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Ciências & Cognição
versão On-line ISSN 1806-5821
Ciênc. cogn. vol.11 Rio de Janeiro jul. 2007
Artigo Científico
Consciência, emoção e cognição: o efeito do priming afetivo subliminar em tarefas de atenção.
Conscience, emotion and cognition: the effect of priming affective subliminal in attention tasks.
Monica S. Borine
Laboratório de Eletroencefalograma de Alta Resolução, Instituto de Psiquiatria, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, São Paulo, Brasil
Resumo
Parte-se da revisão de duas linhas de pesquisas, desenvolvidas nas últimas décadas: o estudo de efeitos de estimulação subliminar "priming", e de desencadeamento de reações emocionais por estímulos controlados. Este estudo combinou tais linhas com o objetivo de estudar a consciência com o pré-preparo afetivo: efeito de estímulos de conteúdo aversivo, subliminares e supraliminares sobre a cognição pela análise do desempenho em tarefas de atenção. Três tarefas experimentais foram realizadas por 35 indivíduos em laboratório de neuropsicologia: a tarefa base onde se testou à detecção de alvo visual simples, e a mesma tarefa de base, porém com estímulos distratores aversivos intercalados, de forma supraliminar ou subliminar (500 ms ou 50 ms de duração), em blocos aleatorizados entre os indivíduos. Calcularam-se índices de detectabilidade e critério de resposta, que serviram para a comparação estatística entre condições (medidas repetidas). Os resultados mostram uma mudança significativa do índice "critério", indicando uma mudança de estratégia na presença de distratores subliminares aversivos. Concluiu-se que a tarefa subliminar fez um efeito "destruidor ou devastador" na tarefa supraliminar, cometendo menos falso-alarmes protegendo a tarefa supraliminar, tendo um efeito "protetor". Os resultados são discutidos no contexto da relevância de influências emocionais sobre o comportamento.
Palavras-chave: consciência; pré-preparo afetivo; estimulação subliminar; atenção; emoção.
Abstract
This thesis evaluated two lines of research, developed in the last few decades: the study of subliminal stimulation "priming", and the triggering of emotional reactions by controlled stimuli. The present study aims at combining these lines for the study the consciousness with the affective priming: the effect of stimuli with aversive contents, subliminal and supraliminal, on cognition, by analysis of performance during attention task. Three experimental tasks were performed by 35 individuals in neuron psychology laboratory: a baseline task where detection of simple visual target was tested, and the same task with interposed distracting aversive stimuli, both in supraliminal and subliminal presentation (500 ms or 50 ms duration), in random blocks among the subjects. Detection and response criterion rates were calculated and used for the statistical comparison between conditions (repeated measures). The results show a significant difference in the detection significant change of "criterion", indicating change of strategy in the presence of aversive affective images. The conclusion the subliminal task made a destructive effect in supraliminal task, damage false alarms, have a "protector" effect. The results are argued in the context of the relevance of emotional influences on the behavior.
Keywords: consciousness; awareness; subliminal; affective priming; attention; emotion.
