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Estudos de Psicanálise
versão impressa ISSN 0100-3437
Estud. psicanal. no.36 Belo Horizonte dez. 2011
A clínica com adolescentes e sua função na educação1
Adolescents clinic and its role in education
Wilfried Gontran
Tradução: Marília Etienne Arreguy
Université Toulouse II
RESUMO
Frequentemente concebidos em oposição, os campos educativo e a prática clínica, ao contrário, possuem laços particularmente estreitos, em que cada um pode se nutrir do outro. Uma abordagem de aproximação desses dois discursos necessita, previamente, destacar a dimensão altamente política do processo adolescente
Palavras-chave: Educação, Adolescência, Sexualidade, Transferência, Socioterapia.
A intervenção de hoje é especial para mim por diferentes motivos: primeiro, claro, pela honra de ter sido convidado para trabalhar aqui com vocês; e também, pelo tema da intervenção, que diz respeito ao lugar da educação na clínica e/ou o contrário disso: a dimensão clínica do ato educativo.
Com efeito, o tema é muito atual especificamente no meu trabalho de coordenador-responsável de um hospital-dia: nas minhas intervenções, seja ao lado dos adolescentes, dos meus colegas ou, ainda, nas decisões que concernem à filosofia e à organização do nosso trabalho, eu percebo que devo articular constantemente o campo educacional e o campo clínico.
Enfim, esta intervenção é também especial porque me faz retornar as minhas primeiras reflexões sobre a adolescência, que eu publiquei em 1999, sob o título: "O adolescente, entre revolução e modernidade".
Com efeito, me questionando sobre o que o adolescente poderia ter de realmente específico na nossa sociedade pós-moderna e me referindo ao papel perturbador (reivindicações, protestos, às vezes, revoltas) que ele desempenha desde sempre, me parece mais e mais claro que o adolescente poderia brilhar em domínios inteiramente opostos, uma posição paradoxal do adolescente que vai suscitar nosso interesse: de um lado, sua capacidade revolucionária, e de outro, sua não menor capacidade de se anestesiar nos gozos ofertados pela nossa sociedade capitalista, em primeiro plano por seu gosto e seu saber acerca dos objetos de consumo.
Antes de prosseguir nesta reflexão, me pareceria oportuno definir rigorosamente o que é um adolescente a fim de precisar melhor o que está em jogo em relação às questões da educação e da clínica em seu acompanhamento.
O princípio da adolescência
Do meu ponto de vista, o elemento que caracteriza mais fielmente a adolescência é o fato de que nós a consideramos como um tempo, um tempo não tanto cronológico (não é possível defini-la por uma faixa etária), mas um tempo lógico, aquele de um encontro. O que é um tempo lógico?
É um tempo que determina a estrutura: é o que constitui o que é próprio ao humano, ou seja, o que faz com que qualquer indivíduo, pelo fato de ser um ser de linguagem, não possa escapar de um certo número de testes, de encontros. Segundo Freud, há, entre eles, três fundamentais: o encontro com o pai, com a mulher e com a morte.
Chamando à baila o que nosso trabalho com os adolescentes nos indica, não seria este um trio central na crise adolescente? O tempo lógico de um encontro vem, finalmente, condensar os três encontros assinalados por Freud. Esse encontro traz um novo aspecto do sexual. Esta novidade é a entrada em cena do parceiro amoroso, aquele que faz nossa iniciação sexual.
Vamos ver porque eu dou tanta importância a esta instância do parceiro, da qual ninguém pode escapar, não mesmo. E mesmo de maneira ainda mais massiva, o celibatário que vive essa iniciação como algo terrível que seu parceiro, por permanecer ideal, jamais se separa disso. É exatamente por causa disso que nada na realidade pode ser negociado.
Lembremos que, até então, ou seja, desde a infância, o sexual era apreendido exclusivamente em termos de uma sexualidade auto-erótica que não precisava da colocação de uma fantasia para sua economia pulsional. Com efeito, na prática masturbatória, a criança não põe em jogo nenhum outro como condição de satisfação pulsional: as pulsões são, ainda, parciais (orais, anais, sádicas, etc.), ou seja, ainda não unificadas pela pulsão genital, retomando os termos freudianos.
