Serviços Personalizados
Journal
artigo
Indicadores
Compartilhar
Vínculo
versão impressa ISSN 1806-2490
Vínculo vol.15 no.2 São Paulo jul./dez. 2018
https://doi.org/3c79c4f3165443f374c-3358
ARTIGO
DOI - 3c79c4f3165443f374c-3358
Aconselhamento em grupo de apoio psicológico a mães de bebês prematuros: um estudo exploratório
Counseling in a psychological support group for mothers of preterm babies: an exploratory study
Consejería en grupo de apoyo psicológico a madres de bebés prematuros: un estudio exploratorio
Rodrigo Sanches Peres*, I; Manoel Antonio dos Santos**, II
IUniversidade Federal de Uberlândia
IIUniversidade de São Paulo
RESUMO
Os grupos de apoio psicológico se destacam como uma das modalidades assistenciais mais proveitosas diante da necessidade de oferecer suporte emocional a mães de bebês prematuros. O presente estudo teve por objetivo descrever a incidência do aconselhamento enquanto fator terapêutico em um grupo de apoio a mães de bebês prematuros internados na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) de um hospital filantrópico. O corpus de pesquisa foi constituído pelos registros de 10 sessões do grupo, os quais foram submetidos a análises descritivo-exploratórias conduzidas independentemente por dois pesquisadores e, posteriormente, cotejadas quanto à identificação da ocorrência do aconselhamento e seus efeitos benéficos. O aconselhamento foi identificado ao menos uma vez em cada sessão, tendo emergido essencialmente em um contexto de oferecimento ativo de informações, sugestões e orientações. Observou-se que o aconselhamento derivou tanto de intervenções verbais do coordenador quanto de relatos das próprias participantes. Os resultados sugerem que as mães que frequentavam o grupo de apoio em questão valorizavam a troca de experiências, o que potencializava processos de mudança.
Palavras-chave: Grupos de apoio; Processos grupais; Fatores terapêuticos; Prematuridade.
ABSTRACT
Psychological support groups stand out as one of the most beneficial care modalities in face of the need to offer emotional support to mothers of preterm infants. The objective of the present study was to describe the incidence of counseling as a therapeutic factor in a support group for mothers of premature infants admitted to the Neonatal Intensive Care Unit (NICU) of a philanthropic hospital. The corpus of the research was consisted by the records of 10 sessions of the group, which were submitted to descriptive-exploratory analyzes conducted independently by two researchers and, later, compared regarding the identification of the occurrence of and its beneficial effects. The counseling was identified at least once in each session, having emerged essentially in a context of actively offering information, suggestions and guidance. It was noted that counseling derived from verbal interventions by the coordinator and from participants reports. The results suggest that the mothers who attended the support group in question valued the exchange of experiences, which potentiated change processes.
Keywords: Support groups; Group processes; Therapeutic factors; Prematurity.
RESUMEN
Los grupos de apoyo psicológico se destacan como una de las modalidades asistenciales más provechosas ante la necesidad de ofrecer soporte emocional a madres de bebés prematuros. El presente estudio tuvo por objetivo describir la incidencia de la consejería como factor terapéutico en un grupo de apoyo a madres de bebés prematuros internados en la Unidad de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN) de un hospital filantrópico. El corpus de investigación fue constituido por los registros de 10 sesiones del grupo, los cuales fueron sometidos a análisis descriptivo-exploratorias conducidas independientemente por dos investigadores y posteriormente cotejadas para la identificación de la ocurrencia de la consejería y sus efectos benéficos. La consejería fue identificada al menos una vez en cada sesión, emergiendo esencialmente en un contexto de ofrecimiento activo de informaciones, sugerencias y orientaciones. Se observó que la consejería derivó de intervenciones verbales del coordinador y de relatos de las participantes. Los resultados sugieren que las madres que frecuentaban el grupo de apoyo en cuestión valoraron el intercambio de experiencias, lo que potenciaba procesos de cambio.