Introdução
O estudo que hora se apresenta se concentra num estudo psicológico e neurológico e é de natureza original no que diz respeito à escolha e abordagem do tema proposto. O objetivo geral foi o de medir e avaliar os efeitos da pré-ativação (priming) com estímulos visuais afetivos aversivos ou repulsivos em modo subliminar e supraliminar na atenção humana, através de um experimento baseado em testes de cognição em ambiente controlado. Partiu-se de duas linhas de pesquisa bem conhecidas na literatura, mas para as quais não se encontrou algum estudo unificador. De um lado, a linha que vem estudando nas últimas décadas a memória humana, sua divisão em módulos, sua organização e a inserção da pré-ativação enquanto um modo distinto de memória. Para Tulvin & Schacter (2002) a pré-ativação é uma forma não consciente ou involuntária de memória que se dá através da identificação perceptiva de palavras e objetos e que somente mais recentemente foi reconhecida como separada das outras formas ou sistemas de memória. De outro lado, um alinha que tem se dedicado ao estudo da atenção, seus mecanismos e formas de operação. A essas duas linhas acrescentou-se o elemento emoção, resultando em um estudo multidisciplinar, como sugere a própria neuropsicologia, no qual se espera contribuir com o conhecimento da inter-relação entre memória, atenção e emoção. Para Helene & Xavier (2003) é surpreendente que a literatura dedicada à atenção raramente se refira à memória ou à emoção, diante da clara influência e interdependência entre memória, atenção e emoção. Três tarefas experimentais foram realizadas por 35 indivíduos em laboratório de neuropsicologia. A tarefa base, onde se testou a detecção de alvo visual simples e a mesma tarefa de base, porém com estímulos distratores aversivos intercalados de forma supraliminar ou subliminar (500ms ou 50ms de duração), em blocos aleatorizados entre os indivíduos. Foram calculados índices de detectabilidade e critério de resposta, que serviram para a comparação estatística entre condições (medidas repetidas). Com isso, declara-se formalmente a seguinte pergunta-problema: Qual é a influência de estímulos visuais afetivos na cognição em termos de atenção humana? Para responder a esta pergunta elaborou-se o objetivo de estudar, medir e avaliar a influência de estímulos visuais afetivos supraliminares e subliminares sobre a cognição em termos de atenção humana. Foram investigados:
a) Estudar os efeitos da informação de conteúdo afetivo, apresentado de forma supraliminar e subliminar, sobre o desempenho de tarefas cognitivas, particularmente a atenção;
b) Realizar um experimento em ambiente controlado, submetendo indivíduos a testes de atenção sob efeito de pré-estimulação supraliminar e subliminar com estímulos visuais de conotação aversiva repulsiva, colhidos do IAPS (International Affective Picture Sistem), Lang; Bradley & Cuthbert (1999);
c) No caso de afetar a cognição seria verificado se os estímulos subliminares ou supraliminares tinham efeitos iguais ou diferentes;
d) Se eles fossem diferentes, se verificaria a influência da ordem das tarefas isto é, se a prévia estimulação subliminar acentuaria os efeitos da estimulação supraliminar.
Cognição e emoção
Nos anos 80, tornou-se insustentável a neuropsicologia e psicologia se mantivessem distantes e alheias às novas e atualizadas possibilidades, e o encontro entre as duas áreas proporcionou que abrissem um canal de comunicação, como decorrência, surgiram eventos, publicações e pesquisas em conjunto. Desde então, a parceria denominada Neuropsicologia Cognitiva tem incrementado a demanda de produções a partir da troca de informações, material teórico e experiência clínica. (Andrade et al., 2004, p.6). A memória operacional sustenta o processo de cognição por tempo suficiente para que as informações sejam retidas pela memória de longa duração, ao mesmo tempo em que oferece subsídios para o gerenciamento de atividades correntes de cognição, entre elas a atenção e suas diferentes formas. Durante esse processo, o gerenciamento da atenção assim como, a escolha e a forma como certas informações serão retidas na memória de longa duração, sofrem influência de fatores externos, como estímulos visuais subliminares ou supraliminares, e de fatores internos como os níveis de neurotransmissores, hormônios e outras substâncias neuroativas ou das próprias emoções desencadeadas ou facilitadas por estímulos internos e externos. Com isso, as tarefas de cognição, especialmente as relacionadas à atenção, são susceptíveis a alterações e interferências emocionais mensuráveis quantitativamente, de modo a fornecer um perfil de resposta de indivíduos, com variação de desempenho cognitivo de acordo com seu estado emocional.
