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Revista Mal Estar e Subjetividade
versão impressa ISSN 1518-6148
Rev. Mal-Estar Subj vol.12 no.1-2 Fortaleza jun. 2012
AUTORES DO BRASIL
ARTIGOS
Modos de inserção dos psicólogos na saúde mental e suas implicações no comprometimento com a reforma psiquiátrica?1
Insertion modes of psychologists in mental health and its Implications to commitment to psychiatric reform
Modos de inserción de los psicólogos em la salud mental y sus implicaciones em el compromiso com la reforma psiquiátrica
Les manières d'insertion des psychologues dans la le système de santé mentale et leurs implications dans l'acceptation d'un compromis avec la réforme de la psychiatrie
João Paulo MacedoI; Magda DimensteinII
IPsicólogo, Mestre e Doutor em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Professor da Universidade Federal do Piauí, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas/PPGPP e ao Departamento de Psicologia - Campus Parnaíba. End.: UFPI - - Campus Parnaíba, Depto. de Psicologia. Av. São Sebastião, 2819. São Benedito. CEP 64202-020 - Parnaíba - PI. E-mail: jpmacedo@ufpi.edu.br
IIPsicóloga, Mestre em Psicologia Clínica pela PUC/RJ e Doutora em Saúde Mental pelo Instituto de Psiquiatria da UFRJ. Professora da UFRN, vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia/PPGPsi. End.: UFRN - CCHLA, Depto. de Psicologia, Campus Universitário, Lagoa Nova. CEP 59078-970 - Natal - RN. E-mail: magda@ufrnet.br
RESUMO
Objetiva-se analisar os modos de inserção e os efeitos técnicos e políticos da presença dos psicólogos na Saúde Mental. Considera-se que a maneira com que cada profissional se insere, maneja conhecimentos teórico-práticos e organiza suas ações político-profissionais pode ou não efetivar e dar sustentação às mudanças necessárias à efetivação da reforma psiquiátrica. Trata-se de um estudo qualitativo, com base em pesquisa documental e trabalho de campo realizado em Teresina/PI. Dentre os psicólogos que atuam na Saúde Mental do município foram entrevistados 29 profissionais com a orientação de um roteiro semiestruturado. Quanto aos resultados, observou-se que os profissionais são jovens, formados há 10 anos, com pouca experiência na área. Além disso, convivem com trabalhos precarizados, baixos salários, razão pela qual mantêm vários empregos, tendo como destaque o consultório privado. Identificou-se que os profissionais demonstram forte vinculação com os modos tradicionais de atuação e pouco comprometimento com o desenvolvimento de novas práticas em saúde mental. Isso produz efeitos diretos na organização dos processos de trabalho e nos modos de funcionamento das equipes, mantendo o psicólogo afastado da perspectiva psicossocial, bem como das lutas para efetivar a Política de Saúde Mental em curso no País. Além disso, observou-se o agenciamento de um modo de ser psicólogo operador de práticas governamentais de gestão/controle de subjetividades e da vida.
Palavras-chave: Reforma psiquiátrica, luta antimanicomial, psicologia, cultura profissional, compromisso social.
ABSTRACT
The aim is to analyze the insertion modes and the technical and political effects of psychologist presence in Mental Health. It is considered that the way each professional inserts himself, handles theoretical practical knowledge, and organizes his political-professional actions, may or may not actualize and give support to necessary changes to the effectuation of the psychiatric reform. It is a qualitative study, based on a documental research and a field work in Teresina/PI. Among the psychologists acting in mental health in the city, 29 were interviewed with guidance of a semi-structured script. As to results, observed that professionals are young, graduated 10 years, with little experience in the area. Moreover, they work in precarious conditions and low salaries, the reason why they have other jobs, highlighting private practice. It was found that professionals demonstrate great link with traditional acting modes and little commitment in developing new practices in mental health. This produces direct effects in the organization of work processes and team functioning ways, maintaining psychologists away from psychosocial perspective, as well as of the struggle to actualize Mental Health Politics underway in country. In addition, it is observed the agency of a way of being psychologist operator of governmental practices of control of subjectivities and life.
Keywords: Psychiatric reform, anti-asylums fight, psychology, professional culture, social commitment.
RESUMEN
Se tiene como objetivo analizar los modos de inserción y los efectos técnicos y políticos de la presencia de los psicólogos en la Salud Mental. Se considera que la manera con que cada profesional se inserta, maneja conocimientos teórico-prácticos y organiza sus acciones político-profesionales puede o no efectivizar y dar sustentación a los cambios necesarios para la concretización de la reforma psiquiátrica. Se trata de un estudio cualitativo, con base en una investigación documental y trabajo de campo realizado en Teresina/PI. Entre los psicólogos que actúan en la Salud Mental del municipio fueron entrevistados 29 profesionales con la orientación de un cuestionario semi-estructurado. En cuanto a los resultados, se observó que los profesionales son jóvenes, formados hace 10 años, con poca experiencia en el área. Además, conviven con trabajos precarios, bajos salarios, razón por la cual mantienen varios empleos, teniendo como destaque el consultorio privado. Se identificó que los profesionales demuestran fuerte vinculación con los modos tradicionales de actuación y poco compromiso con el desarrollo de nuevas prácticas en salud mental. Esto produce efectos directos en la organización de los procesos de trabajo y en los modos de funcionamiento de los equipos, manteniendo al psicólogo alejado de la perspectiva psicosocial, como también de las luchas para efectivizar la Política de Salud Mental en curso en el país. Además, se observa el perfil de un modo de ser psicólogo operador de prácticas gubernamentales de gesto/control de subjetividades y de la vida.
Palabras-clave: Reforma psiquiátrica, lucha antimanicomial, psicologia, cultura professional, compromiso social.
RÉSUMÉ
Ce travail vise à analyser les manières d'insertion et les effets techniques et politiques de la présence des psychologues dans la Santé mentale. On considère que la manière par laquelle chaque professionnel s'insère dans le système de Santé Mentale manipule la connaissance théorique-pratique et organise leurs actions politiques professionnels. Cette manière, peut ou non exécuter et donner une sustentation aux changements nécessaires à l'application de la réforme psychiatrique. C'est une étude qualitative basée sur la recherche documentaire et sur l'enquête sur le terrain à Teresina/PI. Parmi les psychologues qui agissent dans le système de Santé Mentale de cette ville, 29 professionnels ont été interviewés avec l'orientation d'un itinéraire semi-élaboré. Quant aux résultats, Nous avons observé que les professionnels sont jeunes, ils se sont diplômés il y a 10 ans, avec peu d'expérience dans le domaine. En plus, ils expérimentent des travaux dans la précarité, des bas salaires, et c'est la raison pour laquelle ils possèdent plusieurs emplois en donnant plus d'importance à la clinique privée. Nous avons remarqué que les professionnels démontrent une forte relation avec les manières traditionnelles de d'exécution du travail et peu d'acceptation d'un compromis avec le développement de nouvelles pratiques dans les services de Santé Mentale. Cela produit des effets directs dans l'organisation des processus de travail et sur les manières d'opération des équipes, en maintenant le psychologue éloigné de la perspective psychosocial, aussi que des batailles pour exécuter la Politique de Santé Mentale en cours dans le pays. En plus, nous avons observé l'installation dans une voie d'être psychologue opérateur des pratiques gouvernementales d'administration /et du contrôle de subjectivités et de la vie.
Mots-clés: Réforme psychiatrique; lutte anti-asilaire; psychologie; culture professionnelle; engagement social.
Introdução
Este artigo apresenta reflexões sobre os modos de inserção dos psicólogos na Política de Saúde Mental no Brasil e os efeitos técnicos e políticos que derivam desse contexto como vetor de sustentação do processo de Reforma Psiquiátrica em curso no País. Propõe-se essa discussão por dois motivos: de um lado, pelo fortalecimento da presença dos psicólogos nas políticas públicas, que encontra na Saúde Mental um importante dispositivo de expansão e interiorização da profissão; de outro, pelos avanços (apesar das inúmeras dificuldades presentes) quanto à reversão da estrutura asilar de tratamento para a estruturação de uma rede integrada de serviços extra-hospitalares e de base comunitária, com foco nas ações continuadas de cuidado que se pretendem substitutivas ao hospital psiquiátrico.
