilizar um questionário para avaliar em que lugar o educador (professor, diretor e coordenador) se coloca como agente de controle do comportamento do aluno, Alfano (1998) pôde observar que, o que o professor caracteriza como sendo parte de sua função, não é cumprido, segundo ele. Para esse educador, o professor deveria "formar para a vida", dar educação fundamental e formar cidadãos. Porém, muito do que acontece no contexto escolar ainda é atribuído ao aluno, e o eventual mau desempenho do docente é justificado pela falha do sistema educacional, pelos problemas trazidos pelo próprio aluno e, apenas quando se trata de outro profissional a identificar o problema, que não o próprio professor, este é atribuido a ele. O papel atribuído à escola como instituição é, também, o de formar para a vida, dar educação fundamental e formar cidadãos, mas o que na realidade se cumpre, acaba sendo o assistencial e burocrático.

A busca de variáveis de controle do comportamento em contexto escolar também foi objetivo de Iwata, Wallace, Kahng, Lindberg, Roscoe, Conners, Hanley e Thompson & Worsdell (2000). Esses autores defendem a análise funcional como ferramenta eficaz para profissionais de diferentes áreas de atuação, por permitir a identificação de contingências mantenedoras do comportamento e, desta forma, propiciar implementação de programas de avaliação e mudança comportamental efetivos.

Em seu trabalho, foi proposto um procedimento de instalação de habilidades em realizar análise funcional por participantes não treinados, nessa habilidade previamente. Os interesses que tinham com o experimento eram os de verificar qual a velocidade com que esses indivíduos, sem treino anterior, adquiriam a habilidade referida e, ainda, qual a quantidade de treino necessária, para que realizassem a análise funcional.

Nessa pesquisa, foram participantes estudantes universitários que, anteriormente ao estudo, já tinham algum conhecimento teórico em "Análise do Comportamento", mesmo que não, em análise funcional. Então, a partir deste conhecimento teórico, foi proposto como passo seguinte para instalação de repertório de habilidade em realizar análise funcional um procedimento de simulação de situações (situações específicas que mostram o sujeito fornecendo consequência ao comportamento de outro) - role play.

Os resultados apontados por Iwata et al (2000) foram que um procedimento de role-play se mostrou eficaz para instalação de repertório de análise funcional em participantes sem treinamento prévio, já que todos os participantes melhoraram o desempenho, após o treino proposto.

Para analisar a possibilidade de o professor controlar e, portanto, alterar o comportamento de seu aluno, é necessário que se compreenda, primeiramente, o que controla o comportamento do professor. Além da história pessoal, as variáveis do ambiente escolar têm importância crucial na maneira como o professor conduz seu processo de ensino. Pereira, Marinotti & Luna (2004) citam algumas dessas variáveis em seu artigo "O comportamento do professor com a aprendizagem do aluno: contribuições da Análise do Comportamento". Algumas delas são: a) As instâncias superiores; b) Outros professores; c) O plano de aula; d) O comportamento disciplinar do aluno; e) A qualidade da relação com os alunos; f) A participação dos pais na escola; g) A crença sobre as famílias dos alunos; h) As crenças sobre a responsabilidade pelo desempenho do aluno; i) As exigências burocráticas; j) As expectativas profissionais; e l) A formação profissional.

Em relação à formação profissional, os autores destacam que os métodos são arcaicos, mesmo quando o professor tem uma formação atualizada e que esses métodos desconsideram as diferenças individuais dos alunos, dificultando que o ensino seja qualificado e eficaz.

A formação do professor, assim como a do aluno, apresenta problemas: desconsiderase seu repertório inicial; apresentase uma quantidade enorme de informações, com as quais ele tem dificuldade de lidar; a formação tem o caráter puramente verbal, o que acaba por desenvolver repertório verbal e não a habilidade de ensinar - de arranjar contingências reforçadoras. A formação do professor, desta forma, não prioriza que o controle de seu comportamento seja o resultado observado em seus alunos.

Concebendo desta forma a educação, o papel do educador no processo de aprendizagem e, portanto, seu "poder de intervenção", o proposto trabalho se apoia na ideia de que o professor pode arranjar um método eficaz de ensino e que, com esse arranjo, pode ser capaz de controlar o comportamento de estudar e também outros comportamentos incompatíveis com o comportamento violento deste aluno.

O procedimento criado e testado pretendeu, então, avaliar se o ensino de conceitos básicos e a realização de análises de interação entre professores e alunos, possibilitariam que o professor interferisse mais apropriadamente na sala de aula, em comportamentos considerados por ele como "violentos"2. Além disso, pretendeu-se verificar se, após sua preparação em "Análise do Comportamento", o relato sobre o comportamento do aluno e a consequência fornecida pelo professor também tornava-se mais preciso (correspondente ao que, de fato, ocorreu em sala de aula).