Relevância do tema
Este estudo se mostra relevante não apenas por sua originalidade, mas pela contribuição que pode oferecer para diferentes áreas e aplicações da psicologia na atualidade. Demonstrar empiricamente com dados confiáveis a influência mensurável que estímulos visuais aversivos podem afetar a cognição, sobretudo a atenção, seja de forma supraliminar ou subliminar é de considerável utilidade para a psicologia do trabalho, para educação corporativa, para a inteligência de negócios (BusinessIntelligence) e diversas outras áreas onde o desempenho do indivíduo seja importante. Os resultados podem ter reflexos no conhecimento e nas técnicas atuais de motivação humana, dinâmica de grupo, trabalho em equipes e liderança, oferecendo aos estudiosos e profissionais dessas áreas, subsídios para inclusão de técnicas baseadas em estimulação visual afetiva. Isso significa oportunidade de novas técnicas aplicáveis em cursos, treinamentos, palestras e ambientes de trabalho, e também as possibilidades de aplicação clínica em psicologia, neuropsicologia e psiquiatria como: ansiedade, depressão, fobias.
Pré-ativação (priming)
Para a compreensão da pré-ativação segundo Kolby & Wishaw (2003) o termo "Priming" pode referir diferentes conceitos segundo o jargão específico da área de conhecimento em que seja utilizado. Por exemplo, pode expressar a utilização de uma pré-vacina seguida de uma vacina principal para obtenção de uma resposta imunológica específica que não seria possível com apenas uma vacina ou, pode significar uma demão de produto especial para preparação ou ativação de uma superfície para que esta receba uma pintura posteriormente. Em geral, os diferentes conceitos de priming sugerem alguma forma de preparação. No presente estudo, devido à sua natureza neuropsicológica, priming assume um conceito sob duas diferentes visões: a psicológica e a neurológica. Os testes e experimentos envolvendo pré-ativação (priming) se inserem no conceito do Método Específico, abrindo um leque de estudos experimentais relacionados, sobretudo a atenção, memória e desempenho, utilizando diferentes instrumentos e métodos em onze ou mais categorias nesta seqüência de ordem de freqüência dos experimentos:
1- palavras;
2- rostos;
3- letras;
4- localização espacial de objetos;
5- STROOP;
6- cálculos de desempenho tarefa intelectual;
7- ideogramas: chineses e japoneses associados com rostos;
8- imagens;
9- números;
10- sinais e setas;
11- pronúncias (sons).
O efeito de pré-ativação sobre o sistema nervoso pode ser obtido de forma supraliminar como por um relato verbal para dois grupos de pessoas, preparando-as por sugestões pré-elaboradas, que quando assimiladas, induzem ao comportamento esperado, ou de forma subliminar. Por exemplo, fazendo-se que a pessoa perceba objetos num ambiente e sofra efeitos destes objetos sobre os seus sonhos, como no caso da hiperminésia (Erdelyi, 1985). Poderá também ser de detecção direta do que foi preparado para o reconhecimento, como no caso da detecção dos próprios objetos previamente apresentados. Existem cinco tipos básicos de fenômenos de estimulação, denominados de pré-ativação ou priming:
I - Efeito de Exposição: Exposição de uma imagem consciente que se predispõe para preferir uma imagem dentre outras.
II - Efeito Poetzl: Palavras e imagens percebidas na consciência com alteração da resposta da imagem apresentados posteriormente após a submissão de conteúdo onírico.
III - Pré-ativação afetiva: Exposição de imagens de conteúdo afetivo ou emocional para a consciência supraliminar ou subliminar causando uma resposta emocional de conhecimento.
IV - Pré-ativação semântica: Exposição de palavras de conotação emocional causando uma resposta de conhecimento.
V - Ativação psicodinâmica: São exposição de imagens fantasiosas ou sugeridas por associação poderão influenciar os estados psicológicos de adaptação e persistência, como no caso do comportamento de esperar ou de se apressar num dado comportamento.