Para se concretizar a substituição do tradicional modelo técnico-assistencial em saúde mental é necessário que sejam vencidos alguns desafios, dentre eles: a) obter maior sustentação técnica e organizativa por parte dos profissionais e gestores, e consequentemente, pela rede de serviços, dos princípios da reforma psiquiátrica e do modelo de atenção psicossocial; b) promover avanços no âmbito normativo-institucional - por meio da criação de portarias ministeriais e fontes de financiamento que fortaleçam os dispositivos substitutivos; c) no âmbito jurídico-político - por meio da criação de leis que aprofundem ações de proteção social e mudanças na legislação civil e penal, para maior celeridade das ações afirmativas e de reinserção social dos usuários da saúde mental; d) por fim, conquistar maior participação, luta e ação política dos diversos atores sociais envolvidos para o desmonte dos manicômios - que configuram não apenas os estabelecimentos de saúde, mas principalmente as relações que estruturam a sociedade, que organizam as cidades e, inclusive, que compõem as subjetividades dos indivíduos -, portanto, para a transformação dos aspectos socioculturais e do imaginário social relacionado à loucura (Amarante, 2007; Bezerra Junior, 2007).
A questão de fundo que acompanha os autores neste estudo diz respeito à necessidade de maior qualificação técnica e política dos atores envolvidos para se avançar sobre o cenário anteriormente apresentado e enfrentar os desafios encontrados na Saúde Mental. No caso dos psicólogos, atores importantes desse processo, tal preocupação intensifica-se devido ao movimento de expansão e estruturação da rede psicossocial, que tem contribuído significativamente para o fortalecimento da profissão nesse campo. Dessa forma, não se pode deixar de problematizar exatamente as relações que se têm construído entre esses profissionais e seus modos de inserção na Saúde Mental, bem como os efeitos que derivam desse contexto em termos da sustentação técnica e política do movimento de Reforma Psiquiátrica no Brasil.
Parte-se da compreensão de que, dependendo da maneira como cada profissional se insere, organiza e maneja os conhecimentos teórico-técnicos e prático-profissionais necessários para atuar na Saúde Mental, e se movimenta politicamente nos espaços de luta dentro e fora dos serviços, pode ou não efetivar e dar sustentação para a defesa das mudanças que se quer implantar nesse campo no País. Assim, a Saúde Mental demarca um tipo de trabalho que tem como particularidade a de incluir no saber-fazer profissional não apenas conhecimentos técnico-científicos e determinados manejos práticos, mas, especialmente, "a implicação política e afetiva com a construção de outro modo de cuidar e entender a loucura" (Ramminger, 2006, p. 38). No intuito de aprofundar alguns desses aspectos para problematizar os modos de inserção e os efeitos técnicos e políticos da presença dos psicólogos na Saúde Mental no Brasil, situar-se-ão rapidamente os desafios do processo de Reforma Psiquiátrica em curso e a movimentação da profissão nesse campo.
Os Desafios do Processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil
A década que se inicia talvez esteja configurada como aquela em que se darão os maiores desafios para se efetivar a Política de Saúde Mental em toda a sua radicalidade no País. Conforme dados do Ministério da Saúde (Brasil, 2011), conta-se atualmente com 1.690 Centros de Atenção Psicossocial (Caps) que realizam o acompanhamento de pacientes com transtorno mental grave e severo. O propósito dos serviços prestados por essas instituições consiste no trabalho na perspectiva do cuidado e conquista da autonomia e reinserção social.
Ao longo desses 10 anos da aprovação da Lei n. 10.216/11 - indutora do processo de reforma psiquiátrica - alcançou-se o índice de 68% da população coberta com serviços territoriais e de base comunitária. Por outro lado, não foram criados novos leitos ou mesmo novos hospitais psiquiátricos no mesmo período. Registraram-se mudanças no perfil dos hospitais psiquiátricos com incentivo financeiro naqueles de menor porte (48,64% dos leitos estão concentrados em hospitais com até 160 leitos). Além disso, registra-se maior financiamento das ações extra-hospitalares (70,56%) do que hospitalares (29,44%) (Brasil, 2011). Entretanto, é cada vez mais evidente que a única forma de se avançar no desmonte da estrutura asilar é torná-la desnecessária em termos das funções sociais que o hospital exerce na sociedade. Nesse sentido, como contra resposta à lógica asilar é necessário implantar serviços abertos e de base territorial que supram as funções de moradia, alimentação, trabalho/ocupação, lazer, as relações de amizade e os vínculos sociais que o hospital, desde o seu nascimento, estrutura e materializa por meio de sua existência.
Como resposta para se avançar no desmonte da estrutura asilar em todo o País foram criados o dispositivo das Residências Terapêuticas (SRT) e o Programa de Volta para Casa (PVC), que contam atualmente com 603 unidades e 3.897 beneficiários, respectivamente. Tais dispositivos garantem a desinstitucionalização de usuários de longa permanência dos hospitais, cujas internações, na maioria das vezes, se justificam muito mais por questões familiares, sociais e econômicas, do que efetivamente clínicas. Fora isso, tem-se o incentivo de 640 ações de geração de trabalho e renda para pessoas com transtornos mentais. Para se fortalecer as ações de saúde mental na atenção primária foram implantadas 1.528 equipes do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf). Para a população em situação de rua disponibilizaram-se 92 equipes de Consultórios de Rua que, em conjunto com mais 44 Casas de Acolhimento Transitório (CAT), oferecem cuidados básicos em saúde e ações de redução de danos para dependentes do álcool e outras drogas, incluindo o crack (Brasil, 2011).
Apesar das conquistas devido à ampliação de serviços e à criação de outros dispositivos em saúde mental entende-se que há necessidade premente de estruturação de uma rede psicossocial integrada e articulada, inclusive intersetorialmente com outras políticas públicas, para efetivar ações de continuidade do cuidado. As demandas que têm surgido no setor são prova disso: o crack e a internação compulsória de dependentes químicos; adolescentes (usuários de drogas) em conflito com a lei; atenção à crise e urgência psiquiátrica; pacientes crônicos; população de rua; assistência ao público infantil (autismo e medicalização do sujeito escolar); suporte familiar; violência social e situações de catástrofes/desastres; casos de transtornos psiquiátricos menores (Vasconcelos, 2010). Outro aspecto que merece atenção diz respeito à formação profissional. Não são poucos os trabalhos que têm insistido no problema de como os trabalhadores desse campo têm dificuldade de atuar na perspectiva da desinstitucionalização e do paradigma psicossocial, principalmente promovendo deslocamentos em relação à centralidade do saber médico-psiquiátrico (ou do poder do especialista) para a interdisciplinaridade de saberes; da noção de doença para a de produção da saúde; da ideia de isolamento como tratamento nos hospitais psiquiátricos para a de circulação pela cidade; do conceito de doente mental para o de portador de uma existência-sofrimento; do julgamento de incapaz e tutelado para o de cidadão, com foco na produção do cuidado e no aumento do coeficiente de autonomia e participação comunitária de usuários e familiares (Costa-Rosa, 2000; Ramminger, 2006).
Desse modo, o maior desafio para se avançar em direção à máxima do movimento da luta antimanicomial no País - "Por uma sociedade sem manicômios" - talvez seja a realização de ações, por parte dos trabalhadores, gestores e sociedade em geral, que deem maior sustentação técnica, organizativa e política para se avançar na construção de um novo lugar social para a loucura (Amarante, 1999).
A Saúde Mental como um Dispositivo de Expansão e Interiorização dos Psicólogos no Brasil
Nos últimos 20 anos os psicólogos expandiram significativamente seu campo de atuação na área das políticas sociais, sendo o seu maior empregador o Sistema Único de Saúde (SUS). Esse quadro resultou das articulações da categoria com os movimentos sociais e o próprio Estado brasileiro, que desde os anos 1980 tem propiciado à profissão o engajamento na agenda política em torno do debate sobre as políticas públicas, especialmente em relação a uma postura mais atuante diante dos problemas e desafios que a sociedade brasileira impõe (Bock, 1999). Foi exatamente por meio das movimentações políticas e sociais da sociedade civil em geral que o País avançou no processo de descentralização das políticas sociais, especialmente na saúde, saúde mental e assistência social, contribuindo, assim, para o movimento de expansão e interiorização dos psicólogos em todo o País.
No caso da Saúde, com a efetivação da estratégia de "inversão do parque sanitário brasileiro" (Machado, 2006, p.12), antes com serviços centrados na alta complexidade, agora na atenção primária, tem-se a expansão das ações, serviços e programas do SUS, por meio: a) da significativa ampliação e fortalecimento da rede e das ações na atenção básica, mediante a Estratégia Saúde da Família (ESF), que articula equipes do Programa Saúde da Família (PSF) em conjunto com o Nasf, além das equipes de Apoio Matricial e Unidades Básicas/Centros de Saúde e Unidades Mistas; e b) do crescimento das equipes multiprofissionais nos serviços especializados, notadamente nos Caps, Serviços Residenciais Terapêuticos, Consultórios de Rua, hospitais geral e especializado, unidades de referência em medicina física e reabilitação e ambulatórios multidisciplinares especializados. A consolidação de todos esses equipamentos pelo País tem contribuído, sem sombra de dúvida, para o fortalecimento da presença do psicólogo no SUS (Böing, 2009). Por outro lado, apesar de legalmente o psicólogo ser reconhecido muito mais como um profissional do nível secundário e terciário da atenção à saúde, os gestores de diversas localidades têm priorizado sua inserção no desenvolvimento de cuidados primários, com ações da clínica ampliada, do matriciamento das equipes da saúde da família e do desenvolvimento de ações na promoção e prevenção de agravos à saúde, incluindo a saúde mental.
