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Revista de Psicologia da IMED

versão On-line ISSN 2175-5027

Rev. Psicol. IMED vol.9 no.2 Passo Fundo jul./dez. 2017

https://doi.org/10.18256/2175-5027.2017.v9i2.1464 

ARTIGO DE REVISÃO NÃO SISTEMÁTICA DE LITERATURA

 

Revisão Sistemática da Literatura Sobre Características de Intervenções em Carreira

 

Systematic Literature Review on Characteristics of Career Interventions

 

 

Clarissa Tochetto de OliveiraI; Marco Antônio Pereira TeixeiraII; Ana Cristina Garcia DiasIII

IMestre em Psicologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: clarissa.tochetto@gmail.com; ORCID iD: https://orcid.org/0000-0002-2624-8843
IIDoutor em Psicologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: mapteixeira@yahoo.com.br; ORCID iD: https://orcid.org/0000-0001-7981-9788
IIIDoutora em Psicologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: anacristinagarciadias@gmail.com; ORCID iD: https://orcid.org/0000-0003-2312-3911

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Existem diversas modalidades de intervenção em carreira, com diferentes abordagens teóricas, objetivos e procedimentos. Nesse sentido, é importante que tanto orientadores quanto usuários possam conhecer quais as alternativas descritas na literatura, a fim de fundamentar a prática profissional e a escolha por abordagens adequadas às demandas dos clientes. O objetivo deste estudo é caracterizar as intervenções em carreira testadas empiricamente e publicadas no período 2010-2014. Para tanto, foi realizada uma revisão sistemática da literatura com as palavras-chave carreira/career e intervenção/intervention nas bases de dados Lilacs, Redalyc, Pepsic, Scielo, PsycInfo e periódicos CAPES no período informado. Um total de 17 artigos foram analisados. As informações foram organizadas em quatro categorias: modelos teóricos, público-alvo, estrutura e procedimentos e avaliação da intervenção. Os resultados mostraram um predomínio dos referenciais teóricos dos modelos sociocognitivo de carreira e do modelo de Holland, foco nas populações de adolescentes e adultos, e duração da intervenção variando de uma a várias sessões. Os resultados dessas intervenções foram avaliados de forma predominantemente quantitativa, com medidas pré e pós-intervenção. Conclui-se que as intervenções em carreira incluem conteúdos e processos diversos e diferentes públicos-alvo.

Palavras-chave: carreira, intervenção, desenvolvimento profissional, revisão de literatura


ABSTRACT

There are several career intervention modalities, with different theoretical approaches, objectives and procedures. In this sense, it is important that both counselors and users can know what alternatives are described in the literature, in order to base the professional practice and the choice by appropriate approaches to the clients' demands. The aim of this study is to characterize career interventions that have been carried out and empirically tested lately. A systematic literature review was performed with the keywords carreira/career and intervenção/intervention in Lilacs, Redalyc, Pepsic, Scielo, PsycInfo e periódicos CAPES databases between 2010 and 2014. We found 89 papers, but only 17 were analyzed. Information was organized in four categories: theoretical model, target population, structure and procedures, and evaluation of intervention. We verify that there are no predominant theoretical model, structure and procedures, although career intervention may be effective and useful to people in different phases of human development. Results show that career interventions in general were based on the Socio-Cognitive theories of Career and Holland, for adolescents and adults, carried out in one or more sessions. The results were evaluated in a predominantly quantitative way. We conclude that career interventions can include diverse content and processes, as well as different target audiences.

Keywords: career, intervention, professional development, literature review


 

 

Intervenções de carreira referem-se a qualquer apoio direto a um indivíduo para ajudá-lo a resolver dificuldades encontradas no desenvolvimento da carreira (Spokane, 1990). As primeiras intervenções de carreira surgiram como uma resposta à transição da economia agrícola para a economia industrial. Nesse período, entre os anos de 1900 a 1950, predominavam as intervenções que tinham como modelo a combinação das características das pessoas com aquelas exigidas pelos empregos. Estas abordagens ficaram conhecidas como modelos de ajustamento ou traço-e-fator (Savickas, 2015). Estes modelos apresentam a vantagem de categorizar a informação sobre pessoas e ambientes de trabalho de forma a facilitar a tomada de decisão na carreira (Barros, 2010).