Palabras claves: Grupos de apoyo; Procesos grupales; Factores terapéuticos; Prematuridad.
INTRODUÇÃO
A gravidez é um evento impactante para a saúde física e mental da mulher, provocando alterações significativas em seu cotidiano. Ao transicionar do papel de filha para o papel de mãe, a mulher enfrenta o desafio de redimensionar sua identidade e, paralelamente às mudanças corporais desencadeadas pela gestação, vivencia experiências que resultam em crescimento pessoal. Ademais, a maternidade fomenta a elaboração de novos projetos para o futuro, o que exige a reorganização dinâmica das relações familiares anteriores à concepção do bebê. Afinal, antes mesmo do nascimento, o bebê já existe subjetivamente no imaginário dos pais (Felice, 2000).
Porém, o parto prematuro – ou seja, aquele que se dá com menos de 37 semanas de gestação – tende a frustrar as expectativas positivas relacionadas ao nascimento do bebê, de modo que pode ser considerado um acontecimento potencialmente desestabilizador para os pais (Favaro; Peres; Santos, 2012). Assim, mães de bebês prematuros frequentemente experimentam sintomas de estresse, ansiedade e depressão, tais como irritabilidade, apreensão, fadigabilidade, anedonia, hostilidade e labilidade afetiva (Harrisson; Magill-Evans, 1996; Doering; Moser; Dracup, 2000; Cunha; Smith; Akerman; Souza, 2017).
Nesse cenário, a saúde mental materna se encontra em risco. Além disso, a adequada formação de um vínculo afetivo consistente entre a díade mãe-bebê se torna mais complexa, o que pode comprometer a qualidade dos cuidados maternos (Padovani; Linhares; Carvalho; Duarte; Martinez, 2004). Não obstante, há que se considerar que os sintomas referidos são potencializados, ao menos em parte, pelo fato de que o bebê prematuro, em sua luta precoce pela sobrevivência, geralmente necessita receber, temporariamente, o amparo de recursos humanos e tecnológicos disponíveis em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN).
Logo, é comum que a mãe de um bebê prematuro demonstre preocupação resultante da incerteza quanto à evolução clínica do recém-nascido e tristeza desencadeada pela separação precoce imposta pela hospitalização, bem como se mostre suscetível ao sentimento de culpa por não ter conseguido manter a gestação até o final (Kennell; Klaus, 1993). O ambiente altamente artificial e tecnocientífico da UTIN, se, por um lado, contribui para dar sustentação a um recém-nascido que vem ao mundo em situação de vulnerabilidade, por outro lado fragiliza o estabelecimento do vínculo inicial mãe-bebê.
Tendo em vista o que precede, torna-se patente a necessidade de oferecer suporte emocional às mães de bebês prematuros. Pesquisadores brasileiros apontam que os grupos de apoio psicológico – também chamados simplesmente de grupos de apoio – se destacam como uma das modalidades assistenciais mais proveitosas nessas circunstâncias adversas ao desenvolvimento saudável do vínculo mãe-bebê, sobretudo por possibilitarem a troca de experiências entre pessoas que enfrentam um problema em comum (Linhares, 2004; Carvalho, 2005). Em uma perspectiva ampliada de saúde, os grupos de apoio usualmente são parte da estratégia de assistência oferecida por serviços especializados, com distintas finalidades de prevenção, tratamento ou reabilitação (Santos; Scorsolini-Comin; Gazignato, 2014).