Especificamente sobre a Saúde Mental, tal política tem se expressado como um importante dispositivo de interiorização do psicólogo brasileiro. Os Caps estão em sua maioria implantados em municípios de 20.000 a 70.000 habitantes (47%), ou em municípios de 70.000 a 200.000 habitantes (26,5%) (Brasil, 2011). Quanto às equipes Nasf, foram implantadas para o suporte às ações da Estratégia Saúde da Família, e 90,2% das mesmas estão instaladas nos municípios do interior do País. Desse modo, percebe-se que tanto os Caps quanto os Nasf, no geral, são serviços localizados em cidades de pequeno e médio porte, dado que coloca a Saúde Mental como um importante dispositivo de expansão e interiorização dos psicólogos em todo o País.
Porém, o encontro dos psicólogos com essa nova realidade territorial, proporcionado pelas políticas públicas, acabou por aproximar a profissão de um contexto ainda distante do que comumente se conhece e se discute por ocasião da formação. Vários são os desafios que derivam desse encontro, o maior deles relativo à reorientação dos modos de trabalho nesses novos serviços, que questionam o clássico modus operandi dos psicólogos no campo social. Dentre as principais dificuldades enumeradas por alguns autores que têm tratado do tema destacam-se:
1) A manutenção da lógica ambulatorial e o foco no modelo clínico tradicional - principal atividade realizada pelos psicólogos nos serviços de saúde, independentemente do tipo de população e da queixa atendida, ou do tipo de serviço e do nível de atenção em que o atendimento é realizado. Como efeito, as práticas dos psicólogos no SUS acabam por se apresentar pouco integradas (e implicadas) com os demais processos de trabalho que acontecem nos serviços, a exemplo da prática do acolhimento, da construção de projetos terapêuticos, da produção do cuidado, da realização de atividades de sala de espera, do atendimento em grupo, das visitas domiciliares, das oficinas terapêuticas, do matriciamento das equipes e das ações de fortalecimento comunitário e do controle social etc. (Boarini & Borges, 2009; Ferreira Neto, 2008; Sales & Dimenstein, 2009a, 2009b; Spink, Bernardes, Santos & Gambá, 2006).
2) A supervalorização do caráter técnico e especialista - que considera muito pouco o trabalho interdisciplinar e em equipe e menos ainda a necessidade de articulação com as redes de serviços ou bases de apoio comunitário. Ou seja, são práticas com pouca abertura para operar ações compartilhadas de planejamento e gestão do trabalho, seja no interior das equipes e do próprio serviço, seja na esfera da gestão central, bem como o desenvolvimento de ações intersetoriais com outras políticas públicas ou equipamentos sociais voltados para o fortalecimento das fragilidades e potencialidades dos territórios (Barros, 2005; Dimenstein, 2009).
Posto isso, compreende-se que atuar no campo das políticas sociais exige dos psicólogos (e de outros profissionais): a) um permanente enfrentamento do modo clássico de organização dos processos de trabalho (e também do funcionamento dos serviços); b) um desabituar-se do entendimento tradicional e cotidiano sobre o saber técnico que define suas práticas e identidade profissional; c) habilidade para inserir-se no trabalho em equipe e transitar por conhecimentos interdisciplinares; d) habilidade para contagiar e conquistar novos parceiros de luta dentro e fora dos serviços; além de e) disposição para circular nas comunidades e permitir-se encontrar com o cotidiano das pessoas (ou seja, com os modos como as populações percebem, sentem, produzem sentido e agem sobre sua própria realidade) (Macedo & Dimenstein, 2009). Assim, entende-se como relevante a realização de estudos que problematizem os modos de inserção e os efeitos da presença dos psicólogos na Saúde Mental. Para tanto, deter-se-á na análise de uma realidade específica que é a do estado do Piauí, realidade cujo processo de reforma psiquiátrica local concentra uma série de acontecimentos, semelhante a outros contextos do País, e sinaliza bem o momento atual de tentativa de consolidação da Política de Saúde Mental em todo o Brasil.
Apesar de recente, o processo de reforma psiquiátrica piauiense alcançou rapidamente a oitava melhor cobertura populacional (82%) do País (Brasil, 2011). Desde 2004, registra-se o trabalho intenso da Coordenação Estadual de Saúde Mental, impulsionado pelo Ministério Público Estadual (MPE-PI), para a expansão dos serviços substitutivos no Estado (Rosa, 2008). Por outro lado, também se assistiu à implantação tardia dos primeiros cursos de psicologia no Piauí, que ocorreu a partir de 1998, mas logo se expandiu, inclusive contribuindo para que muitos psicólogos egressos desses cursos fossem os protagonistas da abertura dos primeiros Caps no interior do Estado.
O fenômeno do rápido crescimento do número de cursos de psicologia, consequentemente, do número de profissionais no mercado de trabalho, ocorrido no Piauí, espelha a própria realidade brasileira. O próprio processo de expansão das políticas públicas, especialmente na saúde, saúde mental e assistência social, contemporâneo ao crescimento da profissão em todo o País, tem configurado o setor público como um dos maiores empregadores da categoria: no Piauí, por exemplo, 43,4% dos psicólogos estão institucionalizados nas políticas públicas, enquanto o panorama nacional registra o percentual de 40,3% (Macêdo, Heloani & Cassiolato, 2010).
Dessa forma, muito mais do que tratar o problema da inserção dos psicólogos na saúde mental apenas como uma questão local, pretende-se torná-lo expressão de uma problemática nacional. Nesse caso, colocar-se-ão as análises aqui realizadas para dialogar com as de outros estudos que têm tratado do tema. Objetiva-se com esta investigação conhecer as formas de inserção profissional dos psicólogos nos serviços de Saúde Mental localizados na capital do Piauí. Em seguida, problematizar os efeitos desses modos de inserção profissional na Saúde Mental tanto na maneira como esses profissionais organizam seus processos de trabalho, quanto na forma como se posicionam frente ao processo reformista local. Intenciona-se com este trabalho contribuir para uma análise crítica sobre a forma de inserção profissional dos psicólogos nas Políticas de Saúde Mental e fornecer subsídios para atuações mais qualificadas nesse campo, especialmente em tempos de ampliação das possibilidades de atuação da profissão com as propostas de expansão e interiorização das políticas públicas em todo o Brasil.
Método
Trata-se de um estudo qualitativo com os respectivos caminhos da investigação: primeiro realizou-se uma pesquisa documental no Conselho Regional de Psicologia, na Secretaria Estadual de Saúde (Sesapi) e na Fundação Municipal de Saúde (FMS) para mapear os locais e os modos de inserção dos psicólogos na Saúde Mental, além de identificar os profissionais que atuam no setor. Em seguida, aplicou-se a pesquisa de campo, por meio de visita aos serviços que contam com a presença de psicólogos e realização de entrevistas (roteiro semiestruturado).
A entrevista abordou aspectos relativos às formas de inserção profissional, ao tempo de trabalho na área, ao tempo de formação, à carga horária de trabalho, às experiências profissionais anteriores, aos interesses/motivos para atuar/permanecer na saúde mental, aos demais vínculos de trabalho, às atividades realizadas e às dificuldades enfrentadas no setor. Ao todo foram entrevistados 29 psicólogos, que atuam em sete Centros/Unidades básicas de Saúde (n=7), em quatro Centros de Atenção Psicossocial (Caps) (n=13), em dois Hospitais Psiquiátricos (n=7)2, como também na Gerência Estadual de Saúde Mental (n=2).
Quanto ao tratamento dos dados, trabalhou-se com a análise de conteúdo com base em Minayo (2000), tendo como procedimentos as etapas de categorização, inferência e interpretação dos dados. Os resultados foram organizados a partir dos seguintes eixos de análise: modos de inserção profissional, efeitos para atuação na saúde mental e efeitos para processo de reforma psiquiátrica. Para a realização deste estudo, contou-se com a autorização da Secretaria Estadual de Saúde e da Fundação Municipal de Saúde, além da própria autorização dos participantes para integrarem o estudo.