Pré-ativação (priming) subliminar e supraliminar
A pré-ativação subliminar vem sendo definida por uma quantidade de informação, dividida pelo tempo de exposição. É o termo utilizado quando um sujeito é preparado com uma breve exposição preliminar de um estímulo (que pode ser imagem, som, símbolos, objetos) antes de medir seu desempenho em um teste/tarefa. Pode-se ainda compreendê-la como um aumento na velocidade ou precisão de uma decisão que acontece como conseqüência de uma exposição anterior a alguma informação relevante para a decisão, sem qualquer intenção ou tarefa relacionada à motivação. Ela poderá ser apresentada em forma de estímulos com exposição suficiente1 para a percepção em nível consciente como pré-ativação supraliminar ou em exposição insuficiente para a percepção da consciência como a pré-ativação subliminar. A pré-ativação subliminar é utilizada em tarefas onde a memória para a informação prévia não é requerida e é comprovadamente um fenômeno não consciente. Os primeiros estudos sobre percepção subliminar foram feitos no final do século XX. Nos primeiros experimentos, os pesquisadores mostravam aos sujeitos voluntários fichas com letras ou figuras geométricas a uma distância tão grande que quando perguntados sobre o que viam todos diziam que não conseguiam distinguir nada além dos borrões; depois pediam as pessoas que tentassem reconhecer em um questionário de múltipla escolha, as figuras que haviam sido mostradas. Como o nível de acerto era maior do que o que seria obtido ao acaso, os pesquisadores concluíram que as pessoas haviam sido afetadas pelas imagens (Merikle, 1992). Beversdorf (2007) apresentou um estudo com evidências de que a tensão emocional afeta a cognição, sobretudo a capacidade de resolução de problemas, como associação de palavras. Um trecho de 20 minutos do filme "O resgate do Soldado Ryan", carregado de perigo suspense e um trecho da comédia de animação "Shreck" foram exibidos para grupos de estudantes, que em seguida foram submetidos a testes de associação de palavras. Os grupos que assistiram à comédia tiveram um desempenho médio 39% melhor que o grupo submetido a cenas de tensão e estresse emocional. Segundo Volchan (2003), emoção pode ser funcionalmente considerada como uma disposição à ação que prepara o organismo para comportamentos relacionados à aproximação e esquiva, elas são experiências referente a reações neurovegetativas em resposta a um estimulo agradável ou desagradável. "O simples olhar uma face a sorrir, ou uma face triste, ou ouvir uma palavra como 'funeral' ou 'festa', parece ter a capacidade de tornar mais acessível pensamentos com idêntica valência afetiva." (Marques, 2005, p. 437).
Materiais e Metodologia
Partindo para uma investigação mais sistemática de como as variáveis de atenção, emoção, pré-ativação subliminar e supraliminar se comportariam em relação à consciência, acolheu-se a idéia de combinar a pré-ativação subliminar com a supraliminar para verificação da possibilidade de alguma espécie de dado que pudesse dar indícios de como se processa a consciência diante de estímulos combinados. Para isso foi desenvolvido um experimento com a intenção de testar os sujeitos em sua capacidade atencional quando submetidos ou não a estímulos visuais (imagens com sugestão de conteúdo repulsivo e aversivo) para isso foram utilizadas imagens selecionadas do IAPS (International Affective PictureSystem), série de imagens testadas em laboratório Lang, Bradley, & Cuthbert (2005).
Método
Materiais e Instrumentos
Esta pesquisa experimental foi realizada e delineada com exclusividade, em laboratório controlado e os instrumentos utilizados foram:
1) Um programa comercial de computador (Stim, Neurosoft Inc.);
2) Um computador com visor e dispositivo com dois botões para indicação do alvo com os dedos da mão;
3) Estímulos visuais, imagens de fotos, colhidas do IAPS (International Affective Picture System) criados pelo NIMH (Centerof the study of emotion and attention) laboratório da Universidade da Flórida; imagens coloridas selecionadas com conteúdo afetivo aversivo e repulsivo, Lang, Bradley, & Cuthbert (1999 - 2005).
