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Psicologia em Revista

versão impressa ISSN 1677-1168

Psicol. rev. (Belo Horizonte) v.14 n.2 Belo Horizonte dez. 2008

 

ARTIGOS

 

Relacionamento interpessoal e mídia: as amizades no Castelo Rá-tim-bum

 

Interpersonal relationships and media: friendships in Castelo Rá-tim-bum

 

Relación interpersonal y los medios de comunicación: las amistades en el Castelo Rá-tim-bum

 

 

Luciana Teles Moura*; Agnaldo Garcia**

 

 


RESUMO

Este trabalho teve por objetivo investigar alguns aspectos das amizades (rede de amigos, similaridade, atividades compartilhadas, comunicação, cooperação, apoio social, intimidade, aspectos afetivos, conflito, agressividade e competição) das personagens centrais do Castelo Rá-tim-bum. O conteúdo de 20 episódios foi analisado e classificado a partir de categorias pre-estabelecidas e os dados obtidos foram comparados com a literatura científica sobre amizade na infância. Os resultados indicaram uma rede de amigos mais restrita e diversificada em relação a gênero, idade e etnia do que as observadas na vida real. Aspectos positivos de atividades compartilhadas, comunicação, cooperação, apoio social e aspectos afetivos e cognitivos são realçados no programa, indicando a idealização da amizade. Por outro lado, possíveis aspectos negativos como conflito, agressividade e competição estão praticamente ausentes. Pode-se concluir que a série apresenta a amizade como algo idealizado, contribuindo para o estabelecimento de um ideal de amizade pelas crianças que o assistem.

Palavras-chave: Amizade, Relacionamento interpessoal, Crianças, TV.


ABSTRACT

This study aimed at investigating some aspects of friendship (friend network, similarity, shared activities, communication, cooperation, social support, intimacy, emotional aspects, conflict, aggressiveness and competition) in the main characters of Castelo Rá-tim-bum. The content of 20 episodes was examined and classified according to pre-established categories, and the data were compared with those of the scientific literature on friendship in childhood. Results showed a narrower although more diversified friend network regarding gender,age and ethnicity than those observed in real life. Positive aspects of shared activities, communication, cooperation, social support, as well as emotional and cognitive aspects are highlighted in the show, indicating the idealization of friendship. On the other hand, possible negative aspects such as conflict, aggressiveness and competition are practically absent. It was concluded that the show presents an idealized form of friendship, which may contribute to the establishment of an ideal of friendship in children who watch it.

Keywords: Friendship, Interpersonal relationships, Children, TV.


RESUMEN

El objetivo del estudio fue investigar aspectos de la amistad (red de amigos, similitud, actividades compartidas, comunicación, cooperación, apoyo social, intimidad, aspectos emocionales, conflictos, agresividad y competencia) de los personajes centrales del Castelo Rá-tim-bum. El contenido de 20 episodios fue examinado y clasificado según categorías preestablecidas y los datos fueron comparados con la literatura científica sobre la amistad en la infancia. Los resultados mostraron una red de amigos más reducida pero más diversificada con respecto a sexo, edad y origen étnico que las observadas en la vida real. Aspectos positivos de las actividades compartidas, comunicación, cooperación, apoyo social y aspectos emocionales y cognitivos se destacan en el programa, indicando la idealización de la amistad. Los posibles aspectos negativos como conflictos, agresividad y competencia son prácticamente ausentes. Se llegó a la conclusión de que la serie presenta una amistad idealizada que puede contribuir para establecer un ideal de amistad en los niños que la ven.

Palabras clave: Amistad, Relaciones interpersonales, Niños, TV.


 

 

Amizade na infância

Uma série de estudos tem contribuído para o conhecimento da amizade na infância, incluindo meta-análises (Newcomb & Bagwell, 1995), coletâneas de estudos (Bukowski et al., 1996) e revisões da área (Garcia, 2005) que indicam que as crianças se comportam diferentemente com amigos e não-amigos (Simpkins & Parke, 2002). Segundo Garcia (2005), entre as dimensões investigadas nas amizades da infância estão similaridade, cooperação, apoio social, competição, conflito e agressividade.

A similaridade é uma dimensão central da amizade e inclui semelhanças em características demográficas (como idade e gênero), no status sociométrico, no comportamento agressivo e desempenho acadêmico (Kupersmidt et al.,1995, Haselager et al., 1998). Outras dimensões se referem a processos psicossociais entre amigos, como cooperação, competição e apoio social. A cooperação entre amigos estimula a criatividade (Miell & MacDonald, 2000), mas amizades também incluem competição (Tomada, 2000) e amigos chegam a competir mais acirradamente que não-amigos (Fonzi et al., 1997). A amizade também influencia o comportamento prossocial em relação à outra criança, predispondo-a à ação (Sebanc, 2003). Ao lado da família, os amigos representam uma importante fonte de apoio social para as crianças (Reid et al., 1989), particularmente de apoio emocional (Booth et al., 1998), inclusive em situações estressantes (Prinstein et al., 1996)

Conflito e agressividade também fazem parte das amizades. Contudo, amigos agem de forma diferenciada de não-amigos na negociação de conflitos (Fonzi et al., 1997) e em relação à agressividade (Brendgen et al., 2002). Esta geralmente é percebida como um fator de distanciamento, dificultando o estabelecimento de amizades entre as crianças (Phillipsen et al., 1999). Por outro lado, crianças agressivas se atraem mutuamente (Ray et al., 1997).