Se o professor relatar o comportamento de seu aluno como parte de uma contingência e, ainda, se consequenciar este comportamento em situação de sala de aula de forma diferente do que fazia antes da intervenção, poderíamos supor que o procedimento foi eficaz na instalação do repertório proposto para os professores participantes.

 

Método

Participantes

Participaram da pesquisa 18 docentes, todas do sexo feminino, de uma escola da rede Municipal de ensino, localizada na zona sul de São Paulo. Das docentes, 11 lecionavam em ensino fundamental I (primeira à quarta série, composto de professoras polivalentes - que ensinam todas as matérias) e sete em ensino fundamental II (quinta à oitava série). O critério para a escolha dessas professoras foi a adesão voluntária de cada uma delas a participarem do estudo. Foi pedido que a direção da escola e as professoras assinassem um termo de consentimento de participação no trabalho.

Local

Os encontros com o grupo de discussão ocorreram em uma sala de reuniões e na sala de leitura da escola, quando houve apresentação de slides.

A sala de aula também foi usada para a observação feita pela experimentadora, durante o período de aulas (entre as 15h00min e as 19h00min). Os horários em que as observações foram realizadas foram randomicamente estipulados, sendo que a observadora nunca permanecia mais que uma hora consecutiva, em cada sala de aula.

Procedimento e Material

Um grupo de professoras do ensino fundamental I foi identificado no trabalho como grupo I. Este grupo participou das discussões propostas no trabalho. Um segundo grupo, chamado grupo II, participou apenas respondendo a questionários e roteiros de observação entregues pela pesquisadora. O grupo II era composto de professoras, tanto do ensino fundamental I, quanto do ensino fundamental II.

O procedimento foi dividido nas seguintes fases:

Fase 1. Preenchimento de questionário sobre violência

O objetivo deste questionário era o de identificar como as professoras descrevem a violência no ambiente escolar e se esta ocorre na sala de aula (rotina escolar). Ainda, se identificam quem são os atores dessa violência (os alunos e/ ou os professores e/ ou a direção).

O material utilizado nesta parte do trabalho foi um questionário impresso adaptado do trabalho desenvolvido por Alfano (1997). O questionário era composto dos seguintes itens: a) Dados pessoais; b) Cotidiano escolar; c) Experiências docentes.

Fase 2. Observação e registro do comportamento dos alunos pelas professoras

Os comportamentos descritos pelas professoras na Fase 1 serviram para elaborar uma folha de registro utilizada na Fase 2. O objetivo desta fase era o de verificar quais os comportamentos violentos praticados pelos alunos que eram observados pelas professoras.

As professoras dos dois grupos foram instruídas a observar o comportamento dos seus alunos, registrando aquilo que identificassem como "comportamento violento", de acordo com as categorias identificadas no questionário inicial da Fase 1 (os tipos de violência apontados pelas próprias professoras no questionário serviram como categorias de comportamento a serem observados). Além disso, era pedido que descrevessem a contingência (antecedente, resposta e consequência).

Nas reuniões de preparação, relatos escrito e oral das observações realizadas em sala de aula, foram pedidos aos professores. Essas reuniões serão melhor explicadas na descrição da fase 4 do procedimento.

Fase 3. Observação em sala de aula (avaliação inicial)

Duas professoras do grupo I foram observadas pela experimentadora em sua sala de aula. Uma das professoras lecionava para a primeira série e a outra, para a segunda.

O objetivo desta observação era o de fazer o registro de linha de base do procedimento, para que, posteriormente à intervenção, fosse feito novo registro e, assim, a comparação entre eles.

A observadora registrou, durante as aulas, os comportamentos observados em "comportamento do aluno" e "comportamento da professora", em uma folha padronizada.

Após o registro, as relações "resposta do aluno - consequência fornecida pela professora" foram categorizadas em quatro diferentes tipos:

1) Atenção a comportamento "apropriado"; 2) Atenção a comportamento "inapropriado"; 3) Não atenção a comportamento "apropriado";

4) Não atenção a comportamento "inapropriado".

Fase 4. Encontros com professoras (preparação docente)

Após a aplicação do questionário e da observação, foram elaboradas aulas para discutir a concepção das professoras acerca do comportamento de seus alunos, embasando teoricamente algumas dessas discussões. Essas aulas eram expositivas e também ocorreram discussões das professoras com a experimentadora. Os encontros com as professoras consistiram de discussões com os temas a) Comportamento: Comportamento Apropriado X Comportamento Inapropriado; e b) Consequências para o comportamento: como consequenciar o comportamento apropriado e como consequenciar o comportamento inapropriado?

Foram apresentados alguns conceitos básicos (reforço, extinção e punição) e discutidos exemplos, principalmente os trazidos pelas professoras. Ao final das discussões, exercícios de classificação de descrições comportamentais e questionários conceituais foram realizados pelas professoras.