Sujeitos
Foram escolhidos 35 (trinta e cinco) sujeitos saudáveis de ambos os sexos, com visão normal ou corrigida para normal, na proporção de 50% homens e mulheres, sem doenças neuropsiquiátricas. Homens e mulheres com idade entre 23 a 49 anos, sem abuso de drogas ou álcool e sem tratamento com fármacos. Todos os sujeitos assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido aprovado pelo comitê de ética.
Local
Laboratório de EEG (Eletroencefalograma) de Alta resolução, departamento de Neuropsicologia do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - USP.
Descrição das tarefas e procedimentos
Experimento 1
Todos os aspectos da tarefa foram controlados por um programa comercial de computador (Stim, Neurosoft Inc.). Os estímulos visuais que compunham os pares de dica-alvos (S1-S2) consistiam em pequenos retângulos 8 (excentricidade 0.8, S1: 100 ms de duração, S2: 17 ms). Em metade dos testes, os retângulos S2 continham um círculo cinza (o alvo da tarefa) com 0.3 de excentricidade. S1 foi seguido por S2, com inícios separados no tempo por 1,6 segundo. Nós instruímos aos indivíduos do teste que um retângulo seria apresentado para indicar que 1,6 ms depois ele acenderia novamente, porém com maior rapidez, contendo ou não o círculo-alvo. O indivíduo decidiria se havia dentro um retângulo S2, e indicaria a presença do alvo pressionando o botão direito com o polegar direito, ou a ausência do alvo pressionando o botão esquerdo com o polegar esquerdo. Omitiu-se deliberadamente nas instruções o tempo de reação e mediu-se o desempenho exclusivamente pela porcentagem de testes corretos, do total de 96 rodadas ou testes que compunham o experimento. Um ponto de fixação para os olhos aparecia continuamente no centro da tela do computador, bem como, um fundo para mascarar estímulos, com o intuito de impedir imagens posteriores.
Experimento 2
A segunda condição apresentada foi realizada num bloco orientado de modo randomizado, uma quantidade de sujeitos praticamente 50% do total geral e 50% entre sujeitos masculinos e femininos. Primeiramente na ordem, a tarefa subliminar e, a outra quantidade de sujeitos realizou primeiramente a tarefa supraliminar. Houve a inserção de 104 pares de retângulos de uma rodada quanto entre rodadas da tarefa. A diferença foi à duração dos estímulos onde o tempo do subliminar foi de 50 ms e o supraliminar foi de 500 ms. Para todos os sujeitos que realizaram o experimento foram realizadas cinco perguntas pelo experimentador aos sujeitos depois de dadas todas às informações e instruções necessárias para a realização do experimento.
1 - Como você está se sentindo? (Pergunta efetuada antes da realização das tarefas no laboratório).
2 - Como você está se sentindo? (Pergunta efetuada depois da realização de todas as tarefas no laboratório).
3 - Você viu alguma coisa durante a tarefa que realizou? (Tarefa realizada com a exposição de estímulos SUB do IAPS).
4 - Qual a tarefa mais difícil para você?
5 - Qual a tarefa que você menos gostou?
Análise dos resultados
Uma vez que a tarefa de base foi sistematicamente realizada antes das outras, efeitos de fadiga e treinamento não poderiam ser evitados, a análise estatística restringiu-se às variáveis obtidas nas duas condições subseqüentes, apenas. Computamos análise de variância (ANOVA) com medidas repetidas, entre as duas condições de interesse, das variáveis: detectabilidade, critério (e seus componentes, Hits (acertos positivos) e falsos positivos), tratando como fatores o sexo dos sujeitos e a ordem entre as duas condições subliminar e supraliminar. Para isso foram usados índices de detectabilidade e critério, derivados da teoria de detecção de sinais (Macmillan & C. D. Creelman, 2005):
1 - A partir das porcentagens (entre 0 e 1) tanto de Hits (h) quanto de falsos alarmes (fa),
2 - Calcularam-se a transformada z (inversa da gaussiana) de Hits, z(h), e de falso-alarmes, z(fa).
3 - A detectabilidade é definida como: d'=z(h) - z(fa).
