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Trivium - Estudos Interdisciplinares
versão On-line ISSN 2176-4891
Trivium vol.3 no.1 Rio de Janeiro jan./jun. 2011
ARTES
Comentário sobre o CD "Vamos chamar o vento"
Ricardo Cravo Albin*
Meu amigo Fernando Rocha transita pacificamente entre o psicanalista e o cantor popular. Pacificamente? Confesso que ao ouvir este delicioso "Vamos chamar o vento F.R. canta Caymmi", um disco tão profissional que presumível de cantor de profissão única ( a de cantor), pensei cá comigo: "agora o Fernando vai precisar mesmo de um colega psicanalista melhor ainda que ele para ajudá-lo a lidar com o dualismo desconcertante, porque o pacificamente vai ficar cada vez mais distante". Digo isso -e temo pelo duplo exercício profissional - porque este disco é dos melhores que ouvi e exige atenções mais veementes que as solicitadas apenas a um amador. Que Fernando sempre foi um cantor pleno e realizado - eu sempre soube, a partir dos dois espetáculos que criei, dirigi e apresentei para o grupo "Cantores do Chuveiro", onde ele brilhava ao lado de outros ótimos cantores que se dizem amadores, apenas porque continuam a exercer profissões paralelas bem sucedidas. E sempre soube disso também por seus CDs anteriores, dedicados a Cartola, à música francesa ou à música nordestina.
A beleza deste CD - abrigando a música de Caymmi, compositor universal e de minha predileção a partir de sempre - é indiscutível e potencialmente perigosa para os pacientes do Doutor Fernando, que bem podem ficar a ver navios, sem médico para lhes tornar mais livres as cucas...Porque "Vamos chamar o vento" vai exigir do titular mais shows, mais apresentações, mais atenções ao ato sacralizado, quase canônico, do cantor profissional.
Não vou nem me deter aqui nas canções do meu amado Dorival - todas as obras-primas indiscutíveis, a não ser a não menos adorável embora menos conhecida Canção da Primeira Netinha - até para evitar o lugar comum dos elogios desnecessários. Chamo, porém, a atenção que a beleza deste precioso CD mora na contenção e na elegância da simplicidade - parâmetros ideais da própria música caymmiana - tanto dos arranjos de Alain Pierre quanto da atmosfera "cool" de todo o disco, em cuja a linha de frente esta precisamente a voz de Fernando Rocha, suave como vento, doce como o balançar dos coqueiros, firme como o mar de Caymmi.
Além - é claro - das participações especiais, a começar pelo canto de Danilo Caymmi, este herdeiro em gênero, numero e grau de nenhuma degenerescência. E a se concluir pela participação criativa dos filhos Felipe e Rafael e pelas vozes de Silvia Machete, Paloma Lima, Marina Lutfi, Ana Cláudia Lomelin, Muri Costa, e dos netinhos Martim & Mia. A par dos músicos, todos de primeira linha.
Em resumo: Fernando Rocha fez um CD definitivo. Que causára inevitável prazer - quando não surpresa por tratar ainda de cantor, insisto, que se diz amador - a qualquer ouvinte que possa gostar de melhor MPB.
Músicas do CD: | ||
1. | Morena do mar | |
2. | O vento | |
3. | Promessa de pescador | |
4. | A vizinha do lado | |
5. | Festa de rua | |
6. | Cala a boca menino | |
7. | O que é que a baiana tem | |
8. | Oração de Mão Menininha | |
9. | A preta do acarajé | |
10. | Milagre | |
11. | Sábado em Copacabana | |
12. | Marina | |
13. | A jangada voltou só | |
14. | O mar / Canção da noiva / Velório | |
15. | Saudade de Itapoan | |
16. | O bem do mar | |
17. | Acalanto / Canção da primeira netinha |
Recebido em: 06 de junho de 2011
Autor do Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira, disponível em meio digital. Publicou diversos livros, dentre eles: O canto da Bahia (1973); De Chiquinha Gonzaga a Paulinho da Viola (1976); Da necessidade do fazer popular (1978); Índia, um roteiro bem e mal humorado (1996); MPB - A história de um século, (1997).
* Fundou e dirigiu o Museu da Imagem e do Som (1965-1971). Historiador de MPB, produtor musical, de rádio e Criador do Instituto Cultural Cravo Albin, (2001).