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Estudos Interdisciplinares em Psicologia

versão On-line ISSN 2236-6407

Est. Inter. Psicol. vol.3 no.1 Londrina jun. 2012

 

Artigos

 

Concepções da equipe de saúde de um hospital de Curitiba/Paraná sobre a prática de psicologia

 

Conceptions of the health team from the hospital of Curitiba/Parana about the psycologic practice

 

Concepto del equipa de salud de un hospital de Curitiba/Parana en la práctica de la psicología

 

 

Luziane de Fátima Kirchneri; Mariana Dambros Granzottoii; Claudia Lucia MenegattiI,iii

IUniversidade Positivo

 

 


Resumo

O trabalho do psicólogo é atualmente compreendido como forma de integrar as ciências médicas e sociais, porém sua atuação no hospital é ainda pouco conhecida pelos profissionais da saúde que nele atuam. Com base neste aspecto, o presente estudo visou investigar a percepção da equipe de saúde sobre o trabalho de Psicologia no ambiente hospitalar. Para isso, todos os profissionais de saúde de um Hospital Filantrópico de Curitiba/Paraná foram convidados a responder um questionário contendo questões que verificaram seu conhecimento sobre a atuação do psicólogo em geral e no ambiente hospitalar, sua percepção sobre a importância da atuação do psicólogo em diferentes áreas do hospital, como o trabalho com pacientes, familiares e/ou equipes de saúde e sua percepção sobre as necessidades de atuação do psicólogo neste ambiente. Através dos dados levantados, pode-se concluir que os participantes consideram importante a atuação do psicólogo no hospital, embora seja observado o conhecimento parcial sobre esta atuação. Algumas atribuições dadas a este profissional parecem inclusive trazem risco de confusão com a função de outros profissionais de saúde (ex.: percepção de que o psicólogo pode receitar medicamentos, 53%). Poucos respondentes tiveram contato com o psicólogo no hospital (64%), e indicaram que as formas de contato foram no atendimento com pacientes (38%), reuniões com a equipe de saúde (31%), e participação em cursos sobre psicologia (30%). Considerando a crescente inserção do psicólogo no hospital, o contato com este profissional mostra-se ainda reduzido. No entanto, a percepção dos respondentes quanto a necessidade do psicólogo realizar atendimento em grupo, com a equipe de saúde (64%) ou com familiares (48%), pode ser considerada um avanço, no sentido de ampliação do conhecimento sobre as diferentes modalidades de atendimento que a psicologia pode realizar no hospital.

Palavras-chave: psicologia hospitalar, profissionais de saúde, atuação em equipes multidisciplinares.


Abstract

The psychologist job is currently understood as a way to integrate the medical and social sciences, but its performance in the hospital is steal poorly understood by the health professional working in it. Based in this aspect, the present study aimed to investigate the perception of the healthcare team about the work of psychology in the hospital environment. For this, all health professionals of a charitable hospital in Curitiba/Paraná were asked to answer a questionnaire containing questions that verified their knowledge of the psychologist actuation in general and in the hospital environment, their perceptions of the importance of the psychology actuation in differents areas of the hospital, such as working with the patients, family and/or health team and their perceptions of the needs of the psychology actuation in this environment. Through the data collected, it could be concluded that the participants considered important the psychology actuation at the hospital, although the observed partial knowledge about this performance. Some assignment given to these professionals seem to even carry a risk of confusion with the role of other health professionals (eg.: perceptions that the psychology can prescribe medications, 53%). Few respondents had contact with the psychology in the hospital (64%), and indicated that the contact forms were in the attendance with patients (38%), meetings with the health team (31%), and participation in courses about psychology (30%). Considering the growing number of psychologist in the hospital, contact with this professional shows that is still low. However, the perceptions from the answers about the needs of a psychology to perform group care, with the health team (64%) or with the family (48%), could be considered a step in the direction of expansion of knowledge about the different modalities of care that psychology can be accomplish in hospital.

Keywords: hospital psychology, health professionals, work in multidisciplinary teams.


Resumen

El psicólogo se entiende actualmente como una forma de integrar las ciencias médicas y sociales, pero su rendimiento en el hospital aún es poco conocido por los profesionales de la salud que trabajan en ella. En base a este aspecto, el presente estudio tuvo como objetivo investigar la percepción del equipo de salud acerca de la labor de la Psicología en el ámbito hospitalario. Para ello, todos los profesionales sanitarios de un hospital de caridad en Curitiba/Paraná se les pidió que respondieran a un cuestionario que contiene preguntas que verificaban su conocimiento del psicólogo en general y en el ámbito hospitalario, su percepción de la importancia del psicólogo en diferentes áreas del hospital, tales como el trabajo con los pacientes, las familias y/o los equipos de salud y su percepción de las necesidades de los psicólogos en este entorno. A través de los datos obtenidos, se puede concluir que los participantes consideran importante el psicólogo en el hospital, aunque el conocimiento parcial observada sobre esta actuación. Algunas tareas asignadas a estos profesionales parecen tener incluso un riesgo de confusión con la función de los profesionales de la salud (por ejemplo, la percepción de que el psicólogo puede recetar medicamentos, 53%). Pocos entrevistados tuvieron contacto con el psicólogo en el hospital (64%), e indicó que los formularios de contacto estuvieron presentes con los pacientes (38%), reuniones con el personal de salud (31%), y la participación en cursos de psicología (30 %). Teniendo en cuenta el creciente número de psicólogos en el hospital, póngase en contacto con shows profesionales es aún bajo. Sin embargo, la percepción de los encuestados sobre la necesidad de realizar el psicólogo cuidado en grupo, con el personal de salud (64%) o con la familia (48%) puede considerarse un paso en la dirección de la expansión del conocimiento sobre las diversas modalidades servicio que la psicología puede realizar en el hospital.

Palabras clave: psicología de la salud, profesionales de la salud, trabajo en equipos multidisciplinarios.


 

 

Introdução

Em termos de organismo humano, a saúde é considerada como um processo permanente, e expressa a qualidade do desenvolvimento de elementos biológicos, subjetivos e sociais (Minayo, Hartz & Buss, 2000). Dentro dessa perspectiva, é papel dos profissionais da saúde incentivar políticas que se comprometam com a prevenção e a promoção de saúde de forma multidisciplinar; utilizando uma visão global sobre o surgimento dos sintomas, a definição do diagnóstico e a evolução do tratamento dos casos clínicos.

A prática das equipes multidisciplinares e interdisciplinares é resultante da compreensão do modelo biopsicossocial da saúde. Para Trindade e Andrade (2003), essa prática reflete maior rapidez e praticidade no alívio dos sintomas, maior adesão a tratamentos, como no caso das doenças crônicas, e busca desenvolver estratégias para um ambiente de trabalho mais tranquilo, que se traduza em práticas eficazes, seguras e humanistas.

Contudo, as diferentes formações disciplinares, os divergentes pensamentos filosóficos e a formação acadêmica que não capacita os futuros profissionais a atuarem em equipe, contribuem para que a interação multidisciplinar seja difícil de ser conquistada (Nina, 2005), pois a falta de entendimento da equipe de saúde quanto à prática dos diferentes profissionais dificulta o trabalho multidisciplinar (Tonetto & Gomes, 2007). Wild, Bowden e Bell (2003) complementam que, para um trabalho multidisciplinar efetivo, é necessário clareza das práticas, ações e expectativas quanto às especificidades das profissões, em outro caso, a falta desse entendimento pode se traduzir em baixo índice de encaminhamento aos profissionais adequados.

A respeito das áreas emergentes introduzidas às equipes de saúde, cita-se a Psicologia. Essa ciência integra em seus pressupostos filosóficos as ciências médicas e sociais, o que possibilita respostas aos problemas que implicam desenvolver uma nova forma de pensamento em saúde (Romano, 1999).

Segundo Gorayeb (2001), a prática da Psicologia nos hospitais deve estar envolvida nas questões mais amplas de saúde do paciente, com destaque para os aspectos da saúde orgânica associados aos aspectos psicológicos, adequando, desta forma essa ciência ao contexto hospitalar. Para Resende, Santos, Souza, Marques (2007) isso pode facilitar a comunicação com a equipe de saúde, assim como auxiliar o paciente a perceber sua doença como um processo reversível, incentivando-o a desenvolver sua autonomia, questionando o tratamento e possuindo papel ativo na sua reabilitação, aderindo ao tratamento e desenvolvendo estratégias de enfrentamento, em casos agudos ou crônicos.

A Psicologia, comparada a outras áreas da saúde, é considerada uma ciência recente, e tendo suas ações ainda pouco conhecidas. Observando esse cenário, neste trabalho pretendeu-se identificar, no contexto de um hospital filantrópico, as percepções sobre quais características e atividades são atribuídas ao psicólogo, bem como verificar como a Psicologia vem sendo inserida nos serviços de saúde, em busca de informações que valorizem a inserção deste profissional em práticas multidisciplinares.

 

Método

A pesquisa teve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (Nº 53/2009), e foi realizada por meio de um questionário semiestruturado (descrito a seguir), caracterizando-se como um levantamento quantitativo.

Participaram 109 profissionais e estudantes da área da saúde de um hospital filantrópico de Curitiba – Paraná, dentre eles: enfermeiros, auxiliares, técnicos, médicos, farmacêuticos, fisioterapeutas, nutricionistas e assistentes sociais; de ambos os sexos, e diferentes idades e tempo de experiência na profissão.

Após a autorização do diretor geral do hospital e da coordenação de enfermagem, todos os profissionais de saúde dos turnos da manhã, da tarde e da noite foram abordados no ambiente de trabalho e convidados a participar da pesquisa, sendo explicados todos os procedimentos para sua realização. Aos que concordaram em participar foi entregue um questionário e solicitado que o devolvessem preenchido no dia seguinte.

Instrumento

O questionário foi desenvolvido pelas autoras, constituído por sete questões fechadas e uma aberta. As questões e alternativas de resposta foram elaboradas com base nos relatos que o senso comum atribui à prática do psicólogo, além dos relatos obtidos informalmente na atuação profissional em contexto hospitalar e descrições da literatura. O questionário foi submetido a uma aplicação piloto, com cinco profissionais de saúde de outro hospital, posteriormente sendo ajustado e aplicado aos participantes desta pesquisa.

Sobre as questões fechadas, quatro foram direcionadas a investigar a concepção dos profissionais de saúde sobre a atuação global do psicólogo em diferentes áreas (se tiveram contato com o psicólogo em contextos fora do hospital e o tipo do contato; se indicariam o trabalho do psicólogo a outras pessoas; atribuições de características necessárias ao psicólogo que atua em contextos fora do hospital) e três investigaram a concepção sobre a atuação do psicólogo especificamente no ambiente hospitalar (contato com o psicólogo hospitalar, importância do trabalho de PsicologiaHospitalar com pacientes, familiares e/ou equipes de saúde, características atribuídas como necessárias ao psicólogo que atua em contexto hospitalar). As questões fechadas eram de múltipla escolha, sempre constando a opção "outro", na qual o respondente poderia descrever outras respostas não contempladas nas alternativas anteriores. Na questão aberta, os respondentes foram solicitados a descrever as necessidades de atuação do psicólogo hospitalar, a partir do que observavam em seu ambiente de trabalho. As respostas obtidas nesta questão foram agrupadas quanto à similaridade, formando categorias de resposta.

Por se tratar de uma pesquisa quantitativa, mesmo as respostas categorizadas na última questão foram analisadas quanto às suas frequências absolutas e convertidas em percentuais.

 

Resultados

A população deste estudo foi composta por todos os profissionais ou estudantes de áreas da saúde que atuavam no hospital e que se disponibilizaram a participar. Ao total, participaram 109 profissionais ou estudantes. Houve predomínio de respondentes técnicos de enfermagem (31%), seguido por estudantes de medicina (19%) e auxiliares de enfermagem (11%), sendo o restante da amostra composta por profissões variadas (39%). A maioria cursava graduação (35%): destes, 55% eram estagiários de medicina, 18% de nutrição e outros 26% eram graduandos de outras áreas da saúde. Prevaleceram também os profissionais com o segundo grau completo (32%) e entre eles estavam os técnicos e auxiliares de farmácia e de enfermagem, seguido dos profissionais graduados (33%) que eram os fisioterapeutas, nutricionistas, farmacêuticos, entre outros. Referente ao tempo de experiência na profissão foi apontado predominantemente entre 1 a 10 anos (76%), seguido de 11 a 20 anos (6,4%) 1 a 11 meses (5,5%), e posteriormente mais de 21 anos de profissão (3,6%). Outros 9 participantes não responderam essa informação.

Os participantes foram questionados se já estiveram algum contato com o psicólogo em seu trabalho no hospital ou em outros contextos. Estes foram solicitados a indicar o tipo de contato e o grau de satisfação com este contato (Tabela 1).

 

 

A maior parte respondeu que teve contato com psicólogos fora do hospital (78%), embora o contato com psicólogos hospitalares também tenha sido significativo (67%). O tipo de contato mais frequente foi participar de processos de seleção (40%), e no contexto hospitalar foi observar os psicólogos atenderem os pacientes (38%).

Os participantes também foram questionados se indicariam o trabalho de Psicologia a outras pessoas: qual tipo de trabalho e para quais pessoas indicariam. Estes relataram predominantemente indicar o trabalho de Psicologia clínica/individual (78%), predominantemente a crianças e adolescentes (26%) e a pessoas com problemas mentais/intelectuais (25%). Apenas um participante relatou que não indicaria o trabalho de Psicologia a outras pessoas.

Para observar diferenças de percepção sobre o psicólogo hospitalar e o psicólogo em geral, perguntou-se aos participantes que características consideravam importantes nessas duas atuações. A Figura 1 ilustra essas diferenças quanto à frequência percentual das características assinaladas.

 

 

Verificou-se que em todas as características apontadas pelos participantes, o psicólogo que atua em contextos gerais parece ter que cumprir mais exigências de acordo com a percepção dos participantes. Comparativamente, estas mesmas categorias foram citadas em menor frequência para o psicólogo hospitalar, como apontado na Figura 1. Os dados mostram que houve similaridade entre as categorias: falar coisas que agradem, saber elogiar, ser afetivo, atribuídas para os psicólogos que atua em contextos gerais e hospitalares.

De forma discrepante para esses dois campos de atuação, as características predominantemente atribuídas ao psicólogo que atua em contextos gerais foram: ser bem resolvido emocionalmente, 89%; saber escutar, 86%; ser observador, 85%; saber resolver os problemas do paciente, 74%. Enquanto que para o psicólogo hospitalar foram atribuídas predominantemente as características: ter habilidade para adivinhar o que as pessoas estão pensando, 87%; ter a voz calma, 71%; saber receitar medicamentos, 53%, saber deixar o paciente calmo, 49%.

Note-se que, se, para o psicólogo em geral algumas habilidades do profissional foram adequadamente observadas (como saber escutar e observar), para o psicólogo hospitalar as observações foram ainda mais distorcidas quanto às habilidades e a o papel profissional. Exemplos disso se referem à ideia de que o psicólogo pode adivinhar o que pessoas pensam ou ao desconhecimento de que psicólogos não podem receitar medicamentos. Tais dados parecem revelar que, no grupo entrevistado, a função do psicólogo em ambientes de saúde, bem como as habilidades que ele deve dispor para atuar, são parcialmente conhecidas e com risco de confusão com outras atividades na área da saúde.

Além disso, para ambos os contextos verificou-se atribuições dadas à forma do psicólogo se comportar, bem como as suas características pessoais (ex.: ter a voz calma, ser afetivo, ser sincero, ser bem resolvido emocionalmente), como sendo importantes ao trabalho profissional. Características do comportamento e pessoais foram mais atribuídas ao psicólogo que atua em contextos gerais, em comparação ao psicólogo hospitalar.

Outras características parecem sinalizar a percepção de que o psicólogo deve ter características que o tornem o principal responsável pela mudança do indivíduo. Tal atribuição indica que, ao delegar a função ao psicólogo de "solucionador dos problemas", o indivíduo percebe-se como passivo nesta relação e na sua própria mudança. Exemplos disso podem ser observados nas características atribuídas ao psicólogo, em ambos os contextos: saber resolver os problemas do paciente, saber resolver diferentes tipos de problemas, e saber deixar o paciente calmo.

Além disso, investigou-se, por meio de uma escala formato likert, a importância da atuação do psicólogo em diferentes contextos no hospital. Na Figura 2 são apresentadas as frequências percentuais sobre os setores de maior e menor importância para a atuação do psicólogo.

 

 

Pode-se observar que os participantes consideraram ser mais importante a atuação do psicólogo junto a familiares (77%), e posteriormente a equipe de saúde do hospital (74%). O setor administrativo do hospital é significativamente o que menos requer a atuação do psicólogo, de acordo com os participantes (72%).

Os profissionais também foram solicitados a descrever as demandas do contexto hospitalar nas quais percebem a necessidade da atuação do psicólogo. E interessante notar que nessa questão aberta, os respondentes descreveram principalmente a necessidade de intervenção com pacientes. Segue a frequência desses dados: acompanhamento psicológico aos pacientes com quadros psiquiátricos (28%), sendo que alguns deles especificaram os transtornos de ansiedade e a depressão, acompanhamento a familiares no caso de doenças graves e óbito (22%), acompanhamento de pacientes no pré e pós operatório (18%) e acompanhamento de funcionários em situações de estresse e pressão no ambiente de trabalho (13%).

Dentre esta atuação com pacientes, familiares e equipe de saúde, os respondentes assinalaram as atividades que percebem como mais importantes para o psicólogo trabalhar no contexto hospitalar (Figura 3).

 

 

Os respondentes indicaram que as funções do psicólogo no hospital são principalmente direcionadas aos pacientes, posteriormente aos familiares e à equipe de saúde. A metade das categorias apresentadas no gráfico indicou frequência similar, para a atuação com pacientes e com familiares.

As funções destacadas na atuação com pacientes foram: realizar atendimentos individuais (79%), fazer avaliação psicológica (64%) e escutar o paciente (65%). Note-se que outras modalidades de atendimento (atender em grupo, 48%) ou utilização instrumentos de trabalho (utilizar revistas, livros vídeos como recurso para atendimento, 22%) foram menos frequentes, sugerindo que o modelo clínico tradicional ainda é visto como a principal forma do psicólogo atuar com pacientes.

Já para a atuação com a equipe de saúde e com os familiares, verificou-se que a função do psicólogo nestes setores é prestar atendimento grupal (à equipe, 64%; aos familiares, 48%), mais do que o atendimento individual (à equipe, 52%; aos familiares, 44%). Este dado indica o avanço em direção a novos olhares sobre o trabalho do psicólogo e as diferentes formas que este profissional pode atuar no contexto hospitalar.

Dentre as funções atribuídas ao psicólogo na atuação com familiares, merecem destaque: explicar sobre a doença e o tratamento (34%) e informar o falecimento de um paciente (29%). É importante ressaltar que tais funções são necessariamente atribuições do médico responsável pelo paciente, mas imagina-se nelas a importância da presença do profissional psicólogo, já que são situações que podem desencadear reações emocionais, muitas vezes evitadas pelas equipes de saúde.

 

Discussão

A Psicologia Hospitalar se refere a aplicações teóricas ou práticas da Psicologia a problemas de ou temas associados ao sistema de saúde. De acordo com Miyazaki, Domingos e Caballo (2001), ela busca compreender o papel das variáveis psicológicas sobre a manutenção da saúde, do desenvolvimento de doenças e dos comportamentos associados a esta. Mota, Martins e Verás (2006) ainda complementam que a Psicologia Hospitalar contribui com o papel de observar o ser humano além das dimensões biológicas, revelando as características psíquicas e sociais; a fim de auxiliar na ampliação de conhecimento sobre as práticas, os focos de ação e envolver o paciente em um papel ativo na sua reabilitação, auxiliando na compreensão da necessidade de um contexto relacional saudável entre a equipe de saúde.

As principais funções deste profissional são: promover o modelo preventivo da saúde; atuar junto à família e equipe de saúde, informando, orientando, dando suporte emocional e auxiliar da adaptação a nova condição, a fim de evitar distorções e emoções (como frustração e raiva) que possam comprometer as relações interpessoais e o convívio entre familiares e membros da equipe de saúde; acompanhar clinicamente o paciente, devido às demandas de seu tratamento que podendo causar impacto ao seu estilo de vida, favorecendo o surgimento de emoções como ansiedade, frustração, insegurança, medo e estresse. Além disso, o psicólogo deve atuar como agente de mudança na equipe multiprofissional do hospital a fim de colaborar para a humanização das relações (Leitão, 2003).

Como mostram os dados, de acordo com os participantes deste estudo, a principal forma de atuação do psicólogo no hospital é o modelo de atendimento clinico/ individual. A amplitude de possibilidades de atuação é desconhecida por grande parte população estudada, sobretudo quanto à possibilidade de o psicólogo atuar em outras modalidades (atendimentos em grupo, realizar intervenção para procedimento médico), e/ou utilizar diferentes instrumentos de trabalho (utilizar recursos no atendimento, como livros, revistas, vídeos). Romano (1999) aponta que no hospital ainda se mantêm uma visão antiga da psicologia, especificamente do modelo de Psicologia Clínica. Os psicólogos, no entanto, são os principais responsáveis pela construção dessa imagem, pois optam por atuar de acordo com um único modelo e/ou técnica, deixando de transmitir o conhecimento sobre a vasta possibilidade de atuações que podem fazer dentro do hospital.

No entanto, quando as questões se voltaram para a compreensão da atuação com familiares e equipes de saúde, essa visão parece estar sendo modificada, uma vez que foi atribuída a necessidade de o psicólogo realizar grupos de atendimentos com essas populações. Atualmente, a crescente necessidade da inserção do psicólogo em hospitais somada à grande demanda para atendimento, fazem com que o psicólogo precise se adaptar a outras modalidades de atuação (Leitão, 1993).

Uma parte dos participantes também mostrou dificuldade para diferenciar as funções do psicólogo das funções de outros profissionais da saúde, como, por exemplo, indicando ser atribuído ao psicólogo receitar medicamentos, explicar sobre a doença e o tratamento, informar falecimento de um paciente, explicar sobre a doença e o tratamento. De acordo com Campos (1995) é dever do medico informar aos familiares o falecimento, e não do psicólogo. Analisamos este dado como reflexo da insegurança e ansiedade da equipe em ser confrontada pelas dúvidas e medos da família diante dessa situação, relembrando que a insensibilidade emocional e o afastamento são muitas vezes as estratégias de enfrentamento mais utilizadas pela equipe de saúde para lidar com as experiências emocionais desencadeadas pela sua rotina de trabalho (Calderero, Miasso & Corradi-Webster, 2008; Wondracek, Rasanelli & Piovesan, 2011; Negromonte, 2010).

As características atribuídas como importantes ao psicólogo foram direcionadas as formas de se comportar (ex.: ser calmo, ser afetivo, ser sincero), e as categorias que indicam habilidades para conduzir o trabalho (ex.: não fazer julgamento as pessoas, conduzir avaliações psicológicas) foram apresentadas em menor escala, embora também tenham sido sinalizadas como importantes. Observe-se que variáveis mais pessoais ou subjetivas parecem ser mais notadas pelos participantes do que variáveis baseadas na formação técnica do profissional. Isso parece indicar que ainda persiste muito desconhecimento sobre a tecnologia de trabalho própria do psicólogo, e que ainda se espera que este profissional atue mais como um facilitador no processo de tratamento do paciente hospitalizado do que um profissional que apresenta propostas dentro de sua formação autônoma (CFP, 1994).

Ao psicólogo também foi atribuída a característica de ser o "solucionador dos problemas", como observado nas categorias: saber resolver os problemas dos paciente, ser convincente com a pessoa, saber resolver todos os tipos de problema. Isso parece refletir que existe uma concepção de que o psicólogo é o que conduzirá a mudança, sendo que o indivíduo atendido se torna um agente passivo desta relação (Fighera e Viero, 2006).

Apesar do pouco conhecimento sobre sua prática, a psicologia foi vista como necessária no hospital. Os respondentes indicaram a importância de o psicólogo atuar predominantemente com os familiares e a equipe de saúde, o que mostra o quanto eles expressam a necessidade de serem atendidos por um psicólogo, bem como observam as dificuldades dos familiares, que também necessitam deste tipo de intervenção. Este dado condiz com a literatura, que descreve o quanto esta população administra seus conteúdos emocionais com cautela e necessita de um profissional que além de saber sobre sua ciência, deve ter habilidade para praticá-la, sem causar maior sofrimento (Quintana & Arpini, 2002; Menegatti, 2001; Paschoalini, Oliveira, Frigério, Dias & Santos, 2008).

Observa-se que na questão aberta foram mais frequentemente exemplificados os tipos e a necessidade de atendimentos a serem realizados com os pacientes (assistência a pacientes portadores de quadros psiquiátricos, como a ansiedade e a depressão). Esse resultado evidencia o quanto a equipe de saúde expressa a necessidade da intervenção psicológica, embora não consiga expor queixas especificas que demandam tal intervenção. Com isso, exemplificam com mais facilidade as queixas que delimitam a intervenção psicológica aos pacientes.

E importante destacar que a maior parte dos respondentes teve algum tipo de contato com o psicólogo hospitalar, embora o tipo de contato mais frequente tenha sido fora do hospital. Não podemos descartar que 42% dos participantes não tiveram contato com psicólogos hospitalares, e 31% não tiveram contato com nenhuma atuação do psicólogo, considerando este número expressivo, diante do espaço que tem se construído para a atuação do psicólogo no hospital. Os tipos de contato indicados pelos respondentes foram: na observação de atendimentos com o paciente, em reuniões com a equipe de saúde, e/ou palestras sobre a psicologia hospitalar.

Considera-se que o pouco conhecimento dos respondentes sobre a pratica psicológica pode estar relacionada à inexistência de um psicólogo no hospital estudado, ou ainda que há pouca informação sobre a atuação deste profissional nesta área específica, sendo predominante o conhecimento da prática tradicional do psicólogo na clínica, com ênfase no atendimento direcionado aos pacientes hospitalizados.

 

Considerações Finais

Participaram da pesquisa predominantemente os profissionais da enfermagem, com segundo grau completo e aproximadamente 10 anos de experiência da profissão. A maior parte dos respondentes teve algum tipo de contato com o psicólogo hospitalar, embora o maior tipo de contato tenha sido fora do hospital. Os tipos de contatos indicados pelos respondentes, em relação ao psicólogo hospitalar, foram: na observação de atendimentos com o paciente, em reuniões com a equipe de saúde, e/ou palestras sobre a psicologia hospitalar.

Considerando a crescente inserção de psicólogos nos hospital, o número de pessoas que tiveram contato com esta prática ainda está reduzido e limitado ao conhecimento de poucas atuações. Pode-se concluir que os profissionais de saúde do hospital pesquisado consideram importante a atuação do psicólogo no hospital, seja no atendimento com pacientes, familiares ou equipe de saúde. Apesar disso, o conhecimento sobre essa profissão ainda é parcial, mostrando que são atribuídas a esses profissionais a necessidade de ter comportamentos, de que o psicólogo e solucionador dos problemas, além gerar confusão da sua atuação com outros profissionais de saúde.

No entanto, pode-se considerar um avanço em relação à percepção dos profissionais de saúde, quando esses atribuem como função do psicólogo realizar atendimentos em grupo (mais do que atendimentos individuais) direcionados à equipe de saúde e aos familiares, no contexto hospitalar. A imagem construída sobre essa prática é principalmente de responsabilidade do psicólogo, sendo que muitos deles ainda mantêm o modelo de atuação clínica/individual, ignorando a aplicabilidades de outras modalidades ou técnicas de trabalho. A visão deste modelo de trabalho acaba por restringir a atuação do psicólogo, impossibilitando o desenvolvimento de novas práticas que o aproximem do trabalho multiprofissional.

 

Referências

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Endereço para correspondência

Luziane de Fátima Kirchner

email: luzianek@yahoo.com.br

 

Recebido em: 27/05/2012
Revisado em: 02/06/2012
Aceito em: 25/06/2012

 

 

Notas

iMestre em Análise do Comportamento pela Universidade Estadual de Londrina
iiEspecialista em Psicologia da Saúde e Hospitalar pelas Faculdades Pequeno Príncipe
iiiProfessora da Universidade Positivo e Mestre em Psicologia da Infância e Adolescência da Universidade Federal do Paraná