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Gerais : Revista Interinstitucional de Psicologia

versão On-line ISSN 1983-8220

Gerais, Rev. Interinst. Psicol. vol.5 no.1 Juiz de fora jun. 2012

 

ARTIGOS

 

Desvelando a vergonha da vivência de trecheiros na contemporaneidade

 

Unveiling the shame of "trecheiros" experiences in the contemporary world

 

 

Lucas Martins Soldera1; Francisco Hashimoto

*Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Assis, Brasil

 

 


RESUMO

Este trabalho visou a identificar a presença do sentimento da vergonha em "trecheiros" (nômades) no mundo contemporâneo e quais significados foram construídos na vida dessas pessoas. Efetuou-se tal compreensão a partir do questionamento sobre o sujeito, a sua história e a sua relação com o grupo e com a sociedade. A pesquisa se fundamentou na abordagem Psicossociológica, e o material de estudo foi constituído por relatos de sete "trecheiros" que fazem uso dos serviços do Centro Atendimento ao Migrante (CAM) de Assis/SP. Os dados foram obtidos por meio de entrevistas semidirigidas com duração variável. A pesquisa possibilitou a compreensão das significações construídas pelos trecheiros a partir dos três aspectos que identificam esse contemporâneo: o registro do corpo, da ação e do sentimento. Por fim, foi encontrado o sentimento da vergonha relacionado a esses três aspectos, marcando a relação de mal-estar entre vergonha e contemporâneo.

Palavras-chave: Vergonha, Psicossociologia, Contemporâneo, Nômades


ABSTRACT

This research aimed at identifying the existence of the feeling of shame in "trecheiros" (nomads) in the contemporary world and which meanings were built in those people's lives. Such comprehension was developed based on the questioning regarding the subject, its history, and its relation with the group and with society. The survey was based on the psychosociological approach and the material was built with reports from eight "trecheiros" who use the services of the C.A.M. (Migrants' Assistance Center) of Assis, in the State of São Paulo. The data were gathered by means of semi-directed interviews, with varied lengths of time. The survey enabled the comprehension of the meanings built by the "trecheiros" from the three aspects which identify this contemporary: the registrations of the body, of the action, and of the feeling. Finally, the feeling of shame was found related to these three aspects, marking the relation of uneasiness between shame and contemporary.

Keywords: Shame, Psychosociology, Comtemporary, Nomads


 

 

Este trabalho teve como intuito identificar se há presença do sentimento de vergonha em trecheiros no mundo contemporâneo e quais significados são constituídos nas vidas dessas pessoas. Isso nos levou a compreender como esse sentimento se instala e se desenvolve no trecheiro a partir da análise do funcionamento psíquico e das relações que o sujeito estabelece com a sociedade.

O mundo contemporâneo foi caracterizado aqui pelo desenvolvimento tecnológico, mudança da noção de tempo e espaço, consumismo e narcisismo, um mundo onde tudo ocorre de forma rápida, em que os valores e a forma de agir nem sequer se consolidam, interferindo, provavelmente, no vínculo de confiança das pessoas com o futuro.

Para compreender tal mundo, Bauman (2007) utiliza o conceito de liquidez, que significa a impossibilidade de manter a forma ou permanecer em seu curso por muito tempo, o que acentua a noção de mudanças rápidas e imprevisíveis na vida precária e incerta das pessoas. Assim, "[...] na vida líquida a distinção entre consumidores e objeto de consumo é, com muita frequência, momentânea e efêmera, e sempre condicional" (Bauman, 2007, p. 18). O referido autor mostra uma sociedade predatória, "[...] de valores voláteis, descuidada do futuro, egoísta e hedonista". Uma sociedade voltada para o consumo e para o presente, onde a velocidade é mais importante que a duração: "[...] com a velocidade certa, pode-se consumir toda a eternidade do presente" (ibidem). Dessa forma, a questão aqui é ajustar a eternidade a uma existência individual.

Vivemos em uma sociedade onde cada vez mais a produção, como processo produtivo de bens e serviços, é valorizada. A partir da exploração de mão de obra, o trabalho é entendido não só como um modo de transformar a natureza para a existência humana, mas também como forma de estabelecimento de relações e subjetividade que ainda confere certo status social, confirmando o ditado popular: "O trabalho dignifica o homem".

O indivíduo, enquanto excluído dos padrões capitalistas valorizados socialmente, fica desprovido desse papel "dignificador" dado pelo trabalho, sendo visto pela sociedade como inútil, uma figura que é mais cômodo não observar. Existem várias pessoas dentro de nossa sociedade que ocupam essa posição. Contudo, visamos a discorrer sobre uma figura em especial. Assim, inserimos em nosso trabalho a figura do trecheiros, definidos por Nascimento (2008):

Trecheiros são indivíduos que perambulam pelas rodovias a pé, de cidade em cidade, sobrevivendo de trabalhos temporários e de eventuais ajudas filantrópicas. Diferenciam-se dos andarilhos de estrada que, embora perambulem também a pé pelas rodovias, não adentram as cidades e nem recorrem a ajudas filantrópicas, pois romperam definitivamente com os modos de vida sociais. Desse modo, os trecheiros são indivíduos que se encontram num limiar de transição, pois, à medida que passam os anos, a falta de perspectivas futuras em relação a trabalho e emprego fixos se acentua e a tendência é se tornarem andarilhos de estrada devido às condições miseráveis em que vivem (p. 23).

São nômades que percorrem (caminhando, de ônibus, de carona etc.) as estradas. Não possuem casa, entram na zona urbana para pedir auxílio, na forma de comida e/ou dinheiro, ou seja, sobrevivem da generosidade alheia para posteriormente continuarem sua jornada. A condição desses sujeitos é formada hoje de uma mescla entre andarilhos (público que transita pelas rodovias e não adentra as cidades) e antigos mendigos (sobrevivem somente dentro das cidades), dando origem a um novo grupo de pessoas, os autodenominados trecheiros.

Em detrimento do modelo capitalista adotado pelas sociedades, a figura do mendigo teve que alterar seus costumes de sobrevivência, de modo que hoje ele não fica mais parado em um determinado local ou cidade: tem que estar sempre em movimento, buscando novos públicos, novas cidades, novas abordagens e novas estratégias para sobreviver. Existe, entre os próprios nômades, uma diferenciação de nomenclaturas, pois se incomodam de serem chamados todos de mendigos. Para eles, existem claramente três grupos nômades: os mendigos (pardais), os trecheiros e os andarilhos. Grupos distintos de pessoas dos quais procuramos esclarecer a diferenciação, mais adiante, a partir do próprio ponto de vista dos trecheiros.

Nesse contexto, a descartabilidade não está restrita somente aos objetos: os homens também se tornaram alvo desse conceito. O desemprego - aspecto característico de nossa sociedade atual - exemplifica essa passagem, constituindo o primeiro passo para a mendicância, para o crime e para a informalidade, todos decorrência da procura malsucedida de emprego, de oportunidade ou mesmo de laço afetivo.