A partir de meados do século XX, aproximadamente, o foco das intervenções foi se ampliando e a escolha profissional passou a ser vista como uma decisão que deveria levar em conta os interesses do indivíduo e o seu papel nessa decisão. Mais do que isso, a carreira passou a ser vista como um processo que se desenvolve ao longo da vida. A escolha seria, assim, uma tentativa de expressar, através de uma ocupação, a imagem que a pessoa possui de si mesma. A ideia de que as escolhas individuais não podem ser compartimentadas em escolhas pessoais, acadêmicas ou profissionais contribuiu para que o aconselhamento de carreira passasse a considerar os comportamentos de carreira de forma integrada aos demais comportamentos e contextos de vida ao longo do desenvolvimento. Essa perspectiva foi mais nitidamente enfatizada na teoria de desenvolvimento de carreira de Donald Super (Savickas, 2015; Super, 1980).

Já a partir dos anos 90, ocorreu a ascensão de abordagens narrativas para a compreensão das carreiras, com foco nos significados atribuídos pelos indivíduos às suas decisões (Herr, 2008). A ideia de que o indivíduo constrói sua carreira por meio da forma como narra a realidade deu origem a intervenções focadas nas histórias de vida, que identificam modelos e temas de vida, além de considerar o passado e o presente para a construção das carreiras (Barros, 2010; Savickas, 2015).

Atualmente, a sociedade industrial encontra-se em transição para uma sociedade considerada da informação. Com a redefinição das estruturas de emprego e da organização do trabalho, surgem mudanças importantes na área do desenvolvimento e aconselhamento de carreira. Observam-se transformações na quantidade e qualidade dos empregos disponíveis, nas taxas e nos períodos de ocorrência de desemprego, nos processos de transição da escola para o mercado de trabalho e nos contextos de trabalho (Herr, 2008; Savickas, 2015). Os indivíduos vivenciam múltiplas transições na carreira e na vida, e necessitam integrar diferentes papéis. Assim, embora a questão da escolha continue sendo um dos elementos centrais nos processos de aconselhamento profissional, surge a necessidade de se considerar a capacidade do indivíduo se adaptar a contextos que se encontram em constante mudança (Barros, 2010; Savickas, 2015). Esse cenário tem estimulado a criação de novas intervenções de carreira, com foco mais abrangente que a escolha profissional pontual e a preparação para o trabalho apenas, englobando também fatores psicológicos, como a redução do estresse e da raiva (Herr, 2008), a efetividade de decisões de carreira (Lam & Santos, 2017), a promoção da adaptabilidade de carreira (Savickas, 1997; Seibert, Kraimer, & Heslin, 2016) e a criação e aproveitamento de oportunidades (Mitchell, Levin, & Krumboltz, 1999).

Dada a diversidade de opções de intervenções em carreira, torna-se necessária a sistematização de informações sobre as mesmas. Os usuários merecem conhecer os resultados e a utilidade dos serviços oferecidos. Ao mesmo tempo, os profissionais possuem a responsabilidade ética de utilizar abordagens e técnicas efetivas (Mau, 2007). Assim, o conhecimento das características das intervenções atuais em carreira pode beneficiar os profissionais desse campo. A identificação das teorias, estrutura e procedimentos adotados nas intervenções pode contribuir para a atualização teórica e prática do profissional (Barros, 2010). A partir disso, os profissionais podem não só replicar as intervenções, como ampliar o serviço oferecido para outros públicos que também podem se beneficiar de intervenções de carreira.

Há dois estudos que se destacam por terem sistematizado evidências que mostram que as intervenções de carreira são efetivas, por que o são e com que tipo de cliente (Brown & Ryan Krane, 2000; Mau, 2007). Brown e Ryan Krane (2000) indicaram cinco componentes críticos para a efetividade de intervenções de decisão de carreira, independente de como o estudo foi conduzido, quem foram os participantes da intervenção e se a mesma foi individual, grupal ou autodirigida. Esses componentes são: a) exercícios escritos, em que os participantes escrevem suas metas e planos, por exemplo, b) feedback individual das atividades realizadas, independente do formato da intervenção, c) oportunidades de buscar informações sobre o mundo do trabalho durante a intervenção, d) modelagem, que consiste na exposição a modelos de exploração vocacional, tomada da decisão, etc.) formação de uma rede de apoio para suas decisões e planos de carreira (Brown & Ryan Krane, 2000). De forma complementar, Mau (2007) sintetizou quais modalidades de intervenção são mais efetivas dependendo do tipo de cliente. Em geral, este estudo identificou que as intervenções mais efetivas eram baseadas nas teorias Sócio-Cognitiva de Bandura, de Condicionamento e Reforço Cognitivo-comportamental e dos Tipos Psicológicos de Holland. Além disso, eram compostas por atividades estruturadas ou semiestruturadas, organizadas em quatro a oito sessões, com duração mínima de duas semanas (Mau, 2007).