Fase 5. Registro do comportamento dos alunos pelas professoras (comparação com avaliação inicial após preparação docente)

No primeiro registro, as professoras foram solicitadas a descrever, em uma folha padronizada, a contingência de três termos, na qual fazia parte o comportamento do aluno observado. Após as discussões realizadas com o grupo I, os dois grupos foram então, solicitados a fazerem novo registro. Nesta nova observação, não foi pedido que atentassem para os antecedentes ou consequentes do comportamento, mas sim que descrevessem da maneira como soubessem, o comportamento do aluno.

Este novo registro deveria ser comparado ao anterior (linha de base) e, desta forma, ser usado como uma das formas de avaliar a intervenção.

Nesta segunda observação, esperavase que as professoras do grupo I fizessem um registro que descrevesse a contingência, não apenas a topografia das respostas de seus alunos, mesmo isto não sendo pedido na folha de registro desta vez. Desta forma, seria possível verificar se o primeiro registro feito por elas em contingências de três termos, estaria apenas sob controle do que era pedido na folha ou se, agora, depois de treinadas, a observação seria feita desta forma, independente de como fosse pedido a elas que registrassem.

Fase 6. Observação em sala de aula (comparação com avaliação inicial)

A observadora, novamente, fez o mesmo registro em sala de aula. O resultado desta observação foi comparado ao resultado obtido na primeira observação (linha de base). O material utilizado e o procedimento realizado foram os mesmos da fase 3 do procedimento.

Teste de fidedignidade

O teste de fidedignidade foi realizado com a presença de uma outra observadora em algumas das vezes em que a pesquisadora esteve presente em sala de aula, registrando o comportamento de alunos e professoras. A concordância no teste de fidedignidade foi calculada dividindose o número total de concordâncias entre as observadoras pela soma das discordâncias e concordâncias e multiplicandose o resultado por 100.

 

Resultados

Os resultados serão descritos separadamente para cada uma das fases.

Questionário de concepções do professor acerca da violência

Ao todo, oito professoras responderam o questionário. O que pôde ser observado a partir das respostas obtidas nos questionários é que há presença de violência na escola, segundo as professoras. Na Figura 1 as respostas ao questionário estão sumarizadas.

Das oito respondentes, apenas uma não afirmou diretamente que existe violência na escola. Porém sua resposta não é negativa; o que ela afirma é que há outros fatores/ motivos que levam à violência, ou seja, não deixa de confirmar que, de alguma forma, a violência também é presente neste ambiente. "Violência, para mim, é um termo muito forte. Penso que na escola existem comportamentos que levam à violência" (sic).

A violência física, forma mais explícita de violência, segundo elas, ainda é a mais frequentemente encontrada. A violência moral, referida principalmente como desacato, falta de respeito e agressão verbal, também era observada por elas no cotidiano escolar.

Quando questionadas sobre quem pratica os atos de violência na escola, as professoras afirmaram ser o próprio aluno o principal agente deste comportamento. A comunidade escolar (professores e funcionários) aparece também, como praticante nesta ação, porém em menor frequência.

A agressão física dos alunos é, segundo elas, geralmente dirigida a outro aluno. A falta de respeito, o desacato a figuras de autoridade (funcionários, professores, coordenação e direção), palavrões (dirigidos tanto a colegas quanto a professores) e o descumprimento das regras da escola, também aparecem com bastante frequência no relato das professoras.

A violência, quando praticada pelos professores, segundo elas, é caracterizada como "violência moral". Na definição que apresentaram, a violência moral seria a presença de punição no comportamento do professor, de agressividade por parte dele, de uso de palavrões e de desacato. Consideram que o próprio exercício do trabalho se torna o maior responsável pelo desempenho "violento" dos professores. O desgaste pelo exercício do trabalho geraria, segundo elas, cansaço, emoções negativas e estresse. Além disso, a perda de autoridade, também seria um dos motivos pelos quais o professor tem que agir com violência na relação com o aluno. "O professor não tem mais autoridade na sala de aula, não é respeitado pelos alunos e acaba constantemente envolvido pelo estresse" (sic).

Além disso, razões como a formação inadequada, a falta de estrutura familiar do professor e a ausência de uma solução para a situação (não saber o que fazer) fazem com que professores ajam dessa maneira.

Algumas das possíveis razões para a violência dos alunos, apontadas por elas, são os problemas sociais e/ou sócioemocionais; a falta de estrutura, de orientação familiar, de atenção da família, de criação apropriada; a falta de estimulação apropriada; o convívio com a violência; a impunidade de quem comete a violência; a falta de limites e de educação; a baixa autoestima; as emoções presentes (agitação, tensão); e, ainda, a violência como uma forma de reação à má compreensão por parte dos adultos.

As professoras relataram acreditar que o professor poderia alterar este quadro, através de sua atuação, diminuindo a incidência deste tipo de comportamento no ambiente escolar.