4 - O critério é definido como: beta= -0.5 [z(h)0 + z(fa)].
Esperou-se que, comparando-se as duas condições, onde se supõe que a detectabilidade do individuo fosse a variável modulada, que o d' variasse e o beta (critério) ficasse aproximadamente constante.
Resultados
A partir deste parágrafo, para facilitar a compreensão, serão utilizadas as siglas de SUB para a palavra subliminar e SUPRA para a palavra supraliminar no decorrer do texto. Deste experimento, foram eliminados 5 sujeitos por desempenho insuficiente na tarefa base, abaixo de 56% de respostas corretas, o que estatisticamente deve ser considerado aleatório. Comparando as três condições, portanto incluindo-se a tarefa base como três medidas repetidas, verificaram-se não haver nenhum efeito global, demonstrando diferença significativa entre as três, para qualquer das variáveis apesar da condição de base da tarefa sem os distratores, ter sido efetuada primeiramente pelos sujeitos, ela não melhorou ou piorou o desempenho, significativamente, nas duas condições de interesse. A figura 01 mostra as médias das três variáveis, total de acertos, detectabilidade, e critério.
Figura 1 - Médias para todos os participantes (n = 30) de detectabilidade total de acertos em porcentagem, e critério, nas três tarefas: (barras indicam 1 desvio padrão; rep = repetições: 1 = tarefa base, 2 = distratores subliminares, 3 = distratores supraliminares).
Figura 2 - Critério ( 1 desvio padrão), para as duas condições, com grupos de indivíduos divididos em função da ordem: 1= realizou primeiro a tarefa SUB; 2= realizaram primeiro a tarefa SUPRA.
Em tal análise, tratando-se as três condições como medidas repetidas, não houve diferença significativa no total de acertos ou no índice de detectabilidade, Porém, houve uma diferença significativa do índice critério (F= 5,59 e P= 0,26). O "critério", claramente menor para a condição de base (figura 02), diferiu significativamente na comparação das três condições, e mostrou efeito significativo da ordem das tarefas (F=7,63 e P= 0,01). Na comparação entre as tarefas SUB e SUPRA, quando tratamos apenas as duas condições de interesse, que estavam aleatorizadas entre os indivíduos, como medidas repetidas, também não houve diferenças significativas na detectabilidade e no total de acertos. Quanto ao índice critério, novamente houve um efeito significativo de ordem de apresentação (P= 0,05 e F=4,21), A figura 06 mostra o índice critério para as condições SUPRA e SUB, com indivíduos divididos quando à ordem de execução das tarefas.
Os sujeitos que realizaram primeiramente a tarefa SUB, tiveram o índice critério superior, para as duas condições, demonstrando assim um efeito de ordem. Tal efeito, uma vez detectado, levou-nos a analisar os componentes, de HITS (acertos) e falso-alarmes. O falso-alarmes demonstra uma diferença significativa em função da ordem de apresentação (F=4,97 e P=0,035). A figura 03 mostra o componente "falso-positivo" do critério, para as duas condições, em função da ordem de apresentação.
Figura 3 - Falso-positivos ( 1 desvio padrão), para as duas condições, com grupos de indivíduos divididos em função da ordem: 1 = realizou primeiramente a tarefa SUB; 2 = realizaram primeiramente a tarefa SUPRA.
Os sujeitos, em sua grande maioria, responderam que estavam bem no inicio das tarefas, e quando questionados ao final do experimento, disseram não se sentiam tão bem. Alguns sujeitos reportaram mal humor diretamente devido as imagens, consideradas pela maioria "ruins e pesadas". Quando questionados em relação a haver percebido algo além dos estímulos neutros, na tarefa dos estímulos subliminares a grande maioria dos sujeitos respondeu dizendo que não viram nada, apenas brilhos, pedaços de figuras, ou algumas cores. Porém, apenas na proporção de 3% do que foi de fato apresentado. A grande maioria dos indivíduos disse que não gostou da tarefa de base, na proporção de 60%, considerando que o alvo era apresentado muito rapidamente (17ms). A maioria dos sujeitos considerou ter mais dificuldade com a tarefa de base e na tarefa SUPRA. Finalmente, um achado interessante, apesar de estatisticamente não significativo, foi à diferença de HITS (acertos) entre sexos. As mulheres foram mais prejudicadas no desempenho (e mais afetadas, por seus relatos). A figura 04 mostra a média e desvio padrão de HITS (acertos), separados por sexo.