Resultados
Em 1998, ano marco do surgimento dos primeiros cursos de psicologia no Piauí, a 11ª Regional do Conselho de Psicologia - Seção Piauí contava com 119 psicólogos inscritos. Dentre eles, registrava-se um número razoável de profissionais (32%) que atuava em instituições públicas e/ou privadas conveniadas ao SUS em todo o Estado (Dimenstein, 1998). Transcorridos 13 anos, o Conselho Regional de Psicologia do Piauí (CRP11-PI) passou a contar com 1.516 profissionais, sendo 305 os que atuam no SUS e 353 os que atuam nos serviços públicos da Assistência Social.
Sobre o movimento de expansão da presença do psicólogo na Saúde do Piauí, conforme dados de Dimenstein (1998), havia 24 psicólogos atuando no setor naquele ano, sendo que apenas 11 estavam vinculados aos serviços da atenção primária em saúde da capital: cinco em centros e/ou unidades básicas de saúde e os demais nos serviços ambulatoriais com suporte à atenção básica. Em 2011, elevou-se para 83 o número de profissionais atuando somente na capital, com expressivo crescimento de psicólogos na Saúde Mental, assim distribuídos: rede hospitalar pública (38); hospital psiquiátrico (14); setor ambulatorial e de atenção básica de suporte à saúde mental (11); rede Caps (16); SRT (1); e Gerência Estadual de Saúde Mental (Sesapi) (3).
Dentre os profissionais identificados que integram a Saúde Mental da capital piauiense registrou-se que 87,8% são do sexo feminino. Trata-se, portanto, de um dado compatível com os estudos sobre o psicólogo no SUS (Spink et al., 2007) e que corrobora, ainda, a última caracterização geral da profissão, que evidenciou que 83,3% dos psicólogos no País são do sexo feminino (Bastos, Gondim & Rodrigues, 2010).
O fato de o serviço público estar configurado como o principal empregador dos psicólogos no estado do Piauí, especialmente no campo da Seguridade Social - saúde, saúde mental e assistência social -, já era identificado no estudo de Dimenstein (1998) antes mesmo de ser uma realidade nacional (Bastos, Gondim & Rodrigues, 2010). A questão é que o ingresso de psicólogos no serviço público piauiense ganhou maior densidade nos últimos anos, especialmente com o processo de expansão dos serviços substitutivos em Saúde Mental em todo o Estado.
Neste estudo, a maioria dos entrevistados é mulher (79,3%), jovem (58,6%), formada há menos de 10 anos (62%) e vinculada ao setor público (93,1%), seja como contratada sob o regime estatutário (76%), seja como prestadora de serviço (24%). Dentre os estatutários, 41% ingressaram no serviço público como prestadores de serviços e conquistaram a estabilidade no cargo após a Constituição de 1988. No tocante aos demais, 59% ingressaram mediante concurso público. Quanto ao tempo de trabalho na saúde mental, 55,2% dos entrevistados atuam há menos de três anos no setor, 13,8% têm entre 10 a 15 anos, e 31%, mais de 20 anos.
Os Caps concentram o maior número de entrevistados (n=13), inclusive aqueles com vínculo estatutário (n=10) e carga horária de 20h semanais (n=11). Além disso, os psicólogos dos Caps são adulto-jovens (n=7), formados há menos de 10 anos (n=9) e ingressaram na Saúde Mental ainda na condição de recém-formados (n=10). A maioria dos entrevistados relatou que o Caps foi o seu primeiro emprego (n=11). Todos os lotados na atenção primária e setor ambulatorial são estatutários e trabalham cumprindo uma carga horária de 30h semanais (n=7). No geral, são profissionais com maior tempo de serviço na Saúde Mental (15 anos) se comparados aos lotados nos Caps. No entanto, assim como os anteriores, os profissionais da atenção primária e setor ambulatorial enfatizaram a falta de experiência na área ao ingressaram no serviço. Quanto aos entrevistados dos hospitais psiquiátricos (n=7), constam como aqueles com maior tempo de serviço na Saúde Mental, em média 20 anos, à exceção de um que, semelhante ao relatado pelos profissionais dos Caps, ingressou recentemente no setor. Todos foram contratados com carga horária de 30h semanais. Dois entre eles integravam o setor privado e cinco, o setor público. Dentre os profissionais do setor público, pelo menos quatro são estatutários (conquistado com a estabilidade do cargo) e o outro ingressou por meio de concurso público. Quanto aos dois entrevistados da Gerência Estadual de Saúde Mental, setor que desde o final da década de 1980 contou com psicólogos compondo a equipe-gestora, também são recém-formados, com pouca experiência em Saúde Mental.
Modos de Inserção Profissional dos Psicólogos na Política de Saúde Mental
Diferentemente do ocorrido em outras localidades do País, os psicólogos piauienses ingressaram no serviço público por meio da Saúde Mental. Ainda no final da década de 1970, dois psicólogos ingressaram no principal hospital psiquiátrico da capital piauiense. Com a implantação do I Plano de Saúde Mental do Piauí (1983), destinado a promover a regionalização da assistência psiquiátrica em todo o Estado, bem como o fortalecimento da assistência na capital, conforme os moldes da experiência americana da "psiquiatria preventiva", de Gerald Caplan (Nogueira, 1993), houve a contratação de mais psiquiatras, além de 15 psicólogos, pela Sesapi para atuar na Saúde Mental. Todos os psicólogos contratados ingressaram sem concurso público e obtiveram, posteriormente, a estabilidade do cargo, mantendo-se efetivos naquela Secretaria de Governo até hoje. Além disso, referiram que ingressaram na Saúde Mental sem qualquer experiência profissional anterior. Porém, cinco deles comentaram que, ainda na graduação, realizaram estágios extracurriculares em hospitais psiquiátricos e o contato com as condições da assistência psiquiátrica ali oferecida fez com que se vinculassem ideologicamente ao movimento da Reforma Psiquiátrica nos anos 1980.
O movimento de ingresso dos psicólogos piauienses na Saúde Mental coincidiu, no plano nacional, com o momento de expansão e formalização do modelo sanitarista (1980-1987). O movimento da reforma sanitária brasileiro, aliado ao processo de redemocratização do País, resultou na garantia constitucional da Saúde como direito de todos e dever do Estado (Vasconcelos, 1999). Também data desse período a marcante presença de trabalhadores e militantes do movimento sanitário, incluindo aqueles da saúde mental, nos aparelhos do Estado, especialmente nas Secretarias de Governo, cujo principal efeito foi o surgimento das primeiras experiências de reversão do modelo sanitário, com prioridade para as ações de promoção, prevenção, proteção e continuidade do cuidado. Na saúde mental a principal ação desenvolvida foi a humanização dos hospitais, bem como o controle da rede hospitalar e ambulatorial do setor. Quanto aos psicólogos, participaram desse processo somando-se a outros atores políticos na busca de humanizar as instituições de tratamento, além de ocuparem cargos nas equipes de gestão das cordenações estaduais e municipais de saúde em várias localidades do País.
Apesar dos avanços e da mobilização das entidades da categoria dos psicólogos (conselhos profissionais e sindicatos) para contribuir com o movimento reformista, no plano da formação as graduações em psicologia não acompanharam os debates sobre os desafios para atuar nos serviços públicos de saúde. O desdobramento disso foi o completo despreparo dos psicólogos para os novos desafios e serviços que encontravam pela frente, em função de uma formação efetivamente pautada pela hegemonia da clínica privada e pelo fortalecimento do ideário liberal de autonomia do exercício profissional em detrimento do trabalho no setor público (CFP, 1994; Dimenstein, 1998; Vasconcelos, 1999).
Outro aspecto recorrente, ao longo dos anos 1980 na realidade piauiense, foi o ingresso de profissionais no serviço público sem a prestação de concurso público. Um dos entrevistados trouxe o testemunho de que era comum ocorrer situações em que, antes mesmo de concluírem o curso, não raro suas famílias já tinham realizado as investidas necessárias, ou as devidas "negociações" com a classe política local, para assegurar os locais de trabalho quando eles retornassem formados para o Estado. Assim, muitos psicólogos que chegaram ao Piauí nos anos 1980 ingressaram no serviço público, sendo lotados na Saúde Mental, especificamente no Hospital Areolino de Abreu, espécie de reduto da profissão para aqueles que se formavam fora do Piauí, dada a pouca oportunidade de empregos para os psicólogos no Estado. O curioso é que essa associação entre psicólogo/hospital psiquiátrico/loucura ficou tão fortemente marcada na capital piauiense que foi por muito tempo limitante do acesso dos psicólogos a outros campos de atuação da profissão no Estado. Somente com o funcionamento dos primeiros cursos de psicologia no final dos anos 1990 é que se passou a desestigmatizar a profissão no tocante à associação atendimento psicólogo/loucura para a população local.