Os aspectos cognitivos investigados nas amizades se referem ao processamento de informação, desde a percepção social (Barry & Wigfield, 2002), conceito e expectativas de amizade (Ray & Cohen, 1996), compreensão social (McElwain & Volling, 2002), até avaliação da relação com o amigo (Meurling et al., 1999). Do lado afetivo, a amizade tem sido considerada importante para o desenvolvimento emocional (Salisch, 2001).

Outros estudos privilegiam o desenvolvimento da amizade, desde sua fase inicial, a manutenção e um possível término. Entre os fatores que influenciam a escolha de amigos, estão gênero e etnia (Graham et al., 1998), sendo o gênero usualmente considerado a maior influência. Maior estabilidade tem sido atribuída a uma melhor qualidade de comunicação, o que facilitaria a resolução de conflitos (Schneider et al., 1997). Apesar do sentimento de perda e tristeza, o término de uma amizade apresenta consequências positivas, como abrir novas possibilidades de relacionamento (Parker & Seal, 1996). Amizades ocorrem dentro de redes sociais complexas, incluindo a criança, seus pares e amigos, além de familiares e outras pessoas. As pesquisas sobre a amizade infantil cobrem desde aspectos pessoais da criança (Tani, 2000) até as redes de amigos, desde díades (Vaughn et al., 2001), tríades (Lansford & Parker, 1999) até redes mais amplas (Salisch & Seiffge-Krenke, 1996). Essas redes estão ligadas ao ambiente escolar ou estão fora da escola (Smith, 1995). O melhor amigo é comumente encontrado na infância (Ray et al., 1995). Mesmo crianças pequenas reconhecem a amizade como a parte mais importante da vida (Trevisan, 2006). As crianças também consideram seus animais de estimação como amigos (Merizio & Garcia, 2005). Em suma, a amizade promove um contexto positivo para o desenvolvimento social, emocional e cognitivo, ocupando um lugar central na vida das crianças.

 

O Castelo Rá-tim-bum e o relacionamento entre crianças nos programas infantis

Segundo (Linn, 2006), as crianças brasileiras entre quatro e 11 anos passam uma média de 4h51min19s por dia na frente da tevê. Isso dá a elas o primeiro lugar mundial em consumo de mídia televisiva, passando cerca de 33 horas semanais com a tevê contra 23 horas em que estão na escola. A televisão ainda inspira 35% dos brinquedos produzidos no Brasil, um mercado que, em 1997, chegou a 180 milhões de unidades (Pereira Júnior, 2002). Alguns personagens de desenhos animados se transformaram em um grande filão econômico e viraram diferentes produtos (Brito, 2005).

Quanto à programação educativa infantil, Carvalho (2007) defende que o grande desafio dos programas educativos para crianças é ser tão atrativo e interessante quanto um programa que visa unicamente ao entretenimento, ao mesmo tempo em que transmite informações em condições semelhantes à aula de um bom professor. A mesma autora cita programas em que é permitido às crianças brincar, fantasiar, sonhar e aprender, destacando, entre eles, o “Castelo Rá-tim-bum”, que estreou na TV Cultura em 9 de maio de 1994. No primeiro ano de exibição, a série alcançou picos de 18 e média de 12 pontos de audiência em horário noturno e ameaçou a liderança de grandes redes de comunicação televisiva (Carneiro, 1999). Nenhuma outra atração de emissoras educativas alcançou índices similares de audiência.

O castelo foi o principal local onde as histórias foram mostradas. Cardoso (2006) investigou os cenários do programa e concluiu que os espaços foram projetados incorporando elementos de expressão artística, como o artesanato, que visavam a produzir uma atmosfera mágica vinculada ao universo infantil ao mesmo tempo em que registravam um espaço de caráter educativo. Muitos dos objetos que compunham os cenários, como telefone, relógio e televisão, lembravam muito mais brinquedos feitos com sucata do que objetos concretos como os que existem nas residências reais. Além disso, o excesso de formas, texturas, linhas e de objetos amontoados em um único ambiente contribuíam para reconhecer o propósito lúdico e educativo do programa e também geravam identificação com as crianças, que podiam enxergar na aparente “bagunça” do castelo um pouco de suas próprias vidas, espaços e bagunças. Havia dois tipos de cenários: os destinados às narrativas principais e os reservados para os quadros educativos. Ao mesmo tempo em que os produtores utilizaram cenários representando ambientes tradicionais de residências comuns, como quartos, salas e cozinhas, incorporaram também espaços que só existiam na perspectiva ficcional fantástica do programa, como passagens secretas.

