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Cadernos de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento
versão impressa ISSN 1519-0307versão On-line ISSN 1809-4139
Cad. Pós-Grad. Distúrb. Desenvolv. vol.18 no.2 São Paulo jul./dez. 2018
https://doi.org/10.5935/cadernosdisturbios.v18n2p170-186
Deficiência intelectual e transtorno do espectro autista: uma revisão da literatura sobre os comportamentos do professor na inclusão escolar
Intellectual disability and autistic spectrum disorder: a literature review about the teachers' behaviors towards school inclusion
Discapacidad intelectual y trastorno del espectro autista: revisión de la literatura sobre los comportamientos del profesor en la inclusión escolar
Rafaela da Silva RodriguesI; Priscila Rodrigues Corbini DomicianoII; Deisy Emerich-GeraldoIII
IFaculdades Metropolitanas Unidas (FMU - Laureate International Universities), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: rafaellasrodrigues@outlook.com
IIFaculdades Metropolitanas Unidas (FMU - Laureate International Universities), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: pricorbini@gmail.com
IIIFaculdades Metropolitanas Unidas (FMU - Laureate International Universities), São Paulo, SP, Brasil. Programa Ambulatorial Integrado dos Transtornos do Impulso (PRO-Amiti-IPq-HCFMUSP). E-mail: deisy.remerich@gmail.com
RESUMO
No Brasil, o processo de inclusão de crianças com Necessidades Educacionais Especiais (NEE) conta com uma legislação própria que lhes garante o direito a educação. Todavia é importante compreender quais as variáveis relacionadas ao comportamento do professor que podem influenciar para a consolidação da educação inclusiva. O presente trabalho consiste em uma revisão da literatura cujo objetivo é descrever os comportamentos dos professores que podem influenciar processos de inclusão educacional de crianças com deficiência intelectual (DI) e/ou Transtorno do Espectro Autista (TEA). A pesquisa foi realizada nas bases de dados Scientific Electronic Library e PubMed Central. Os descritores utilizados, nos idiomas português e inglês, foram: Transtorno do Espectro Autista, Deficiência Intelectual, Professores, Atitudes dos Professores, Interação Professor-Aluno. Dez trabalhos compuseram a amostra do estudo e indicaram que o professor tem um papel como agente facilitador e mediador do processo de inclusão. Porém, os estudados destacam a falta de conhecimento dos professores sobre quadros de Transtornos do Neurodesenvolvimento, mais especificamente o TEA, e a falta de profissionais suficientes para o número total de crianças em sala de aula como barreiras que o impedem de intervir de modo adequado nesse processo. Os dados revelaram que a necessidade de iniciativas para conscientização e capacitação desses profissionais, de modo que os mesmos sejam capazes de oferecer a essas crianças meios para um melhor desenvolvimento de habilidades, desde sociais, acadêmicas, autoestima, autoconfiança e outras competências emocionais.
Palavras-chave: Transtorno do Espectro Autista. Deficiência Intelectual. Professores. Atitudes dos professores. Interação professor-aluno.
ABSTRACT
In Brazil there is a law that guarantees the right to education and inclusion of children with special educational needs (SEN). However, it is important to understand which variables related to the teacher's behavior might influence for a real inclusive education. The present study is a literature review describing variants of teacher's behaviors that might influence the processes of inclusive education to children with intellectual disability and/or Autism Spectrum Disorder (ASD). The literature was searched using Scientific Electronic Library Online (SciELO) and PubMed Central (PMC). The following keywords in Portuguese and English were applied: Autistic Spectrum Disorder, Intellectual Disability, Teachers, Teacher Attitudes, Teacher-Student Interaction. Ten papers composed the final sample. In conclusion, the teacher has a mediation and facilitation role on the inclusion process. However, the lack of knowledge of teachers regarding children with atypical development and the lack of professionals for the total number of children in a classroom are barriers that prevent an effective intervention. The analysis revealed a need for initiatives that raise awareness and promotes qualification of these professionals, in order to enable them to offer the means best suited to develop academic and social skills, self-esteem, self-confidence and other emotional abilities.
Keywords: Autistic Spectrum Disorder. Intellectual disability. Teachers. Teacher attitudes. Teacher-student interaction.