O adolescente, por sua vez, descobre na relação com o parceiro amoroso, algo que não é uma verdadeira descoberta, já que a criança estava afundada (no sentido de mergulhada na água, imersa; eu utilizo essa palavra para exprimir o lado mortífero do amor devido ao narcisismo em questão) no amor maternal. O que ele descobre, portanto, de novo, é aquilo em que o amor parasita o sexual e, mais ainda, pelo contrário, por quê o amor fracassa em canalizar perfeitamente o sexual, as pulsões.
A articulação amor-sexual não acha um ponto de equilíbrio, de harmonia; esse fato não é apenas uma contingência, mas uma impossibilidade que será difícil de digerir. A clínica psiquiátrica com os adolescentes, notoriamente, mostra de maneira muito explícita os avatares desta articulação impossível; é um leque de erros [fracassos] para fazer coexistir o amor e o sexual que nos são propostos diariamente, nos seguintes extremos: ou o adolescente agride sexualmente, sem consideração nem ao tempo, nem ao sexo, nem à posição subjetiva do agredido; nessa posição que nós situaríamos do lado da psicopatia, o sexual funciona sem ser temperado pelo amor. Ou o oposto: o adolescente permanece fixado ao impasse da solução amorosa onde tudo deve acontecer segundo a relação à mamãe (a anoréxica, por exemplo): um mundo em que tudo é amor, isto é, uma relação infantil que tem por motivação a recusa do sexual e suas implicações.
Esse tempo estrutural da adolescência corresponde, ainda, à prova infringida pelo real da puberdade; as transformações do corpo impulsionam o adolescente sobre uma nova reflexão: eu posso ser a meu turno um genitor, ou seja, eu posso ser outra coisa além da criança dos meus pais. O trauma subjacente ao sexual é definitivamente que, dando a vida, dá também a morte.
Após ser construída a articulação entre amor e sexual, é preciso também considerar aquela entre amor e morte. Precisemos que não é o real biológico das mudanças fisiológicas que determina a entrada na adolescência, como se faz erroneamente entender bastante frequentemente; isso é apenas o suporte, o catalisador do que já está inscrito na estrutura, um dado inscrito na Ordem simbólica.
Jacques Lacan fez seu pequeno comentário sobre o que coloca a criança no caminho da problemática adolescente: é pelo "despertar de seus sonhos", ou seja, a insistência do inconsciente de que o parceiro tenha seu lugar na problemática psíquica. Com efeito, é pelo sonho que a criança será constringida a apreender sua relação com o outro como ser sexuado, o que ela não fazia no tempo da infância em que meninos e meninas estavam clivados a coexistirem em dois grupos separadamente (o azul de um lado, o rosa do outro).
Em primeiro lugar, então, são finalmente as posições infantis que são postas à prova no momento em que o adolescente gostaria de poder assumir seus novos encontros (com o parceiro) segundo as suas representações passadas, ou seja, no modelo papai-mamãe, para dar conta do rapportentre homem e mulher. Isso se dá de modo tão lógico que não há nada a não ser essas representações à sua disposição. Ora, as posições infantis não dizem nada quanto ao que se deve fazer do lado desse novo sexual apreendido no nível da parceria.
A clínica nos mostra bem isso, já que nesta ocasião pode se mostrar a fragilidade particular dessas posições infantis no momento em que se trata de remanejá-las, o que nos mostra, de maneira exemplar, o trabalho com as crianças adotadas, as quais ficam particularmente em dificuldade na adolescência; pois as identificações vacilam, e notoriamente as identificações ao pai, já que ele vai se mostrar particularmente falho em transmitir qualquer coisa do sexo: por exemplo, dizer o que ele vai fazer disso quando for homem ou mulher, quando se supõe que cada um deles se pense em relação ao outro.
O pai revela, então que ele não escapa à falta de saber, o que vai permitir à criança se agarrar a uma possibilidade de questionar ela mesma esse saber sobre o sexual. Face a esta questão do saber faltante, o adolescente se aproxima de uma nova forma de solidão.
Essa precisão que concerne a relação ao saber, o qual só se considera em relação à sua falta, é certamente essencial para os pedagogos: aqueles que recusam assumir sua falta não podem constituir um saber no sentido do conhecimento pessoal; eles, então, estão em dificuldade de aprendizagem. Retornaremos talvez à discussão sobre os modos de recusa de aprender.