As informações sistematizadas (Brown & Ryan Krane, 2000; Mau, 2007) têm norteado o desenvolvimento de intervenções em carreira. Embora os critérios apresentados por esses autores sejam válidos, faz-se necessária uma revisão da literatura atualizada das intervenções em carreira. O objetivo deste estudo é caracterizar as intervenções em carreira testadas empiricamente e publicadas no período 2010-2014. Em especial, pretende-se responder: a) em que teoria as intervenções estão baseadas, b) a quem as intervenções se destinam, c) qual a estrutura e o procedimento das intervenções e d) como as intervenções foram avaliadas.

 

Método

A revisão sistemática foi organizada em três fases, que podem ser visualizadas na Figura 1. Na primeira, foi realizada uma busca da literatura publicada entre os anos de 2010 e 2014 sobre intervenções em carreira. Este período foi escolhido com o intuito de mapear as publicações atuais sobre o tema. A busca foi realizada nas bases de dados Lilacs, Redalyc, Pepsic, Scielo, PsycInfo e periódicos CAPES. Optou-se por essas bases de dados por oferecerem acesso ao texto completo de publicações nacionais (Lilacs, Pepsic, Scielo) e internacionais (Redalyc, PsycInfo e periódicos CAPES) no meio eletrônico. Foi utilizada a combinação entre duas palavras-chave: carreira/career e intervenção/intervention. Embora essas palavras-chave não constem como descritores na Terminologia em Psicologia da Biblioteca Virtual em Saúde, as mesmas foram escolhidas pela frequência com que são utilizadas em artigos da mesma temática. Em novembro de 2014, foram encontrados 89 trabalhos completos que possuíam as palavras carreira/career e intervenção/intervention no título.

 

 

Na segunda fase, os artigos foram avaliados conforme os critérios de inclusão definidos a partir do objetivo deste estudo: caracterizar as intervenções em carreira testadas empiricamente e publicadas no período 2010-2014. Os critérios de inclusão foram: a) ter sido publicado nos últimos cinco anos (2010-2014), b) o texto estar disponível na íntegra e c) o trabalho abordar a discussão de intervenções em carreira. A partir da leitura do título, foram excluídos 46 artigos repetidos. O ano de publicação fora do período de interesse também resultou na exclusão de quatro artigos. Em seguida, buscou-se recuperar os 39 artigos restantes, mas sete deles foram excluídos da amostra por não estarem disponíveis na íntegra. Os resumos dos 32 artigos restantes foram lidos a fim de delimitar a amostra de trabalhos a serem analisados na íntegra. Foram excluídos mais nove artigos que não apresentavam intervenção de carreira e seis que tratavam de outros temas, como políticas de carreira e validação de instrumentos. No total, foram excluídos 72 artigos dos 89 encontrados na busca.

A amostra final foi constituída por 17 artigos que foram lidos na íntegra. As informações foram organizadas em cinco categorias definidas a priori, de forma a contemplar o objetivo do estudo. As quatro categorias são: modelos teóricos, público-alvo, estruturas e procedimentos utilizados na intervenção e avaliação da mesma.

 

Resultados e discussão

Foram analisados 17 artigos publicados entre 2010 e 2014. A Tabela 1 caracteriza as publicações conforme seus objetivos, teorias utilizadas para construção da intervenção, público-alvo, estrutura e procedimentos da intervenção e avaliação da eficácia e/ou do processo.