A proposta dos criadores do Castelo Rá-tim-bum era desenvolver um programa para a faixa etária entre 4 e 10 anos, criando uma narrativa principal (uma história ficcional) com a inserção de quadros pedagógicos. Na visão de Carneiro (1998), o programa não se enquadrou no modelo clássico de programa educativo; constituiu-se, sim, em entretenimento educativo, procurando divertir e ensinar. Incorporou uma proposta pedagógica a um formato quase comercial. Buscando a tradição de ensinar contando histórias, o programa utilizou recursos típicos de outras mídias, como cinema, literatura, artes plásticas, rádio, música, dança e teatro, para citar apenas algumas. Apresentou ainda alguns dos elementos classificados por Machado (1999) como típicos do gênero ficcional televisivo: dramaticidade, humor, ritmo acelerado em algumas cenas, participação de elementos fantásticos, caracterização das personagens por meio de maquiagem e figurino, preocupação cenográfica, iluminação cuidadosa e uso de efeitos especiais e de computação gráfica.

Segundo Carneiro (1998), a série seguiu um esquema narrativo próximo ao das telenovelas pela longa temporalidade (90 capítulos), mas sem continuidade entre os episódios. Almeida (2004) destaca que o nome “Rá-tim-bum” no título da série procurou incorporar um conceito de griffe, vinculando os produtos infanto-juvenis da emissora, muito embora o antecessor do Castelo Rá-tim-bum (simplesmente “Rá-tim-bum”) e o sucessor (Ilha Rá-tim-bum) não tivessem relação entre conteúdo ou personagens.

Apesar de o Castelo Rá-tim-bum e a “Ilha Rá-tim-bum” terem sido objetos de discussão (Carneiro, 1999, Almeida, 2004), os relacionamentos entre seus personagens ainda não foram investigados. No caso da “Ilha Rá-tim-bum”, Almeida (2004) apontou para a divergência entre a intenção manifesta pelo enunciador e a intencionalidade presente no enunciado. Enquanto os valores buscados se referiam a pacifismo, amizade, valorização da vida, bom humor, solidariedade, coragem, conservação do meio, troca de experiências e leitura, os valores realizados incluíam violência, morte, traição, magia, medo e amoralidade.

De modo semelhante, a despeito de reflexões sobre programas infantis na tevê brasileira (Brito, 2005, Campos & Souza, 2003), a questão do relacionamento interpessoal tem sido pouco investigada. Mesmo no contexto internacional, as poucas pesquisas sobre relacionamentos interpessoais de crianças nos programas de tevê têm enfatizado a publicidade. Larson (2001) analisou as atividades e interações de meninos e meninas em 595 comerciais com crianças na programação infantil. A atividade primária era o brincar não criativo, com considerável violência e agressão. As interações eram cooperativas, competitivas, paralelas ou independentes. As atividades incluíam brincar/divertir-se, comer e jogar, entre outras. Trinta e cinco por cento dos comerciais apresentavam alguma forma de agressão física ou verbal (somente entre meninos). O número de meninos e meninas em comerciais era próximo. Comerciais somente com meninas se davam mais em ambiente doméstico, e aqueles com meninos, em ambientes de mais aventura.

Outros autores observaram relações de gênero ou raciais nos comerciais com crianças. Furnham (1997) relatou estereótipos de gênero nas propagandas de tevê para crianças nos EUA e Grã-Bretanha. Larson (2002) identificou diversos traços positivos, incluindo a presença de diversidade racial e crianças de diferentes etnias interagindo e comunicando-se de modo positivo em comerciais de tevê na programação infantil.

Moura e Garcia (no prelo) analisaram a natureza dos relacionamentos interpessoais entre crianças retratadas em comerciais de televisão veiculados por uma emissora de tevê por assinatura destinada ao público infantil. Os comerciais enfatizavam o lado positivo dos relacionamentos. Episódios de conflito e competição eram tratados com leveza e bom humor. Os autores concluíram que os relacionamentos presentes nos comerciais poderiam servir de referência para os relacionamentos da criança. Assim, a tevê afetaria os relacionamentos da criança de duas formas: retirando-a do convívio com pares e familiares e pelas relações interpessoais que ela assiste.

O objetivo deste trabalho foi analisar algumas dimensões das amizades (rede de amigos, similaridade, atividades compartilhadas, comunicação, cooperação, apoio social, intimidade, aspectos afetivos, conflito, agressividade e competição) de Nino, Zequinha, Biba e Pedro, personagens infantis centrais do Castelo Rá-tim-bum, e compará-las com as amizades reais, conforme a literatura da área. Apesar de Nino ser interpretado por um ator adulto, a série o retrata como um menino.

 

Metodologia

Material de análise – O programa infantil Castelo Rá-tim-bum, criado por Flávio de Souza e Cao Hamburguer, consta de 90 episódios produzidos de 1994 a 1997. Ainda hoje é transmitido por 25 canais na América Latina (incluindo o Brasil) e na Península Ibérica. A narrativa gira em torno de Nino, um garoto de 300 anos, que faz amizade com Pedro, Biba e Zequinha.