A clínica dos adolescentes nos mostra bastante fielmente esse ponto; tomemos mais uma vez o exemplo desses adolescentes que conservam totalmente sua posição infantil, seja por continuar a adular o pai da realidade, negando-lhe toda castração possível (ainda que ele faça a pior das sujeiras, ele continua sendo o melhor; nenhuma objetividade em matéria de julgamento do pai !), seja continuando a visar apenas o que o outro lhe demanda, ou seja, colocando-se ao seu serviço [ser escravo dele]. A título de exemplo, o obsessivo, que remete a questão de seu desejo sobre a demanda do Outro, a histérica, que assiste ao pai faltante e, ainda mais paradigmaticamente, a anoréxica, que superexplora o campo das identificações que, sustentadas pela potência do supereu, vão visar a reabsorver / apagar o desejo.
Tudo parece bom para evitar aquilo que o Outro sexo nos introduz irremediavelmente, ou seja, a diferença, o que até aqui não tinha sido apreendido, antecipado ou, menos ainda, imaginado: o Outro sexo é o inconcebível. Freud situará esse Outro sexo como o enigma do feminino, seu famoso "continente negro".
O tempo da adolescência é também aquele correlato da separação com relação aos pais. A questão se anuncia frequentemente assim: como deixar meus pais sem que isso mude nada entre nós? (quer dizer, crescer, permanecendo ainda criança). Frequentemente, o adolescente é tomado por um vivo sentimento de culpa no momento desse teste de separação.
Essa culpabilidade não é nova, não é gerada por esse contexto de separação com os pais. Ela é, antes, constitutiva do sujeito humano: é aquela que surgiu da morte simbólica do pai e que se refere à dívida contraída desse fato (conforme o mito de Totem e Tabu de Freud).
O trabalho vai, então, visar que o adolescente se aproprie dos termos desta dívida, garantia de sua inscrição na comunidade dos homens: até aqui, ela era portada por seus pais. O trabalho de apropriação vai fazer dele um sujeito inteiramente responsável. Encontramos aí a principal razão da reivindicação contida nos enunciados de contestação, nos protestos.
Reivindicar significaria nesse contexto a recusa de se responsabilizar pela dívida; pois o que se reivindicaria, no fundo, é que os pais continuem a se responsabilizar por ela, o que vem a contradizer os enunciados frequentes dessas reivindicações: ter mais liberdade. A recusa de apropriação desta dívida pode, assim, constituir a razão central de um tipo de depressão característica da adolescência.
Em resumo, o encontro com o parceiro exacerba as posições infantis, as submete à prova. No enquadre de nosso trabalho de acompanhamento, tratar-se-á finalmente, no fundo, de levar o jovem a por em ação, após tê-las clareado, as insuficiências de suas posições infantis e assim poder inventar sua solução face ao enigma que constitui o sexual.
O tempo da adolescência é, então, fazer face a esta espinha atravessada na garganta que constitui o sexual, o tempo de tomada de risco de que necessita toda criação, tomada de risco pegando de empréstimo uma formulação, a meu ver, mais exata do que aquela da "conduta de risco". O adolescente está, então, pronto para se deparar com a crise de se lançar na tarefa de inventar uma solução para fazer composição com este novo dado no nível sexual: o lugar da criação!
O sujeito, então, entra em crise porque ele deve, sem poder escapar a isso, se posicionar, fazer uma escolha, uma escolha forçada certamente, no que diz respeito a sua identificação sexual e a sua escolha de objeto sexual. Ele deverá forjar um desejo para si, um desejo próprio, não mais ditado e suportado pelos pais ou, de modo mais amplo, pelo Outro (escola, social, etc.).
Essas necessidades que concernem à adolescência nos interessam na medida em que elas põem em evidência o quanto a coisa sexual está no primeiro plano na caracterização do adolescente: porque ele é aquele que experimenta o sexual através de seu corpo, o adolescente já está em posição de resistência. De resistência no sentido político do termo, tal como se diz da resistência ao fascismo ou ao totalitarismo: as ditaduras asfixiam os indivíduos enquanto sujeitos desejantes, o que é contrário a essa exigência de criação que se impõe ao adolescente em sua descoberta do sexual.
É por esta razão fundamental que a juventude tem sempre representado uma ameaça ao poder político. Por extensão e pelas mesmas razões, deduziremos disso que se o adolescente é, por natureza, impossível a assujeitar, ele não é mais educável.
