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Ciências & Cognição
versão On-line ISSN 1806-5821
Ciênc. cogn. vol.3 Rio de Janeiro nov. 2004
Resenha
Uma visão geral sobre a teoria da ciência
An overview about science theory
Maurício Aranha
UNIPAC, Barbacena, Minas Gerais, Brasil; Universidade Redentor, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil; Setor de Psiquiatria, CAPS/FHEMIG, Barbacena, Minas Gerais, Brasil; Núcleo de Psicologia e Comportamento, ICC, Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil
Introdução à teoria da ciência (2004).Luiz Henrique Dutra. 2. Edição. Editora UFSC,
ISBN 8532801072, 15. pág.
Palavras-chave: Filosofia da ciência; epistemologia.
Não se pode tornar fácil o difícil, a não ser deturpando-o. Entretanto, pode-se abordar temas difíceis com clareza, o que faz o professor Luiz Henrique Dutra, no livro Introdução à Teoria da Ciência, cujo objetivo é dar ao leitor, de forma didática, uma visão geral e introdutória das principais questões da epistemologia ou filosofia da ciência. Trata-se de um livro indicado particularmente aos alunos de graduação e início de pós-graduação, não só de filosofia, mas, dada à importância das ciências no cenário contemporâneo, de qualquer área de estudos universitários. É útil ainda para os professores de disciplinas afins, que nem sempre dispõem de bibliografia acessível e atualizada sobre os debates relativos ao conhecimento científico.
O autor analisa, inicialmente, as condições de aceitação das teorias científicas, problema que divide realistas científicos e anti-realistas. Os primeiros aceitam uma teoria porque a consideram "aproximadamente verdadeira", enquanto aqueles últimos, instrumentalistas, resumem a questão à "adequação empírica" da teoria.
Em seguida, o autor passa às teorias da confirmação, com destaque para as teses de Carnap (verificabilidade) e de Popper (falseabilidade), bem como às teorias do progresso (há continuidade e acúmulo de conhecimento?), que, guardadas as diferenças entre si, vêem o fazer científico como processo de mudança. Temos por exemplo, em Popper, a substituição de uma teoria refutada por outra melhor; em Thomas Kuhn, a célebre noção de revolução científica; e, em Richard Boyd, a acomodação entre conhecimento e realidade, mente e mundo. Por fim, Dutra aborda as teorias da explicação através de três modelos: o nomológico-dedutivo (de Hempel); o da relevância estatística (de Salmon); e o pragmático (de Bas van Fraassen). Trata-se de um necessário mergulho na lógica - o que certamente tornará este o capítulo mais árido para os não iniciados, apesar do esforço do autor.
Realismo científico e dialética? Embora pouco conhecidos ainda fora do círculo de especialistas, Dutra dedica a Boyd e van Fraassen a maior atenção do livro. Pode-se dizer mesmo que são o seu "fio condutor". O primeiro representa a posição que a filosofia analítica anglo-saxônica, hoje chama de realismo científico, enquanto o outro representa o grupo anti-realista. Mérito do autor colocá-los ao alcance do público universitário.
É de particular interesse o realismo científico, para o qual as teorias científicas são aproximadamente verdadeiras mesmo quando tratam de entidades inobserváveis como, por exemplo, o "quark" no caso da física das partículas, as quais são consideradas existentes, reais, objetivas.
O realismo segue a doutrina clássica da verdade como correspondência entre pensamento e realidade, entre proposição e objetos, entre teorias e fatos. Contra os relativismos, é sensível ao conceito de objetividade, tão atacado pelas "epistemologias feministas" e "pós-modernistas". Não é apenas atitude de filósofos ou epistemólogos, mas de "cientistas filosoficamente cultos". O físico e Prêmio Nobel Steven Weinberg diz, no tocante à discussão, que a ciência não se ocupa somente de coisas observáveis, como queria o positivismo.
"Outros físicos, inclusive eu, preferem um outro modo, realista, de olhar a mecânica quântica, em termos de uma função de onda que pode descrever laboratórios e observadores da mesma forma que átomos e moléculas, governada por leis que não dependem materialmente da existência de observadores"1.
Em relação ao realismo de Boyd, é difícil entender porque tanta insistência no conceito de dialética, que refere vagamente à "acomodação entre mente e mundo" ou entre conhecimento e realidade. O fato é que não se faz ciência com dialética. Pressuposto desta, pelo menos na sua acepção moderna (hegeliana), é a contradição. Ora, não existem contradições reais: a realidade comporta somente oposições, conflitos. Trata-se aqui de oposição real e isto nada tem a ver com processo dialético. Em favor de Hegel, é possível dizer que pelo menos foi coerente com seu idealismo.
Como dizia Kant nos Escritos pré-críticos, um corpo em movimento é alguma coisa, um corpo estático é também alguma coisa, porém, um corpo que esteja em movimento e, ao mesmo tempo, não esteja em movimento não é nada. Ainda assim, alguém poderá objetar: e as contradições no pensamento? Estas, por sua vez, são vazias: afirmar e negar ao mesmo tempo não faz sentido. Pensamento contraditório, portanto, não produz conhecimento. Esta porém é uma discussão que, invocações dialéticas (Boyd) à parte, escapando aos propósitos do livro de Dutra. Aliás, plenamente alcançados.
Notas
M. Aranha
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(1) Weinberg, Steven (1996). Sonhos de uma teoria final, Rio de Janeiro: Rocco.