Contudo, Yalom e Leszcz (2005) advertem que a resolutividade de qualquer modalidade assistencial grupal depende da ocorrência de fatores terapêuticos, ou seja, de determinados processos – desencadeados quer seja a partir de intervenções do coordenador ou de relatos dos participantes do grupo – que provocam efeitos benéficos e funcionam como agentes mediadores de mudança. O manejo do coordenador, não obstante, é capaz de potencializar fatores terapêuticos derivados de relatos dos participantes, a depender dos objetivos de cada grupo. Segundo o sistema classificatório descrito por Beccheli e Santos (2001), existem dez fatores terapêuticos básicos, a saber: (1) universalidade, (2) instilação da esperança; (3) altruísmo; (4) aceitação, (5) auto-revelação; (6) catarse; (7) aconselhamento; (8) aprendizado por intermédio do outro; (9) aprendizado interpessoal e (10) autocompreensão. Todos ocorrem no âmbito de uma complexa trama interacional de experiências humanas multifacetadas (Oliveira; Munari; Bachion; Santos; Santos, 2009).
Deve-se precisar que o termo "aconselhamento", quando se refere a um fator terapêutico, é utilizado em uma acepção distinta daquela que embasa o aconselhamento psicológico como prática específica. É preciso, portanto, estabelecer uma breve delimitação teórico-conceitual a respeito. Nessa direção, cabe informar que, nas últimas décadas, o aconselhamento psicológico se distanciou da testagem psicológica e passou a designar uma prática alicerçada em uma relação de ajuda que se institui quando uma pessoa busca um psicólogo a fim de encontrar esclarecimentos para seus dilemas em diversos domínios da vida, não necessariamente por meio de uma orientação diretiva (Schmidt, 2012; Scorsolini-Comin; santos, 2013). Assim, o aconselhamento psicológico é focado na resolução de problemas pessoais, familiares, profissionais e/ou educacionais.
Já quando considerado como fator terapêutico que aflora em diferentes enquadres grupais, o aconselhamento é operacionalizado mediante o oferecimento de sugestões para o enfrentamento de dificuldades relacionadas às situações vitais que representam o denominador comum entre os participantes do grupo, como definem Beccheli e Santos (2001). Ressalte-se que os grupos proporcionam diferentes formas de aconselhamento, as quais, ainda que se traduzam em uma sugestão que não venha a ser efetivamente seguida por seus membros, servem para que cada um – tanto aquele que a veicula quanto aquele que a recebe – reflita sobre o que está sendo discutido e proposto. E é interessante sublinhar que, como também observaram os referidos autores, frequentemente uma sugestão reflete aspectos importantes, ou até mesmo dificuldades, da própria pessoa que a ofereceu.
Conforme Yalom e Leszcz (2005), o aconselhamento é um fator terapêutico essencial em grupos de apoio. Parece razoável propor que essa assertiva se aplica em especial a grupos de apoio voltados a mães de bebês prematuros. Ocorre que, como já mencionado, os mesmos são considerados particularmente relevantes na assistência a este público, na medida em que podem fornecer um espaço seguro para a expressão de emoções deflagradas pelo parto prematuro. Afinal, o intercâmbio de experiências similares favorece a produção coletiva de significados para eventos traumáticos. A subsequente exploração desses significados pode liberar forças psicológicas restauradoras, canalizando-as para a busca de soluções para os problemas comuns que afetam a vida dos participantes de qualquer grupo de apoio (Santos, 2006). E as diferentes formas de aconselhamento promovidas no âmbito de tal modalidade assistencial tendem a contribuir significativamente para tanto, como realçam Beccheli e Santos (2001).
Todavia, ainda há pouco conhecimento produzido sobre a ocorrência do aconselhamento em grupos de apoio a mulheres que vivenciam a situação de prematuridade de seus bebês. E diversos autores defendem que a avaliação dos fatores terapêuticos possibilita a compreensão dos processos grupais e fornece importantes indicadores de efetividade em diferentes enquadres grupais (Beccheli; Santos, 2001; Oliveira; Munari; Bachion; Santos; Santos, 2009). Assim, o presente estudo teve por objetivo descrever a incidência do aconselhamento enquanto fator terapêutico em um grupo de apoio a mães de bebês prematuros internados na UTIN de um hospital filantrópico.