No castelo, ainda vivem os tios de Nino, Victor e Morgana, seus animais de estimação e seres estranhos. Outros amigos vêm eventualmente brincar com Nino: Caipora, um ser folclórico; Etevaldo, um extraterrestre; Bongô, um entregador de pizza. Além destes, tipos especiais também participam dos episódios, como relógios, quadros e sapatos mágicos, fadas e animais de várias espécies e tamanhos, interpretadas por atores ou bonecos animados. O vilão é o doutor Abobrinha (Pompeu Pompílio Pomposo), um corretor imobiliário cujo maior desejo é construir, no terreno do castelo, um prédio de cem andares. A série se desenrola em um castelo em uma região urbana, cercado de prédios modernos, próximo à cidade de São Paulo. O programa está dividido em blocos, e uma história completa com um tema específico é contada a cada episódio. Em média, seis quadros pedagógicos são inseridos em cada episódio, três em cada metade do programa, dividido ao meio por um intervalo comercial. Os 90 episódios não têm continuidade. A maioria registra acontecimentos que se passam em um único dia, sendo raras as passagens de tempo ultrapassando algumas horas.

Procedimento de análise – Foram analisados 20 dos 90 episódios produzidos do programa Castelo Rá-tim-bum (em DVD), com duração aproximada de 25 minutos cada. Os programas analisados foram escolhidos aleatoriamente por causa de sua disponibilidade, incluindo episódios produzidos ao longo dos três anos em que a série foi produzida. Os 20 programas foram assistidos, e as cenas referentes ao relacionamento de qualquer uma das quatro personagens centrais (Nino, Pedro, Biba e Zequinha) com um ou mais amigos foram identificadas, selecionadas e catalogadas, e seu conteúdo foi analisado quanto aos aspectos pre-estabelecidos. Foram analisadas 164 cenas em que as personagens indicadas apareceram em conjunto. As cenas foram analisadas de acordo com um roteiro de observação com os seguintes pontos com base em Hinde (1997): (1) rede de amigos: número, gênero e idade dos amigos; (2) similaridade entre amigos: física (como características físicas e vestes) e comportamental (similaridade de ações e preferências); (3) atividades compartilhadas; (4) comunicação: conteúdo e forma; (5) cooperação: objeto da cooperação e formas de cooperar; (6) apoio social: concreto, informacional e emocional; (7) intimidade: autorrevelação e privacidade; (8) aspectos afetivos: manifestações de caráter afetivo e emocional; (9) conflito, agressividade e competição: origem, evolução e desfecho de situações envolvendo conflitos, agressividade e competição. Finalmente, as amizades no programa foram comparadas com dados disponíveis na literatura sobre a amizade na infância indicando convergências e divergências entre o produto cultural e relacionamentos reais.

 

Resultados

Os resultados são apresentados em nove itens: (1) rede de amigos; (2) similaridade; (3) atividades compartilhadas; (4) comunicação; (5) cooperação; (6) apoio social; (7) intimidade; (8) aspectos afetivos; e (9) conflito, agressividade e competição

1. Rede de amigos – Nino, Biba, Zequinha e Pedro formam a rede central de amigos da série. Estes três últimos já aparecem como amigos no início do primeiro episódio, na escola, brincando com outras crianças e indo embora juntos. Nino é um menino solitário que mora em um castelo com seus tios e alguns seres fantásticos. No primeiro episódio, seus tios lamentam que Nino não consiga se matricular em nenhuma escola (devido à idade), não podendo fazer amizade com outras crianças. Para atrair crianças ao castelo, Nino enfeitiça a bola de Zequinha. A partir do primeiro encontro, as quatro personagens centrais formam o núcleo da rede de amigos que se encontra para brincar nos demais 89 episódios. A rede se completa com personagens secundárias, como Etevaldo (um extraterrestre), Caipora (ser folclórico) e Bongô (um entregador de pizza), que participam esporadicamente dos episódios, porém sem se encontrarem. Outras personagens também são tratadas como amigos pelos personagens centrais: tio Victor, Mau, Godofredo, Gato Pintado, Celeste, e Tap e Flap, seres animados que moram no castelo.

2. Similaridade entre amigos – As personagens apresentam características físicas diversas. Há personagens masculinos e femininos, de diferentes etnias e idades. Nino, um menino de 300 anos, Caipora e Etevaldo são criaturas fantásticas. Biba (8 anos), Pedro (10) e Zequinha (6) são crianças típicas. Bongô possivelmente é adolescente, pois estuda e trabalha. A maior semelhança física entre os personagens está em suas vestes coloridas de retalhos. Em um episódio, Nino veste um fraque e se encanta com o novo traje e resolve tornar-se adulto para parecer mais importante, distanciando-se dos outros, retomando as vestes usuais ao final do episódio.

Por outro lado, a similaridade comportamental (de ações, reações, gostos, preferências, entre outros) é marcante. Todos apresentam comportamento infantil (gostam de brincar, são criativos, curiosos e alegres). Compartilham gostos e preferências, pela arte, comida, brincadeiras e pessoas. Gostam de dançar, brincar, jogar, realizar atividades artísticas e ouvir histórias. Reagem de modo semelhante aos acontecimentos, muitas vezes respondendo em uníssono com a mesma frase e expressão facial. Compartilham o interesse pela fotografia, botânica, folclore, animais selvagens, robôs e viagens interplanetárias, entre outros. Todos gostam de samba, literatura, animais, plantas, da natureza, de ir à praia ou passear em lugares interessantes. Apresentam opiniões e preocupações comuns.

3. Atividades compartilhadas – Em todos os episódios observados, Biba, Zequinha e Pedro chegam ao castelo juntos, depois da escola. Quando Nino não está esperando os amigos à porta, estes o procuram juntos. Após o encontro e as saudações iniciais, começam as atividades, principalmente brincar. No primeiro episódio, Nino convida as crianças a voltarem todos os dias para brincar com ele. As personagens secundárias, que, por vezes, aparecem, envolvem-se nas diversas brincadeiras. Algumas atividades se davam com os brinquedos (quase sempre de Nino): jogo de damas, boliche, granada de guerra, tiro ao alvo, binóculos, malabares, bolas de gude, quebra-cabeça e seus inventos. Ainda faziam imitações de animais, robôs, sementes nascendo e plantas, pessoas em uma praia, pessoas andando no centro de uma grande cidade e veículos no trânsito. Brincavam também de jogos como adivinhações, charadas, formulação de histórias e leitura de livros, palavras enigmáticas e “pedra, papel e tesoura”. Até atividades de caráter artístico viravam brincadeira: pintura, desenho, construção de maquetes, projetos, ou da elaboração de textos e poesias. A maioria das brincadeiras teve como cenário o próprio castelo, em cômodos diferentes. Apesar de a série envolver personagens com poderes especiais, suas brincadeiras foram semelhantes às das crianças comuns. Em apenas quatro cenas, as personagens com tais poderes utilizaram-no na brincadeira.

Outras atividades compartilhadas foram comer, conversar, dançar, cozinhar, cuidar de um bebê, plantar e colher, observar quadros, imagens, teatros de marionetes e dançar. De modo geral, tudo que era realizado pelas crianças ou por Nino se transformava em algo coletivo. As atividades de higiene pessoal (lavar as mãos e escovar os dentes) e os momentos de descanso também eram compartilhados. Mesmo que a tarefa coubesse a apenas uma personagem (como quando Nino inventava algo, ou Biba cozinhava), as demais permaneciam juntas. Até nas fotos, posavam juntas.

4. Comunicação – A comunicação entre as personagens era rica e diversificada. Comunicavam-se por linguagem corporal (gestos e expressões faciais) e verbal (oral e escrita). A utilização de gestos foi comum, com total compreensão pelos receptores da mensagem, assim como a comunicação pelo olhar. Diversas vezes, Nino, ao tentar contar uma mentira para seus tios, foi advertido pelo olhar dos amigos. A comunicação por desenhos também foi usada e até história em quadrinhos. Cartas foram empregadas para comunicar-se com amigos ausentes ou para facilitar a revelação de uma notícia difícil. A linguagem oral foi o meio mais utilizado. Neste caso, foram usadas figuras de linguagem, comparações, indiretas e até o uso original de determinadas palavras. Ainda foram explorados elementos paralinguísticos nas conversas, como pausas e entonações especiais. Quando queriam conversar mais reservadamente ou compartilhar sentimentos que não deveriam ser do conhecimento de todos, cochichavam.

Os temas das conversas concentravam-se em torno dos próprios acontecimentos dos episódios, incluindo informações sobre algum fato relevante. Quem mais recebeu informações foi Zequinha (mais jovem), Etevaldo e Caipora. Conselhos eram motivados por algum problema ou comportamento inadequado. A principal “conselheira” foi Biba, possivelmente por ser menina e assumir funções maternais. Tio Victor participou de alguns diálogos com Nino e seus amigos e fez recomendações a todos. Como a principal atividade foi brincar, muitos diálogos se davam em torno das brincadeiras, com descrições das dinâmicas e regras, avaliações de desempenho dos participantes, organização dos espaços e troca de impressões ou avaliações ao longo da realização da atividade. Outros temas ainda explorados nas conversas foram o mundo dos bruxos, invenções de Nino e Tio Victor, e a criação e narração de histórias.

5. Cooperação – Em diversos episódios, Biba, Zequinha, Pedro, Nino, Etevaldo, Caipora e Bongô cooperaram em uma tarefa coletiva ou na resolução de um problema. Em todas as situações de cooperação havia no mínimo quatro personagens (Biba, Pedro, Zequinha e Nino) e os resultados beneficiaram ao menos parte do grupo. Em alguns casos, houve liderança, geralmente de Nino, Bongô ou Biba. A cooperação tinha início com a chegada das crianças ao castelo, realizando uma tarefa ou descobrindo uma senha para ter acesso ao seu interior. Também cooperavam na arrumação do castelo, no preparo das refeições, na arrumação da mesa para o lanche ou jantar, na escolha de nomes, na construção de maquetes, no cuidado com as plantas, entre outros. A cooperação para resolver problemas decorreu de desafios lançados. As histórias decorriam de um acontecimento central em torno do qual as personagens precisavam se unir para superar alguma dificuldade ou resolver um mistério. Alguns episódios também foram construídos a partir de um problema inicial e sua resolução. Em alguns momentos, o grupo cooperava para apoiar um de seus membros.

A cooperação resultou em soluções criativas, fortaleceu os vínculos e promoveu o companheirismo. Os resultados almejados sempre foram alcançados e se envolveram em atividades positivas, construtivas. Não houve indícios de trapaças entre as personagens. Quando Nino planejava mentir para evitar broncas, sempre era advertido a falar a verdade.

6. Apoio social – O apoio entre amigos foi recorrente. Nos programas analisados, foram registradas 103 manifestações de apoio. O apoio instrumental foi o mais comum (51 manifestações), seguido pelo informacional (27) e emocional (19). As personagens eram muito solícitas, dispostas a ajudar e se alternavam em solicitar e dar apoio. Nino foi quem mais precisou de apoio, especialmente instrumental e emocional. Biba mostrou a maior disposição de ajudar, talvez pelo papel feminino.

O apoio instrumental permitiu a resolução de um problema, dificuldade ou necessidade de alguma personagem. Foi fornecido por uma personagem ou por um grupo de amigos. Todos, ao menos uma vez, demandaram apoio instrumental, inclusive os adultos e animais do programa. Zequinha apareceu como a segunda personagem que mais precisou de apoio instrumental, especialmente para a realização de tarefas incompatíveis com o seu tamanho, como subir e descer em muros e escadas altas ou mesas. Zequinha, por ser o mais jovem, e Etevaldo, por ser de outro planeta, foram os que mais demandaram apoio informacional na forma de explicações e demonstrações. A necessidade constante de fornecimento de apoio informacional a Zequinha deu origem a diversos quadros educativos para explicar o significado das palavras ou descrever fenômenos da natureza.

O apoio emocional deu-se com menor frequência. Nino era frequentemente consolado em seus momentos de crise. Os amigos se mantinham ao seu lado, o estimulavam e aconselhavam, amenizando suas frustrações. Todos apoiaram de modo mais grupal do que individual. Zequinha também recebeu apoio emocional dos amigos. Ao descrever sua indignação com os colegas da escola, que não o deixavam jogar futebol por seu tamanho, foi apoiado pelos amigos, que o aconselharam também a ter paciência e esperar o momento certo para que pudesse crescer e tornar-se um grande jogador.

7. Intimidade – A intimidade, entendida como a revelação de conteúdos pessoais, é um traço da amizade que tem início na infância, mas se desenvolve especialmente na adolescência. Foram poucas as revelações pessoais. Nino, como personagem central, compartilhou com os amigos mais fatos sobre sua vida, preferências e família. Caipora também falou um pouco sobre si. Os demais fizeram poucas referências a suas vidas. Bongô não escondia de Morgana e Zequinha o medo e a frustração por ser pequeno e impedido, pelos meninos de sua escola, de jogar futebol. Caipora revelou seu arrependimento por ter magoado Nino e expressou o desejo de retratar-se. Nino confidenciou, depois de uma briga com Caipora, que estava com saudades da amiga. Por duas vezes, as personagens não apenas falaram algo sobre si, mas também mostraram objetos pessoais. Nino levou as crianças para conhecer seu quarto, brinquedos,seu laboratório secreto e seus inventos. Zequinha mostrou sua merendeira e seu lanche. Essas foram as únicas aparições de objetos e propriedades pessoais apresentadas aos amigos. Atividades de higiene, como escovar os dentes e lavar as mãos eram compartilhadas sem constrangimento.

8. Aspectos afetivos da amizade – Biba, Zequinha, Pedro, Nino, Caipora, Etevaldo e Bongô tratam-se como amigos e valorizam a amizade e os amigos por manifestações verbais e comportamentais de apreço. A principal emoção resultante dos encontros foi a alegria. Os momentos de despedida eram cercados de lamentações e promessas de um breve reencontro. As crianças reconheciam e expressavam com facilidade suas emoções em relação aos amigos, declarando-se felizes, tristes, chateados ou com saudade. Na maioria das vezes, as expressões foram positivas, como gostar muito de todos, estar com saudades, ficar feliz com o reencontro ou por ajudar, entre outras. As sete personagens expressaram aos demais alguma consideração positiva sobre o que sentia. Caipora e Biba foram as que mais se manifestaram verbalmente aos outros. Nino também foi relativamente expressivo.

Mas existiram também manifestações verbais de desagrado, ressentimento e tristeza entre os amigos, por parte de Nino em relação a Caipora e desta em relação a Nino. As crianças também se ressentiram com Caipora, mas, com medo de magoá-la, não se manifestaram verbalmente. As crianças se chatearam depois que Nino quis fazer-se de adulto. Eles se mostraram tão decepcionados com o amigo, que disseram que iriam embora e não voltariam mais. No final, Nino se arrependeu e todos fizeram as pazes.

Os vínculos entre as personagens também eram visíveis pelo contato físico. Em várias cenas, abraçaram-se, deram as mãos, ofereceram colo ou aconchego, especialmente as meninas. Biba e Caipora trocaram abraços no reencontro, permaneceram abraçadas por vezes durante os diálogos e até andaram de mãos dadas. O abraço também marcou a reconciliação depois de brigas e reações ao medo. Especialmente Zequinha procurava o abraço quando se sentia em perigo, correndo, por exemplo, para os braços de Pedro quando viu Nino disfarçado de fantasma.

A estima pelos amigos foi demonstrada nas preocupações e cuidado pelos que precisavam de ajuda. Ao ver que Nino não passava bem, seus amigos ficaram ao seu lado. Quando Zequinha sumiu no castelo, Pedro saiu à sua procura. Zequinha dividiu seu sanduíche com todos do castelo. Biba fez uma macarronada para o Nino quando ele estava com fome. Quando Zequinha virou um bebê, seus amigos cuidaram dele com paciência, oferecendo carinho, conforto e atenção. Zequinha, por ser o mais novo, era tratado com mais consideração e paciência. Salvo quando começava uma sessão interminável de “porquês”, ao qual respondiam em coro: “Porque sim, Zequinha!”.
A amizade é retratada como o maior motivo de alegria para Nino, que avaliou sua amizade com as três crianças como superior a qualquer outra.

9. Conflito, agressividade e competição – Houve poucas situações de conflito, que eram momentâneos, sem gravidade e rapidamente resolvidos. Os motivos para os conflitos foram: (a) opiniões discordantes entre os amigos, como possíveis temas de livros que seriam interessantes; (b) disputa por objetos (equipamento de mergulho); (c) irritação provocada por algum comportamento de uma personagem (excessivas perguntas de Zequinha); (d) ser alvo de riso (Zequinha se irritou com os amigos ao rirem dele); (e) implicância entre as crianças (mais os meninos, especialmente Nino e Caipora); e, principalmente, (f) divergências nos momentos de brincadeira. O conflito sempre era retratado de forma sutil, com humor e efeitos sonoros especiais. A maioria aconteceu nas brincadeiras e foram circunstanciais, sendo resolvidos com humor (associado a efeitos sonoros e expressões fisionômicas).

Não havia personagens agressivos, nem mesmo o Doutor Abobrinha, vilão da série. As duas situações de maior agressividade envolveram Nino e Caipora. Nino ficou extremamente zangado e chamou Caipora de “chata”, “monstro guloso”. Ela, ofendida, respondeu que iria embora para nunca mais voltar. No entanto, Nino se arrependeu e se desculpou, dizendo o quanto ela era importante, uma amiga muito amada. Caipora também se arrependeu, e os dois se reconciliaram. Em outro episódio, Nino agiu agressivamente com relação a Caipora, Zequinha, Pedro e Biba, ao decidir que não seria mais criança, trocando de roupas e mudando o modo de relacionar-se com eles. Não queria mais outras crianças e bagunça pelo castelo. Ao encontrar os quatro amigos brincando em seu quarto, Nino ficou muito zangado. Os amigos se surpreenderam com o tratamento e se foram. Logo Nino se arrependeu e sentiu falta dos amigos. No final, todos voltaram a brincar felizes e unidos.

Nenhuma situação de competição foi observada envolvendo as personagens centrais ou secundárias. Foram observadas cenas em que as crianças disputavam algum jogo (damas ou bolinhas de gude), mas os diálogos apenas evidenciaram prazer na atividade, sem qualquer caráter competitivo.

 

Discussão

Comparando-se a estrutura e o funcionamento das amizades no programa com os dados da literatura científica sobre o tema, várias observações podem ser feitas. Apesar de as dimensões investigadas nas amizades na infância estarem presentes, como similaridade, cooperação, apoio social, conflito e agressividade (Garcia, 2005), sua ocorrência parece diferir da esperada em amizades reais. Em geral, há uma forte tendência de idealização, especialmente na estrutura da rede de amizades, na ênfase em aspectos prossociais e na quase inexistência de aspectos conflituosos ou agressivos. Essa idealização dos relacionamentos também foi observada por Moura e Garcia (no prelo) em comerciais de televisão para crianças.

Geralmente as amizades são investigadas em díades (Vaughn et al., 2001). No programa, contudo, as cenas comumente envolvem redes mais amplas de amigos (Salisch & Seiffge-Krenke, 1996). Como observado na vida real, essas redes envolvem outras crianças do ambiente escolar e vizinhança (Smith, 1995). Contudo, não é possível encontrar a figura de um melhor amigo, o que ocorre nas amizades reais (Ray et al., 1995). A rede de amigos se mostra idealizada em sua composição ao incluir crianças com idades, gêneros e etnias diferentes, adultos e seres fantásticos, enquanto a literatura tem indicado a similaridade de gênero e etnia (Graham et al.,1998).

A similaridade é um aspecto importante das amizades, incluindo semelhanças de idade, gênero, status sociométrico, comportamento agressivo e desempenho acadêmico (Kupersmidt et al., 1995, Haselager et al., 1998). Nesse sentido, é notável a falta de similaridade entre os amigos do seriado, incluindo crianças e adultos, meninos e meninas, humanos e não-humanos. Alguns artifícios parecem ter sido usados para minimizar essa falta de similaridade, como o uso de vestimentas semelhantes por todos. As diferenças também são compensadas por uma forte similaridade comportamental (de ações, reações, gostos, preferências, interesses, opiniões, entre outros), com todos se comportando como crianças (gostam de brincar, correr, dançar e são curiosas). A similaridade comportamental chegou a ser exagerada ao esboçarem as mesmas reações, opiniões, expectativas, desejos e interesses. O brincar foi a principal atividade compartilhada, o que corresponde ao que tem sido observado na vida real (Garcia, 2005). Quase todas as atividades eram coletivas, como comer, conversar, dançar, cozinhar e descansar.

A cooperação entre amigos ocupa um lugar de destaque na série, geralmente envolvendo o grupo, de forma coletiva e integrada (em alguns casos com um líder). Frequentemente as personagens precisavam unir-se para superar alguma dificuldade ou resolver um mistério ou um problema. A cooperação chegou a envolver divisão de tarefas para apoiar um deles e resultava em soluções criativas. Os resultados almejados sempre foram alcançados. Há, assim, uma idealização e supervalorização da cooperação, em sua organização e funcionamento e em seus resultados.

Os amigos representam uma importante fonte de apoio social para as crianças (Reid et al., 1989, Booth et al., 1998). No programa, o apoio social entre amigos foi recorrente e enfatizado. As personagens solicitavam e davam apoio instrumental, informacional e emocional. Ao contrário das amizades reais, as personagens forneceram mais apoio concreto que emocional. Quanto à intimidade, o programa aproxima-se dos dados da literatura, com poucas revelações pessoais.

O programa destacou o valor dado aos amigos, por manifestações verbais, comportamentais e de alegria. Nesse sentido, a literatura também tem apontado altos índices de valorização da amizade e a alegria como a emoção mais associada à amizade (Garcia, 2005, Trevisan, 2006). Nino tinha praticamente tudo: uma grande casa, brinquedos variados, uma família presente e preocupada com ele, mas foram os amigos que trouxeram alegria e realização em sua vida, tornando-se um garoto criativo e de bem com a vida.

A literatura recente sobre as amizades na infância tem reconhecido a presença de conflitos (Fonzi et al., 1997), de agressividade (Phillipsen et al., 1999, Ray et al., 1997) e de competição entre amigos (Tomada, 2000, Fonzi et al., 1997). O programa, contudo, apresenta uma idealização da amizade ao reduzir drasticamente as situações de conflito, minimizando a agressividade e a competição entre amigos. Os conflitos foram leves, momentâneos e rapidamente resolvidos com humor (efeitos sonoros, músicas e expressões faciais engraçadas), seguidos por reconciliação e continuação da amizade. As poucas manifestações agressivas foram verbais e circunstanciais, especialmente da parte de Nino, seguidas de arrependimento, pedidos de desculpa e reconciliação. Nenhuma situação de competição foi observada. O programa parece apontar para uma utopia social baseada na harmonia e na cooperação. Não há a busca de interesses pessoais em jogo. A presença de algum nível de conflito dá um caráter de realidade às amizades sem comprometê-las, no entanto a manutenção de uma ambiência socialmente estável e pacífica parece ser atraente e facilitar a transmissão de conteúdos educativos.A amizade é central para a série permitindo o desenrolar harmonioso da narrativa que embasa os quadros educativos. A importância da amizade também aparece na literatura e crianças chegam a declarar que a amizade é a parte mais importante de suas vidas (Trevisan, 2006).

Comparadas com as amizades reais, as amizades no Castelo se apresentam, em grande parte, idealizadas, com o exagero de características positivas, de harmonia, boa convivência e minimização do conflito e da agressividade. São amizades imutáveis ao longo da série, marcadas pela alegria e pelo brincar constante.

No castelo, não há discriminação de raça, gênero, idade ou situação econômica. Todos os amigos brincam juntos e são felizes. Não há fome, guerra, crime, drogas ou enfermidade. A ganância e o poder financeiro (Dr. Abobrinha) são ridicularizados. A amizade aproxima e interliga as personagens e fundamenta a paz e a integração social. Enfim, tudo se passa em um mundo encantado. A forma como as amizades são retratadas no programa possivelmente sirva de referência para a construção de um ideal de amizade na vida da criança.

 

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*Texto recebido em maio/2008.
Aprovado para publicação em setembro/2008.

 

* Mestre em Psicologia, Universidade Federal do Espírito Santo.
**Doutor em Psicologia, Universidade Federal do Espírito Santo, e-mail: agnaldo.garcia@pesquisador.cnpq.br

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