RESUMEN
En Brasil, el proceso de inclusión de niños con necesidades educacionales especiales (NEE) cuenta con una legislación propia que les garantiza el derecho a la educación. No obstante, es importante comprender cuales variables relacionadas con el comportamiento del profesor que pueden influir para la consolidación de la educación inclusiva. El siguiente trabajo consiste en una revisión de la literatura cuyo objetivo es describir variables relacionadas con el comportamiento de los profesores sobre los procesos de inclusión educacional de niños con Discapacidad intelectual (DI) y/o Trastorno del Espectro Autista (TEA). La investigación fue realizada sobre las bases de datos Scientific Electronic Library Online (SciELO) y PubMed Central (PMC). Las palabras clave utilizadas en portugués y en inglés, fueron: Trastorno del Espectro Autista, Discapacidad intelectual, Profesores, Actitudes de los profesores, Interacción Profesor-Alumno. Diez trabajos compusieron la muestra final. Se concluye que el profesor tiene un papel como agente facilitador y mediador del proceso de inclusión, pero, hay en ese proceso, sin embargo la falta de conocimiento de los profesores sobre esos cuadros de desenvolvimiento atípico y la falta de profesionales suficientes para el número total de niños en salón de clase son barreras que lo impiden de intervenir de modo adecuado en ese proceso. Los datos revelaron que la necesidad de iniciativas para la concientización y capacitación de esos profesionales, de modo que los mismos sean capaces de ofrecer a esos niños medios para un mejor desenvolvimiento de habilidades, desde sociales, académicas, autoestima, autoconfianza y otras capacidades emocionales.
Palabras clave: Trastorno del Espectro Autista. Discapacidad Intelectual. Profesores. Actitudes de los profesores. Interacción profesor-alumno.
INTRODUÇÃO
Os transtornos do neurodesenvolvimento, como Transtorno do Espectro Autista (TEA) e Deficiência Intelectual (DI), são caracterizados por déficits no desenvolvimento que implicam prejuízos de âmbito pessoal, social, acadêmico ou profissional e se manifestam precocemente durante o período de desenvolvimento infantil, normalmente antes que a criança atinja idade escolar (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014). Os quadros de DI e TEA, isolados ou em comorbidade, são muito comuns na população escolar. Levy, Mandell e Schultz (2009) indicaram a prevalência de TEA em aproximadamente 60 casos em 10 mil crianças e entre 40% e 80 % dos casos apresentam comorbidade com a DI. Em 2012, foi realizada nos Estados Unidos, com crianças de 8 anos de idade, uma pesquisa que estima que uma em cada 68 crianças tem diagnóstico de TEA (CHRISTENSEN et al., 2016).
Crianças com TEA e com DI podem apresentar alterações comportamentais que comprometem suas competências sociais. Por exemplo, no caso do TEA existem padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014). Além disso, é possível que crianças com DI ou TEA apresentem comportamento agressivo direcionado a si próprias, ao outro ou até mesmo a propriedades (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014). Os comprometimentos nas diferentes áreas relatadas anteriormente podem oscilar entre leve, moderado e grave (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014). Especificamente acerca das topografias dos comportamentos, é sabido que em casos de comorbidades entre TEA e DI aumentam as chances de ocorrência de sintomas como hiperatividade, problemas de comportamento e dificuldades emocionais, de acordo com o Strengths and Difficulties Questionnaire (SDQ) (TOTSIKA et al., 2011). Inclusive, quando comparado com crianças com desenvolvimento típico, nos casos de DI é significantemente superior a prevalência de dificuldades externalizantes que causam grande impacto no ambiente, como birras, mudanças imprevisíveis de humor, estereotipias, agressividade e autolesão (EINFELD; TONGE, 1996; EMERSON, 2003; EMERSON; EINFELD, 2010; WHITE et al., 2005).
De acordo com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008), crianças e adolescentes com diagnósticos de DI e/ou TEA são parte de um dos grupos que compõem as condições de Necessidades Educacionais Especiais (NEE). A política de inclusão escolar visa justamente facilitar uma interação positiva entre as crianças com transtornos do neurodesenvolvimento e os alunos neurotípicos. Nesse ínterim, a figura do professor tem grande relevância, pois a relação criança-professor tem muita influência no desenvolvimento das habilidades sociais da criança no ambiente da sala de aula (MATSUSHIMA; KATO, 2015). Para se conduzir a inclusão desses educandos, lidar com os problemas de comportamento representa um desafio para o professor. A presença de problemas comportamentais pode implicar dificuldades em seguir instruções, cumprir uma tarefa atribuída, e déficits na área de habilidades sociais que dificultam o processo de interação com o outro (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014; GAL; SCHREUR; ENGEL-YEGER, 2010). Nesse sentido, é evidente a importância de intervenções voltadas ao desenvolvimento de habilidades sociais e funções executivas na infância, a fim de facilitar a socialização entre os pares e reduzir os riscos evidentes de rejeição e vitimização, contribuindo assim para a consolidação do processo de inclusão escolar de alunos com DI e TEA (EMERICH; ALCKMIN-CARVALHO; MELO, 2017).