Os artigos analisados tinham como objetivo descrever e avaliar a efetividade de uma intervenção em carreira (Behrens & Nauta, 2014; Bullock-Yowell et al., 2014; Davidson, Nitzel, Duke, Baker, & Bovaird, 2012; Herman, 2010; Turner & Conkel, 2010). Para tanto, foram verificados os possíveis efeitos produzidos pelas intervenções em variáveis de desfecho relacionadas ao planejamento de carreira (Dik, Steger, Gibson, & Peisner, 2011; Doren, Lombardi, Clark, & Lindstrom, 2013; Koivisto et al., 2011; Salmela-Aro, Mutanen, & Vuori, 2012; Vuori, Toppinen-Tanner, & Mutanen, 2012), à escolha de carreira (Ferrari et al., 2012; Işik, 2014; Koivisto, Vinokur, & Vuori, 2011), à exploração vocacional (Gamboa, Paixão, & Jesus, 2011; Pinto & Taveira, 2011), à perspectiva temporal (Dik et al., 2011, Ferrari, Nota, & Soresi, 2012), ao aprendizado (Salleh, Abdullah, Mahmud, Ghavifekr, & Ishak, 2013), às preocupações de carreira (Pinto & Taveira, 2011) e a emoções positivas e autoeficácia (Ouweneel, Le Blanc, & Schaufeli, 2013). Alguns ainda buscaram examinar se a moderação de um grupo online por um profissional da área de desenvolvimento de carreira beneficiaria os participantes (Herman, 2010), e coletar dados qualitativos para melhorar a intervenção (Dik et al., 2010).

A seguir, as características dos estudos analisados serão apresentadas e discutidas de acordo com as categorias: modelos teóricos, público-alvo, estruturas e procedimentos e avaliação da intervenção.

 

Modelos teóricos

Uma teoria é construída para compreender fenômenos complexos, fazer predições sobre o futuro e para indicar a adoção de determinadas técnicas (Krumboltz, 1994). Assim, as teorias podem indicar o formato de intervenções com objetivos diversos e definidos a partir da diversidade dos destinatários (Barros, 2010). Contudo, nem sempre se verifica uma relação clara entre teoria e intervenção (Savickas, 1996). Dentre os artigos analisados, alguns não apresentaram ou não especificaram qual foi o modelo teórico utilizado para desenvolver a intervenção (Doren et al., 2013; Gamboa et al., 2011; Herman, 2010; Ouweneel et al., 2013). Outros criaram a intervenção com base nas supostas necessidades da população alvo (Pinto & Taveira, 2011), em experiências anteriores (Salmela-Aro et al., 2012) e em pesquisas anteriores (Doren et al., 2013).

Dentre os artigos que especificaram as teorias utilizadas, verifica-se que não existe um modelo teórico predominante. Foram citadas a Teoria Sócio-Cognitiva de Carreira (Davidson et al., 2012; Koivisto et al., 2011; Vuori et al., 2012), o modelo de Holland (Behrens & Nauta, 2014; Salleh et al., 2013), a adaptabilidade de carreira e a maturidade de carreira (Cassie & Chen, 2012; Ferrari et al., 2012), que são construtos e não teorias, o processamento cognitivo da informação (Bullock-Yowell et al., 2014), o Integrative Contextual Model (Turner & Conkel, 2010) e Modelo expectancy-value (Koivisco et al., 2011).

Em estudos empíricos, a teoria pode aparecer como um argumento que ajuda a explicar fenômenos que ocorrem no mundo. Os pesquisadores propõem ou especificam uma teoria, que define como e por que as variáveis investigadas podem estar relacionadas, e coletam dados para testá-la (Creswell, 2010). Nos artigos analisados, nem sempre foi possível identificar a justificativa teórica, ou seja, a explicação sobre o que é importante trabalhar com determinados participantes em uma intervenção em carreira, por que é importante e como fazê-lo.

 

Público-alvo

O público-alvo das intervenções em carreira pode variar conforme o objetivo da mesma (Barros, 2010). Houve estudos que utilizaram a escolaridade para caracterizar os participantes. Participaram estudantes de ensino fundamental (Dik et al., 2011; Koivisto et al., 2011; Turner & Conkel, 2010), ensino médio (Cassie & Chen, 2012; Doren et al., 2013; Ferrari et al., 2012; Gamboa et al., 2011; Salleh et al., 2013) e ensino superior e pós-graduação (Behrens & Nauta, 2014; Işik, 2014; Pinto & Taveira, 2011).

O foco em diversos níveis educacionais pode indicar a preocupação atual de oferecer um acompanhamento no desenvolvimento de carreira desde cedo. Assim, as intervenções deixam de ser pontuais para assumirem uma perspectiva educativa, com ênfase em programas de intervenção, estruturados para promover o desenvolvimento vocacional dos jovens (Barros, 2010). Nesse sentido, destaca-se que uma proposta de intervenção chamado educação para a carreira. Como o nome sugere, esse modelo possui enfoque educativo e busca auxiliar crianças e jovens nas escolhas profissionais e no preparo para futuros empregos (Munhoz & Melo-Silva, 2011). Embora esse modelo não tenha sido claramente citado por nenhum estudo analisado, as intervenções destinadas a participantes de diferentes escolaridades possuíam objetivos gerais em comum (ajudar nas decisões de carreira e no preparo para futuros empregos).