Figura 4 - Detecções corretas (HITS) em função do sexo (masc = 1; fem = 2), em ambas as condições, subliminar e supraliminar.
Discussão
Os sujeitos foram submetidos a efeitos de estímulos subliminares e supraliminares, usados como distratores repulsivos do IAPS, sobre tarefa de atenção visual. Os resultados encontrados vieram de encontro com experimentos como o de Bargh (1992), onde se demonstrou que as emoções, atitudes, objetivos e intenções podem ser ativados sem a participação da consciência e podem influenciar o modo de pensar e agir dos indivíduos nas situações sociais. A detectabilidade do alvo foi levemente inferior nas duas condições de interesse (SUB e SUPRA), comparadas com a condição base, mas não significativamente. Os fatores escolaridade e idade, o fator stress e visão defasada (apesar de serem dadas instruções aos sujeitos da necessidade de correção da visão), não controlados neste estudo, podem ter contribuído para o desempenho insuficiente de alguns sujeitos. Todos os sujeitos realizaram a primeira tarefa de base de atenção sem os distratores afetivos aversivos. Supunha-se que a fadiga e o treinamento, de influências opostas sobre o desempenho, poderiam ter se sobreposto a todas as pessoas do estudo. Porém, o efeito de treinamento parece haver impedindo a deterioração por nós esperada na tarefa base. Outra possibilidade é de exatamente os distratores levarem a uma maior concentração nas tarefas, por evitação dos estímulos aversivos. Foram encontrados alguns pontos críticos nos resultados deste experimento. Os resultados obtidos vão de encontro com os objetivos deste estudo, demonstrando que a estimulação subliminar afetou o desempenho na tarefa de atenção, porque a mudança de critério dos sujeitos que iniciaram primeiramente a tarefa subliminar em relação à próxima tarefa, a supraliminar, demonstraram uma modificação significativa do índice critério. Em relação aos objetivos específicos também foi demonstrado neste estudo que os estímulos utilizados do IAPS, quando apresentados de maneira subliminar ou supraliminar, têm efeitos distintos. Quanto à terceira hipótese do estudo, onde a preocupação era verificar a influência de ordem das tarefas, especificamente, se a estimulação subliminar prévia acentuaria os efeitos da estimulação supraliminar obteve-se resultados opostos à expectativa. O índice "critério" que demonstrou um efeito "destruidor" na tarefa SUPRA, isto é, alterou o resultado "critério" para todos os sujeitos que iniciaram a ordem da tarefa pelos estímulos SUB. A ausência de efeito significativo global tanto de total de HITS (acerto) e detectabilidade, parece dever-se ao fato da tarefa de base ter sido realizada sempre em primeiro lugar com todos os sujeitos. Constatou-se que houve um efeito de treinamento, porém a diferença de critério mostra que ocorreu uma mudança de estratégia de execução ao efeito de ordem de apresentação das tarefas ativos confirma esta hipótese de mudança de estratégia, tanto entre as três tarefas, quanto entre as duas principais. Constatou-se que o efeito de ordem sobre o critério deve-se a falso-alarmes: quem começou pela tarefa subliminar cometeu significativamente menos falso-alarmes nas duas tarefas de interesse. Isso significa que tal grupo de sujeitos, na ausência do alvo, rejeitou corretamente relativamente mais que o outro grupo. Além disso, quem iniciou pela tarefa SUB, "protegeu-se" na tarefa SUPRA a seguir, cometendo menos falso-alarmes nessa também. Ao contrário, quem começou pela SUPRA, parece haver sofrido efeito "devastador", isto é, já cometendo relativamente mais falso-alarmes, e surpreendentemente, mantendo esse desempenho relativamente pior na tarefa SUB que realizaram a seguir. Apesar de não significativo o efeito de sexo sobre o desempenho, suspeita-se que com uma amostra maior, ou mais representada por mulheres, poderíamos observar um prejuízo geral de desempenho, devido a mais erros de detecção (menor número de HITS).