Quando as crianças com transtornos do neurodesenvolvimento possuem um bom suporte nas escolas regulares, apresentam status social equivalente aos de crianças da mesma faixa etária com desenvolvimento neurotípico (TUERSLEY-DIXON; FREDERICKSON, 2015). Alguns dos benefícios esperados pela inclusão social são promover o desenvolvimento da criança, habilidades sociais, atitudes positivas acerca da deficiência e aceitação social entre as crianças da comunidade em que essa criança está inserida (LIPSKY; GARTNER, 1997 apud TUERSLEY-DIXON; FREDERICKSON, 2015). O comportamento dos professores perante as necessidades e dificuldades do aluno com transtornos do neurodesenvolvimento consiste em um dos fatores ambientais que podem influenciar a criação de um meio ambiente menos restritivo e facilitar a superação de barreiras que as crianças com NEE enfrentam num contexto escolar. Assim, a partir de uma capacitação adequada, o professor poderia atuar como mediador para a adaptação da criança e o desenvolvimento de suas habilidades sociais, autoconfiança, autoestima e outras competências emocionais, propiciando um ambiente apropriado para melhorar o relacionamento entre crianças com DI e TEA e seus pares neurotípicos (MATSUSHIMA; KATO, 2015).
Desse modo, para a inclusão se consolidar conforme é prevista, o professor tem um papel muito importante por atuar como mediador das relações entre alunos com NEE e seus pares neurotípicos. A partir dessa perspectiva, realizou-se uma revisão da literatura nacional e internacional para compreender aspectos relacionados aos comportamentos dos professores no tocante ao processo de inclusão educacional de crianças com DI e/ou TEA.
MÉTODO
Foi realizada uma revisão da literatura nas seguintes bases de dados: Scientific Electronic Library Online (SciELO) e PubMed Central (PMC). Os descritores utilizados foram: Autistic Disorder, Intellectual Disability, School Teachers, Teacher Attitudes, Teacher Student Interaction. As terminologias foram baseadas no Mesh (Medical Subject Headings), dicionário de termos para indexação de artigos no PubMed.
Para compor a amostra, foram determinados os seguintes critérios de inclusão: 1. artigos nos idiomas inglês, espanhol ou português; 2. artigos empíricos, sendo excluídas as revisões de literatura; 3. artigos sobre a inclusão escolar; 4. inclusão de crianças com diagnóstico de DI - foram eliminados estudos referentes à deficiência física e quadros de necessidades especiais em que as crianças não apresentam atrasos no desenvolvimento (como TDAH e superdotação); 5. com idade igual ou inferior a 18 anos; 6. artigos que abordavam a relação professor-aluno; 7. artigos publicados nas bases de dados até o dia 11 de abril de 2017.
O processo de levantamento de dados ocorreu com as seguintes etapas: pesquisa por publicações em bases eletrônicas; revisão de títulos e resumos; eliminação de publicações repetidas e aplicação dos critérios de inclusão para seleção de potenciais artigos, o que incluiu a consulta ao resumo e ao artigo original.
O levantamento inicial resultou em 291 artigos sobre inclusão escolar de crianças que apresentam deficiência intelectual. Desses, um artigo foi excluído por estar repetido nas bases de dados. Os 290 trabalhos remanescentes foram analisados a partir dos critérios de inclusão previamente mencionados. Nessa etapa, 280 trabalhos foram excluídos em função dos critérios: não ser um artigo empírico (n = 1), não estar relacionado à inclusão escolar (n = 127), não incluir participantes com os quadros clínicos estabelecidos (n = 46), não contemplar a idade estabelecida na metodologia (n = 11), não estabelecer relação entre professor e aluno (n = 80). Dentre os restantes, 15 artigos não foram localizados após busca por material físico. Assim, a amostra final da pesquisa foi composta por dez trabalhos, conforme pode ser visto na Figura 1.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O estudo mais antigo identificado na revisão da literatura foi o de B. B. Weiner, que pesquisou sobre o impacto da presença de alunos com DI num Programa Pré-Acadêmico na Escola de Treinamento do Condado de Wayne sobre o professor na sala de aula (WEINER, 1950). Todavia, essa pesquisa não constou na amostra final. Os estudos que compuseram a amostra foram publicados a partir de 2009, o que indica que o interesse por esta temática é recente, dado que todos os artigos que compõem estão compreendidos entre 2009 e 2016. Entre os estudos avaliados, a maioria foi publicada no Brasil (n = 5), seguida por Estados Unidos (n = 2) e outros países, como Egito, Turquia e Japão (n = 3).