Outros estudos utilizaram critérios diversos, como ser adulto (Herman, 2010), estar empregado (Salmela-Aro et al., 2012; Vuori et al., 2012), estar desempregado (Bullock-Yowell et al., 2014) e ser mulher que esteve em um relacionamento íntimo abusivo (Davidson et al., 2012). Esses participantes podem apresentar demandas diferentes, de forma que justifique reuni-los para uma intervenção específica. Há evidências de que adultos que procuram por serviços de orientação de carreira, por exemplo, apresentam preocupações quanto ao ingresso no ensino superior, às transições de carreira e à necessidade de informação profissional (Santos & Melo-Silva, 2011). De forma semelhante, indivíduos que estão empregados parecem precisar de confiança nas suas habilidades para lidar com suas carreiras e na sua motivação em um ambiente de trabalho cada vez mais imprevisível (Salmela-Aro et al., 2012). Por outro lado, pessoas que estão desempregadas apresentam necessidades semelhantes as de estudantes universitário no que se refere a pensamentos negativos de carreira e autoeficácia para decisão de carreira (Bullock-Yowell, Andrews, McConnell, & Campbell, 2012). Mulheres que foram abusadas por seus parceiros parecem precisar de auxílio para estabelecer independência econômica e explorar oportunidades de carreira (Davidson et al., 2012). Mulheres mães privadas de liberdade apresentam necessidades relacionadas à educação continuada e treinamento vocacional (Laux et al., 2011). Estudantes universitários estrangeiros demandam estratégias para colocação professional, para lidar com fatores individuais que interferem nas barreiras percebidas na carreira e estratégias para busca de ajuda (Crockett & Hays, 2011). A partir dessas evidências, verifica-se que pessoas que compõem grupos diferentes apresentam demandas de carreira diferentes. A avaliação das necessidades de atendimento pode contribuir para melhor delineamento das estratégias de intervenção com esse público (Santos & Melo-Silva, 2011).

Apenas um estudo não definiu o critério de escolha dos participantes, apesar de utilizar variáveis como sexo e nível educacional para comparação entre grupos (Ouweneel et al., 2013). Questiona-se se isso de fato ocorreu na prática ou se somente não foi relatado no artigo. Se não houve definição prévia do público-alvo para a intervenção, é possível que a mesma tenha sido genérica (sem considerar as necessidades reais dos participantes) e com base na experiência dos pesquisadores, visto que também não esclareceram o modelo teórico utilizado. Além disso, sugere que intervenções em carreira podem ser realizadas "de qualquer jeito" quando, na verdade, estudos mostram que determinados tipos de intervenção funcionam para determinados tipos de pessoas (Mau, 2007). Por outro lado, se as características do público-alvo da intervenção apenas não foram relatadas pelos autores, a falta dessas informações limita uma avaliação mais crítica e a replicabilidade das mesmas (Oliveira, 2014).

 

Estruturas e procedimentos das intervenções

Os estudos analisados relataram intervenções em carreira de estruturas variadas. Em média, as intervenções foram realizadas em quatro a seis sessões, com duração de uma a duas horas, conforme as características das intervenções em carreira efetivas (Mau, 2007). No entanto, houve intervenções de uma sessão, no formato de workshop, com duração de uma hora (Bullock-Yowell et al., 2014) e outras organizadas em cinco dias da mesma semana com três horas cada (Koivisto et al., 2011), em cinco sessões de quatro horas (Salmela-Aro et al., 2012; Vuori et al., 2012), em 10 sessões de duas horas (Ferrari et al., 2012), em 10 sessões de três horas (Salleh et al., 2013), em 18 sessões de 50 minutos (Doren et al., 2013) e, até mesmo, com duração de 55 horas, sem informação sobre como foram distribuídas (Cassie & Chen, 2012).

Alguns estudos relataram ainda o número de participantes por grupo de intervenção. A quantidade variou de três a sete (Davidson et al., 2012; Işik, 2014; Pinto & Taveira, 2011), de seis a 10 (Behrens & Nauta, 2014) e 11 participantes (Salmela-Aro et al., 2012). Quando se trata de intervenções de carreira em grupo, pode ser útil buscar pesquisas que indiquem qual seria a quantidade adequada de participantes por grupo. Por exemplo, há evidências de que intervenções em pequenos grupos, de seis a oito participantes, pode resultar em maior magnitude de efeito que grupos maiores (Faria, Königstedt, & Taveira, 2011).