Sobre as possíveis soluções que apontaram para resolver a violência, as professoras, em sua maioria, indicaram o diálogo como tentativa de resolução do problema. Seu propósito principal, segundo elas, seria o de a) Conseguir encontrar a causa do comportamento do aluno com ele ou com responsáveis; b) Demonstrar a importância das regras e dos limites para a convivência com outros e c) Propiciar comunicação/ contato com direção e responsáveis, no caso do diálogo, apenas no caso do aluno não obter resultado (Figura 2).

Em relação a acreditarem que o professor possa mudar esta realidade, apenas uma professora respondeu contrariamente a isto (Figura 2). Quanto a ações para diminuir a violência, relataram que deveriam ser voltadas, principalmente, à mostrar aonde a violência pode levar; trabalhar com dinâmicas de grupo, trabalhos em equipe, tendo como foco desenvolver a colaboração no grupo; motivar alunos a serem diferentes das pessoas do seu meio e, finalmente, o diálogo como uma forma de colocar o assunto da violência, introduzidoo aos poucos e trabalhado continuamente.

Registro do comportamento dos alunos pelos professores

As observações registradas por três das professoras do grupo I (participantes das discussões com a pesquisadora) mostraram que todas registraram a relação comportamental de forma completa: evento antecedente da resposta, a resposta e a consequência, quando a folha de registro assim requeria o relato do episódio.

Para o grupo II (professores que não participaram das discussões com a não registrou o antecedente da resposta. As outras duas professoras do grupo II fizeram o registro englobando a descrição completa da relação, como era pedido na folha entregue a elas.

No segundo registro (registro no qual a descrição da relação não estava especificada), quatro professoras do grupo I registraram cada uma um episódio de violência e seis professoras do grupo II fizeram o mesmo registro.

Na comparação do primeiro com o segundo registro, pôdese observar que as diferenças nos dois registros referiramse, principalmente, à descrição da relação comportamental de forma completa. Nos registros feitos anteriormente à intervenção, houve o registro de antecedentes, resposta e consequentes em quase todos os casos (exceto em um caso em que antecedentes não foram registrados), tanto pelo grupo I quanto pelo grupo II, enquanto que os registros feitos posteriores à intervenção mostraram essa diferença.

 

 

Observação em sala de aula

As observações realizadas em sala de aula com as duas professoras do grupo I registraram as "respostas dos alunos" e as "consequências fornecidas pela professora", para cada uma das respostas.

O comportamento das professoras no fornecimento de consequências aos comportamentos dos alunos foi categorizado em quatro diferentes tipos de relação resposta - consequência: 1) Atenção a comportamento "apropriado"; 2) Atenção a comportamento "inapropriado"; 3) Não atenção a comportamento "apropriado"; 4) Não atenção a comportamento "inapropriado".

Os comportamentos foram caracterizados como apropriados ou inapropriados de acordo com critérios da pesquisadora. Os comportamentos apropriados dos alunos eram aqueles que são socialmente aceitos e geralmente reforçados em ambiente escolar, como fazer perguntas sobre a matéria dada, fazer a tarefa proposta, permanecer sentado, enquanto é requisitado pela professora, entre outros. Os inapropriados seriam os comportamentos opostos a esses, como conversar e não realizar tarefas, permanecer em pé durante tarefa em que a professora requisita que permaneçam sentados, conversar durante explicação de matéria e não realizar a tarefa proposta, entre outros.

Dos comportamentos observados na sala de aula da professora 1, "apropriado + atenção" representaram 24% dos registros antes das discussões, e 48% dos registros depois das discussões. A categoria "inapropriado + não atenção" também teve uma mudança de ocorrências: de 2% dos registros de observação, antes das discussões, aumentou para 19%. Além disso, para as categorias "inapropriado + atenção" e "apropriado + não atenção", houve diminuição de ocorrência, após as discussões: de 53% para 33% e de 20% para 0%, respectivamente.

Observou-se nos resultados obtidos nas observações feitas com a professora 2, que antes das discussões esta professora teve 5% do total dos registros do seu comportamento na categoria "apropriado + atenção", enquanto que, após a discussão essa categoria representou 39% dos registros. A categoria "inapropriado + não atenção", que tinha 5% de ocorrência, passou para 0 (nenhum comportamento registrado), após as discussões. Para a categoria "inapropriado + atenção", houve aumento de ocorrência após as discussões, passando de 47% a 48% do total de registros de observação. Finalmente, na categoria "apropriado + não atenção", houve diminuição de ocorrência, após as discussões: de 42% a 13% dos registros.

Como é possível observar na Figura 1, antes das discussões, a ocorrência de comportamentos "apropriados" das professoras no fornecimento de consequências ao comportamento de seus alunos, não ultrapassou 26% dos registros. Após as discussões essa frequência aumentou, chegando ao máximo de 80% das ocorrências registradas em uma sessão de observação.