No plano nacional as movimentações em torno do final dos anos 1980 e início dos anos 1990 tiveram como pano de fundo o momento de efervescência política da luta antimanicomial. O movimento da luta deixou de ser uma causa específica de um grupo de trabalhadores, fechada dentro do campo da saúde mental, para se constituir em um movimento social, agregando interesses de usuários e familiares de modo a alcançar o espaço das cidades e implicando toda a sociedade no questionamento sobre a exclusão da loucura. A própria categoria dos psicólogos participou do movimento da luta no plano nacional. Isso contribuiu para a experiência e o engajamento da profissão no trabalho de militância, marcando a presença e a liderança de vários psicólogos frente aos acontecimentos que marcaram aquela época. Entretanto, no Piauí, o debate da luta antimanicomial ficou restrito a alguns poucos profissionais dos hospitais psiquiátricos mais engajados na questão, porém, com pouco poder de articulação para introduzem a discussão na cena local. Os psicólogos entrevistados estavam bem mais preocupados com os seus empregos e o ingresso no mercado de trabalho piauiense do que em envolver-se com as questões políticas e a implicação afetiva com a causa da luta antimanicomial.
Os primeiros concursos para psicólogos realizados no Piauí para o ingresso no serviço público ocorreram em 1988, pela Fundação Municipal de Saúde (FMS), e em 1990, pela Sesapi. Anteriormente, em nível federal, houve um concurso para psicólogo realizado pela Fundação Nacional de Saúde para o Estado, sendo que uma das concursadas ficou lotada num dos hospitais psiquiátricos da capital. Com a estruturação do I Plano de Saúde Mental de Teresina em 1991, nos moldes do plano estadual, houve a ampliação do número de psicólogos no serviço público da capital. Na ocasião, a FMS realocou os psicólogos e psiquiatras existentes na rede de Saúde e realizou, em seguida, dois concursos, a fim de estruturar nove serviços ambulatoriais em Saúde Mental. Como resultado, a gestão municipal passou a contar com 11 psiquiatras, cinco psicólogos e um assistente social para realizar as ações em Saúde Mental em toda a capital, por meio de serviços da atenção primária e ambulatórios de saúde na periferia da cidade. Quanto à Sesapi, não realizou nenhum concurso para a contratação de novos psicólogos até o ano 2000, mantendo, ao invés, a prática de contratação de pessoal temporário para suprir as demandas dos setores do hospital psiquiátrico.
Apesar da contratação de pessoal e da abertura de alguns serviços ambulatoriais na capital e nos interiores, as ações em Saúde Mental no Piauí, na primeira metade dos anos 1990, não avançaram tanto. Em vez de resolutivos, os trabalhos realizados pelas equipes de saúde mental recém-implantadas acabavam por focar-se apenas nos usuários com transtornos mentais leves ou comuns, atuando a partir da medicalização ou do trabalho psicoterápico sem qualquer integração das ações profissionais ou entre os serviços disponíveis no território, alimentando a demanda por internações nos hospitais psiquiátricos. Na segunda metade da mesma década, apesar de algumas movimentações para que fosse impulsionado o processo de reforma psiquiátrica piauiense, com o trabalho concomitante de diminuição de leitos e abertura de serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico, essas estratégias foram paulatinamente desmobilizadas, de modo semelhante ao ocorrido no plano nacional, quando houve uma série de restrições e obstáculos impostos para as políticas públicas em geral, inclusive ocasionando um retrocesso na esfera assistencial e normativa, em função das reformas neoliberais desse período. Outros Estados da Federação, a exemplo de São Paulo e Rio de Janeiro, também sofreram com as reformas neoliberais, principalmente com a desestabilização de alguns Programas de Saúde Mental consolidados.
Por outro lado, a movimentação política que marcou os anos 1990 com a aprovação de diversas leis estaduais de saúde mental em várias unidades federativas do País impulsionou ainda o movimento político e social do processo reformista brasileiro, contribuindo, assim, com o aumento significativo de usuários e familiares como participantes nos encontros da luta antimanicomial por todo o País (Vasconcelos, 2008). Porém, na contramão disso tudo, no Piauí, esse debate ficou novamente restrito à esfera dos trabalhadores, conduzido principalmente pela ala antirreforma, que queria a manutenção da supremacia e do poder central dos hospitais psiquiátricos na condução da assistência psiquiátrica no Estado.
Somente a partir de 2004, durante o Governo "Lula", retoma-se a possibilidade de avanço das políticas sociais no País, apesar da manutenção dos problemas macroestruturais vividos no período anterior. Para Yamamoto e Oliveira (2010), o País avançou com o governo do "Partido dos Trabalhadores" nos quesitos: política externa menos dependente; tratamento diferenciado quanto à dívida externa; não criminalização dos movimentos sociais; incentivo da política agrária com foco na agricultura familiar, apesar do maior incentivo para o agronegócio; e, principalmente, quanto aos ganhos reais do salário mínimo. Porém, os autores ainda comentam que foi mantido o mesmo padrão tributário do período anterior, do governo "Fernando Henrique Cardoso" (1994-2002), fortalecendo assim a macropolítica econômica para o grande capital financeiro. Como consequência, recai-se em políticas sociais que se pretendem universais e redistributivas, mas que na prática mantêm-se focalistas e compensatórias, como é o caso do SUS e o seu subfinanciamento.
Mesmo com as dificuldades relatadas tem início a realização de novas negociações para a ampliação e consolidação da rede de Saúde Mental em todo o território nacional (Vasconcelos, 2010). No Piauí, por exemplo, a despeito da viabilidade financeira para a implementação do Programa de Saúde Mental do Piauí, na perspectiva da desinstitucionalização e da abertura de novos serviços com foco na atenção psicossocial, foi necessária a efetiva participação do Ministério Público Estadual (MPE-PI) para pressionar o processo de Reforma Psiquiátrica no Estado, sobretudo na capital, com a abertura de serviços substitutivos e a retomada de contratação de pessoal para a Saúde Mental. Nesse aspecto, tanto a Sesapi quanto a FMS realizaram concursos públicos, resultando no ingresso de mais psicólogos no setor, especialmente nos Caps, nos serviços de atenção primária em saúde, nos ambulatórios de saúde mental e no hospital psiquiátrico.
Tais avanços possibilitaram alcançar, em menos de uma década, a oitava melhor cobertura populacional em saúde mental do País, passando a contar com uma rede psicossocial composta pelos seguintes serviços distribuídos em todo o Estado: 43 Caps - 27 Caps de porte I, 9 de porte II, 1 de porte III, 4 Caps álcool e drogas, um deles de porte III, e 1 Caps infantil; 4 SRT; 51 leitos psicossociais em hospital geral; 14 ambulatórios em saúde mental; 75 equipes Nasf para o apoio na atenção primária; e somente 1 hospital psiquiátrico, que conta com 160 leitos. Teresina, a capital do Estado, por sua vez, concentra 16,27% dos Caps anteriormente referidos e conta com a rede psicossocial de maior complexidade. Ademais, registra-se o trabalho da Gerência Estadual de Saúde Mental em conjunto com alguns municípios na elaboração de novos projetos para a criação de outros 14 Caps, que estão ou em fase de preparação ou em fase de envio de seus projetos para o Ministério da Saúde (MS) (Piauí, 2010).
Apesar dos avanços quanto à expansão de serviços, com a consequente ampliação de espaços e do percentual de profissionais contratados sob o regime estatutário no setor, conforme percebido no caso piauiense, os efeitos da política neoliberal e da precarização das políticas sociais no Brasil não se fazem sentir apenas na fragilização dos vínculos de trabalho, mas especialmente em relação às condições para a realização desse trabalho em si: salários defasados; larga diferença salarial entre as categorias profissionais; diferenças quanto ao regime de trabalho; péssimas condições de trabalho; falta de pessoal, material, equipamentos e insumos para o desenvolvimento das atividades nos serviços; além da fragilidade da rede assistencial em acolher as demandas da saúde mental. Ou seja, são problemáticas que refletem diretamente nos meios de trabalho e nas formas de organização das equipes, portanto, geradoras de serviços cheios, com longas filas de espera, além de pouca capacidade de suporte e realização do trabalho territorial. Trata-se, desse modo, de serviços cuja prestação apresenta dificuldade de maior resolubilidade frente à complexidade das necessidades dos usuários e familiares.