Quanto aos procedimentos das intervenções em carreira, os aspectos descritos na maioria dos estudos analisados incluíram os objetivos das mesmas, os instrumentos e técnicas utilizadas, instruções, tópicos de discussão. Poucos autores descreveram se e como a equipe foi treinada para facilitar a intervenção (Bullock-Yowell et al., 2014; Koivisto et al., 2011). Esse tipo de informação pode ser relevante para profissionais que queiram replicar a intervenção (Oliveira, 2014).

Há ainda estudos que apresentaram descrição insuficiente para replicação da intervenção, ou seja, somente os objetivos (Davidson et al., 2012) ou instrumentos e técnicas sem relatar como foram trabalhados (Cassie & Chen, 2012; Doren et al., 2013; Gamboa et al., 2011; Koivisto et al., 2011; Pinto & Taveira, 2011). Outros não apresentaram o conteúdo, mas indicaram a referência onde os leitores podem encontrá-lo (Salmela-Aro et al., 2012; Vuori et al., 2012). A falta dessas informações pode comprometer a qualidade da publicação, uma vez que os leitores não sabem como a intervenção foi conduzida (Oliveira, 2014; White, 2005).

 

Avaliação da intervenção

Há evidências de que, de um modo geral, intervenções em carreira são efetivas (Brown & Ryan Krane, 2000; Mau, 2007). Todos os estudos analisados conduziram avaliações antes e depois da intervenção, confirmando a efetividade esperada da mesma. Nessa amostra de estudos, destacou-se a pesquisa de Dik et al. (2011), que realizou grupo focal na etapa de follow-up para melhorar intervenção. Foi realizada uma entrevista estruturada com 10 estudantes que participaram da intervenção. As questões da entrevista buscavam avaliar o que os participantes aprenderam sobre carreira, o que gostaram e o que mudariam na intervenção. Os participantes explicaram que gostaram da intervenção, que a mesma contribuiu para a consideração de novas opções profissionais e forneceu informações úteis para maior autoconhecimento (Dik et al., 2011). No entanto, não foram apresentados os aspectos que poderiam ser modificados na intervenção. Mesmo assim, esse estudo se destaca por avaliar os resultados e processo de forma integrada, com dados quantitativos e qualitativos, ao contrário da conduta adotada pelas pesquisas em aconselhamento de carreira em geral (Heppner & Heppner, 2003).

 

Conclusão

O objetivo deste estudo foi caracterizar as intervenções em carreira que têm sido conduzidas e testadas empiricamente nos últimos anos. Dos 89 artigos identificados em seis bases de dados, 17 foram analisados. Verificou-se que as intervenções em carreira, no geral, foram desenvolvidas com base nas teorias Sócio-Cognitiva de Carreira e de Holland, destinadas para pessoas em diferentes etapas do desenvolvimento humano (adolescentes e adultos), organizadas em uma ou mais sessões. Os resultados foram avaliados de forma predominantemente quantitativa, com medidas pré- e pós-intervenção, embora um estudo tenha realizado grupo focal no follow-up para avaliar a mesma. Assim, conclui-se que as intervenções em carreira podem incluir conteúdos e processos diversos, bem como uma variedade de públicos-alvo.

Este estudo apresenta duas limitações principais que precisam ser reconhecidas. Não foram utilizados juízes na busca e análise dos artigos, embora se saiba que a avaliação de juízes possua o benefício de minimizar vieses nesses processos. Além disso, foram utilizadas palavras-chave que não constam na Terminologia em Psicologia como descritores, o que pode ter limitado a identificação de estudos.

Futuras pesquisas poderiam realizar um levantamento das necessidades de carreira de diferentes públicos-alvo, de forma a nortear o desenvolvimento de intervenções de carreira específicas para determinadas populações. Também poderiam identificar qual o número ideal de participantes para intervenções de carreira em grupo e apresentar estratégias para evitar a desistência dos participantes durante o processo, visto que as possibilidades no contexto brasileiro são diferentes das de outros países, que podem pagar para os participantes, por exemplo.

 

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Endereço para correspondência:
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Av. Paulo Gama, 110 - Bairro Farroupilha - CEP: 90040-060
Porto Alegre - Rio Grande do Sul

Recebido: Ago. 02, 2016
Aceito: Fev. 05, 2018

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