Freud, em seu tempo, tinha desenvolvido a importância da componente sexual ao comentar a maneira pela qual os educadores tentam reprimir o "vício" que não cessa de veicular o jovem: "Os educadores, se é que eles dão alguma atenção que seja à sexualidade infantil, se comportam inteiramente como se eles compartilhassem nossa visão sobre a formação de forças morais defensivas às custas da sexualidade e como se eles soubessem que a atividade sexual torna a criança ineducável, pois eles perseguem todas atividades sexuais das crianças como se fossem «vícios», sem poder fazer grande coisa quanto a elas. Quanto a nós, temos toda razão de atribuir nosso interesse a esses fenômenos que a educação teme, pois deles nós esperamos a chave da constituição original da pulsão sexual". (FREUD, 1987, p.101-102).
Na época de Freud, é a moral cristã, ainda flamejante, que vai permitir lutar contra essa queimadura que constitui o sexual e que os adolescentes não deixam de por em evidência. Nos nossos dias, tendo o sexual se tornado um objeto de consumo como qualquer outro, ele pena cada vez mais para inscrever a diferenciação, o que tem como consequência o fato de nos acharmos numa errância em meio a todas essas possibilidades, não sabendo mais o que fazer de nosso gozo.
A tragédia de nossa época, certamente única na história das civilizações, corresponde a uma anulação do sexual, pelo fato de que a gente não mais se opõe aí, ou seja, a gente não faz nada de particular quanto a isso. Para ilustrar esse ponto, eu os remeto ao fato de que as sociedades em que o poder político permanece ainda forte em face ao discurso capitalista (por exemplo, as ditaduras), possuem uma juventude enérgica, têm ainda uma capacidade de luta, de resistência, de revolução, mas também de amor.
Essa dimensão altamente política da adolescência é exatamente o que eu considero ser a razão ética de meu engajamento ao lado dos adolescentes, porque eles são, eles mesmos, engajados politicamente, e exatamente em seu corpo, pela causa sexual.
A diferença entre nós é que eles não o sabem, o que tem por consequência o agir, certamente de maneira mais ou menos construtiva, mas que jamais sucumbe ao cinismo do ambiente. No fundo, eu considero, então, nosso hospital como um lugar de resistência, aliás, como todo lugar que acolhe adolescentes (escola, lar, etc.)
Nós fazemos, definitivamente, da defesa do sexual um princípio de diferenciação, gerador do laço social. É uma maneira de participar a cada dia das greves, das manifestações muito atuais nesse momento; é uma maneira de ver as coisas!
Vocês notarão lá ainda o papel acelerador no conflito atual na França, quando os jovens se uniram, há alguns dias, do mesmo modo que nos grandes conflitos em toda parte no mundo: Tien An Men (1989), depois os feridos em Jacarta na Indonésia e os conflitos na região dos Grandes Lagos na África.
No nosso hospital, nós temos organizado o trabalho seguindo o modelo da socioterapia, abordagem importada da Inglaterra em meados do século XX, e que consiste em uma consideração do doente, antes de mais nada, como cidadão; sua loucura não faz dele alguém que teria menos do que o indivíduo dito normal, mas nós tomamos simplesmente a responsabilidade pelo fato de que é necessário um cenário diferente de vida.
Os belgas são muito mais inspirados por esta abordagem em comparação com a França onde ela é quase inexistente; parece que no Brasil, ela é também mais comum; vocês me dirão.
Seguindo esta abordagem, tendo consentido com o enigma fundamental da loucura, não há espaço para decretar que uns são mais especialistas que outros já que o princípio diretor é aquele de um não-saber; cada um dos socioterapeutas é igual aos outros em face a este enigma da loucura, o que não impede que cada um possa pôr em ação suas competências específicas, desejos próprios: psiquiatra, psicólogo, psicopedagogo, educador, arte-terapeuta, enfermeiro, professor, cozinheiro intervêm nos espaços próprios mas, igualmente e sobretudo, nos espaços comuns; por exemplo, nas quartas ao meio-dia, nós nos encontramos para lavar a louça após termos dividido a refeição todos juntos, ou então em torno dos jogos da sociedade, para fazer tal ou qual acompanhamento por pouco que encontremos sentido aí; idealmente, nenhuma intervenção é excluída de imediato devido à função de que se ocuparia, o que é clinicamente interessante já que os jovens não podem nos colocar de lado (neutralizar), reduzindo-nos às nossas funções.