Sobre esse aspecto, entende-se que a precarização no setor da Saúde é fruto tanto do financiamento da política, quanto dos graves problemas de gestão que enfrenta. Ademais, não se pode esquecer que a precarização dos vínculos ou das condições de trabalho, bem como a falta de apoio institucional e demais garantias legais tem gerado implicações diretas sobre o modo como os profissionais do setor aderem ou não à luta em defesa do SUS (Feuerwerker, 2005). Na Saúde Mental não é diferente: na realidade local, por exemplo, percebe-se o agravamento dessa situação quando mesmo os trabalhadores que integram o quadro permanente no regime estatutário pouco se mobilizam para pressionar as estruturas do Estado para a melhoria do SUS e da Saúde Mental. Na verdade, a maioria dos entrevistados buscou o ingresso no serviço público interessado muito mais na conquista de certa estabilidade financeira e profissional, especialmente nos termos da segurança que o emprego público proporciona, bem como na possibilidade de complementar a renda com outras atividades, fossem elas autônomas ou mediadas por outros contratos de trabalho no setor privado, do que com o compromisso
com as instituições de saúde, com a qualidade e humanização das práticas, com o acolhimento e vínculo com os usuários, aspectos considerados fundamentais para a transformação dos modos hegemônicos de fazer saúde e para a construção de um sistema de saúde universal, integral e equânime (Dimenstein, 2001, p.58).
Quanto à existência de outros vínculos de trabalho, 83% dos entrevistados relataram possuir dois ou três vínculos profissionais. Nesse caso, é frequente encontrar profissionais que mantêm vínculos com o serviço público e um segundo emprego: consultório privado (n=17), docência superior (n=2) ou outra atividade exercida fora da psicologia (n=2); ou profissionais que mantêm vínculos com o serviço público, o consultório privado e uma terceira atividade, a exemplo da docência superior (n=2) e da psicologia escolar (n=1). Somente cinco entrevistados têm unicamente a Saúde Mental como vínculo profissional: três trabalham em Caps e dois, no hospital psiquiátrico.
Conforme apontam Heloani, Macêdo e Cassiolato (2010), a prática de os psicólogos combinarem mais de um vínculo profissional é um quadro comum no âmbito da profissão no Brasil. Sobre isso, as autoras referem que muitos psicólogos vinculados ao serviço público em todo o País combinam duas (28,9%) ou três inserções (24,8%) profissionais. Na capital piauiense, conforme o perfil identificado na saúde mental, tal percentual é bem mais significativo: 72,4% possuem duas inserções profissionais e 10,3% possuem três inserções. Portanto, trata-se de um quadro que denota a fragilidade do mercado profissional piauiense para os psicólogos, realidade compatível com o contexto nacional, fato que pressiona esses profissionais à situação de multiempregos e à sobrecarga ocupacional, inclusive com algumas inserções fora do campo da Psicologia.
Ainda sobre o quadro de multiempregos, observa-se certa tendência entre os psicólogos piauienses que atuam no serviço público de buscar o complemento da sua renda por meio da atuação na clínica privada (58,62%). Trata-se, portanto, de um índice bem maior que o registrado na realidade nacional, em que, entre os psicólogos que combinam mais de um emprego (sendo pelo menos um deles no setor público), somente 17,6% são autônomos com consultórios privados (Macêdo, Heloani & Cassiolato, 2010). Tal comparativo denota a importância da atividade clínica entre as preferências de atuação dos psicólogos piauienses, mesmo entre aqueles inseridos em serviços de Saúde Mental, visto que se trata de um campo que exige novas formas de atuação, não se restringindo ao fazer do psicodiagnóstico e psicoterápico. Quanto à existência de profissionais com um único vínculo de trabalho (17,2%), isso ocorre devido ao fato de esses psicólogos contarem com certa retaguarda financeira familiar, sendo desnecessário complementar sua renda com outra atividade profissional.
Quando indagados sobre a escolha pela Saúde Mental como campo de atuação profissional, os entrevistados foram unânimes ao se referirem à oportunidade de emprego e à própria condição do serviço público de proporcionar estabilidade e autonomia profissional àqueles que ingressam em seus quadros, independentemente da área. Tal resposta foi obtida tanto daqueles profissionais que ingressaram no setor na década de 1980, época em que a Saúde Mental era um dos poucos campos que oportunizavam empregos para os psicólogos piauienses, quanto dos que ingressaram na década de 1990 e anos 2000, considerando-se as oportunidades de concurso nesse campo.
Além da estabilidade financeira e profissional que o serviço público representava, outro aspecto relatado nas entrevistas era que a Saúde poderia aproximar esses profissionais de suas aspirações de atuarem na perspectiva da clínica psicológica. Essa imagem social dos psicólogos de que a saúde seria o locus, por excelência, para o exercício da clínica vinha tanto de suas formações profissionais, pois suas graduações deram maior ênfase teórica e prática ao âmbito da clínica, quanto da própria concepção dos órgãos contratadores (Sesapi e FMS), que entendiam o fazer do psicólogo ligado às práticas tradicionais de atuação: atendimento clínico individual ou em grupos com pacientes e familiares; psicodiagnóstico; e preparação para a alta hospitalar. Entretanto, depois que esses mesmos profissionais ingressaram na Saúde, pelo menos 65,5% não imaginavam que seriam lotados nos serviços de Saúde Mental, atuando direta ou indiretamente com pacientes psiquiátricos. No caso dos entrevistados vinculados à atenção primária e ambulatorial (n=6), bem como aos Caps (n=11), apesar de pouco satisfeitos quando ingressaram na Saúde Mental, com o passar do tempo transformaram a insatisfação em simpatia devido à oportunidade de realizar o trabalho clínico desenvolvido na graduação, cuja base foi construída a partir da frequência em disciplinas do tipo: psicopatologia, clínica psicológica e teorias e técnicas psicoterápicas (por abordagem). O contato anterior desses 17 profissionais com a Saúde Mental ocorreu apenas na graduação, por meio de visitas técnicas em hospitais psiquiátricos. Em relação aos entrevistados dos hospitais psiquiátricos, pelo menos quatro tiveram experiências de estágio na área antes de ingressarem no setor, além do que eram bastante identificados com a Saúde Mental.
O curioso da realidade piauiense é que, diferentemente de outros Estados, como Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Rio Grande do Norte e Ceará, em que os psicólogos ingressaram no serviço público por meio da Educação, Segurança Pública, Assistência Social ou mesmo por outros setores da Secretaria de Saúde, sendo depois deslocados para a Saúde Mental, os piauienses já ingressaram no serviço público pela via da Saúde Mental (Andrade & Simon, 2009; Carvalho, Bosi & Freire, 2009; Figueiredo & Rodrigues, 2004; Oliveira et al., 2005; Sales & Dimenstein, 2009b). Nesse caso, o esperado era que anos de experiência tivessem contribuído e aproximado bem mais os psicólogos piauienses com a Saúde Mental. Mas, na prática, mesmo aqueles que ingressaram nos serviços mais recentemente, por concurso, queixaram-se das mesmas dificuldades e sensações de surpresa, incerteza e despreparo relatadas pelos profissionais dos outros estados que não foram contratados diretamente para a Saúde Mental. Tal fato reflete o quanto se precisa qualificar e reverter os modos clássicos de formação, bem como a maneira como os profissionais ingressam, atuam e realizam suas intervenções na Saúde Mental em todo o País.
Nesse sentido, entende-se que a realidade de muitos municípios brasileiros em relação ao campo da Saúde Mental, sobretudo os de médio e pequeno porte (ou até mesmo aqueles de maior porte), não divirja tanto da que se evidencia no cenário da capital piauiense ora relatado, especialmente em termos dos modos de inserção, das condições de trabalho e dos motivos de opção dos psicólogos pela Saúde Mental como campo de atuação profissional. Essas considerações ganham maior força quando se entende que, de modo semelhante ao que acontece na realidade local, o processo reformista efetivado na maioria dos municípios brasileiros é recente e foi se concretizando em meio ao processo de expansão e interiorização dos serviços de Saúde Mental na última década (Fagundes, 2010; Luzio & L'Abbate, 2009).
Diante desse quadro, estima-se que muitos dos profissionais que atuam no setor em todo o Brasil, da mesma forma que os piauienses, são jovens, cuja formação se deu há poucos anos, o que evidencia pouca experiência na área. Além disso, o Caps, nesse contexto de expansão e interiorização dos serviços de Saúde Mental da última década, tem se configurado como local de primeiro emprego de muitos profissionais, especialmente dos psicólogos, que se desdobram em mais de uma inserção profissional (multiempregos) como forma de garantir sua sobrevivência. Outro aspecto também relevante e bastante presente nesse contexto investigado é o fato de os profissionais que atuam nesse campo terem que lidar constantemente com o "fantasma" do despreparo profissional para atuar na Saúde Mental (Ferreira Neto, 2008; Honorato & Pinheiro, 2008; Lobosque, 2010; Oliveira, 2008; Ramminger, 2006; Romagnoli, 2006; Sales & Dimenstein, 2009a).