MÉTODO
Trata-se de um estudo qualitativo, fundamentado em um enfoque descritivo-exploratório. Considerando-se as premissas já apresentadas, um grupo de apoio foi oferecido a mães de bebês prematuros em um hospital filantrópico localizado em uma cidade de médio porte da região sudeste do Brasil. Coordenado por um psicólogo, o referido grupo era aberto e ocorria duas vezes por semana em um local reservado nas instalações do hospital, após o término do horário de visitas da UTIN. Cada sessão durava, em média, 50 minutos, e a estratégia de manejo adotada era fundamentada na literatura especializada (Beccheli; Santos, 2001).
Antes do início das visitas, todas as mães de bebês prematuros internados no setor eram convidadas individualmente a frequentar as sessões. Os encontros grupais geralmente contavam com a presença de quatro ou cinco participantes. Depois de participarem pela primeira vez do grupo, as mães passavam a frequentá-lo, na maioria dos casos, até a obtenção da alta do bebê da UTIN. Em função disso, o número de sessões era variável para cada uma delas.
As intervenções verbais do psicólogo responsável pela coordenação do grupo dependiam das necessidades que emergiam nos relatos das participantes. Intervenções integrativas como a recapitulação, assinalamento e clarificação frequentemente complementavam intervenções suportivas como o reasseguramento, a sugestão e a validação. Conforme Fiorini (1981), as primeiras almejam facilitar a elaboração de experiências, ao que as últimas visam, essencialmente, ao provimento de suporte emocional. Vale destacar que o psicólogo assumia uma postura ativa na coordenação do grupo, reforçando positivamente o surgimento de temas considerados de maior relevância no contexto de vida das participantes e também promovendo a distribuição da palavra, evitando que uma determinada mãe monopolizasse o lugar de fala, de modo a favorecer o máximo proveito possível da interação grupal por todas elas.
O corpus de pesquisa foi composto pelos registros referentes a 10 sessões do grupo de apoio, selecionadas mediante sorteio aleatório. Esses registros foram elaborados por meio de anotações literais das verbalizações emitidas pelas participantes e pelo coordenador do grupo, registradas do início ao final de sessão por observadores silentes (estagiários do curso de Psicologia em treinamento profissionalizante). Vale destacar que tais anotações eram complementadas, imediatamente após o encerramento das sessões, por informações sobre o estado afetivo das participantes conforme percebido no momento de suas verbalizações. Buscava-se o consenso entre os julgamentos dos observadores e do coordenador do grupo, com o intuito de garantir a fidedignidade das informações.
Deve-se mencionar que, quando da implementação do grupo em questão, o coordenador gravou em áudio algumas sessões com o intuito de discuti-las em supervisão, contando, para tanto, com o consentimento das participantes. Porém, foi possível observar que o gravador causava constrangimento em algumas delas. Diante dessa situação, o coordenador, amparado no consentimento das participantes, recorreu à estratégia de introduzir observadores silentes no grupo. Após um período de experiência e familiarização, a presença dos observadores – no máximo dois em cada sessão – tornou-se rotineira, uma vez que foi bem aceita e assimilada pelas participantes e, aparentemente, não despertava constrangimento. Não obstante, é preciso salientar que, antes de iniciar cada sessão, o coordenador sempre tomava o cuidado de solicitar a autorização das mães para que os observadores pudessem proceder anotações.
Os registros das 10 sessões do grupo consideradas para os fins do presente estudo foram submetidos a análises descritivo-exploratórias, conduzidas independentemente por dois pesquisadores e, posteriormente, cotejadas para identificação de eventuais convergências e divergências. Os relatos foram examinados buscando-se demarcar, especificamente, a ocorrência do aconselhamento e seus efeitos benéficos. Essa estratégia é oportuna, tendo em vista que possibilita, conforme Yalom e Leszcz (2005), uma abordagem do complexo pelo simples, isto é, a exploração de um fenômeno intrincado – os processos grupais – por um de seus componentes básicos – o aconselhamento enquanto fator terapêutico. Ressalte-se que, no presente estudo, os relatos correspondem a reproduções literais das verbalizações. Por fim, é válido sublinhar que os nomes verdadeiros das participantes foram substituídos por nomes fictícios, com o intuito de preservar-lhes o anonimato.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O aconselhamento, conforme definido por Beccheli e Santos (2001), foi identificado ao menos uma vez em cada sessão do grupo de apoio, tendo emergido essencialmente em um contexto de oferecimento ativo de informações, sugestões e orientações. Observou-se que o aconselhamento derivou tanto de intervenções verbais do coordenador quanto de relatos das próprias participantes. Em linhas gerais, os relatos das participantes estimulavam a utilização da fé e do pensamento positivo, como se pode vislumbrar nos relatos 1 e 2, transcritos a seguir.
Relato 1: "Tenha fé, viu? Reza muito e pede a Deus, que Ele vai te ajudar" (Ana, 22 anos).
Relato 2: "Ih, eu conheço várias pessoas que teve nenê prematuro. E os nenê hoje tão tudo crescido, forte" (Bernadete, 27 anos).
Por outro lado, algumas intervenções do coordenador – e, mais pontualmente, determinados relatos das participantes – recomendavam, de maneira mais prática, o fortalecimento do recurso ao suporte familiar e a divisão de tarefas, nomeadamente a fim de viabilizar as visitas ao bebê na UTIN, de acordo com os relatos 3 e 4.
Relato 3: "Nesse momento, você deve recorrer à sua família para conseguir dar conta das tarefas do dia-a-dia. Por exemplo: você não pode pedir para sua irmã buscar seu outro filho na escola? Daí você não fica com os horários tão apertados para fazer as visitas aqui no hospital" (Coordenador).
Relato 4: "A louça eu tô deixando pro meu marido lavar. Acho que a gente não pode se desgastar com essas coisas agora, não" (Carla, 29 anos).
Ademais, com frequência intervenções do coordenador e relatos das participantes igualmente preconizavam, conforme ilustram os relatos 5 e 6, estratégias de enfrentamento mais funcionais no manejo das dificuldades implementadas pelo nascimento prematuro.
Relato 5: "Faz que nem eu. Quando eu volto da visita, eu ligo pra minha mãe e conto como a nenê tá. Falo pra ela tudo que os médico falou. E minha irmã, minhas tias, tudo os parente liga pra ela. Eles não liga mais pra mim. Já sabe que é pra ligar pra ela [...] Ah, é bem melhor desse jeito, porque eu descanso um pouco a cabeça" (Daniela, 25 anos).
Relato 6: "Tenta vir todo dia [visitar o bebê no hospital]. Mas o dia que não der, não vem. Não é sempre que dá. É longe, fica cansativo. Só que não pode ficar com culpa depois. Se não deu, não deu" (Francisca, 31 anos).
Conforme Schopler e Galinski (1993), os grupos de apoio em geral, por possibilitarem o alívio de sintomas psíquicos, favorecem o restabelecimento do equilíbrio emocional de seus participantes, pois os auxiliam não apenas a vislumbrar, mas, sobretudo, a utilizar estratégias de enfrentamento respaldadas em recursos adaptativos latentes. Outrossim, Santos et al. (2014), identificaram que, em um grupo de apoio especificamente destinado a pacientes com diagnóstico de transtornos alimentares, os participantes, ao reconhecerem, nas experiências alheias, aspectos semelhantes às suas próprias experiências, puderam se identificar uns com os outros e alcançar uma sensação de alívio associada à redução de estigma.
Os resultados obtidos no presente estudo, ao revelarem a ocorrência do aconselhamento enquanto fator terapêutico, corroboram as formulações de Schopler e Galinski (1993) e são consistentes com os achados de Santos et al. (2014), pois ilustram que as participantes do grupo em questão, devido à universalidade da queixa, se sentiam à vontade para a troca de experiências, o que potencializava processos de mudança. Portanto, com base no compartilhamento de experiências vitais, o grupo promovia conforto e bem-estar. O aconselhamento contribuía nesse sentido, por exemplo, auxiliando as mães a identificar adversidades que poderiam ser superadas com a alta de seus bebês da UTIN.
Santos (2006) pontuou que as modalidades assistenciais grupais subsidiam a exposição de diferentes perspectivas a respeito de determinadas situações problemáticas vivenciadas, o que engendra posicionamentos pertinentes aos pontos de vista assumidos por cada um dos participantes. Estas perspectivas algumas vezes se mostram divergentes e outras vezes se traduzem em vozes harmônicas e complementares. Se essa pluralidade for devidamente acolhida e elaborada no grupo, podem ser mobilizados recursos em prol da resolução de conflitos. Como consequência, os participantes terão condições de lidar positivamente com as diferenças e desfrutar de seu potencial transformador, aprendendo por intermédio dos outros. E, aparentemente, isso de fato se deu no grupo de apoio em questão.
De forma semelhante, Carvalho (2005) verificou que, ao contribuir para a redução dos sintomas de ansiedade e depressão das participantes, os grupos de apoio às mães de bebês prematuros criam condições propícias para o estabelecimento de um vínculo afetivo mais consistente entre a díade. Consequentemente, as respostas do sistema familiar às necessidades do bebê tendem a ser mais adequadas. Evidencia-se, portanto, a pertinência dessa modalidade assistencial, inclusive na prevenção de problemas capazes de comprometer os processos saudáveis de desenvolvimento infantil, uma vez que, como asseveram Carvalho, Linhares e Martinez (2001), a evolução a longo prazo de bebês prematuros é influenciada decisivamente pelos cuidados que lhes são dispensados por seus pais.
Por fim, é possível postular que a maximização do aconselhamento enquanto fator terapêutico no grupo em questão pode ter auxiliado as participantes, particularmente, na operacionalização da estratégia de enfrentamento que, conforme revela uma pesquisa recente, é prevalente entre mães de bebês prematuros, a saber: o enfrentamento focalizado no problema. Embora deva ser empregado conjuntamente com outras estratégias, o enfrentamento focalizado no problema se mostra especialmente alinhado à necessidade materna de reunir informações em prol de uma compreensão mais racional acerca dos riscos inerentes à prematuridade, o que, por sua vez, auxilia a evitar uma eventual desorganização psíquica (Cunha; Smith; Akerman; Souza, 2017).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados obtidos no presente estudo reforçam o pressuposto teórico de que a investigação de fatores terapêuticos, dentre os quais o aconselhamento, possibilita a compreensão dos processos grupais, além de que coloca em relevo a importância dos grupos de apoio a mães de bebês prematuros na assistência a tal público. Malgrado os achados animadores aqui reportados, novas pesquisas são necessárias, utilizando delineamentos quase-experimentais e ensaios clínicos randomizados, para que as vantagens e desvantagens inerentes à utilização de tal modalidade assistencial no âmbito institucional, direcionada a distintas populações, possam ser estimadas com maior precisão, visto que a mesma infelizmente não vem sendo tão estudada quando praticada na realidade nacional.