Conclusão
O desempenho foi superior nas duas condições à tarefa de base de atenção, o que deve ser devido ao efeito de treinamento, mas o índice "critério" foi significativamente diferente, aumentando nas duas condições na tarefa SUB e a tarefa SUPRA em relação à tarefa de base. O achado mais importante foi o efeito da ordem de apresentação das duas tarefas principais da SUB e a SUPRA, sendo que o grupo que iniciou pela condição subliminar teve os valores e a "média do critério" superiores em ambas as condições. A análise dos componentes do índice "critério" revelou um aumento de falso-alarmes no grupo que iniciou a tarefa na condição supraliminar e que se manteve na condição subliminar, ao contrário o grupo que iniciou na condição subliminar, que manteve o número menor de falso-alarmes durante a condição supraliminar. Deve-se considerar que enquanto o hemisfério direito do cérebro faz a ação o esquerdo tende a explicar com alguma situação relevante que se encaixe no movimento. Borine (2005) alude sobre o pensamento de Le Doux que, comportamentos muitas vezes são atitudes sem consciência de suas razões, pois o comportamento é produzido por sistemas cerebrais de atividades não conscientes, visto que uma das principais tarefas da consciência é fazer da nossa vida uma história coerente, um autoconceito. O cérebro faz isso dando explicações para o comportamento com base em nossa auto-imagem, em lembranças do passado, em expectativas futuras, na situação social presente e no meio ambiente físico em que se produz o comportamento, sendo assim, parece que grande parte da vida mental acontece fora dos limites da percepção consciente. Segundo Le Doux, (2001), a emoção e cognição parecem atuar de forma não consciente, mas somente o resultado da atividade cognitiva e emocional é percebido conscientemente; os materiais e estímulos absorvidos que não ganham forma de conteúdos conscientes poderá ser armazenado e depois mais tarde passar a influenciar o pensamento e o comportamento. No presente caso, não se verificou o esperado efeito de estímulos subliminares acentuarem o efeito, supostamente distrator dos estímulos supraliminares, mas o contrário. Tal efeito contrário, "protetor", significa que de fato, os estímulos subliminares influenciaram a tarefa subseqüente de modo significativo. A exploração de possibilidades neuropsicológicas voltadas para a compreensão da inter relação dos aspectos da consciência, emoção e cognição são de fundamental importância para a Psicologia da Consciência à medida que os aspectos biopsico e sociais determinam o comportamento. Este estudo demonstrando como os estímulos apresentados subliminarmente afetam a consciência humana no desencadeamento de efeitos emocionais à luz do desempenho da cognição, especialmente a atenção, pode abrir portas a novos experimentos que contribuam no auxilio da diminuição de diversas doenças, como ansiedade, fobias, depressão, e também facilitar a aprendizagem, as relações sociais e de trabalho.
Agradecimentos
Agradeço particularmente às instituições: INIC (Instituto Integral da Consciência, Atibaia - SP), a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Nível Superior do Ministério da Educação).
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Notas
M.S. Borine
Endereço para Correspondência: Tranqüilo Luiz Rosa, 860 - ATIBAIA - São Paulo - Brasil.
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(1) A insuficiência de exposição para a percepção consciente é geralmente baseada em redução a pequenas frações de tempos, mas também pode ser baseada em menor nitidez, menor definição, menor completude, volume, no caso de sons, ou outras formas que impeçam ou dificultem a percepção consciente.