Em uma contemporaneidade ágil de mudanças rápidas, em que não é possível consolidar algo, surge nossa necessidade de compreender um sentimento que pode permear as relações nessa vida líquida:a vergonha. Segundo Calligaris (2006), a vergonha enquadra-se como um regulador social, o qual alude a uma determinada conduta moral do indivíduo, e é nesse contexto que a integridade do self pode ser atingida, pois tal sentimento se refere à união do medo do julgamento do olhar do outro com a própria depreciação, além de caminhar juntamente ao narcisismo. Pelo olhar do outro, entendemos suposições do próprio sujeito, as quais podem ser reais ou imaginárias, de um indivíduo ou de um coletivo, dependentes da valorização que atribuímos a esse outro. A vergonha2 se torna um regulador das experiências interpessoais e intrapessoais. Assim, o sentimento que estamos retratando aqui estará sempre presente na subjetividade de cada um.

Optamos, então, por um trabalho psicossociológico, considerando o sujeito e a possibilidade do seu sentimento de vergonha e tendo como referência as relações sociais, porque é nesse contexto do mundo contemporâneo que se têm apresentado, de um lado, as exigências de um padrão capitalista e, de outro, uma situação de precariedade. A vergonha pode ser trabalhada, assim, no encontro do sujeito com ele próprio e com o social, buscando integrar os aspectos psíquicos e sócio-históricos aliados à capacidade de autorreflexão.

A vergonha se inscreve numa relação social. Ela pode fazer elo às raízes inconscientes, cada indivíduo reagindo distintamente a uma situação de humilhação, em função dos componentes psíquicos próprios. Mas ela é indissociável da relação social que contrasta o sujeito com as normas do seu meio, com os valores da comunidade à qual ele pertence (Gaulejac, 2006, p. 38).

O sentimento de vergonha emerge na relação de cada indivíduo consigo mesmo e em seu grupo social, que possui um sistema de normas comuns. Tomando como referência a situação da precariedade, podese dizer que a convivência com a vergonha pode estar associada a uma condição de fracasso pessoal. No entanto, Castel (1995) mostra que essa situação é uma questão social, a qual produz efeitos psicológicos, sendo necessário compreender os determinismos socioeconômicos e seus reflexos psicológicos. Assim, neste trabalho, consideramos: "[...] as relações entre 'o' social - que apresenta dimensões emocionais, subjetivas, afetivas e inconscientes - e 'o' psiquismo, pela língua, pelo simbólico e pela sociedade..." (Gaulejac, 2001, p. 37). Além disso, procuramos efetuar um questionamento sobre o sujeito, a sua história, a sua relação com o grupo e com a sociedade. Tal perspectiva buscou concretizar uma análise das articulações entre o social e o psiquismo, produzindo reflexões acerca dessa relação.

O material de estudo foi constituído por relatos de sete sujeitos que vivem como trecheiros que frequentam o Centro de Atendimento ao Migrante (CAM). As identidades dos sujeitos foram preservadas. Para isso, utilizamos nomes fictícios. Além disso, apresentamos a idade, as profissões anteriores e o tempo aproximado como trecheiro: Marcos (30 anos, soldador, dois meses); Rafael (36 anos, catador de material reciclável, 25 anos); Rodrigo (31 anos, chapa3 e cortador de cana, 15 anos); Igor (43 anos, carcereiro e policial, 15 anos); Marcelo (28 anos, servente de pedreiro, dez anos); Guilherme (23 anos, chapa e ajudante de festa de peão, cinco anos) e Francisco (26 anos, pedreiro, 14 anos).

O CAM é um órgão ligado à Prefeitura Municipal de Assis/SP, instalado no terminal rodoviário dessa mesma cidade, que conserva resquícios do antigo Centro de Triagem e Encaminhamento de Migrantes (CETREM), o qual se localizava próximo à rodovia Raposo Tavares, contando com um albergue e uma equipe para acolhimento. Entretanto, o CAM não possui mais albergues, somente um acordo com determinado hotel privado, pouco usado devido à sua localização distante da rodoviária da cidade e porque os encaminhamentos são feitos somente no período noturno. O transporte fornecido pela Prefeitura pouco está presente junto ao órgão. O CAM ainda mantém convênios com empresas de transporte rodoviário, a fim de fornecer uma cota de passagens para os necessitados.

Essa cota que o trecheiro possui é consequência de uma nova estratégia adotada pelo poder público dos municípios, para fazer com que esse público não fique instalado em uma determinada cidade por muito tempo. Eles recebem passes para circularem entre as cidades não só da região, mas também por outros Estados. Caso contrário, a polícia fiscaliza a fixação deles em determinados pontos da cidade.

A cidade de Assis/SP foi escolhida pelo fato de ser uma grande via de passagem de trecheiros devido à sua localização geográfica, já os dados para a realização do estudo foram obtidos por meio de entrevistas semidirigidas, seguindo as orientações e precauções apontadas por Bleger (1998). Nosso trabalho responde às recomendações do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do Hospital Regional de Assis, conforme o termo de consentimento livre e esclarecido que os sujeitos da pesquisa deveriam assinar, face à

considerando-se o referencial teórico adotado, buscando-se compreender o sofrimento psíquico decorrente da precarização e levando-se em conta a questão sociocultural. Dessa maneira, tentando compreender o sofrimento das pessoas em situação de precariedade e mendicância, tivemos a intenção de contribuir para a melhoria da relação homem-sociedade.

 

Desvelando a vergonha da vivência de trecheiros

Essa parte do trabalho consistiu em expor conceitos e discussões sobre o contemporâneo, articulando-os com falas de trecheiros em relação às suas vivências cotidianas, para que, assim, pudéssemos construir uma ideia de como a vergonha é atribuída de significados na vida dessas pessoas.

Tal significação da vergonha tem relações com as interpretações próprias do sujeito, que encontram nesse mal-estar contemporâneo um palco propício. Isso, por sua vez, provoca divergência e traz implicações nos discursos, nas práticas sociais e na vida de cada pessoa.

A seguir, apresentamos um resgate da história de vida dos trecheiros, a fim de contextualizarmos suas vivências, na atualidade.

Infância mesmo eu não tive, entendeu? Perdi minha mãe com um mês de nascido, fui criado com tia. Vim conhecer meu pai com 12 anos, quando eu conheci ele, ele morreu com duas pernas amputadas, de trombose, enterrado em... Eu sou nascido em..., mas sou registrado em... É... eu não tive infância, entendeu, é... infância de... criado por tia, uma infância que, naquele tempo não tinha recurso que tem hoje em dia, que, que hoje tem de tudo, tem criança já nasce com berço de ouro, bem dizer, Bolsa Família tudo. Naquele tempo não tinha, se tinha que ficar parado era pequenininho, não tinha essas coisas tudo (Rafael)

Ah... minha infância sempre foi muito... assim, sempre trabalhei com meu avô, na minha infância. [era da cidade ou do sítio?] meu avô era da cidade. [trabalhava em quê?] Trabalhava de ajudante, de servente [e você sempre do lado dele...] É... lado a lado, eu com meu avô era... tinha boa relação com ele, dava muito bem com ele. Mas depois conheci a mãe da minha filha, juntei com a mãe da minha filha, né... a gente ficou junto uns dez anos, aí depois não deu certo, aquelas coisas. E depois segui meu destino, caí no mundo, no trecho, né. Já! Já fiz um pouco de tudo na vida, né. Trabalhei de servente, parte com pintura. Fiz um pouco de tudo na vida, né (Marcelo)

Verificamos a constante presença de perdas familiares dessas pessoas quando crianças, causa de desamparo e falta a quem recorrer. Temos, aqui, desde cedo, o sentimento do estar sozinho no mundo. Percebemos também a presença de uma atividade profissional ocupacional braçal, na vida de quase todos esses jovens, talvez já visando a ajudar no sustento da família.