Em termos de objetivos de tais publicações, conforme observa-se na Tabela 1, cinco destinaram-se a relação e interação social, por exemplo, pesquisas que investigaram as relações interpessoais e a autonomia como áreas de maior dificuldade para estimulação (PIMENTEL e FERNANDES, 2014), e que fizeram um comparativo de como se dá a interação social entre grupos de alunos que recebem intervenção comportamental, cognitivo-comportamental e de alunos que não recebem intervenção profissional (HASSANEIN, 2014). Lemos, Salomão e Ramos (2014) realizaram a observação comportamental dos alunos e dos professores e descreveram como se dá essa interação entre as partes. Dois estudos destinaram-se a estudar as atitudes e o papel do professor, como a atitude e percepção dos professores quando questionados sobre a educação inclusivas (CROCHÍK; FRELLER; DIAS; FEFFERMANN; NASCIMENTO e CASCO, 2009) e as atitudes de um educador físico ensinando alunos com deficiência intelectual num sistema de inclusão (ÖZER; NALBANT; AGLAMIS; BARAN; SAMUT; AKTOP e HUTZLER, 2013). Dois analisaram as estratégias e percepções sobre processos de inclusão, como pelo estudo sobre concepções de pais e professores referentes ao processo de inclusão escolar de deficientes intelectuais (LEMOS; SALOMÃO; AQUINO e AGRIPINO-RAMOS, 2016) e um estudo comparativo entre duas opiniões divergentes no que tange a educação inclusiva, bem como as maiores dificuldades encontradas pelos professores nesse processo, a visão que o professor tem sobre a DI, as possibilidades de aprendizados e práticas pedagógicas (SANTOS e MARTINS, 2015). Por fim, um único estudo referiu-se a comunicação entre professor e aluno e discutiu a necessidade de alguns professores adotarem a AAC, técnica de Comunicação Aumentativa e Alternativa (FINKE; MCNAUGHTON e DRAGER, 2009). A Tabela 1, a seguir, apresenta uma descrição dos 10 artigos selecionados quanto aos autores, ano, objetivos, métodos e resultados obtidos são apresentados na Tabela 1.
Em relação ao método aplicado nas pesquisas, nove foram descritivos e apenas um utilizou o método experimental. Como a idade não foi variável de interesse de alguns dos trabalhos analisados, não foi possível obter essa informação. Seis artigos descreviam a idade dos professores e apenas três descreveram a idade dos alunos.
O crescente número das pesquisas na última década revela quão atual é esse tema, mas ainda se observa escassez de estudos que tratem da inclusão de alunos com deficiência intelectual e que foquem a relação entre professor-aluno e o papel desempenhado pelo professor como agente mediador nesse processo, levando-se em consideração que essas crianças demandam maior atenção e cuidado dentro da sala de aula. Ainda que a maioria dos artigos que compuseram a amostra deste estudo tenha se dedicado a analisar relação e interação social, há de se considerar que é muito pouco que tenha havido a publicação de cinco estudos em um período de quase sete anos. Todavia, os estudos levantados trouxeram contribuições relevantes. Por exemplo, destaca-se que uma mediação mais direta referente a manejo de comportamentos e no suporte necessário para que essa criança possa atingir melhor desempenho acadêmico, comportamental e social, auxilia na promoção de seu desenvolvimento, habilidades sociais e maior aceitação social entre as outras crianças, facilitando seu convívio com elas e refletindo positivamente no processo de aprendizagem (TUERSLEY-DIXON; FREDERICKSON, 2015).
Al-Sharbati et al. (2015) analisaram o conhecimento dos professores a respeito do TEA e de que maneira isso influencia a sua relação com o aluno. Apesar de os autores destacarem que seus achados foram inconclusivos por algumas limitações na coleta de dados, vale ressaltar que atitudes inapropriadas e mal concebidas acerca da criança com TEA transcende aspectos culturais, geográficos ou étnicos. Pimentel e Fernandes (2014) explanam, por meio de relatos de professores, que conforme a prática com aquele aluno específico, passam a aprender a lidar com certas situações e comportamentos, mas sem uma teoria para embasar o manejo adequado. Assim, nota-se que muitas vezes grande parte dos comportamentos interventivos é intuitiva e não possui teoria alguma que a direcione. A falta de capacitação quanto ao manejo comportamental dessas crianças pode interferir diretamente na manutenção de tais dificuldades. Hassanein (2015) estudou como a relação entre professor e aluno pode provocar alterações de comportamento no aluno com DI. O autor realizou um comparativo entre crianças que receberam intervenção cognitivo-comportamental, cognitiva e um grupo controle para verificar a efetividade desses tratamentos. Apesar das limitações no levantamento de dados, foi possível concluir que a intervenção cognitivo-comportamental se mostra mais efetiva para as crianças com DI, que o professor possui um papel essencial no processo de inclusão e que sua capacitação adequada pode ser benéfica para essas crianças (HASSANEIN, 2015).