O fornecimento de consequência "inapropriada" por parte das professoras (comportamento apropriado do aluno + não atenção ou comportamento inapropriado do aluno + atenção), ocorrido antes e após as discussões, foi representado na Figura 2.

Antes das discussões, a ocorrência de comportamentos "inadequados" das professoras no fornecimento de consequências ao comportamento de seus alunos foi superior a 69% dos registros, em todas as observações. Após as discussões de preparação essa porcentagem diminuiu, principalmente para a professora 1, chegando a representar, para esta professora, o mínimo de 13% em uma das sessões e o máximo de 50% em outra. Para a professora 2, o mínimo registrado em uma sessão foi de 20% de comportamentos inadequados, e o máximo de 75%, em outra sessão.

 

Figura 3

 

Avaliação da preparação das professoras

Após os encontros, foi pedido às professoras que tentassem identificar em uma série de situações escolares, o conceito básico abordado em cada situação (exemplos).

Cinco professoras que participaram dos encontros responderam à avaliação. Dentre as nove situações descritas, uma das professoras cometeu um erro e outra, cometeu dois erros. As demais professoras identificaram todos os conceitos corretamente. Todas as outras identificaram de maneira correta cada um dos conceitos, nas nove situações.

 

Figura 4

 

Em seguida, foi entregue um questionário de avaliação sobre a definição dos conceitos básicos discutidos, e seu resultado é mostrado na Tabela 2.

 

 

Todas as professoras acertaram a definição de comportamento. Para os demais conceitos, respostas corretas ou incompletas foram, de maneira geral, mais frequentes do que respostas incorretas, exceto para o tema "diminuição da frequência de um comportamento".

O critério para que se pudesse avaliar a discussão como uma boa forma de aquisição de conceitos seria o de, pelo menos, 90% de acertos para cada participante. Duas das professoras obtiveram 100% de acertos, enquanto as outras três responderam de maneira incorreta ou incompleta à maior parte dos conceitos. Portanto, há ainda o questionamento do quanto as professoras, de fato, adquiriram os conceitos pretendidos.

Teste de fidedignidade

O teste de fidedignidade foi realizado em duas sessões de observação. Anteriormente à realização do teste de fidedignidade, a pesquisadora realizou uma sessão de treino de observação com a segunda observadora, para que, posteriormente, fosse feito o teste.

O registro das observações foi feito por ambas as observadoras, dentro da sala de aula, em intervalos de tempo fixos de 5 minutos, ou seja, a cada 5 minutos ambas registravam o comportamento da professora que estivesse ocorrendo subsequente ao comportamento de um aluno (fornecimento de consequência por parte da professora ao comportamento do aluno).

O resultado do teste de fidedignidade foi de 78,3% de concordância entre as observadoras, somandose as duas sessões de observação realizadas.

 

Discussão

A primeira etapa do trabalho tinha por objetivo verificar a presença ou não de violência na escola pesquisada.

Um primeiro aspecto de importância do questionário aplicado era o de verificar se as professoras apresentavam esta queixa e se o tema seria de interesse dessas profissionais.

Com isso, pôdese supor que o fato de todas as professoras terem apontado a existência de violência na escola, em alguma medida, provavelmente propiciou que todas, no momento da apresentação da proposta do trabalho, se disponibilizassem a participar como participantes da pesquisa, a despeito de alguma imposição da coordenação ou direção.

Na resposta à pergunta sobre quais seriam os atores (praticantes) desta violência, o número total de respostas indicou os alunos, na maioria das vezes, como praticantes desses atos. Mesmo assim, todas as outras respostas somadas totalizaram um número superior às respostas que apontam os alunos como atores: alunos com cinco respostas no total e comunidade escolar, professores e funcionários totalizando 6 respostas. Isto é, há a indicação também do corpo docente como praticante deste tipo de comportamento.

Uma suposição inicialmente feita é a de que, para este público, um trabalho que vise à análise e diminuição da ocorrência de violência no ambiente escolar, seria bem sucedido focando, tanto o público "corpo docente", quanto os alunos.

De acordo com o modelo de violência descrito por Sidman (2001/1989), a agressão pode ser entendida como produto de controle aversivo. Desta forma, entender o contexto em que se dá a violência, quais os atores deste comportamento e como os professores identificam seu papel no que cabe à análise da frequência desses atos em ambiente escolar, provavelmente, facilitaria a discussão sobre o tema, com este público.

No que diz respeito aos tipos de violência encontrados por professores em ambiente escolar, a presença de agressão física foi o tipo mais relatado pelas professoras que responderam o questionário. Quando Sidman (2001/1989) relata seu estudo sobre agressão com sujeitos experimentais, observa que, numa situação em que um sujeito foi punido, se tiver acesso a outro sujeito, a resposta do primeiro será a de agredir o segundo. Isto quer dizer que, em uma situação de controle aversivo, a resposta do indivíduo que está sob este controle pode ser a de agredir a outro indivíduo.