Encontramos, nos relatos a seguir, indícios do motivo de essas pessoas estarem vivendo nesse difícil modo de vida.

Aí eu caí no mundo, com dez anos de idade eu já tava na rua, trabalhando, né. Naquele tempo catava 'osso' é mesma coisa que reciclagem, vendia 'osso'. E minha tia me deu uma surra e com dez anos eu saí de casa, andando o mundo, era o tempo do 'fusquinha'. Não tinha essas viaturas, o fusquinha já dava impressão [falando sobre a polícia]. Aí saí de casa com dez anos, fiquei andando pra lá e pra cá. Aí depois com... 14 anos eu já tava no... já trabalhando em fazenda já. Sou registrado em carteira desde 1992, eu tenho registro em carteira de trabalho. Aí eu arrumei uma mulher lá no... com 20 anos, eu tô com 36. Lá em..., prá lá de..., aí nasceu um moleque. Só que essa mulher que eu arrumei ela já tinha dois filhos que não era meu e cada um tinha um pai, embarquei em um caminho errado, né, moleque novo, né, ela já era vivida. Mais nova né, pah, era bonita, né, vamos dizer, era atraente, né, e eu se envolvi, aí nasceu meu moleque, nasceu em... Nasceu em 1996, ele nasceu em..., no dia sete de janeiro. Aí nós tava no... trabalhando em uma fazenda, aí tava ruim, não dava pra pagar um gás e os pais dela moravam em..., aí nós resolvemos ir pra lá. Aí 'lascô' tudo mesmo. Eu sem nenhum parente lá e ela com um monte de parente e nós dependendo, aí começou aquele 'brigaiero'. Aí até dei uns tapas nela, entendeu? Perdi a cabeça, dei uns tapão. Os parentes entraram no meio, já briguei com um lá, dela também, já fomos pra... (Rafael)

Ah... era bem, sempre me deram de tudo assim. Aí teve uma época que meu pai decaiu na bebida, por causa que ele ficou desempregado e começou a faltar as coisas dentro de casa e ele não suportava ver isso, porque ele nunca deixou faltar nada para nós e foi decaindo cada vez mais e chegou ao ponto que... Aí vim com minha mãe para o interior, aí chegando aqui no interior, ela morreu atropelada. Morreu atropelada com 41 anos. Eu... na época tinha... oito anos, aí quando eu fiz 17 anos, ela veio a falecer e... 17 ou 18 anos, faltava um mês, um mês e pouco para meu aniversário. E amanhã é meu aniversário, dia oito de maio, Dia das Mães, aí eu não tenho motivo para comemorar, né... complicado (Guilherme)

As principais características que aparecem, como motivos por estarem na vida de trecheiro, são: desemprego e consequentemente a falta de oportunidade posterior, as perdas familiares e a falta a quem recorrer, brigas com mulheres, sejam decorrentes do casamento ou não, e alcoolismo.

Sobre as mudanças deste mundo contemporâneo, nossos sujeitos abordam alguns pontos.

Ah! As brincadeiras nossas eram umas brincadeiras totalmente diferentes de hoje, né. Era soltar pipa, bolinha de gude, pião, esse pião de jogar, brinca daquele negócio de pique-esconde, polícia e ladrão, essas brincadeirinhas aí, de criança mesmo, eram umas brincadeiras sem maldade, até os desenhos que a gente assistia era uns desenhos mais disciplinados que eram para criança mesmo, hoje em dia você vê esse monte de desenho aí que é só desenho que eu acho que força a criança a ficar até violenta, na nossa época não tinha isso.

[...] A modernização do celular, hoje uma criança de dez anos pode ter um celular que grava, que, que filma essas coisas tudo e ali ele pode baixar filme de mulher pelada, de sacanagem, né, tá ouvindo... né, não, e o pais e a mãe não sabem, internet... O pai sai pra ir trabalhar e a mãe, fica ali e entra num site ali e ali ele vê mulher pelada, ali ele já tá com 14, 15 anos eles fazem formação de galera e falam em briga essas coisas, né (Marcos)

A sociedade aí, não todos, mas a maioria não vale nada e eles não veem a situação deles, só pensam que tá de bem de 'boinha'. Não é assim que funciona, gosta de julgar os outros, né, sem saber o que é a vida dos outros. Nem todos são iguais (Rafael)

Igor relata a unidade que ele encontra no grupo de trecheiros, aspecto que ele não vê na sociedade:

Meu caro, é uma verdadeira família. Um ajuda o outro. Um empresta o passe dele pro outro. Um empresta o cigarro dele pro outro. Entendeu? Falar a verdade para você, entre os trecheiros, é uma verdadeira família, se um fica sabendo que o outro tá no trecho, um ajuda o outro, como pode. Se um não tem uma coberta, um dá uma coberta pro outro, um dá uma meia pro outro. Uma verdadeira comunidade que não existe na verdadeira sociedade.

Francisco ainda fala das dificuldades atuais:

Ah... o que tem de bom é que você anda o mundo, conhece várias pessoas, umas boas, outras ruins. E o ruim seria se eu tivesse preso. Na rua, solto já tá difícil... Você imagina preso...

Apesar de todas as adversidades e falta de informações, os trecheiros ainda tecem algumas críticas à sociedade atual, dizem das mudanças que hoje percebem e que não notavam até há pouco tempo, como a tecnologia que mudou o comportamento das crianças e o individualismo que dificulta o relacionamento e a aproximação com as pessoas num âmbito geral.

Considerando tal afirmativa, apresentamos, a seguir, três aspectos que identificam o mal-estar no contemporâneo, segundo Birman (2006): o registro do corpo, da ação e do sentimento.

O corpo aparece como o primeiro registro e o mais evidente do mal-estar: as queixas corporais se projetam pelas estratégias publicitárias que levam a novas modalidades de terapias exóticas e práticas médicas. Kehl (2003) contempla essa questão quando aponta que nosso corpo é reflexo do meio em que vivemos; em outras palavras, é uma imagem atribuída de significados pelos outros, que podem ou não nos gerar marcas. Essas marcas, se unidas, suscitam significados, constituindo uma forma de vergonha.

O corpo do trecheiro exemplifica esse aspecto. As condições precárias em que vive trazem características para sua imagem, destacando-a das demais. Marcos consegue abordar esse problema, no seguinte trecho da fala dele:

Ah... sei lá, é uma apresentação, né, você tá com uma barba feita, você tá limpo, essa aí é uma questão que normalmente as pessoas... se você tá trabalhando, executando uma tarefa, você tando sujo, tudo bem, mas se tiver executando uma tarefa, mas se você não tá fazendo, o que justifico de você tá sujo, tá barbudo, é você tá nas drogas, é você tá na bebida, é isso, não tem outra justificativa. Eu vejo assim e eu sou um cara que eu penso muito no que as pessoas tão... da maneira que elas me olham, né, olham outras pessoas, os companheiros.

Ele diz sobre a importância da imagem em nossa sociedade, expondo sua impossibilidade de atender às exigências propostas pela sociedade do espetáculo, como nos apresenta Débord (1997).

Já o segundo registro é a ação, a qual emerge da hiperatividade que move o indivíduo na atualidade. As pessoas agem sem saber o que buscam, pois a marca é a indeterminação. Tal como ressalta Bauman (2007), as realizações individuais dificilmente se solidificam, e as condições de ação e as estratégias de reação envelhecem, tornadas, assim, obsoletas.

Por causa que a gente não gosta de ficar parado numa mesma cidade. Ah... nóis gosta de andar. Sumir no mundo, conhecer outras cidades, outros rostos (Francisco)

É, não ficar muito tempo no mesmo lugar, um pouco aqui, aí, sai pra outro lugar, é o dom da paciência, né (Guilherme)

Francisco e Guilherme expõem o porquê das constantes viagens. O sumir no mundo é uma espécie de esconderijo, da não vontade de ser identificado. Entretanto, significa também a dificuldade de fixação em determinado lugar: ao se chegar a um local desejado, eles permanecem pouco tempo e logo partem para outro. Há, ainda, o desejo de não ficar conhecido em determinado local, de não ser confundido com mendigos e andarilhos, como explicam Francisco e Marcelo, respectivamente.

Mendigo é aquele que anda aí na cidade todo imundão, vira 'pardal' da cidade, tá de um lado pro lado. Nós, não. Nós gosta de andar. Nós não para, vamo andando, é diferente do mendigo

Trecheiro, né... porque tem, ó... tem o trecheiro e tem o andarilho, né. O andarilho é aquele que só anda beirando as BRs, não entra dentro de cidade, só fica andando a pé. E tem o trecheiro que o seguinte, o trecheiro ele entra de cidade em cidade, em outros Estados, cidade em cidade, entendeu?

Os próprios nômades fazem essa divisão entre eles: andarilho, trecheiro e mendigo (pardal). Cada um possui suas características, conforme apontado. Contudo, há certa angústia quando reunidos em uma mesma categoria: a de mendigo (figura mais conhecida).

Rafael relata sobre essa mescla de nomenclaturas que os incomoda:

Na rua, os outros veem você na rua e chamam você de mendigo. Pô... não é assim!

E reforça sua afirmação, argumentando:

Jesus andava de a pé, todo lado, pra lá, pra cá, em outros, outros lugares, outros Estados, igual eu venho fazendo. Então, Jesus era mendigo também? Pô, não é assim, entendeu?

Há um incômodo, por parte dos nômades quando a sociedade os vê como sendo todos da mesma classe, sem efetuar distinção dos grupos de que fazem parte e se autodenominam.

O terceiro registro do mal-estar é o sentimento. No mundo líquido, o sentimento de segurança psíquica se evapora. O eu não consegue estabelecer relações entre o corpo e o mundo e, por sua vez, o eu e o psíquico ficam sem potência. Assim, a despossessão de si apresenta indícios de comportamento depressivo, tornando-se uma das principais questões do mal-estar na atualidade. Ainda que não tenhamos observado a instauração de uma depressão nos trecheiros, fica claro o aparecimento de alguns sinais de angústia e tristeza.

Ah, simplesmente num ponto a gente fica triste, né, entrega na mão de Deus, né, aí pensa assim: esse é fraco de espírito, entendeu? Não soube ser solidário... assim... vamos dizer, Jesus perambulou também, pediu, bateu nas portas. Aí quando chega a noite, quando fecha tudo, não tem mais recurso para você ir, não tem com quem você conversar, não tem onde você esconder a cabeça, entendeu? É a hora mais triste, é aí que muitos se entregam na bebida, já toma bastante, já desmaia e dorme. (Guilherme)

Ah... é uma vida sofrida, é uma vida que, vou falar pra você, a pessoa tem que saber sobreviver, senão fica muito mais sofrida, hein? Aquele sofrimento, ficar dependendo de albergue, dependendo disso, dependendo daquilo... se Deus quiser, esse ano agora eu pretendo sair dessa vida, que é muito sofrida (Marcelo)

Essa questão da tristeza pode ser evidenciada na perda da autoestima, por parte dos trecheiros. Por sempre estarem sendo ignorados, já se acostumaram com isso. É o que Francisco nos explica quando perguntado sobre como sente o preconceito das pessoas:

Ah... já acostumou, né. Você olha assim na pessoa, você vê que eles têm preconceito. Mas tanto tempo já na rua, você acaba se acostumando, não tem outro jeito.

As constantes situações de descaso e repúdio da sociedade para com esse público minam suas defesas a ponto de fazê-los acreditar que seu lugar é esse de inferioridade, de ser menos e menor que os demais cidadãos "normais". Sua autoestima e amor próprio são afetados, o que lhes proporcionará consequências indesejáveis.

Essas formas de manifestações do malestar podem ser construídas pelo medo da perda do corpo, do status social, do trabalho e do poder, dentre outros elementos formadores de nossa identidade. Cai sobre esse aspecto do medo da perda do espaço social a incumbência de modelar um código de conduta, que, se não for bem trabalhado, pode internalizar no indivíduo o sentimento de vergonha, o qual carregará até o fim de sua vida.

Enriquez (1997) enfatiza que a nova mentalidade contemporânea sobre o trabalho gera mobilização dos seres humanos para o mesmo, levando ao surgimento de valores sociais pelos quais "[...] os indivíduos que não trabalham são parasitas, delinquentes e inúteis. Ou que, em certo sentido, aqueles que não trabalham não têm o direito de comer (p.03)". Aparece um interesse global pelo trabalho, tanto pelos empregadores como pelos empregados, justificando uma busca por um elemento constitutivo e fundamental da personalidade.

O capitalismo permeia por completo a sociedade atual, pregando sua ideologia consumista. Tudo é tratado como produto, já que a principal característica desse modelo é a produção visando ao acúmulo e, consequentemente, à obtenção de lucros pela venda. Aqui, a mídia, juntamente com a propaganda, ganha um importante papel. Ela reproduz imagens - idolatradas pelo público - que serão interiorizadas como possíveis autoimagens a serem atingidas. Esse processo torna ainda mais difícil a separação entre real e fantasia, uma vez que o consumo age como "facilitador" da obtenção dessa fantasia.

Em uma sociedade na qual o sonho do sucesso foi esvaziado de qualquer sentido além do seu próprio, os homens nada possuem para medir seus próprios feitos, a não ser os feitos de outros homens. A autoaprovação depende do reconhecimento e aclamação públicos, e a qualidade dessa aprovação sofreu importantes mudanças por direito próprio. [...] Hoje em dia, os homens buscam o tipo de aprovação que aplaude não suas ações, mas seus atributos pessoais (Lasch, 1983, p. 87).

A imagem, relacionada igualmente ao corpo, ou melhor, à ideia (fantasia) que temos de nosso corpo ou do corpo do outro, transformou-se em um objeto que tentamos vender a qualquer custo, mesmo tendo que corromper nossos próprios valores, de sorte que nos submetemos a avaliações, a julgamentos, objetivando reconhecimento social, pautados em uma imagem reproduzida sem muitos significados a não ser o seu próprio. Isso nos conduz à superficialidade, cedendo à sedução pela aparência e afirmando um individualismo ajustado ao narcisismo.

Marcos aborda essa questão quando expõe sua preocupação com o olhar dos outros e complementa, dizendo:

[...] até eu se fosse eu empresário, dono de alguma coisa aí: chegar um cara limpo e um sujo, minha preferência seria a do cara limpo, independente se aquele que tivesse, se um tivesse mais experiência de trabalho do que o outro. Por quê? Normalmente quem tá sujo é isso mesmo, um cara que tá envolvido na cachaça, nas drogas, tá perdido, não quer nada com nada. Se ele não tá cuidando dele, vai cuidar do emprego dele, né? E é essa maneira que eles olham.

Guilherme focaliza o mesmo problema:

Porque o que eu ganho, o pouco que eu ganho eu invisto e as coisas que eu ganho eu não desfaço, eu não vendo, procuro usar, pode olhar, tá furadinho, mas também ninguém nota, o importante é estar limpo.

Apesar de estarem à margem do que a sociedade considera aceitável e de não possuírem muitos meios para manutenção da higiene básica, os trecheiros não conseguem estar alheios aos valores sociais emergentes no contemporâneo.

Para não banalizarmos a definição de narcisismo apenas como sendo o amor por si mesmo, quando queremos usá-lo como fenômeno social decorrente desse modo de vida capitalista, utilizamos a leitura de Lasch (1983).4 Assim, podemos trabalhar com um individualismo carente, vinculado ao sentimento de vazio e ao exibicionismo exacerbado, no qual a autoestima do sujeito se liga às suas figuras de contemplação sem significados, admiradas e vendidas.

A velocidade da produção e as exigências de venda de novos bens ajudaram na mudança de sentido do fabricar e comprar. O raciocínio de que as coisas são produzidas para atenderem às necessidades reais não é mais aplicado, deixando de lado o valor que legitima o esforço humano na fabricação de algo.

Nesse contexto, a utilidade é proporcionada pela felicidade, em que a compra de objetos se torna signo do conforto emocional desejado. Portanto, as raízes do consumismo (Birman, 2006) vão além da lógica de mercado, chegando a vias de monopólio de prestígios e prazeres, no qual o indivíduo busca diferenciar-se dos outros, por meio do "comprismo", visando a conter sua insatisfação social e emocional. Ter prazer é sentir satisfação pela compra, ou seja, satisfação é compatível com consumo. Já que sentir prazer é o principal ingrediente da felicidade, consumir passa a ser uma tentativa de comprar a felicidade.

[...] eu queria um trabalho de carteira, eu pedia um adiantamento e alugava um quartinho com banheiro e uma cozinha, só isso, nem ia ficar em casa, ia trabalhar o dia inteiro mesmo, a noite até dava pra arrumar uma namoradas (Rodrigo)

Ah, você vai para uma casa, eles arruma, se você chegar num bar, se tem um cara tomando uma pinga lá, já arruma. Nessa parte, é mais fácil. Chega lá, pede um salgadinho, todo mundo ajuda (Igor)

O que notamos nessa passagem é a inversão da lógica capitalista. Esse grupo de pessoas não compartilha dos ideais consumistas, já que almeja no máximo um emprego simples com carteira assinada. O ato da compra é substituído pelo pedir alguma ou qualquer coisa para matar a fome ou a vergonha. Pela lógica do consumo, os objetos são primeiramente fantasiados e posteriormente inutilizados. "Isso porque a interlocução pressupõe a existência do outro para que se possa fazer um apelo e ser o suporte para produção de sentido. Enfim, o vazio da subjetividade atual é o correlato do mundo que perdeu o sentido" (Birman, 2006, p. 193).

Temos, então, o mise-en-scène onde o que importa é o "gozo" próprio, o querer a qualquer custo as figuras idealizadas do consumismo, juntamente a uma indiferença pelo "gozo" do outro. Todavia, o indivíduo nunca alcançará satisfação duradoura o suficiente, pois novos produtos sempre serão lançados, "mais bonitos, mais aperfeiçoados". O prazer será sempre momentâneo. Não encontraremos a autorrealização emocional no consumismo.

É o que Lasch (1983) chamou de falsas satisfações, em que as gratificações são buscadas de modo imediato: é o mito do sucesso pregado por nossa sociedade. A satisfação está no momentâneo (pegar o que se quer ao invés de esperar o que se merece). O objeto exaltado hoje pode ser alcançado por meio do consumo. No entanto, amanhã haverá outro "melhor". Para que consigamos enfrentar os problemas de nossa sociedade, devemos rever todos os nossos ideais de felicidade e não dar tanta importância ao consumismo mais do que ele merece.

Na sequência, tentamos estabelecer uma relação entre os trecheiros, o trabalho e o consumo. Partimos da premissa de que os trecheiros estão inseridos na mesma sociedade capitalista que todos os outros seres humanos, de forma que o ato de trabalhar ocupa grande importância nesse contexto, porque o homem pode vender sua mão de obra a troco de dinheiro, circunstância que fez com que passasse a ser explorado. Esse mesmo homem, trabalhador e digno de status social, passa a ser cada vez mais explorado, tem que comprar cada vez mais símbolos para sua afirmação social, pois é isso que nossa sociedade prega, ou seja, um consumismo exacerbado. A intenção, aqui, foi mostrar a relação que o trecheiro estabelece com tal conjuntura, já que não possui subsídios para manter a imagem pregada e idolatrada pelo consumismo.

A intensa relação homem/produto, exaltada pelo capitalismo, faz com que a despossessão assuma um papel significativo junto à vergonha. O medo de perder algum produto ou status leva o sujeito a crer que está perdendo algo de si. Consequentemente, isso o levará a uma conduta moral perante a sociedade com a finalidade de não arriscar a tais perdas.

Pellegrino (1987) aponta o trabalho como o fornecedor desse status. No entanto, para isso, o indivíduo deve passar por algumas situações, porque o sujeito precisa sentir-se excluído da relação dos pais e, apesar de sentir-se impossibilitado, procura abrir opções na vida. Existe, portanto, uma lei que serve para estruturar o sujeito, possibilitando sua inserção no meio social.

O Édipo é a Lei do desejo. À Lei do desejo pode - e deve - corresponder um desejo de lei. A lei existe sobre a égide de Eros - para servir a Eros. Ela é, portanto, um produto erótico, está na base do processo civilizatório, desde sua origem, na sua raiz do esforço individual e coletivo no sentido de hominização - e da hominização do ser humano (Pellegrino, 1987, p. 199).

O indivíduo precisa renunciar ao desejo vinculado ao princípio do prazer, buscando a adequação ao princípio da realidade. Após esse sentimento de perda, outro aparece:

O pacto com a Lei da Cultura - ou Lei do Pai - é a tarefa primordial da criança na primeira etapa do seu desenvolvimento psicossexual. Transpondo o Édipo e suas vicissitudes, cheias de som e fúria, a criança entra em período de latência e, nele, inicia o processo de aquisição de uma competência, pela qual, no futuro, através do trabalho, irá contribuir para construção - e a transformação - da vida social (Pellegrino, 1987, p. 201).

Desempenhando papel mediador, o trabalho representa a possibilidade de inclusão na sociedade. O pacto com a Lei da Cultura está centrado na renúncia aos impulsos sexuais. Junto, ocorre o Pacto Social por meio do trabalho, no qual o indivíduo deve receber todos os instrumentos necessários para constituir-se como sujeito humano, preparando-se para identificar-se e inserir a si próprio na sociedade.

Trabalhar é inscrever-se no tecido social por mediação de uma práxis, aceitando a ordem simbólica que a constituiu. Trabalhar é disciplinar-se, é abrir mão da onipotência e da arrogância primitivas, é poder assumir os valores da cultura com a qual, pelo trabalho, nos articulamos organicamente (Pellegrino, 1987, p. 201).

É com a prática do trabalho que o indivíduo admite a renúncia pulsional, aceitando o princípio da realidade. O pacto que o sujeito estabelece com a Lei do Pai é que vai possibilitar a realização do Pacto Social:

O pacto primordial, repitamo-lo - prepara e torna possível um segundo pacto, em torno da questão do trabalho. O primeiro pacto garante e sustenta o segundo, mas este, por retroação confirma ou infirma, o primeiro. O pai é o representante da sociedade junto à criança. A má integração da Lei da Cultura, por conflitos familiares não resolvidos, pode gerar conduto antissocial, mas uma patologia social também pode ameaçar - ou mesmo quebrar - o pacto com a Lei do Pai (Pellegrino, 1987, p. 201-202, grifos do autor).

Para ser respeitada e preservada, a sociedade necessita respeitar e preservar o trabalhador. Caso contrário, o trabalhador responderá com desprezo e agressividade, podendo provocar a ruptura com o Pacto Social, como explica Hashimoto (2005).

A troca tem uma função primordial no processo de construção do sujeito, pois, ao oferecer, por meio do trabalho, a competência e a renúncia pulsional, o indivíduo espera receber o mínimo necessário para a preservação dos aspectos físicos e psíquicos. Se essa troca não se efetiva de forma satisfatória, pode ocorrer uma ruptura, no nível do inconsciente, com o Pacto Edípico. Isso significa uma destruição do mundo interno, "[...] o significante paterno, o Nome-do-Pai e, em consequência, o lugar da Lei" (Pellegrino, 1987, p. 203).

Desse modo, a sociedade pode ser considerada um progresso na organização do trabalho, que é visto agora como uma necessidade, podendo representar um agravante para nosso sujeito, já que sua precariedade acentua as restrições de escolha de um possível dignificador social, o trabalho. Tal questão pode ser observada nas falas de Marcos, Rodrigo e Guilherme, quando questionados sobre a importância do trabalho em suas vidas. Rodrigo declara que o trabalho é o que dignifica o homem e que, se tivesse oportunidade, alugaria uma casa bem simples, já que nem iria ficar muito lá, haja vista sua dedicação ao trabalho.

Ah, o trabalho para mim é minha vida. Porque eu, eu abandonei os estudos, por eu só fiz até o segundo grau, tinha vontade de ter tentado uma faculdade, ter me formado em engenharia mecânica, alguma coisa, mas não tive oportunidade, que eu tive que abandonar os estudos pra seguir minha profissão, né. [...]Você tem que abandonar um e eu preferi abandonar o estudo pra seguir minha profissão, por isso pra mim meu trabalho é minha vida. Eu amo o que eu faço, eu não trabalho na solda, porque eu dependo para ganhar um dinheiro, não. Eu trabalho na solda, porque eu amo ela, eu abandonei muitas coisas, até namorada pra poder seguir, pra poder trabalhar, pra poder me esforçar, aprender, virar um soldador e hoje eu me sinto humilhado de tá passando por essa situação igual eu tô te falado, ó cara. E é foda mesmo (você desculpa o vocabulário que eu falei agora, mas que é difícil, é difícil, mesmo, cara). Você ter que chegar e passar por uma situação dessas aí... (Marcos)

Ah, é tudo, né! A dignidade do homem é o serviço, né. Chegar no fim de semana você ter seu dinheiro, ter aquela renda fixa, né (Guilherme)

Os sujeitos relatam a importância de se er um emprego fixo. Contudo, Marcos expõe que fez escolhas para seguir rabalhando no que gosta, mas chegou a um momento em que suas escolhas não mais o dignificam perante a sociedade. Está desempregado, sem oportunidades e sem ninguém a recorrer. Quando busca outros empregos para melhorar sua imagem frente às pessoas, ele se depara com situações que novamente o excluem.

A condição de vida que leva, a falta de residência fixa e o nomadismo - que trouxe consequências negativas para sua vida profissional – são exemplificados em outra fala de Marcos, contando quando vai novamente, procurar emprego:

Perdi lá em... agora, na refinaria lá, ué... tive que tá na... três dias, aí consegui o teste, fiz o teste, aí, pra ir pegar o guia do exame, só depois do resultado da radiografia, quando eu fui lá para poder pegar no dia do exame, eu já tava com os trajes que eu tinha... tive que dormir na rua, quando eu cheguei já meio sujo, eles falaram: 'Ué... mas você não toma banho?' Falaram desse jeito, aí eu falei: 'Não, senhor, eu não tô tendo onde tomar um banho'. Falei a verdade: 'Eu tô dependendo de fichar, aí eu fichando, eu posso assumir um compromisso em uma pousada aí, para eu poder pagar a hora que eu receber o adiantamento ou...' falei com esse cara assim. Aí ficaram assim, falaram pra eu voltar dali cinco dias, aguentei mais cinco dias na rua, aí, quando eu voltei, falaram que tinham cancelado o fichamento de todo mundo [ruídos] Mentira! O pessoal que tava tudo lá tava fichado...

Já Rodrigo se coloca no papel do empregador ao receber um trecheiro numa entrevista de admissão:

Por exemplo: se eu fosse um empresário, aí, também ia ficar meio assim de dar emprego para um cara assim, sujo, que nem tem estudo direito.

Tais questões se unem a um agravante: o fato dos poucos albergues, que ainda existem, aceitarem esses sujeitos por um e, no máximo, três pernoites. Faltam-lhes espaços dentro da sociedade, um espaço que aos poucos vai sendo tomado, fazendo com que sua intensa e constante "peregrinação" seja cada dia mais necessária.

Soma-se a essa conjuntura a política de concessão de passagens adotada pelos governos municipais. Quando nossos sujeitos foram questionados sobre tal política pública de diminuição dos números de albergues e sobre receberem passagens para transitar entre as cidades, eles responderam:

Ah... é mais fácil, né... mas eu nem uso quase, porque você às vezes é humilhado quando entra na cidade, as assistentes social mesmo te esculacham. Eu fico andando, arrumo umas pinga e vô por aí (Rodrigo)

Olha, eu acho que essas verbas de passagens, tudinho, eu tenho 26 anos de rua, tem até gente que é mais velho que eu, eu acho que essas passagens aí tinha que ajuntar tudo e fazer um, um tipo, um negócio de serviço pra ganhar dinheiro e o cara alugar um quarto e... porque hoje eu tô aqui, amanhã joga pra um outro lugar, como é que eu vou ficar só um dia na cidade, daqui a pouco tem as polícias que 'embaçam' também.Então, eu acho que deveria ter um ramo de serviço, para aquele que quer, quem não quer fica de lado. Mas esse negócio de ficar dando passagem de todo lado, isso aí não vira, isso aí é turista, então... forçado. Eu tenho 26 anos que ando de a pé e não gosto de ficar pedindo passagem, agora é que eu tô cansado, mas eu ando pra não precisar ficar se humilhando... (Rafael)

Evidencia-se um descontentamento do próprio público com as políticas públicas adotadas pelos governos municipais. Os trecheiros preferem caminhar de cidade para cidade a entrarem na zona urbana só para pedir passagem, além de alguns se sentirem humilhados pelas próprias assistentes sociais. Há até sugestões dos mesmos para dar outro destino ao dinheiro empregado na compra das passagens.

Marcos conta ainda que, nesse período em que está vivendo como trecheiro, se sente muito mal:

Pô, em dois meses parece que... que eu não... que esses dois meses parece que eu não sou ninguém, um saco de lixo tá parecendo, um inútil, entendeu?

A falta de trabalho para Marcos se configurou em uma história de perda de sua dignidade, perda de padrões valorizados e cobrados pela sociedade, como é o caso da própria conduta moral, cobrada igualmente pela própria pessoa. Esboça-se, dessa maneira, uma questão que consideramos a ferida civilizatória chamada moral. Nessa perspectiva, podemos afirmar que o código moral da sociedade está baseado na culpa.

Trata-se de uma moral que, por sua vez, se incumbiu de canalizar toda a agressividade da civilização. Compreendemos, por conseguinte, um supereu5 social, o qual não se importa com a saúde psíquica do indivíduo, lançando ordens ao eu, julgando-o apto e hábil para tanto. Discorrendo sobre a vergonha, nesse contexto, deparamo-nos com um complexo sistema: eu, supereu e ideal de eu.

O eu é alvo tanto das exigências de seu ideal como dos limites morais do supereu. Ele sofre pressões de ambos os lados, sejam elas internas, sejam externas. Segundo Birman (2000) temos evidenciado uma cena social, que ocupa o lugar de palco, para que o eu seja exaltado, lugar esse onde o ser e o parecer se confundem incitados pelo exibicionismo, em que a relação narcisista é marcante. Aqui, o exibicionismo sinaliza as pressões externas sofridas pelo ego, caracterizando a importância do olhar do outro. Já o narcisismo assinala as pressões internas sofridas pelo ego, caracterizando vivências passadas que podem ser retomadas a qualquer momento.

Débord (1997) mostra uma ligação da "evolução" humana com a negação de instintos primários, uma vez que a liberdade dos instintos é normalmente restringida no processo de socialização. O espetáculo equivale à produção de alienação por causa da expansão econômica que transforma tudo em imagem a ser estimada. Consequentemente, o corpo será afetado pelo desenvolvimento emocional, assim como os estados da psique. Nesse sentido, é provável inserirmos os trecheiros em um tempo, o qual passou por muitas transformações. O mal-estar que antes começava a se delinear, agora já está instaurado e julgado necessário.

A vida em sociedade torna-se o grande agenciador do processo de instauração do mal-estar. Freud (1930), em O Mal-Estar da Civilização, havia alertado para aspectos semelhantes, como o avanço técnicocientífico e os descompassos em nossas satisfações que isso poderia ocasionar. Ele não propôs desvalorizar totalmente o progresso tecnológico da civilização para a obtenção de felicidade. Contudo, ressalta que o poder do homem sobre a natureza não é a única forma de obtenção da felicidade. "Enfim, de que nos vale uma vida longa se ela se revela difícil e estéril em alegrias, e tão cheia de desgraças que só a morte é por nós recebida como uma libertação?" (Freud, 1930, p. 107-108).

O mal-estar, que antes começava a se mostrar e que depois se tornou uma necessidade na sociedade, agora é agravado pelo desenvolvimento e aperfeiçoamento de técnicas e conhecimentos. Se, por um lado, os avanços técnico-científicos podem prolongar a vida do homem, por outro, podem acarretar-lhe sofrimentos. "Pode-se sublinhar a presença, na obra de Freud, não de uma crítica da modernidade enquanto tal - o que seria ingênuo, já que a modernidade é uma produção da ordem da história -, mas dos impasses que a modernidade constituiu para o sujeito" (Birman, 2000, p. 139).

Freud (1930) faz, ainda, uma releitura das problemáticas propostas pela modernidade, inserindo o sujeito como seu fundamento. A partir de tal ponto, a emoção encontra, nessa ocasião, um jeito deturpado de se externalizar, partindo da premissa de que tais avanços foram insuficientes para saciarem nossas alegrias.

É essa concepção de homem, ao mesmo tempo autossuficiente e desamparado - de algo maior para se apoiar, quando em situações adversas - que vai inquietar a humanidade. A quem recorrer nos momentos difíceis?

Mas Deus sabe das coisas, tudo na vida do homem tem um, tem um motivo, né, que sirva de experiência, não sei (Marcos)

[...] simplesmente num ponto a gente fica triste, né, entrega na mão de Deus, né, aí, pensa assim: esse é fraco de espírito, entendeu? Sou, sou católico [gesticula e mostra o crucifixo no pescoço] (Guilherme)

Em função desse sentimento de desamparo e das limitações morais é que a religião conseguiu triunfar. Ela oferece segurança de um futuro melhor para quem a segue e um alívio da culpa, denominado pecado, de que o homem já nasce portador. Há, ainda, nessa culpa, a contenção dos chamados impulsos carnais e de luxúria. As discussões sobre religião são complexas e extensas, mas não é nosso objeto de reflexão, embora auxiliem na compreensão do mal-estar do qual nosso público-alvo (trecheiros) compartilha.

No mal-estar da sociedade dita espetacular, à mídia são atribuídos poderes, pela sociedade, os quais fazem com que ela possa atuar, estimulando a massificação das pessoas, por meio de uma subjetivação social de ideais, focada na ferida narcísica dos indivíduos, que se constitui como a possibilidade da revivência de situações semelhantes àquelas que desencadearam a instauração da vergonha na pessoa.

A mídia é o operador principal desse sistema. Sem esta, afirma-se, o espetáculo se esvazia. Caberia perguntar acerca do lugar ou instância do aparelho psíquico que a mesma vem ocupar para exercer essa capacidade subjetivante, mas também essa potência de captura imaginária e massificação (Fuks, 1999, p. 71).

Assim, deduzimos a contemporaneidade como uma época instaurada de um mal-estar cumulativo de várias outras épocas, que possui, além de um código moral social, exigências sociais amorais, que exigem do sujeito uma postura que não condiz com o equilíbrio orgânico e psíquico, caso este venha a submeter-se aos ditames daquela sociedade, tendo em vista que a velocidade dos acontecimentos é intensa, fruto da volatilidade dos acontecimentos tanto concretos como subjetivos.