Outra dificuldade vivenciada por professores, conforme sugerem Lemos, Salomão e Agripino-Ramos (2014), é a de que não conseguem realizar observações e intervenções diferenciadas com relação aos alunos com TEA por terem de atender a todos os outros alunos neurotípicos que também demandam sua atenção. O estudo desses autores faz uma análise quantitativa dos comportamentos de interação entre professor e aluno, comportamentos como observar, apontar/mostrar, gesticular, apoio físico, modelo, demonstração de afeto, diretivo de atenção e instrução, troca de informação e feedback, bem como os comportamentos responsivos da criança para com o professor e o ambiente que o cerca. Os resultados demonstraram que as crianças com TEA apresentaram maior frequência nos comportamentos de olhar pessoas, iniciativa dirigida à ação, resposta adequada e sorriso, diante da mediação das professoras por meio de diretivos linguísticos e apoio físico.
Algumas das maiores dificuldades enfrentadas pelos professores num contexto de inclusão são as estruturas físicas, recursos materiais e humanos e qualificação específica para essa modalidade de ensino - os professores muitas vezes não são preparados para lidar com essas crianças. Existem também as questões comportamentais, por exemplo, no autismo, os comportamentos estereotipados e disruptivos (PIMENTEL; FERNANDES, 2014).
Outros focos de estudo foram as atitudes e o papel do professor diante do processo de inclusão, a possibilidade de desempenhar um papel de agente facilitador e mediador desse processo. Os estudos de Crochík et al. (2009) e Özer et al. (2012) se dedicaram a esse objetivo - ambos não delimitam se a escola em questão é da rede pública ou privada, nem trazem os dados com relação à idade das crianças, apenas sobre a idade dos professores. Crochík et al. (2009) analisam variáveis como a posição perante a inclusão, bem como seus benefícios e prejuízos, percepção do professor sobre a relação entre as crianças com DI e as crianças neurotípicas, as condições necessárias para a implementação da inclusão, limite de alunos em sala de aula, necessidade de especialização do professor ou de um profissional de apoio e os principais objetivos da inclusão. Özer et al. (2012) conduziram um estudo sobre os comportamentos dos professores num contexto de inclusão, fazendo um comparativo entre professores de diferentes idades, e revelou que aqueles com menos experiência profissional tiveram atitudes mais favoráveis perante os alunos com DI do que os professores com maior tempo de experiência.
Conforme pode ser visto, as pesquisas evidenciaram a importância dessa relação estabelecida entre professore-aluno e, além disso, descreveram o papel do professor como mediador para a adaptação da criança e desenvolvimento de habilidades sociais, autoconfiança, autoestima e outras competências emocionais (MATSUSHIMA; KATO, 2015).
CONCLUSÃO
A revisão da literatura evidenciou a relevância do papel do professor e da relação que este estabelece com a criança com transtorno do neurodesenvolvimento num contexto de inclusão. As maiores barreiras para a inclusão adequada foram a falta de capacitação dos professores no que tange aos conhecimentos sobre as limitações da criança, bem como o manejo adequado dos comportamentos disfuncionais. Outra dificuldade foi a ausência de profissionais suficientes, pois um único professor pode não ser o bastante para o número total de crianças em sala de aula quando existe um aluno com NEE, que demanda maior atenção e cuidado. Assim, muitas vezes pode haver a necessidade de um paraprofissional que auxilie a criança mais atentamente com as questões acadêmicas, sociais e comportamentais.
Em termos práticos, é extremamente relevante que haja iniciativas para conscientização e capacitação desses profissionais, não apenas nacionalmente, como também em muitos países onde essas informações se revelam deficitárias.
A literatura científica ressalta que a falta de conhecimento sobre esses quadros de desenvolvimento atípico são os principais obstáculos para uma inclusão efetiva, capaz de oferecer a essas crianças meios para um melhor desenvolvimento de habilidades - sociais, acadêmicas, autoestima, autoconfiança - e outras competências emocionais. Pesquisas futuras podem ser feitas com um enfoque mais experimental, atuando com conscientização e capacitação no ambiente escolar, ou até mesmo com professores em formação.
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Recebido em: 16.08.2018
Aprovado em: 04.09.2018