Desta forma, entender que a ocorrência de agressão física é constante na escola pesquisada é supor que este comportamento pode ser produto de controle aversivo neste ambiente. Ainda, uma segunda suposição quanto a isto é a de que, uma vez que este controle tenha sido usado, o "punidor" (aquele que utilizou a punição) foi reforçado pelo seu comportamento, por suprimir o comportamento do sujeito punido, e assim teve esta resposta fortalecida, podendo ser utilizada um maior número de vezes e, talvez, generalizada para a relação com outros sujeitos, propiciando a presença e aumento da coercitividade neste ambiente.

Mais um aspecto importante levantado no questionário foi em relação às razões que atribuem para a ocorrência de violência na prática do professor. Quando dizem que o desgaste pelo próprio trabalho é uma das principais "causas" de seu comportamento, estão apontando um fator que, posteriormente, aparecerá também nas discussões realizadas com a pesquisadora: o comportamento violento da professora pode, também, ser uma resposta agressiva de contracontrole à situação de violência, em que já se encontram no exercício de sua profissão.

Os aspectos descritos pelas professoras nas discussões como criadores deste ambiente coercitivo são diversos, e entre eles estão: o grande número de alunos por sala de aula; a falta de apoio da família na continuidade da intervenção proposta por elas para o ensino (fazer tarefas de casa, por exemplo) e a violência entre os alunos; entre outros. Além disso, quando relataram sobre as dificuldades em sala de aula, o aspecto mais frequentemente descrito por elas é o de não saber o que fazer, de se encontrarem em situação de impotência, de não conseguir mostrar para o aluno que comportamentos violentos são prejudiciais para ele.

Como analisado por Pereira et al (2004), há variáveis que controlam o comportamento do professor e, para se fazer uma intervenção em que o foco seja a alteração deste comportamento, é necessário que se compreenda, em primeiro lugar, quais são essas variáveis. Como descrito pelos autores e citado também pelas professoras desta pesquisa, variáveis como o comportamento disciplinar do aluno, a participação dos pais na escola, as crenças sobre a responsabilidade pelo desempenho do aluno, entre outras, acabam por exercer maior controle sobre o comportamento dos professores, do que o próprio aprendizado de seu aluno. Com isso, o foco do processo de ensino se perde, e o que se esperaria do professor (contingência na instalação e manutenção de repertórios adequados e eliminação de comportamentos inadequados) não aparece: o processo, então, fracassa.

Analistas do comportamento teriam um papel fundamental no planejamento eficiente do processo de aprendizagem, já que levam em conta, prioritariamente, o sucesso no aprendizado de seu aluno.

Um outro problema com relação ao desempenho inadequado do professor e, por consequência, do aluno, é que o fracasso escolar é apontado como uma das possíveis causas de comportamento delinquente.

Como os dados obtidos pela presente pesquisa não dizem respeito ao desempenho acadêmico dos alunos, pôdese apenas supor que esses sujeitos, por apresentaram comportamentos violentos com frequência (de acordo com o que foi relatado pelas professoras), podem ser pessoas com história de fracasso escolar. Poderia ser investigada diretamente esta relação: o fracasso aumenta as ocorrências de comportamentos violentos nas escolas?

Os problemas sociais, como a pobreza e a falta de recursos básicos, que estão fora do alcance do exercício da profissão de educador, foram as razões, as quais elas atribuíram a ocorrência da violência. Além disso, quando apontaram a família, a falta de limites e a baixa autoestima como outras possíveis causas do comportamento, se isentaram, mais uma vez, de tomar para si o papel de transformar esta realidade. Porém, a pergunta complementar a esta funcionou como uma forma de verificar se esta hipótese estaria correta. Quando questionados sobre acharem (ou não) que o professor teria o poder de diminuir a incidência deste comportamento através de sua atuação, a maioria delas disse que sim.

Com isso, podese dizer que o procedimento utilizado foi eficaz, não permitindo ambiguidades em relação às informações sobre o que os professores consideram como violência, o que atribuem à origem de tal comportamento e quais as possibilidades de mudança (plasticidade), que acreditam existir em relação a isto.

Sobre as atitudes que tomariam para enfrentar o problema, o diálogo aparece como a consequência geralmente fornecida por elas nessas situações. Com isso, pôdese supor que a atitude que elas já tomam é, ainda, insuficiente, já que o comportamento em questão é recorrente. O diálogo, como uma forma de fornecer atenção ao aluno, poderia estar fortalecendo o comportamento, e assim a intervenção da professora estaria aumentando a probabilidade de ocorrência de violência, contrariando a eficácia que acreditam ter tal procedimento.

Quanto às folhas de registro entregues aos professores, a diferença do registro pedido antes da intervenção e após a intervenção, foi um dos dados utilizados para medir as alterações no comportamento do grupo I.

O objetivo da diferenciação do registro antes e depois das discussões com ambos os grupos, era o de verificar se apenas a requisição feita pela folha de registro (registre em contingências ou registre da maneira como achar melhor) poderia interferir no relato dos professores de "antecedente - resposta - consequência" ou se as discussões (a intervenção proposta) é que tinham tal controle. Ainda, se as discussões teriam como função fazer com que as professoras realizassem, de alguma forma, observação da relação comportamental de seus alunos.

No segundo registro, tanto o grupo I, quanto o grupo II, não aparecem registros apenas de resposta (topografia), ou seja, de alguma forma todos esses profissionais consideram algum contexto (evento antecedente ou consequências), no olhar para o comportamento de seu aluno.

Mesmo assim, observouse que as discussões de preparação não foram eficientes para produzir alterações no registro entre os grupos I e II (grupo que participou das discussões e grupo que não participou das discussões). É possível dizer que, quando requisitado que se observe a relação comportamental descrita por uma contingência, este pedido pode funcionar como forma controle do comportamento do observador. O fato de ter passado por uma intervenção em que se discutiram as funções do comportamento, as variáveis mantenedoras e enfraquecedoras de respostas presentes no repertório dos alunos (conceitos de reforçamento e extinção), não fez com que professores observassem o comportamento de seus alunos como parte de uma contingência. Com isso, podese dizer que as discussões, por mais que alterassem o comportamento de consequenciar respostas dos alunos, não interferiram no comportamento de analisar o contexto, e não apenas a topografia das respostas, ao descrever comportamentos ocorridos na escola, por parte do professor.

Há problemas em se hipotetizar sobre as variáveis controladoras do comportamento de registrar dos professores. Não existe o controle total dessas variáveis e a medida de cada uma delas isoladamente é impossível, o que faz com que apenas sugestões fornecidas pela comparação dos resultados da intervenção com os dados de linha de base sejam possíveis.

Portanto, a hipótese formulada é a de que uma intervenção como a proposta na metodologia desenvolvida não é, ainda, suficiente para alterar o comportamento de registrar e, talvez, o comportamento de observar, das professoras.

Outro problema a ser apontado é que não se pode necessariamente dizer que o registro ocorreu subsequente a uma observação acurada feita por elas. O que isso quer dizer é que, mesmo que o registro sofra alterações após uma intervenção como a proposta, não se pode dizer que o comportamento de observar das professoras tenha mudado. Quando se mede o comportamento de registrar, podese apenas supor que, uma vez que o registro mude, provavelmente o comportamento de observar contingências é que tenha mudado.

Além dos registros feitos por docentes, o registro das observações em sala de aula feito pela experimentadora serviu também de medida da intervenção realizada.

A comparação entre as observações feitas antes e depois da intervenção indica que a intervenção pode ter alterado o comportamento das professoras de consequenciar o comportamento dos alunos. Como não foi possível o controle de variáveis estranhas no experimento, podese apenas sugerir que a intervenção tenha tido propriedade de alterar o comportamento delas. A própria presença da observadora em sala de aula, por exemplo, pode ter interferido para que as professoras se sentissem em situação de avaliação e, portanto, atentassem mais para o comportamento delas, já que este estava sendo observado.

Um outro problema referese ao fato de que as discussões com as professoras terem sido sempre realizadas em grupo. Este modelo de situação de ensino pode ser problemático, já que desconsidera os repertórios individuais (Skinner, 1968; Luna, 1998). Pelas respostas obtidas nos questionários após a terceira discussão, podese dizer que muitas das professoras presentes não aprenderam os conceitos, não atingiram um critério considerado bom. Portanto, um trabalho que visasse o ensino dos conceitos a apenas uma professora, poderia passar por todos os estágios do processo de ensino (avaliar repertório já instalado e instalar repertório adequado de acordo com o "ritmo" do aprendiz).

O trabalho em grupo dificulta o fornecimento de feedback imediato a comportamentos adequados, e dificulta também avaliar se este feedback serve ou não como reforço ao comportamento apropriado, já que é muito mais difícil medir a frequência do comportamento de muitos participantes ao mesmo tempo.

A discussão realizada por Fonai (2005) sugere que alguns procedimentos devam ser combinados, para que se obtenha uma formação de professores mais eficaz. Esses procedimentos seriam (1) Leitura, (2) Discussão, (3) Instrução (descrição de contingências), (4) Observação de role-playing, (5) Atuação real com feedback atrasado e (6) Ajuda gradualmente retirada. Em seu trabalho, grande parte da intervenção se deu em uma sala de atendimento especial de crianças com desenvolvimento atípico, e o sujeito de sua pesquisa era uma única professora. Ao se trabalhar com apenas uma professora, o processo é facilitado, dado que se responde diretamente ao repertório da professora.

Um outro aspecto importante do trabalho de Fonai (2005) é a diferença de público atendido pela professora em treinamento. Com alunos com desenvolvimento atípico, o acesso a reforçadores previamente ao processo de educação, através do teste de preferência de estímulos, facilita a instalação de novas respostas por parte desses professores. Este aspecto é enfatizado pelos próprios professores na discussão realizada no presente trabalho. Com muitos alunos em sala de aula, a dificuldade em encontrar estímulos que aumentem a frequência de determinada resposta e, desta forma, instalar respostas adequadas, através da utilização de tal evento contingente a essas respostas é um procedimento relatado por elas como muito difícil.

Mesmo assim, ao se compararem os dados de linha de base e de observação pós discussões, podese supor que a discussão realizada foi uma forma de alterar o comportamento do professor, sendo então um procedimento eficaz, em alguma medida, no treino de profissionais de diversas áreas em "Análise do Comportamento".

As observações em sala de aula tiveram por objetivo medir a frequência de consequências fornecidas pelas professoras a comportamentos adequados e inadequados dos alunos. Por tratarse de registro sobre o comportamento do professor primordialmente, esta observação incluiu, tanto os comportamentos ditos "violentos", quanto outros comportamentos adequados e inadequados, que ocorressem na situação de observação.

Por este motivo, talvez o foco inicial do trabalho tenha se perdido de alguma forma e, portanto, as professoras tenham se atentado menos aos comportamentos violentos e mais a outros comportamentos (tanto adequados, quanto inadequados).

Segundo Mayer (1995), ao instalar novos repertórios em um sujeito, a ênfase deve ser dada à instalação de novos repertórios, e não na eliminação de outros. Portanto, se a intervenção fez com que o reforço ao comportamento adequado se tornasse presente para diminuir a frequência de comportamentos incompatíveis (tanto os violentos quanto quaisquer outros comportamentos que elas considerem inadequados), podese dizer que este procedimento teve sua importância afirmada e, desta forma, validouse o procedimento proposto para qualquer que seja o foco ao comportamento do aluno que o pesquisador proponha.

Vale lembrar que, no Brasil, a introdução da "Análise do Comportamento" na escola ainda é pobre. Um trabalho no ambiente escolar realizado com corpo docente deve priorizar o atendimento da demanda deste público, já que a imposição de intervenções acaba por perder adesão dos sujeitos e, desta forma, não cria um procedimento vantajoso para eles.

Portanto, um procedimento de intervenção deve, em primeiro lugar, levantar as questões a serem foco de intervenção por parte do público pesquisado.

Ainda, diversas questões podem ser levantadas a partir da literatura da área e dos resultados aqui apresentados: O que é mais vantajoso, discussão de conceitos ou role-play de situações reais? É possível instalar novos repertórios trabalhandose em grupo? Qual o tipo de feedback mais eficiente: na simulação de situações e, portanto, imediato, ou após observação da situação real e discussão e, portanto, atrasado? Uma medida do relato do professor sobre o comportamento do aluno pode fazer com que ele fique sob controle da observação deste comportamento? Enfim, a "Análise do Comportamento" pode ajudar o professor real?

 

Referências

Alfano, B. (1997). A posição de diferentes agentes educacionais frente à violência escolar. Trabalho de Conclusão de Curso, Faculdade de Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.         [ Links ]

Fonai, A. C. (2005). A formação de professores e a Análise do Comportamento: a experiência do programa de inclusão. Trabalho de Conclusão de Curso, Faculdade de Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.         [ Links ]

Iwata, B. A., Wallace, M. D., Kahng, S. W., Lindberg, J. S., Roscoe, E. M., Conners, J., Hanley, G. P., Thompson, R. H. & Worsdell, A. S. (2000). Skill acquisition in the implementation of functional analysis methodology. Journal of Applied Behavior Analysis, 33,181-194.         [ Links ]

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Pereira, M. E. M., Marinotti, M. & Luna, S. V. (2004). O comportamento do professor com a aprendizagem do aluno: contribuições da Análise do Comportamento. Em M. M. C. Hubner e M. Marinotti (Orgs.). Análise do Comportamento para a educação, 1ª Edição, pp. 11-32. São Paulo: ESETec.         [ Links ]

Sidman, M. (2001). Coerção e suas implicações. Tradução organizada por Maria Amália Andery e Tereza Maria Sério. São Paulo: Livro Pleno. (Trabalho original publicado em 1989).         [ Links ]

Skinner, B. F. (1975). Tecnologia do ensino. Tradução organizada por Rodolfo Azzi. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo. (Trabalho original publicado em 1968).         [ Links ]

 

 

Recebido em: 11/11/2008
Aceito para publicação em: 03/08/2010

 

 

1 Pontifícia Universidade Católica de São Paulo , Laboratório de Psicologia Experimental. Perdizes, São Paulo, SP, Brasil.
2 O termo "violento" se refere aqui a comportamentos assim caracterizados pelos professores, e não à concepção das autoras a respeito da violência.