Na sociedade contemporânea, os sujeitos são dotados de poderes e autossuficiência inquietantes e desconfortáveis, proporcionados pelo avanço da tecnologia e da ciência, o qual nós mesmos buscamos. Experimentamos um período em que se encontra um grande descompasso entre alegria e sofrimento, um tempo no qual um instrumento faz a mediação na vida de muitos, recebendo o nome de mídia, e onde o narcisismo triunfou, ressignificando o conceito de relação.

É nesse contexto que vivem os trecheiros, um palco de todas as suas exigências e esperanças em relação à sociedade e desta para com eles, conjuntura na qual a vergonha ocupa um lugar significativo, camuflado por raiva, medo, vivências na infância, violência, humilhação, amores proibidos direcionados às suas ilusões, proporcionadas por suas expectativas num equilíbrio interno e externo.

O significado do trabalho, dentro de nossa sociedade capitalista, ainda os permeia na tentativa de resgatar sua dignidade; porém, os padrões de consumismo - consequência dessa sociedade - não são por eles divididos. A intenção do trabalho é ainda primitiva se pensarmos nos moldes contemporâneos: conseguir uma moradia simples, com uma cama confortável e alimentação.

Contudo, antes mesmo do trabalho, o simples ato de pedir já é uma espécie de ocupação, que resiste aos padrões do consumo exacerbado. Muitos relatam que a vergonha na hora de pedir os impede de "mendigar" sempre, fazendo-o apenas quando absolutamente necessário, para matar momentaneamente a fome, a sede ou mesmo a vergonha.

Vale mencionar as dificuldades encontradas pelos trecheiros, como o medo na hora de dormir, a solidão, quando o uso do álcool acaba sendo importante, em determinados momentos.

[...] mas você dormir num lugar, uma pessoa fazer uma covardia com você, você entendeu? Você tá dormindo e atear fogo em você, ou você toda hora, você ser abordado por polícia, entendeu? É doloroso, né (Marcos)

Agora, o duro é onde você dormir, você entendeu? Fica com esse negócio de droga, de crack aí... então, você não consegue dormir tranquilo, entendeu? Você dorme, mas com dois palitos no olho. Sem descansar (Igor)

Medo, insegurança, violência, inconsequência e delinquência são todos características decorrentes de nosso modelo social consumidor e de seus produtos valorizados, cenário onde a violência que estampa as capas dos jornais são manchetes valorizadas dentro dos noticiários. Em outras palavras, é o que vende. Está criada uma indústria da violência social, em que não só os criminosos ficam com os louros. Considerando que desse movimento pode provir alguma forma de sofrimento, os trecheiros têm suas vidas postas em evidência, pois estão expostos à certeza da precariedade.

Essa posição os colocará em situações nas quais sua vergonha tem maiores chances de aflorar, tendo de lidar com os préconceitos da sociedade, além de seus próprios. Seguem, assim, um raciocínio que os colocará à margem de seus medos, pois, uma vez submetidos às demandas contemporâneas, sua exposição lhes dará propósitos para preocuparem-se, mesmo que eles não a desejem. Quando isso ocorrer, suas feridas jamais se cicatrizarão.

Por isso, a questão da mendicância, o ato de pedir, de estender a mão à espera da boa vontade alheia, em um mundo escasso de um olhar mais íntimo para com o outro, é tão difícil, sendo necessário compartilhar entre si estratégias para que tal ação seja menos árdua. Uma dessas estratégias é o uso do álcool (da pinga, da cachaça), que se torna um aliado nos momentos difíceis, como podemos observar nos relatos a seguir.

Guilherme nos conta que a noite é o momento mais triste. É quando eles param e pensam na vida - e é nesse momento que muitos se entregam à bebida. Bebem para conseguir dormir em qualquer lugar.

Ah, nem que eu quisesse fazer, o que eu não quero fazer é isso aí, ó, pedir, entendeu? Às vezes beber, e às vezes tô bebendo pra poder ver se... pra esquecer os problemas, mas não esquece, depois eles vêm e vêm pior, entendeu? Esquece aquele momento que você chapa ali, fica alcoolizado, dorme, mas você acorda e a realidade é aquela ali mesmo (Marcos)

Ô! Todo dia. [como é?] É difícil, é difícil. Ainda mais você estando são. Por isso que a gente bebe. Se não beber, não pede, aí morre de fome, né(Francisco)

Pedir por necessidade, passar vontade, viajar constantemente e não se fixar em uma cidade apenas, dentre outros vários aspectos indesejáveis, são resultados de um novo padrão (nova política pública) adotado pela sociedade, a fim de que não seja necessário olhar diretamente para esses seres humanos. É mais cômodo esconder ou transferir o problema para um lugar onde não o veremos mais, já que, como enfatiza o dito popular, "o que os olhos não veem o coração não sente".

Por fim, podemos afirmar que encontramos, sim, o sentimento da vergonha nos trecheiros e suas relações com o modo de vida contemporâneo, sendo que o registro do corpo, o da ação e o do sentimento marcam essas relações do malestar entre vergonha e contemporâneo. O corpo aparece como o mais evidente, pois é o reflexo do meio em que vivemos. Desse modo, o corpo do trecheiro escancara tal relação, uma vez que as condições precárias em que vive traz características para sua imagem, destacando-a das demais.

Já a ação se refere à indeterminação: agir sem saber o que buscar. Aparece, então, o nomadismo como uma característica principal. Isso faz com que todos sejam classificados pela sociedade como iguais (trecheiros, mendigos, andarilhos), o que por sua vez causa incômodo.

O terceiro registro do mal-estar é o sentimento, em que constantes situações de descaso e repúdio da sociedade para com os trecheiros os faz acreditar que ocupam um lugar de inferioridade frente aos demais.

Vale mencionar também a importância do trabalho atribuído de significados dentro de nossa sociedade capitalista. Ele atua como um dignificador do homem, o que ressalta e marca ainda mais a figura do trecheiro dentro dessa sociedade "espetacular".

Dessa forma, não é intuito deste trabalho esgotar as discussões sobre o assunto nem apontar meios mais eficientes na conduta de políticas públicas. Levantamos, aqui, questões para melhor entendê-las e, assim, serem discutidas por todos em situação democrática. Contudo, vale a menção da perda contínua de espaço desse público dentro de nossa sociedade.

Não basta fechar os olhos para o problema e esperá-lo desaparecer de nossa frente, pois esse mesmo problema aparecerá em outro lugar, com a mesma ou até com maior intensidade.

 

Referências

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Recebido: 25/05/2011
Aceito: 14/05/2012

 

 

1 Contato: solderamartins@yahoo.com.br
2 Sobre a temática, temos ciência dos estudos de autores relevantes, como: Yves de La Taylle, Harok de La Taille, Ulisses Araújo e Luigi Anolli. Contudo, não é intenção deste trabalho discutir a vergonha sob a ótica de tais autores.
3 Trabalho sem vínculo empregatício, no qual as pessoas auxiliam na carga e/ou descarga de caminhões.
4Para ler mais sobre o assunto, consultar Lasch (1983) em A Cultura do Narcisismo.
5 Sabemos dos embates teóricos que envolvem as traduções das Obras Completas de Sigmund Freud. Contudo, não é intenção deste trabalho entrar em tais discussões.

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