Dessa maneira, argumenta-se que grande parte das imprecisões quanto aos modos de atuar dos psicólogos na Saúde Mental é fruto da maneira como os mesmos têm se inserido nesse campo profissional. Para melhor se fundamentar esse argumento, passa-se, na sessão seguinte, para a problematização do modo como a profissão de psicólogo tem sido incorporada pelo Estado brasileiro no setor das políticas públicas. O objetivo não é outro senão o de pôr em questão as interseções produzidas entre os psicólogos e as políticas públicas, principalmente em termos das filiações que têm se efetivado na parceria (ou nos cruzamentos e jogos de forças) entre um e outro no campo social.
Os Efeitos no Campo Técnico e Político das Formas de Inserção dos Psicólogos na Saúde Mental
Viu-se que o processo de institucionalização da profissão nos aparelhos de Estado e, consequentemente, o fortalecimento da presença dos psicólogos no setor público foi fruto do movimento de expansão e interiorização das políticas públicas no País. Não se pode esquecer que outro elemento também se fez presente nas relações que têm se constituído entre a psicologia e a sociedade: a ideia - que tem ganhado cada vez mais o caráter de verdade na atualidade - de que a atividade do psicólogo é essencial à sociedade (Dimenstein, 1998). O principal efeito disso não poderia ser outro senão a recorrente demanda de que os psicólogos estejam presentes em mais e mais espaços da sociedade para responder às mais diversas questões da vida contemporânea e suas vicissitudes. Portanto, mais um motivo para que os psicólogos se façam presentes nas políticas públicas e seus serviços sejam oferecidos para a população em geral.
Nesse aspecto, argumenta-se que a presença dos psicólogos nas políticas públicas não consiste apenas em uma questão de abertura de mercado de trabalho para a profissão, mas em maquinação das relações de poder entre a psicologia e a sociedade para que se cumpram outras demandas do campo social. Tal entendimento encontra fundamento na "supervalorização de nossa (clássica) cultura profissional" (Dimenstein, 1998, p.70), considerando que ela responde muito bem ao mandato social para o qual a profissão foi criada: "contribuir com avaliações diversas sobre a pessoa e com intervenções para o ajustamento e o desenvolvimento dos indivíduos frente aos mais diversos grupos sociais" (Malvezzi, 2010, p. 21). Isso, por certo, configura o trabalho dos psicólogos como uma tecnologia biopolítica de controle e gestão de condutas por meio do rebatimento de indivíduos, famílias, subjetividades, desejos e comportamentos que se quer adequados, cuja finalidade é responder à sociedade da norma em que se encontram as pessoas na atualidade (Foucault, 2005).
Para Michel Foucault (2008), a vida se apresenta como o campo sobre o qual intervêm as tecnologias de poder na contemporaneidade, por meio de ações de vigilância, controle e disciplina dos corpos ou mesmo de subjetividades. Sua finalidade reside na articulação de ações em todo o tecido social que façam organizar e controlar as pessoas nos espaços em que vivem e por onde circulam, registrando e classificando certas condutas, a fim de modelar e fabricar suas vidas a partir do seu cotidiano.
A arquitetura biopolítica, conforme comenta Farhi Neto (2010), possui intercruzamentos científicos e prático-discursivos que objetivam o homem, sujeitando-o, em pelo menos cinco aspectos de sua vida: "vitalidade física e mental, seus caráteres raciais, a lei de seu desejo, sua condição de rebanho ameaçado, seu interesse e racionalidade econômicos" (p.189). Por este aspecto, retoma o autor:
Saúde, raça, sexualidade, segurança e economicidade são, respectivamente, os princípios de operacionalidade que tornam possíveis os vários modos de assujeitamento das populações, os arranjos e exercícios do poder, segundo as distintas figuras biopolíticas: o poder medical, o poder purificador da raça, o dispositivo de sexualidade, o dispositivo de segurança, o governo econômico (Farhi Neto, 2010, p.190).
Para se avançar na discussão, centrar-se o debate apenas sobre o poder medical que, apesar do nome, não necessariamente pertence ou é representado pelo médico. Do poder medical também participam vários outros atores, instituições e saberes. Farhi Neto (2010), por exemplo, lembra que, no entendimento foucaultiano, além do médico, dos seus pacientes e de toda a estrutura de equipamentos, programas e ações de saúde, também participam outros profissionais que representam outras instituições e saberes que se coengendram e operam de maneira difusa o poder medical para instituir uma sociedade da norma: psicólogos, pedagogos, assistentes sociais etc. Desse modo, assim como o médico foi institucionalizado na mecânica estatal com a medicina social e suas ações de saúde pública, instituindo práticas de vigilância e o controle sobre o meio em que vivem famílias e comunidades como forma de condicionar determinados padrões de comportamento e conduta, posteriormente, outros profissionais também o foram, ou incorporaram determinadas funções médicas (exame e normalização), com a perspectiva de que fossem realizadas intervenções em grupos, indivíduos e populações, tornando a vida e o seu meio menos insalubre ou menos suscetível a doenças e outros agravos, contornando, assim, demais conflitos e problemas sociais que "corrompem" ou "degeneram" indivíduos e famílias.
Nesse caso, pode-se entender o poder medical como um dispositivo produtor de enunciados, discursos e práticas, que ocupa posição importante na teia de relações de poder na atualidade: de um lado, o poder medical está agenciado em termos macro com determinada configuração sociopolítica que cria uma série de estratégias, planificações ou políticas de Estado para intervir sobre o meio no qual determinadas famílias e grupos populacionais vivem, trabalham ou organizam suas vidas; do outro, está agenciado em termos microfísicos com outros saberes e poderes produtores de verdades sobre o modo como os indivíduos se relacionam consigo próprios, com o seu corpo, com a sua saúde, e com a forma como compreendem e agem no mundo, logo, como e em que condições conduzem suas vidas e se produzem sujeitos.
Sendo assim, o poder medical entremeia-se nos estratos macro e microfísico do tecido social, provocando ordenamentos que englobam tanto as modificações no plano urbanístico das cidades, em termos de condições de moradia, trabalho e circulação de pessoas/mercadorias, quanto o investimento em políticas que normalizem a saúde e as condições de vida de indivíduos e populações, inclusive de maneira compulsória, se necessário for, com programas de alimentos e segurança alimentar, natalidade e controle de morbidades, vacinação, ações preventivas e ações de seguridade e assistência social. Tudo sendo feito, é claro, no sentido de melhorar as condições de vida da população, aumentando seu poder de produção e consumo, e a produção de novos saberes, práticas e tecnologias que oportunizem a elevação da duração e da condição de vida dos indivíduos, da saúde das populações e de sua disposição para o trabalho - cuja finalidade maior é o distanciamento dos vícios, desatinos e condições de risco e vulnerabilidade social (Farhi Neto, 2010).
Acompanhando de forma mais pormenorizada os intercruzamentos construídos entre psicologia e políticas públicas visando problematizar o modo como esse campo profissional tem se constituído, organizado e se efetivado no conjunto de instituições e práticas políticas que conformam o Estado brasileiro, toma-se como importante indagar: sob quais maquinações das relações de poder (interesses e objetivos) figura o processo de institucionalização da profissão de psicólogo nos aparelhos do Estado? Quais funções dos psicólogos têm sido incorporadas pela mecânica estatal, especialmente em relação àquilo que Michel Foucault denominou de biopolítica, para serem aplicadas ao conjunto da população?
Para se explorar alguns fios dessa imbricada questão sobre a institucionalização e os modos de inserção dos psicólogos nos aparelhos do Estado, há que se considerar que as políticas públicas são hoje muito mais do que somente "novos espaços" de atuação para a referida profissão. Consistem, na verdade, em espaços que têm exposto os psicólogos, cada vez mais, ao processo de politização da vida. Nesse caso, é urgente considerar que, dependendo da forma como esses profissionais se inserem, de com o que implicam e de como atuam no "setor social", a dimensão do biopoder anteriormente mencionada pode ser facilmente colocada em jogo por eles, a partir de suas práticas, num território bastante profícuo de investimento em práticas governamentais, que são aquelas voltadas para famílias e grupos populacionais margeados de direitos. É o que se pode acompanhar, por exemplo, com o processo de expansão e interiorização da profissão no âmbito das políticas públicas, especialmente quando determinadas práticas são investidas nos programas/serviços da saúde (PSF/Nasf) e saúde mental (Caps/SRT/CAT) e em outras políticas, como a Assistência Social3, por mecanismos de regulação e controle das populações, sem perder o foco nos indivíduos e suas famílias. Por esse aspecto, trata-se de modelos de atuação que acabam respondendo às ações de gestão e governo de condutas e subjetividades, no sentido de serializar e fixar identidades a partir de modos de vida hegemônicos, com o objetivo de fundar ou redimensionar tais vidas simplesmente adequando-as à ordem vigente da sociedade da norma.