REFERÊNCIAS
BECCHELI, L. P. C.; SANTOS, M. A. Psicoterapia de grupo: noções básicas. Ribeirão Preto: Legis Summa, 2001. 155 p. [ Links ]
CARVALHO, A. E. V. Indicadores emocionais maternos e intervenção psicológica durante a internação do bebê pré-termo em UTIN. 2005. 248 p. Tese de Doutorado em Psicologia - Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto. [ Links ]
CUNHA, A. C. B.; SMITH, J. A. B.; AKERMAN, L. P. F.; SOUZA, V. O. Discutindo sobre estresse e enfrentamento da prematuridade por cuidadores. Temas em Educação e Saúde, v. 13, n. 1, p. 41-58, 2017. [ Links ]
DOERING, L. V.; MOSER, D. K.; DRACUP, K. Correlates of anxiety, hostility, depression, and psychosocial adjustment in parents of NICU infants. Neonatal Network, v. 19, n. 5, p. 15-23, 2000. [ Links ]
FAVARO, M. S. F.; PERES, R. S.; SANTOS, M. A. Avaliação do impacto da prematuridade na saúde mental de puérperas. Psico-USF, v. 17, n. 13, p. 457-465, 2012. [ Links ]
FELICE, E. M. A psicodinâmica do puerpério. São Paulo: Vetor, 2000. 99 p. [ Links ]
FIORINI, H. J. Teoria e técnica de psicoterapias. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1981. 233 p. [ Links ]
HARRISSON, M. J.; MAGILL-EVANS, J. Mother and father interactions over the first year with term and preterm infants. Research in Nursing and Health, v. 19, n. 6, p. 451-459, 1996. [ Links ]
KENNELL, J.; KLAUS, M. Atendimento para os pais de bebês prematuros ou doentes. In: KLAUS, M.; KENNELL, J. (Orgs.), Pais-bebê: a formação do apego. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993. p. 170-244. [ Links ]
LINHARES, M. B. M. Estresse, resiliência e cuidado do desenvolvimento de neonatos de alto risco. In: MENDES, E. G. (Org.), Temas em educação especial: avanços recentes. São Carlos: EDUFSCar, 2004. p. 315-324. [ Links ]
OLIVEIRA, N. F.; MUNARI, D. B.; BACHION, M. M.; SANTOS, W. S.; SANTOS, Q. R. Fatores terapêuticos em grupo de diabéticos. Revista da Escola de Enfermagem da USP, v. 43, n. 3, p. 558-565, 2009. [ Links ]
PADOVANI, F. H. P.; LINHARES M. B. M.; CARVALHO, A. E. V.; DUARTE, G.; MARTINEZ, F. E. Avaliação de sintomas de ansiedade e depressão em mães de neonatos pré-termo durante e após hospitalização em UTIN. Revista Brasileira de Psiquiatria, v. 26, n. 4, p. 251-254, 2004. [ Links ]
SANTOS, M. A. Sofrimento e esperança: grupo de pacientes com anorexia e bulimia nervosas. Medicina (Ribeirão Preto), v. 39, n. 3, p. 386-401, 2006. [ Links ]
SANTOS, M. A.; SCORSOLINI-COMIN, F.; GAZIGNATO, E. C. S. Aconselhamento em saúde: fatores terapêuticos em grupo de apoio psicológico para transtornos alimentares. Estudos de Psicologia (Campinas), v. 31, n. 3, p. 393-403, 2014. [ Links ]
SCHMIDT, M. L. S. O nome, a taxonomia e o campo do aconselhamento psicológico. In: MORATO, H. T. P.; BARRETO; C. L. B. T.; NUNES, A. P. (Orgs.), Aconselhamento psicológico numa perspectiva fenomenológica existencial. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012. p. 1-21. [ Links ]
SCHOPLER, J. H.; GALINSK, M. J. Support groups as open systems: a model for practice and research. Health & Social Work, v. 18, n. 3, p. 195-207, 1993. [ Links ]
SCORSOLINI-COMIN, F.; SANTOS, M. A. Counseling psychology: view of the scientific production in the Brazilian postgraduation. Journal of Human Growth and Development, v. 23, n. 3, p. 338-345, 2013. [ Links ]
YALOM, I. D.; LESZCZ, M. The theory and practice of group psychotherapy. New York: Basic, 2005. 602 p. [ Links ]
Endereço para correspondência
Rodrigo Sanches Peres
E-mail: rodrigosanchesperes@yahoo.com.br
* Pós-Doutor em Psicologia pela Universidade de Lisboa. Professor Associado do Instituto de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
** Livre Docente em Psicoterapia de Orientação Psicanalítica. Professor Titular da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).