Além desta dimensão de transversalidade essencial para cada um dos socioterapeutas, surgiu-me, também, alguma coisa de essencial em nosso enquadre de trabalho: o lugar do cuidado que é continuamente e cada vez mais negligenciado, desinvestido, na organização das instituições terapêuticas, pelo menos daquilo que eu conheço, principalmente na França; é preciso comer, urinar, não ter muito calor, muito frio, não mexer, se ocupar; em suma, cuida-se de um corpo vivo.
Ter realmente em conta esta dimensão de necessidade, e não apenas aquela do desejo, fornece bastante contingência à angústia, enquanto certas instituições que se crêem no auge do saber psiquiátrico entorpecem os adolescentes com medicamentos; conjuntamente, eles lhes demandam, sobretudo, que não façam nada na instituição para consagrar toda sua energia aos seus cuidados psíquicos!
Mas qualquer um ficaria louco de ficar em uma peça [um cômodo] sem fazer nada! No período da grande internação psiquiátrica (quando não era ainda um hospital2), o doente ficava internado, certamente, mas participava das tarefas cotidianas: limpar, jardinar, cozinhar, rezar, etc. É bem verdade, no entanto, que existem maus-tratos na psiquiatria. Isto dito, eu não penso, entretanto, que nós possamos banir os benefícios dos cuidados psiquiátricos, incluindo aí, os benefícios para os adolescentes.
Então, que tipo de instituição elaborar para não reduzir o indivíduo a um doente? Eu ouso acreditar que nosso hospital faz parte desse trabalho. Lá se acolhe os jovens que sofrem de problemas psíquicos, aproximadamente, entre 15 e 20 anos.
O painel de patologias acolhidas é preferencialmente amplo, mesmo que nós tenhamos nossas contra-indicações; a psicose claro, mas também as fobias sociais, a histeria, e com certeza, os sujeitos em estado-limite.
Esse fato procede de uma posição que sempre existiu no centro, a saber, a prevalência da dimensão de acolhimento no cuidado psiquiátrico, antes de qualquer consideração sobre a modalidade do tratamento.
Toca-se, aqui, na dimensão filosófica que nos anima, isto é, o aspecto asilar da missão psiquiátrica, asilar no sentido nobre de dar lugar ao outro, oferecendo-lhe refúgio se for necessário.
Isso constitui, aliás, o ponto que nós chegamos também a lembrar aos jovens, notoriamente no seio de nossa reunião comunitária semanal (que conta com a presença de todos internos): é esperado de todos uma capacidade mínima de acolhimento. O fato de que eles tenham aceitado frequentar nosso centro significa a aceitação implícita de que outros poderiam ali estar do mesmo modo, inclusive em sua diferença psicopatológica, e tendo respeito também em relação aos aspectos deficitários de sua doença.
Assim, para responder a eles, nós não rejeitamos em bloco as apelações bem naturais e necessárias aos adolescentes, a fim de aceitar certas realidades de seu cotidiano: "num lugar a mesa dos loucos, noutro a dos normais, etc."
Nós não os reprimimos, contanto que seus nomes feios (insultos) não sejam acompanhados definitivamente por um movimento real de exclusão, em ato, mas assinalem, ao contrário, uma tentativa, certamente desajeitada, de aceitação do outro, para dar a ele um lugar.
Esta condição de aceitação do outro (e, então, de seu reconhecimento) é tão essencial que sua inadequação pode constituir um dos motivos que podem nos conduzir a decidir pelo fim de uma internação, no sentido em que, se ele não pode minimamente dar um lugar ao outro, um jovem poderá ser requisitado a ceder seu lugar a outro.
Notemos que o resultado está longe de provocar um turn-over [uma virada] nos pacientes, mas ao contrário, se instala uma espécie de clima de apaziguamento, de contenção (latente) que é eminentemente necessária a toda instituição de cuidados... e outras. É crucial elucidar esse aspecto: o princípio da diferença está no cerne de nossa concepção da prática psiquiátrica.
A estrutura de nossa organização consiste principalmente na manutenção de ateliês de mediação terapêutica, com suportes e modalidades de inscrição diversificadas.
Através dessas atividades, nós estimulamos os adolescentes em suas capacidades criativas, de enunciação verbal ou escrita, em sua relação com o corpo e com o objeto, assim como em sua capacidade de fazer com o outro; com efeito, nosso serviço psiquiátrico, longe de constituir um parêntese no laço social, compreende de preferência em confrontá-los (talvez lá onde eles não esperam mais) ao que há no cerne do laço social: sempre a famosa diferença portada pelo sexual cuja defesa constitui nossa ética de trabalho; e enfim, trata-se também de lhes por à prova em sua capacidade de suportar a si mesmos, [incitá-los] a viver com seu pensamento ("estou de saco cheio"!), ou seja, tudo o que surge quando não estamos em ação. E da ação, alguns (certamente não todos) [a partir] disso voltam a demandar!
Em nossa instituição psiquiátrica, intervenção educativa e cuidados psíquicos não estão absolutamente em contradição, contrariamente a esta ideia bastante comum, notadamente na França, de que haveriam instituições educativas específicas separadas das outras para terapia. Frequentemente, vem-se por isso então perguntar em que instituição deve ser acolhido tal jovem tendo em vista esta divisão, a meu ver obsoleta.
Em minha prática clínica no hospital, eu noto que as intervenções enquadrantes (chamada às regras, sanções, etc.) têm um efeito gerador de transferência, o que não é admitido por todos (alguns vêem aí uma antinomia profunda); e do inverso, quando se tende a deixar os adolescentes fazerem um pouco o que querem, eles nos desinvestem; nós perdemos toda credibilidade em relação à possibilidade real de acompanhá-los em seu trabalho psicológico. Eu nunca havia suscitado tanta transferência quanto no meu posto de responsável, certamente um responsável que exerce sua autoridade com sensibilidade clínica!
Essas particularidades da transferência na adolescência são explicáveis: nesta época da vida, o saber inconsciente está em plena construção; a posição do sujeito suposto saber ocupada na transferência pelo terapeuta ainda não pode, então, ser considerada, como com o adulto a quem se define ter operado um recalcamento sobre o sexual, tornado agora um saber inconsciente.
Eu tenho o hábito de dizer que o terapeuta não é para o adolescente mais que um transmissor de experiência: o adolescente se dirige a ele não como sujeito suposto saber sobre o seu inconsciente (SsS), mas para compreender como ele procedeu quando tinha sua idade.
O que quer que se fale disso, ele espera então dos cuidadores que eles lhe garantam, antes de mais nada, um enquadre continente para sua angústia. Por outro lado, ele é sensível a que eles demonstrem sua diferença geracional; e em seguida, somente ele poderá pôr em jogo sua intimidade na relação.
Para terminar, eu precisaria que o que está principalmente em jogo na construção de um desejo, que constitui então a tarefa específica do adolescente, é produzir um limite interno (simbolizado) para o gozo (pulsão de morte), o que vai ponderar a angústia de maneira eficaz.
No momento desse processo em obra, a intervenção educativa é capital para fornecer ao adolescente, na realidade, este limite ao gozo. Vocês, entretanto, terão compreendido que esta intervenção se tornará menos necessária à medida que o processo de construção do desejo trouxer seus frutos; o desejo emergente se substitui pouco a pouco à intervenção educativa. Esta então faz parte integrante do processo terapêutico; mais ainda, ela lhe é indispensável.
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Endereço para correspondência
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Tel.: (336)7126-7285
E-mail: wilfried.gontran@free.fr
Recebido: 01/08/2011
Aprovado: 12/09/2011
Sobre o Autor
Wilfried Gontran
Coordenador do Hospital-Dia para Adolescentes – Équipe ASBL, Bruxelas – Bélgica. Psicólogo clínico. Oferece cursos de formação e também dá supervisão para equipes de saúde. Dá aulas para o Mestrado Profissional de Psicologia da Infância e da Adolescência na Université Toulouse II – Le Mirail – França.
1Trabalho apresentado na I Jornada: Subjetividade e educação: Vertentes da Juventude Hipermoderna – Faculdade de Educação – Universidade Federal Fluminense, em 25 de outubro de 2010. Coordenação e Tradução: Marília Etienne Arreguy; Revisão da tradução: Virgínia Pignot.
2N. da T.: O autor se refere aqui ao período anterior às conquistas do movimento antimanicomial, iniciado na Itália com Franco Basaglia, mas que se expandiu para outros países como a França e o Brasil. O modelo de cuidados com a Saúde Mental passou a ser preferencialmente veiculado em hospitais-dia ou em nível ambulatorial.