Tal condição se agrava ainda mais quando se relaciona o contexto descrito ao fato de que nesse processo de avanço da profissão em direção às políticas públicas: 1) não se conseguiu superar o movimento de supervalorização da clássica cultura profissional da sociedade brasileira, que mesmo com alguns progressos, ainda se mostra pautada, exclusivamente, no indivíduo e no fenômeno psicológico, encerrados em compreensões a-históricas e sem qualquer relação com o contexto social, de modo que tudo isso acaba por fadar as práticas a leituras psicologizantes em suas múltiplas formas de intervenção (Dimenstein, 1998); 2) tampouco se conseguiu avançar na produção de conhecimentos teórico-técnicos capazes de ampliar o grau de compreensão e intervenção "que marca historicamente a atuação dos psicólogos" na área social, especialmente em relação às "novas" demandas que têm chegado à profissão nesse campo (Yamamoto & Oliveira, 2010, p.21); 3) e, muito menos, se conseguiu alterar ou sequer identificar os motivos ou padrões hegemônicos com que se priorizam determinadas áreas ou modos de atuar da profissão, como por exemplo, a clínica tradicional (Gondim, Magalhães & Bastos, 2010).
Por outro lado, apesar de todos os desafios impostos pelo cenário até aqui descrito, chama atenção o quanto os psicólogos se constituem como uma categoria marcada por um forte vínculo afetivo com o trabalho. No entanto, esse vínculo está bem mais relacionado com o "elevado comprometimento afetivo" dos psicólogos "com a natureza (clínica) do seu trabalho" (Gondim et al., 2010, p.73) do que efetivamente voltado para enfrentar as contradições e os desafios dos contextos políticos-profissionais em que se dão suas práticas, muitas vezes, reforçadoras do enfraquecimento das políticas públicas e da construção da cidadania devido à predominância do enfoque individual e centrado nos aspectos intrapsíquicos anteriormente relatado (Dimenstein, 1998).
Nesse caso, o estudo aqui realizado permite inferir que, na medida em que os psicólogos foram, paulatinamente, institucionalizados nas políticas públicas no Brasil, assistiu-se, de um lado, ao processo de ampliação e interiorização dos locais de sua atuação, consequentemente, à ampliação dos espaços para o exercício do seu modus operandi clássico de atuar. Do outro, percebeu-se o quanto esses "novos espaços" podem, facilmente, traduzir-se numa forma de capitanear, no sentido de agenciar, aquele modo de ser psicólogo operador de práticas governamentais de gestão/controle da vida. Assim, entende-se que no intercruzamento das relações de poder entre Estado, psicologia e sociedade, o próprio aparato estatal passou a incorporar uma das principais funções que define a psicologia enquanto profissão neste País, a de avaliar e solucionar problemas de "ajustamento". Mas, para quê? Exatamente para associá-la ao poder medical como tecnologia biopolítica e aplicá-la ao conjunto da população. Por isso a necessidade de se fortalecer, cada vez mais, espaços para que as profissões possam avaliar por quais teias de poderes seus saberes e práticas se agenciam com a mecânica biopolítica na contemporaneidade (Duarte, 2010).
Considerações Finais
Observou-se que os psicólogos que atuam na Saúde Mental piauiense são, em sua maioria, mulheres, jovens, formadas há menos de 10 anos e com pouca experiência na área, que optaram pelo ingresso no serviço público por falta de oportunidade no mercado de trabalho local. Além do mais, o setor público, na opinião de todos eles, representava um campo seguro que proporcionaria estabilidade financeira e profissional necessária para se firmarem na profissão. Outro argumento apontado foi que a Saúde figurava como aquele setor que mais apresentava condições para o exercício da clínica psicológica, campo para o qual esses profissionais foram treinados em suas formações. Apesar de a maioria ser enquadrada no regime funcional estatutário, registrou-se um quadro de multiemprego entre os entrevistados, sendo que a atividade clínica em consultório privado sobressaiu como aquela de maior procura, inclusive como forma de complementar a renda profissional.
Muitos entre os entrevistados tiveram os serviços para os quais foram contratados, sobretudo os profissionais dos Caps, como seu primeiro emprego. Poucos relataram possuir alguma trajetória profissional na saúde mental e/ou saúde pública antes de ingressarem no setor. A maioria não escolheu trabalhar especificamente na Saúde Mental quando ingressou no serviço público. E mesmo aqueles que se mostraram inicialmente interessados assim o fizeram devido à simpatia com a área em função das experiências com as disciplinas de psicopatologia, clínica psicológica e teorias e técnicas psicoterápicas.
No geral, defrontou-se com um quadro que revela uma série de dificuldades e incertezas que grassam entre os entrevistados, além de evidenciar certo despreparo para atuar na Saúde Mental. Dentre as dificuldades relatadas, emergem a questão salarial e as fragilidades quanto às condições de trabalho, a exemplo da falta de material e estrutura (testes psicológicos, material lúdico e sala de atendimento adequada, dentre outros), além da baixa capacidade dos serviços de atenderem à demanda, ocasionando filas de espera. Ademais, poucos profissionais cumprem a carga horária para a qual foram contratados, e priorizam somente a realização daquelas atividades que aumentam o seu vínculo ou comprometimento afetivo com o modo clássico de serem psicólogos.
Nesse sentido, conclui-se que a Saúde Mental surge como um dos campos profissionais que mais oportunizam empregos e concursos públicos para os psicólogos piauienses, e que os motivos do seu ingresso nesse campo residem muito mais na abertura e oportunidade para a inserção no mercado de trabalho que proporciona (ou seja, por fatores externos à profissão) do que no interesse, vínculo afetivo ou valorização/comprometimento com a Saúde Mental; na possibilidade de realizar o trabalho clínico para o qual foram formados; ou na oportunidade de desenvolver ações alinhadas com a perspectiva da reinserção e o modelo de atenção psicossocial.
Tal configuração traduz, sem sombra de dúvida, certo distanciamento do perfil profissional, bem como do tipo de vinculação (implicação) pessoal-profissional encontrado entre os entrevistados em relação ao modo de ser profissional nos serviços de Saúde Mental. Na verdade, observou-se, entre os entrevistados, a presença maior de profissionais bem mais vinculados e comprometidos com a natureza do trabalho do psicólogo, que traduz um modo tradicional de atuar e é portador do mandato social para o qual a profissão foi criada, do que com as novas práticas e com a cultura profissional antimanicomial.
Também se percebeu, ao longo deste estudo, o quanto os psicólogos têm dificuldades de pensar sobre o seu fazer e ponderar sobre e para além da sua expertise técnica, consequentemente, sobre os desafios que a realidade brasileira coloca para a profissão. Nesse caso, a presença dos psicólogos na Saúde Mental chega a ser reveladora do "distanciamento" ou "comprometimento de nossas capacidades políticas", como bem coloca Duarte (2010, p.51) quanto ao tipo de vinculação (implicação) pessoal-profissional que a categoria apresenta com o setor. O principal efeito disso é o agenciamento de um modo de ser psicólogo operador de práticas governamentais de gestão/controle de subjetividades e da vida.
Essas, portanto, são questões entendidas como cruciais para o modo como os psicólogos se conformam profissionais da Saúde Mental, pois produzem efeitos diretos na organização dos processos de trabalho e nos modos de funcionamento das equipes, com ações que reafirmam as formas clássicas de atuar dos psicólogos, afastando-os do trabalho na perspectiva psicossocial, bem como das lutas para se efetivar a Política de Saúde Mental em curso no País. Além disso, são questões que apontam diretamente para as insuficiências da formação profissional nesse segmento, com efeitos sobre o modo como esses profissionais se posicionam técnica e politicamente nesse campo.
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Recebido em 04 de novembro de 2011
Aceito em 21 de fevereiro de 2012
Revisado em 15 de março 2012
1 Trabalho elaborado com base no primeiro eixo de análise da tese de doutorado do primeiro autor, e orientado pelo segundo. Agradece-se pelo apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
2 É importante ressaltar que na época da realização do trabalho de campo havia dois hospitais psiquiátricos na capital teresinense. Atualmente, existe apenas um hospital psiquiátrico vinculado à rede pública de saúde.
3 A Assistência Social também conta com serviços e programas voltados para indivíduos e famílias em situação de vulnerabilidade e risco individual e social: Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas).