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Revista Psicopedagogia

versão impressa ISSN 0103-8486

Rev. psicopedag. vol.40 no.122 São Paulo maio/ago. 2023  Epub 24-Jun-2024

https://doi.org/10.51207/2179-4057.20230013 

ARTIGO ESPECIAL

Produzindo e reconhecendo fala, escrita, sinalização: Léxicos mentais em ouvintes-videntes, cegos, surdos, surdocegos

Speech, print and sign recognition and production: Mental lexicons in neurotypical, blind, deaf, and deaf-blind people

Fernando Cesar Capovilla1 

1Professor Titular do Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo (USP); Membro do Conselho Nacional de Educação, São Paulo, SP, Brasil.


Resumo

Este artigo conceitual apresenta uma taxonomia para descrição sistemática dos vários léxicos, ou repositórios de representações mentais envolvidas na produção e reconhecimento de palavras faladas recebidas por audição, visão e tato, de palavras escritas recebidas por visão e tato, e de sinais recebidos por visão e tato por parte de alunos neurotípicos (videntes e ouvintes), cegos, surdos e surdocegos. O artigo cruza modalidades linguísticas de expressão (fala, escrita, sinalização) e modalidades sensoriais de recepção (audição, visão, tato). Identifica: sete léxicos linguísticos, sendo três de recepção da fala (por audição, visão, tato), dois de recepção da escrita (por visão, tato), e dois de recepção da sinalização (por visão, tato). Cada um dos sete léxicos se subdivide em dois: um de entrada para reconhecimento linguístico, e um de saída para produção linguística. O artigo descreve procedimentos para avaliar cada um deles, e identifica diversos instrumentos normatizados e validados para fazê-lo. Dentro de cada léxico existe uma estrutura particular com coordenadas e escalas de valores para indexar precisamente as representações lexicais. O artigo descreve a estrutura de cada léxico, as configurações de coordenadas para armazenamento, processamento e recuperação lexical. Aprendizagem e memorização produzem armazenamento lexical. Comparação lexical produz reconhecimento de padrões na recepção linguística de fala, escrita e sinais. Recuperação lexical produz evocação de padrões na expressão linguística por fala, escrita e sinais. O artigo descreve como o surdocego reconhece palavras ao tatear a configuração de formas e movimentos de boca e lábios, e vibrações de narinas e laringe, que é característica de cada palavra. As vogais são reconhecidas por grau de abertura da boca e protrusão dos lábios. Vogais e consoantes nasais são distinguidas das orais pela vibração das narinas. Ditongos crescentes, decrescentes, e tritongos são identificados pela sequência de abertura-fechamento da boca. Consoantes vozeadas são distintas das desvozeadas pela vibração da laringe. Cada palavra tateada pode ser reconhecida por determinada sequência temporal de configurações de padrões de formas e vibrações, que constitui seu endereço preciso no léxico de reconhecimento de palavras tateadas. Há dois processos de leitura alfabética e orofacial: sublexical de decifragem para palavras faladas e escritas novas; e lexical de reconhecimento visual direto de palavras faladas e escritas familiares. O processo lexical é mais rápido e eficaz que o sublexical, mas sua eficácia depende da força e qualidade da representação. Quanto mais familiar o item, mais forte sua representação lexical. Quanto maior a precisão paramétrica da indexação no ensino-aprendizagem, melhor a qualidade da representação, e de seu armazenamento, processamento e recuperação. Representações precisas são mais fáceis de reconhecer para compreender fala e escrita, e mais fáceis de evocar (resgate lexical) para falar, escrever e sinalizar. O artigo ajuda a compreender como construir os léxicos sistematicamente para aperfeiçoar sua eficácia no reconhecimento e resgate lexical direto da fala, escrita e sinal. O artigo ajuda a conduzir planejamento sistemático de procedimentos de avaliação e intervenção educacionais e clínicas no campo da linguagem.

Unitermos Léxico; Surdo; Surdocego; Fala; Leitura; Escrita; Sinal

Summary

This conceptual article presents a taxonomy for a systematic description of the various lexicons, or mental representation inventories, involved in the production and recognition of spoken words (received by hearing, sight, and touch), of written words (received by sight and touch), and of signs (received by sight and touch) by neurotypical, blind, deaf, and deaf-blind students. The article crosses linguistic modalities of expression (speech, writing, and signing) and sensory modalities of reception (hearing, sight, and touch). It identifies seven linguistic lexicons, three of which pertain to speech reception (by hearing, sight, and touch), two pertain to writing reception (by sight, touch), and two pertain to sign reception (by sight, touch). Each of the seven lexicons is subdivided into an input lexicon for linguistic recognition and an output lexicon for linguistic production. The article describes procedures to evaluate each of them and identifies a series of standardized and validated instruments to do so. Within each lexicon, there is a particular structure with coordinates and value scales to accurately index lexical representations. The article describes the structure of each lexicon and the coordinate settings for lexical storage, processing, and retrieval. Learning and memorization produce lexical storage. A lexical comparison produces pattern recognition in the linguistic reception of speech, writing, and signs. Lexical retrieval produces the evocation of patterns in linguistic expression through speech, writing, and signs. The article describes how the deaf and blind recognize words by groping the configuration (of shapes and movements of the mouth and lips, and vibrations of the nostrils and larynx) characteristic of each word. Vowels are recognized by the degree of mouth opening and lip protrusion. Vowels and nasal consonants are distinguished from oral ones by the vibration of the nostrils. Ascending diphthongs, descending diphthongs, and triphthongs are recognized by the opening-closing sequence of the mouth. Voiced consonants are distinguished from voiceless ones by the vibration of the larynx. Each groped word can be recognized by a certain temporal sequence of pattern configurations of shapes and vibrations, which constitutes its precise address in the lexicon of groped words. There are two processes of alphabetic reading and orofacial reading: sublexical decoding of new words; and lexical direct visual recognition of familiar words. The lexical process is faster and more effective than the sublexical one, but its effectiveness depends on the strength and quality of the representation. The more familiar the item, the stronger its lexical representation. The higher the index parametric accuracy resulting from learning, the better the representation quality, storage, processing, and retrieval. Accurate representations are easier to recognize when understanding speech and writing. And easier to evoke (lexical retrieval) to speak, write, and sign. The article helps to understand how to construct lexicons systematically to improve their effectiveness for recognition and direct lexical rescue of speech, writing, and signing. The paper helps to conduct systematic planning of educational and clinical assessment and intervention procedures in the field of language.

Keywords Lexicon; Deaf; Deafblind; Speech; Reading; Spelling; Sign

Introdução

Este artigo parte do paradigma matricial, da taxonomia e nomenclatura de linguagem oral, escrita e de sinais, propostos por Capovilla e colaboradores (e.g., Capovilla, 2011d, 2011f, 2011i, 2012, 2015a, 2015b, 2015c, 2018b, 2019, 2020, 2021a, 2021b, 2021c, 2021d; Capovilla & Cecconi, 2022; Capovilla & Garcia, 2011; Capovilla & Graton-Santos, 2015; Capovilla, Mauricio, & Raphael, 2015).

Senciência e léxico mental

O termo Senciência se refere à capacidade dos seres vivos de se aperceber conscientemente de suas sensações e sentimentos, à capacidade de perceber o que lhes acontece no ambiente que os cerca. Esse termo deriva do Latim sentiens, que significa “que sente”. Trata-se do particípio presente de sentire, que significa “sentir, ter sensação de algo por meio dos sentidos”. Diz respeito à capacidade de ter conhecimento, consciência e percepção a partir dos cinco sentidos.

Para que possamos reconhecer um determinado padrão de estimulação presente, precisamos comparar esse padrão de estimulação presente com representações mentais de padrões de estimulação previamente armazenados em nossa memória. Quanto maior nosso repositório mental de representações de padrões de estimulação, maior será a nossa capacidade de reconhecer os padrões de estimulação que nos cercam.

A noção de repositório ou coleção é indicada, em Grego, pelo sufixo Teca (como em “biblioteca”, “pinacoteca”, “cinemateca”, “hemeroteca”, “gliptoteca”). Já, em Latim, a noção de repositório ou coleção é dada pelas palavras Acervo ou Coleção, e indicada pelo sufixo Ário (como em “armário”, “herbário”, “aquário”, “aviário”, “planetário”, “abecedário”). Quanto maior o vocabulário mental das pessoas ouvintes e falantes, maior será sua capacidade de reconhecer palavras ouvidas e de se expressar por meio dessas palavras. Quanto maior o sinalário mental das pessoas surdas e sinalizantes, maior será sua capacidade de reconhecer sinais vistos ou tateados em suas mãos (no caso de surdocegos) e de se expressar por meio desses sinais.

Léxico designa um repositório ou inventário de lexemas e itens lexicais como palavras e sinais. O termo léxico deriva do Grego λεξικόν (lexikon), neutro de λεξικός (lexikos), que significa relativo a palavras. Os léxicos mentais são repositórios de representações mentais que nos permitem reconhecer padrões com os cinco sentidos quando somos submetidos (expostos) a determinadas condições sensoriais. Há representações mentais não linguísticas de configurações visuais, auditivas, táteis, proprioceptivas, cinestésicas, olfativas e gustativas. Há também representações mentais linguísticas de configurações visuais, auditivas, táteis, proprioceptivas e cinestésicas. O termo léxico se refere ao repositório dessas representações linguísticas nessas diversas modalidades, mas pode ser estendido metaforicamente às representações não linguísticas. De qualquer modo, o termo léxico se refere a um repositório de representações mentais.

Tipos de léxico: não linguístico e linguístico

Léxicos não linguísticos

  • (1.) Há repositórios ou coleções de representações não linguísticas, nas modalidades

    • (1.1.) visual (representações de imagens da natureza armazenadas na IconoTeca, do Grego, εἰκών [eikón]: “imagem”; e θήκη [téke, thḗkē]: “repositório”);

    • (1.2.) auditiva (representações de sons da natureza armazenadas na EcoTeca, do Grego, ἠχώ [ēkhō]: som”; e θήκη [téke, thḗkē]: “repositório”);

    • (1.3.) tátil (representações de sensações táteis da natureza armazenadas na HaptoTeca, do Grego ἅπτω (hapto): “toque”; ἅπτειν (háptein): tocar, ligar”; e θήκη [téke, thḗkē]: “repositório”);

    • (1.4.) olfativa (representações de aromas de alimentos e bebidas e flores e couro e tintas, armazenadas na OsmoTeca, do Grego, ὀσμή [osmé]: “cheiro”; θήκη [téke, thḗkē]: “repositório”); e

    • (1.5.) gustativa (representações de paladares de comidas e bebidas armazenadas na GeusiTeca, do Grego, γεῦσις [geûsis]: “sabor”; e θήκη [téke, thḗkē]: “repositório”).

Os léxicos mentais não linguísticos são repositórios de representações mentais de:

  1. imagens visuoespaciais da natureza observável reconhecíveis a partir de protótipos (como distribuição espacial de dimensões relativas, como dimensões corpo-pescoço-membros-cabeça-orelhas que permite distinguir entre girafa e cavalo, porco e cachorro, cavalo e burro, cachorro e coelho),

  2. imagens sonoras da natureza audível como timbre, frequência, ritmo (que permite distinguir entre melodias e campainhas e vozes de trinado e mugido e bramido e balido e latido e miado e zumbido);

  3. imagens táteis e proprioceptivas e cinestésica da natureza passíveis de senciência, baseadas em propriedades como temperatura, viscosidade, rugosidade, dureza, peso (que nos permitem distinguir entre líquidos (como água e óleo) e materiais (como areia, pedra, madeira e metal);

  4. imagens olfativas da natureza passíveis de apreensão olfativa, baseadas em propriedades florais e frutadas e amadeiradas e ácidas de aromas e cheiros característicos de flores e frutas e ervas;

  5. imagens gustativas da natureza passíveis de apreensão como paladares, baseados em propriedades como doce e amargo e azedo e ardido, característicos de diferentes alimentos e bebidas.

Esses repositórios de representações de imagens visuais, auditivas, táteis, olfativas e gustativas são usados de modo receptivo, para reconhecer imagens sensoriais visuais, auditivas, táteis, olfativas e gustativas, com óbvias vantagens para sobrevivência. Frutos maduros, tubérculos nutritivos, ervas saborosas e medicinais podem ser reconhecidos e selecionados a partir de suas propriedades visuais, táteis, auditivas, olfativas e gustativas. Frutos ainda verdes ou tóxicos, ervas tóxicas como a urtiga, e tubérculos tóxicos como mandioca selvagem podem ser reconhecidos e evitados a partir de seu aspecto visual, olfativo, gustativo e tátil. Animais peçonhentos podem ser evitados a partir do aspecto visual de sua forma e movimento (característicos de escorpião, aranha, lacraia e serpente), e/ou auditivo (zunido de vespeiro e chocalho de cascavel). Esses repositórios de representações de imagens visuais, auditivas, táteis, olfativas e gustativas também são usados de modo expressivo, para modular impressões sensoriais de modo a obter resultados desejados nos campos de comunicação visual e design gráfico, sonoplastia, cosmética, perfumaria, culinária. Os Léxicos de Entrada para recepção, e os Léxicos de Saída para expressão, são os seguintes.

  • (1.1.) A IconoTeca (do Grego: εἰκών [eikón]: “imagem”; e θήκη [téke, thḗkē]: “repositório”) contém as representações prototípicas da aparência visual de entes da natureza, como animais (vaca, girafa, leão, pomba), vegetais (árvore, flor), e de objetos como veículos de transporte (carro, helicóptero, barco, avião, balsa, navio, submarino), monumentos notáveis (Pirâmides do Egito, Muralha da China, Estátua da Liberdade, Torre Eiffel, Kremlin, Cristo Redentor), e assim por diante.

  • (1.2.) A EcoTeca (do Grego: ἠχώ [ēkhō]: som”; e θήκη [téke, thḗkē]: “repositório”) contém as representações prototípicas de sons da natureza (e.g., miado, latido, trinado, balido, mugido) ou de objetos feitos pelo ser humano (e.g., campainha, motosserra, metralhadora, broca, britadeira).

  • (1.3.) A HaptoTeca (do Grego ἅπτω (hapto): “toque”; ἅπτειν (háptein): tocar, ligar”; e θήκη [téke, thḗkē]: “repositório”) contém as representações prototípicas da sensação tátil de entes da natureza (e.g., o frio escorregadio do gelo, a viscosidade do óleo, a rugosidade da cortiça, a aspereza da rocha, a maciez da seda).

  • (1.4.) A OsmoTeca (do Grego: ὀσμή [osmé]: “cheiro”; θήκη [téke, thḗkē]: “repositório”) contém as representações prototípicas dos aromas da natureza, as representações olfativas de bebidas e alimentos e flores e assim por diante baseadas em seus cheiros ou aromas. Por exemplo, aromas como o de café, pão, chocolate, cachimbo, charuto, couro, banana, jaca, laranja, cebola. O aroma petricor, que exala da terra molhada depois da chuva ou da rega do jardim ou da horta.

  • (1.5.) A GeusiTeca (do Grego: γεῦσις [geûsis]: “sabor”; e θήκη [téke, thḗkē]: “repositório”) contém representações gustativas de bebidas e alimentos baseadas em seus sabores. Por exemplo, o gosto salgado do bacalhau, azedo do limão, doce do mel, amargo do café, cítrico da tangerina.

Léxicos linguísticos

(2.) Há repositórios ou coleções de representações linguísticas, tanto de palavras quanto de sinais. Essas representações podem ser auditivas, como as palavras faladas audíveis. Podem ser visuais, como as palavras faladas visíveis (i.e., legíveis orofacialmente pela visão), os sinais de Libras visíveis, e as palavras escritas legíveis por visão. Podem ser, ainda, táteis, como as palavras faladas tateáveis (i.e., legíveis orofacialmente pelo tato), os sinais tateáveis pelas mãos, as palavras escritas tateáveis (i.e., legíveis pelo tato, como na escrita Braille para cegos).

Ao ouvir palavras como “cão”, “gato”, “sapo”, “tigre”, “vaca”, “zebra”, “porco”, “pombo”, “pato”, “carneiro”, “morcego”, “grilo”, “galinha”, “cobra”, “cavalo”, “raposa”, “corvo”, reconhecemos essas palavras porque já as ouvimos muitas vezes no passado e suas representações encontram-se armazenadas em nosso Léxico Fonológico ou Léxico OtoLálico, ou OtoLaliTeca. Sabemos o que essas palavras significam porque suas representações encontram-se armazenadas em nosso Léxico Semântico, ou SemanTeca. Sabemos que pombos e morcegos voam. Mas que os pombos são aves, assim como a galinha, embora esta não voe. E que os morcegos são mamíferos como o porco, embora este tampouco voe. Essas representações semânticas (e.g., voa x não voa; ave x mamífero) estão armazenadas em nosso Léxico Semântico, ou SemanTeca. Ao ouvir aquelas palavras, imaginamos as respetivas imagens daqueles animais. Protótipos daquelas imagens visuais mentais encontram-se armazenadas em nossa IconoTeca. Imaginamos um cão de língua de fora abanando a cauda, um gato se espreguiçando, um sapo saltando, uma vaca pastando, uma zebra correndo, um porco chafurdando na lama, um pato nadando no lago, um carneiro saltando uma cerca, um morcego pendurado de cabeça para baixo no sótão, um grilo no galho de uma árvore, uma galinha chocando ovos, uma cobra picando a bota de alguém, um cavalo galopando, uma raposa se esgueirando para dentro do galinheiro, um corvo posando num milharal. Quando lemos um livro contendo os nomes de animais, reconhecemos as palavras escritas porque suas representações encontram-se armazenadas em nosso Léxico OrtoGráfico, ou GrafiTeca. A mera audição dessas palavras faladas ou o reconhecimento das respectivas palavras escritas evoca em nós aquelas imagens desses animais cujas representações encontram-se armazenadas em nossa IconoTeca. Imagine agora que alguém nos proponha o desafio de reconhecer o animal a partir de sua voz. Ou seja, a partir do miado, dizer “gato”, a partir do latido, “cão”; do coaxar, “sapo”; do mugir, “boi” ou “vaca”; do relinchar, “cavalo” ou “zebra” ou “burro”; do grunhir, “porco”; do arrulhar, “pombo”; do grasnar, “pato”; do balir, “carneiro” ou “ovelha”; do zumbir, “mosquito” ou “pernilongo”; do farfalhar, “morcego”; do cacarejar, “galinha”; do sibilar, “cobra” ou “serpente”; do regougar, “raposa”; do crocitar, “corvo”. Se tivermos sucesso em reconhecer esses animais a partir de suas vozes respectivas, então isso é prova de que temos as representações não linguísticas auditivas dessas vozes dos animais em nossa EcoTeca. Se tivermos sucesso em nomear esses animais, falando seus nomes, durante essa tarefa, isso prova que temos as representações linguísticas dessas palavras faladas em nosso Léxico OtoLálico de Saída. Se a pessoa que deve pontuar nosso desempenho de nomeação compreender as palavras que falamos, isso prova que ela tem as representações linguísticas dessas palavras faladas em seu Léxico OtoLálico de Entrada.

Os léxicos mentais linguísticos são repositórios de representações mentais de: (1.) palavras faladas, (2.) palavras escritas, e (3.) sinais. Esses repositórios podem ser empregados tanto para compreender a mensagem recebida quanto para formular a mensagem a ser emitida. Os Léxicos de Entrada são usados para compreender uma mensagem recebida. Os Léxicos de Saída são usados para formular a mensagem a ser emitida. Na descrição a seguir são explicados apenas os Léxicos de Entrada, que permitem compreender mensagens faladas, mensagens escritas, e mensagens sinalizadas.

(1.) O Léxico Lálico (às vezes chamado de Léxico Lalêmico ou LaliTeca) contém as Formas Lálicas (às vezes chamado de Formas Lalêmicas), que são as representações das palavras faladas. Há três Léxicos Lálicos, um para cada modalidade sensorial: a auditiva (Léxico OtoLálico), a visual (Léxico OptoLálico), a tátil (Léxico HaptoLálico).

(1a.) As representações das palavras faladas ouvidas são as Formas OtoLálicas ou Fônicas. De fato, Foné significa Voz, OtoLalia é a Fala Audível, e OtoLalema é a Unidade da Fala Audível (UF audív). Ouvintes que compreendem a fala por audição processam OtoLalemas. Ao ouvir uma Palavra Falada, eles serão capazes de reconhecer essa palavra se a Forma OtoLálica dessa palavra corresponder a uma Representação OtoLálica previamente armazenada em seu Léxico OtoLálico, que permite reconhecer palavras faladas quando as ouve.

(1b.) As representações das palavras faladas recebidas por leitura orofacial visual são as Formas OptoLálicas, uma vez que OptoLalia é a Fala Visível, e que OptoLalema é a Unidade da Fala Visível (UF visív). Surdos videntes fazem leitura orofacial visual da fala, e paracompreender a fala processam OptoLalemas. Quando surdos videntes reconhecem, por meio da leitura orofacial visual, uma Palavra Falada, essa Palavra Falada é reconhecida porque sua Forma OptoLálica corresponde a uma Representação OptoLálica previamente armazenada em seu Léxico OptoLálico, que permite reconhecer palavras faladas quando as enxerga.

(1c.) As representações das palavras faladas recebidas por leitura orofacial tátil são as Formas HaptoLálicas, uma vez que HaptoLalia é a Fala Tateável, e que HaptoLalema é a Unidade da Fala Tateável ou Tactível (UF tactív). Surdocegos usuários do Tadoma fazem leitura orofacial tátil da fala, e processam HaptoLalemas. Quando surdocegos reconhecem, por meio do tato manual, uma Palavra Falada, essa Palavra Falada é reconhecida porque sua Forma HaptoLálica corresponde a uma Representação HaptoLálica previamente armazenada em seu Léxico HaptoLálico, que permite reconhecer palavras faladas quando as tateia.

(2.) O Léxico LaloGráfico ou Léxico OrtoGráfico (às vezes chamado de Léxico Grafêmico ou GrafiTeca) contém as Formas LaloGráficas ou OrtoGráficas (às vezes chamadas de Formas Grafêmicas), que são as representações das palavras escritas. Uma representação gráfica consiste numa representação composta de elementos gráficos. A planta baixa de uma construção (blueprint), por exemplo, contém elementos gráficos que representam elementos como varanda, escada, porta, janela, pia, fogão, geladeira, mesa, cadeiras, lavatório, chuveiro, armário, vaso sanitário, sofá, cama, mesa, vaso de plantas. Esse sistema de representação é gráfico, pois consiste em traços escuros contra o fundo branco do papel ou de uma tela; ou em traços de giz branco na lousa escura ou tela escura. Esse sistema gráfico faz uso de pictografia para representar elementos visíveis do ambiente. A cada objeto corresponde um pictograma. O mesmo ocorre em mapas de parques de diversões, que também consistem num sistema pictográfico que representa elementos visíveis do espaço físico. Portanto, sistemas gráficos que representam pictorialmente elementos visíveis do espaço são chamados de Sistemas de Representação Pictográfica ou Sistemas Pictográficos. Por sua vez, os sistemas gráficos que representam elementos da fala são chamados de Sistemas de Representação LaloGráfica ou Sistemas LaloGráficos. O Alfabeto Fonético Internacional é um Sistema LaloGráfico Internacional que mapeia a fala de uma maneira exclusivamente fonotática. Já o Sistema de Escrita Alfabética tem outras dimensões, além da FonoTática, como a MorfoTática, ou SemantoTática, por exemplo. Os HomôNimos HomóFonos HeteróGrafos deixam claro que a grafia de uma palavra não pode ser obtida exclusivamente pelo Mapeamento FonoTático. Quando existem Alternativas Lexicais HeteróGrafas, mas HomóFonas, para uma mesma palavra a ser escrita sob ditado ouvido, o único modo de chegar à Forma OrtoGráfica adequada é por meio do Mapeamento MorfoTático ou SemantoTático que leva em conta inserção da palavra na frase e o contexto semântico de que se fala.

Há diversos exemplos de ParôNimos HomóFonos ou de HomôNimos HomóFonos HeteróGrafos, tanto HomosSêmicos quanto HeterosSêmicos. Constituem exemplos de HomóFonos HeteróGrafos HeterosSêmicos: (1a) paço (praça) e (1b) passo (movimento do pé ao avançar); (2a) espiar (observar) e (2b) expiar (pagar pena); (3a) cessão (ato de ceder ou conceder) e (3b) seção (repartição, divisão) e (3c) sessão (período de tempo em que ocorre evento seriado); (4a) acender (atear fogo, inflamar) e (4b) ascender (subir, elevar-se).

O Alfabeto Fonético Internacional (AFI), também conhecido como International Phonetic Alphabet (IPA) é um Sistema LaloGráfico Geral que permite escrever a pronúncia de qualquer palavra falada de qualquer língua. Os sistemas de escrita alfabéticos de cada língua são os Sistemas LaloGráficos Particulares, como Português, Inglês, Espanhol, Francês, Italiano, Alemão.

Quando o sistema gráfico representa a fala, ele consiste num sistema LaloGráfico. Por questão de economia, aqui esses léxicos serão doravante chamados apenas como Léxicos Gráficos (ou Léxicos Grafêmicos).

Há dois Léxicos Gráficos (ou Léxicos Grafêmicos) que permitem reconhecer e produzir palavras escritas. O Léxico Gráfico da modalidade visual é o Léxico OptoGráfico, ou Léxico OptoGrafêmico. Ele contém as representações visuais das palavras escritas passíveis de serem lidas por visão. O Léxico Gráfico para a modalidade tátil é o Léxico HaptoGráfico, ou HaptoGrafêmico. Ele contém as representações táteis das palavras escritas passíveis de serem lidas por tato.

  • (2a.) A OptoGrafia é a Escrita Visível. O OptoGrafema é a Unidade da Escrita Visível (UE visív). As representações das formas escritas visíveis são as Formas OptoGráficas (ou OptoGrafêmicas). Quando avaliandos videntes reconhecem pela visão uma Palavra Escrita, essa palavra é reconhecida porque sua Forma OptoGrafêmica (Forma OrtoGráfica) corresponde a uma Representação OptoGráfica (OrtoGráfica) previamente armazenada em seu Léxico OptoGráfico (Léxico OrtoGráfico) ou OptoGrafiTeca. Esse léxico permite ao vidente reconhecer palavras escritas à vista.

  • (2b.) HaptoGrafia é a Escrita Tateável (i.e., Braille). O HaptoGrafema é a Unidade da Escrita Tateável (UE tateáv), ou seja, caractere Braille. As representações das formas escritas tateáveis são as Formas HaptoGráficas. Cegos fazem leitura alfabética da escrita Braille. Eles processam HaptoGrafemas, ou seja, caracteres Braille. Quando cegos reconhecem pelo tato uma Palavra Escrita em caracteres Braille, essa palavra é reconhecida porque sua Forma HaptoGráfica corresponde a uma Representação HaptoGráfica previamente armazenada em seu Léxico HaptoGráfico ou HaptoLaliTeca, que permite a esse cego reconhecer palavras escritas quando as tateia.

  • (3.) O Léxico Sematósico (ou Léxico Sematosêmico) ou SematoTeca contém as Formas Sematósicas (ou Sematosêmicas), que são as representações dos sinais das línguas de sinais. Há dois léxicos Sematósicos, um para a modalidade visual (Léxico OptosSematosêmico, ou OptosSematoTeca), e outro para a modalidade tátil (Léxico HaptosSematósico ou Léxico HaptosSematosêmico, ou HaptosSematoTeca).

  • (3a.) As representações das formas sinalizadas visíveis são as Formas OptosSematósicas (ou OptosSematosêmicas), uma vez que OptosSematosia é a Sinalização Visível, e que OptosSematosema é a Unidade da Sinalização Visível (US visív). Surdos videntes comunicam-se por meio da Língua de Sinais Visual, e processam OptosSematosemas. Quando surdos videntes sinalizadores reconhecem por visão um sinal que lhes é articulado, esse sinal é reconhecido porque sua Forma OptosSematósica (ou OptosSematosêmica) corresponde a uma Representação OptosSematósica previamente armazenada em seu Léxico OptosSematósico ou OptosSematoTeca. Esse léxico lhes permite reconhecer sinais à vista.

  • (3b.) As representações das formas sinalizadas tateáveis são as Formas HaptosSematósicas (ou HaptosSematosêmicas), uma vez que HaptosSematosia é a Sinalização Tateável, e que HaptosSematosema é a Unidade da Sinalização Tateável (US tateáv). Surdocegos comunicam-se por meio da Língua de Sinais Tátil, e processam HaptosSematosemas. Quando sinalizadores surdocegos reconhecem pelo tato um sinal que é articulado em suas mãos, esse sinal é reconhecido porque sua Forma HaptosSematósica corresponde a uma Representação HaptosSematósica previamente armazenada em seu Léxico HaptosSematósico, ou HaptosSematoTeca. Esse léxico lhes permite reconhecer sinais ao tato.

Léxicos de Entrada (Input)e de Saída (Output)

Há Léxicos de Entrada e Léxicos de Saída.

  • (a.) Os Léxicos de Entrada (Input) são usados para reconhecer os elementos lexicais de uma mensagem recebida.

  • (b.) Os Léxicos de Saída (Output) são usados para produzir os elementos lexicais de uma mensagem a ser emitida.

  • (1.) O Léxico OtoLálico ou OtoLaliTeca (“Léxico Fonológico”) contém as representações mentais das palavras que a pessoa ouvinte já ouviu um orador pronunciando.

  • (1a.) O Léxico OtoLálico de Entrada contém as Formas OtoLálicas (representações mentais das palavras faladas que são recebidas por audição), que o examinando ouvinte usa para reconhecer as palavras faladas quando ele as ouve sendo faladas por um orador. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Receptivo Auditivo da fala ouvida, tal como avaliado pela escolha de figuras em presença de seus nomes ouvidos. Pode ser avaliado dos 18 meses aos 6 anos de idade (Teste de Vocabulário Receptivo: Capovilla et al., 2011b), dos 6 aos 10 anos de idade (Teste de Vocabulário por Figuras USP: Capovilla, 2011a), ou dos 2 aos 14 anos de idade (Teste de Vocabulário por Imagens Peabody: Capovilla & Capovilla, 1997; Capovilla et al., 1997a).

  • (1b.) O Léxico OtoLálico de Saída contém as Formas OtoLálicas usadas para emitir fala audível. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Expressivo da Fala Audível. Pode ser avaliado diretamente em crianças dos 18 meses aos 6 anos de idade por meio da tarefa de nomeação em voz alta de figuras vistas (Teste de Vocabulário Expressivo: Capovilla et al., 2011b). Pode também ser avaliado indiretamente em crianças dos 2 aos 6 anos de idade, por meio de inventário a ser preenchido pelo adulto que convive com a criança (Lista de Avaliação de Vocabulário Expressivo: Capovilla & Capovilla, 1997).

  • (2.) O Léxico OptoLálico ou OptoLaliTeca contém as representações mentais das palavras faladas vistas que a pessoa vidente já leu orofacialmente por visão na face de um orador.

  • (2a.) O Léxico OptoLálico de Entrada contém as Formas OptoLálicas (representações mentais das palavras faladas que são recebidas por leitura orofacial visual), que o examinando vidente (usualmente surdo, ou PcDA) usa para reconhecer as palavras faladas quando ele as vê sendo articuladas na face do orador. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Receptivo de Compreensão da Fala por Leitura Orofacial Visual. Pode ser avaliado pela escolha de figuras em presença de seus nomes falados articulados de maneira visível (Prova de Leitura Orofacial - modelo INES e modelo fonético-articulatório - normatizadas para alunos surdos do Ensino Fundamental: Capovilla & Cecconi, no prelo a, no prelo b).

  • (2b.) O Léxico OptoLálico de Saída contém as Formas OptoLálicas usadas para emitir fala visível. Essas Formas OptoLálicas são representações mentais das palavras faladas que o examinando falante já falou no passado e que são passíveis de serem lidas orofacialmente pela visão por parte de um observador vidente. O examinando falante usa esse Léxico OptoLálico de Saída para emitir fala passível de ser lida orofacialmente pela visão por parte de um observador vidente. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Expressivo da Fala Visível.

  • (3.) O Léxico HaptoLálico ou HaptoLaliTeca contém as representações mentais das palavras faladas por um orador cuja face (especialmente a boca, a laringe e as narinas) a pessoa senciente surdocega já tateou com os dedos no passado, usando sistemas de leitura orofacial tátil, como o Tadoma.

  • (3a.) O Léxico HaptoLálico de Entrada contém as Formas HaptoLálicas (representações mentais das palavras faladas que são recebidas por leitura orofacial tátil) que o examinando senciente surdocego usa para reconhecer as palavras faladas quando o surdocego as tateia sendo articuladas na face do orador. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Receptivo de Compreensão da Fala por Leitura Orofacial Tátil. Pode ser avaliado pela escolha de objetos tridimensionais em presença de seus nomes falados articulados de maneira tateável. Ou seja, o examinador articula oralmente o nome de um dado objeto. O examinando tateia a face do examinador para fazer leitura orofacial tátil da palavra que o examinador está articulando. A partir dessa leitura orofacial tátil da palavra falada pelo examinador, o examinando deve escolher, dentre diversos objetos tateáveis, ao alcance de sua mão, aquele objeto que corresponde ao nome articulado pelo examinador. Assim, o examinando, que se encontra à frente do examinador, tateia a face deste examinador para fazer a leitura orofacial tátil do nome do objeto que ele deve selecionar.

  • (3b.) O Léxico HaptoLálico de Saída contém as Formas HaptoLálicas usadas para emitir fala tactível. Essas Formas HaptoLálicas são representações mentais das palavras faladas que o examinando falante já falou no passado e que são passíveis de serem lidas orofacialmente por tato por parte de um surdocego senciente. O examinando falante usa esse Léxico HaptoLálico de Saída para emitir fala passível de ser lida orofacialmente por tato por parte de um surdocego senciente. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Expressivo da Fala Tateável.

  • (4.) O Léxico OptoGráfico (Léxico OrtoGráfico) ou OptoGrafoTeca contém as representações mentais das palavras escritas que a pessoa vidente já leu com os olhos no passado.

  • (4a.) O Léxico OptoGráfico de Entrada contém as Formas OptoGráficas ou OrtoGráficas. Essas Formas OptoGráficas ou OrtoGráficas são representações mentais das palavras escritas que o examinando vidente já leu no passado. O examinando vidente usa essas Formas OptoGráficas ou OrtoGráficas para reconhecer as palavras escritas quando ele as lê com os olhos. Esse léxico corresponde ao Vocabulário de Leitura Alfabética Visual das Palavras Escritas. Ele pode ser avaliado pedindo que o examinando escolha figuras em presença das palavras escritas, ou que escolha palavras escritas em presença de figuras (Teste de Nomeação de Figuras por Escolha: Capovilla & Raphael, 2004a, 2004b, 2005a, 2005b, 2005c). Esse léxico pode ser avaliado também pedindo que o examinando julgue se uma determinada palavra que designa uma figura está ou não escrita de maneira ortograficamente correta (Teste de Competência de Leitura de Palavras e Pseudopalavras: Seabra & Capovilla, 2010).

  • (4b.) O Léxico OptoGráfico de Saída contém as Formas OptoGráficas ou OrtoGráficas usadas para emitir escrita legível pelos olhos. Essas Formas OptoGráficas ou OrtoGráficas são representações mentais das palavras escritas que o examinando vidente já escreveu no passado. O examinando vidente usa essas Formas OptoGráficas ou OrtoGráficas para emitir escrita ortograficamente correta. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Expressivo de Escrita, que pode ser avaliado pela tarefa de nomeação de figuras por escrita (Teste de Nomeação de Figuras por Escrita: Capovilla & Raphael, 2004a, 2004b, 2005a, 2005b, 2005c).

  • (5.) O Léxico HaptoGráfico ou HaptoGrafoTeca contém as representações mentais das palavras escritas no sistema Braille que a pessoa já tateou com os dedos no passado.

  • (5a.) O Léxico HaptoGráfico de Entrada contém as Formas HaptoGráficas. Essas Formas HaptoGráficas são representações mentais das palavras escritas em Braille já tateadas com os dedos no passado. O examinando surdocego ou PcDA usa essas Formas HaptoGráficas para reconhecer as palavras escritas quando ele as tateia. Esse léxico corresponde ao Vocabulário de Leitura Alfabética Tátil das Palavras Escritas. Para surdocegos, pode ser avaliado pedindo que o examinando escolha objetos tridimensionais em presença das palavras escritas em Braille, ou que escolha palavras escritas em Braille em presença de objetos tridimensionais. Para cegos ouvintes e falantes, pode ser observado simplesmente pedindo que leiam em voz alta as palavras escritas em Braille.

  • (5b.) O Léxico HaptoGráfico de Saída contém as Formas HaptoGráficas usadas para emitir escrita tactível pelos dedos. Essas Formas HaptoGráficas são representações mentais das palavras escritas em Braille já escritas com a reglete e o punção no passado. O examinando usa essas Formas HaptoGráficas para emitir escrita ortograficamente correta em Braille. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Expressivo de Escrita em Braille. Para cegos ouvintes e falantes, pode ser observado simplesmente pedindo que usem a escrita Braille para tomar ditado de sentenças ouvidas. Para surdocegos, pode ser avaliado pedindo que o examinando, tendo tateado objetos tridimensionais, use Braille para escrever seus nomes.

  • (6.) O Léxico OptosSematósico (Léxico OptosSematosêmico) ou OptosSematoTeca contém as representações mentais dos sinais que a pessoa surda vidente já viu sendo articuladas por um sinalizador no passado.

  • (6a.) O Léxico OptosSematósico de Entrada contém as Formas OptosSematósicas ou OptosSematosêmicas. Essas Formas OptosSematósicas ou OptosSematosêmicas são representações mentais dos sinais visíveis. O examinando surdo vidente usa essas Formas OptosSematósicas ou OptosSematosêmicas para reconhecer os sinais quando ele os vê sendo articulados à sua frente por um sinalizador. Esse Léxico OptosSematósico de Entrada corresponde ao Vocabulário Receptivo de Sinais Vistos, que permite ao examinando reconhecer os sinais visíveis que um sinalizador articula à sua frente. Pode ser avaliado pedindo que o examinando escolha figuras em presença de sinais vistos (Teste de Vocabulário Receptivo de Sinais da Libras: Capovilla & Raphael, 2004a, 2004b, 2005a, 2005b, 2005c) ou que escolha sinais em presença de figuras (Teste de Nomeação de Sinais por Escolha: Capovilla & Raphael, 2004a, 2004b, 2005a, 2005b, 2005c).

  • (6b.) O Léxico OptosSematósico de Saída contém as Formas OptosSematósicas (OptosSematosêmicas) que o examinando sinalizante já sinalizou no passado e que usa para emitir sinais visíveis passíveis de serem recebidos por visão por observadores surdos videntes. O examinando usa essas Formas OptosSematósicas para formular seus pensamentos em sinais visíveis e corretos em termos de significado e forma, de modo que sua sinalização possa ser recebida por visão e compreendida por observadores videntes. Esse Léxico OptosSematósico de Saída corresponde ao Vocabulário Expressivo de Sinais Visíveis, ou ao SinalÁrio Visível de Saída.

  • (7.) O Léxico HaptosSematósico (Léxico HaptosSematosêmico) ou HaptosSematoTeca contém as representações mentais dos sinais tateados.

  • (7a.) O Léxico HaptosSematósico de Entrada contém as Formas HaptosSematósicas (HaptosSematosêmicas). Essas Formas HaptosSematósicas ou HaptosSematosêmicas são representações mentais dos sinais tateáveis. O examinando surdocego usa essas Formas HaptosSematósicas ou HaptosSematosêmicas para reconhecer os sinais de um sinalizador à sua frente quando ele os tateia. Esse Léxico HaptosSematósico de Entrada corresponde ao Vocabulário Receptivo de Sinais Tateados, que permite ao examinando reconhecer os sinais tateados a partir de um sinalizador. Pode ser avaliado pedindo que o examinando escolha miniaturas (objetos tridimensionais) tateáveis em presença de sinais emitidos pelo examinador e recebidos pelas mãos do examinando surdocego. Isso seria uma adaptação, para o surdocego, do Teste de Vocabulário Receptivo de Sinais da Libras (Capovilla & Raphael, 2004a, 2004b, 2005a, 2005b, 2005c). Nessa adaptação o surdocego teria de escolher, dentre quatro miniaturas, aquela que corresponde ao sinal que o examinador emitiu e que ele, surdocego, tateou. Pode também ser avaliado pedindo que o examinando surdocego escolha, dentre sinais tateados pelo sinalizador, aquele que corresponde à miniatura que ele tateia. Isso seria uma adaptação, para o surdocego, do Teste de Nomeação de Sinais por Escolha (Capovilla & Raphael, 2004a, 2004b, 2005a, 2005b, 2005c).

  • (7b.) O Léxico HaptosSematósico de Saída contém as Formas HaptosSematósicas (HaptosSematosêmicas) que o examinando sinalizante já sinalizou no passado e que usa para emitir sinais tactíveis passíveis de serem recebidos por tato por surdocegos sencientes. O examinando usa essas Formas HaptosSematósicas para formular seus pensamentos em sinais tactíveis e corretos em termos de significado e forma, de modo que sua sinalização possa ser recebida por usuários de língua de sinais tátil e compreendida por surdocegos sencientes. Esse Léxico HaptosSematósico de Saída corresponde ao Vocabulário Expressivo de Sinais Tateáveis ou SinalÁrio Tateável de Saída.

Léxico OtoLálico (Fonológico) de Entrada e de Saída

O Léxico OtoLálico (ou Léxico Fonológico) ou OtoLaliTeca contém as representações mentais das palavras faladas, que são no ambiente (UF audív ou Formas OtoLálicas) ou audibilizadas mentalmente (UF audibilizav ou Formas EndOtoLálicas).

  • (1a.) O Léxico OtoLálico de Entrada contém as Formas OtoLálicas (representações mentais das palavras faladas que são recebidas por audição), que são usadas para reconhecer as palavras faladas ouvidas quando se as ouve sendo faladas. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Receptivo Auditivo, da fala ouvida. Pode ser avaliado pela escolha de figuras em presença de seus nomes ouvidos. Ele pode ser avaliado por testes como o Teste de Vocabulário por Imagens Peabody (Capovilla & Capovilla, 1997; Capovilla et al., 1997c; Capovilla et al., 1997b; Dunn et al., 1986a, 1986b), o Teste de Vocabulário por Figuras USP (Capovilla, 2011a) e o Teste de Vocabulário Auditivo (Capovilla et al., 2011b), dentre outros. Quanto maior o Léxico OtoLálico de Entrada, isto é, quanto maior o repositório de representações de palavras ouvidas, maior a compreensão auditiva da fala. E maior a compreensão da leitura pela Rota Perilexical, que se dá por Decifragem Grafema - Fonema. Nessa leitura perilexical, o acesso ao significado se dá “de ouvido”, como se estivéssemos ouvindo alguém ler em voz alta aquilo que estamos lendo silenciosamente. Quando usamos essa Rota Perilexical de Decifragem Grafema - Fonema, construímos uma pronúncia e precisamos, então, tentar reconhecer essa pronúncia. Assim como temos um Léxico OtoLálico de Entrada que nos permite compreender palavras ouvidas ou audibilizadas na leitura com compreensão feita “de ouvido”, temos um Léxico OtoLálico de Saída que nos permite falar com significado.

  • (1b.) O Léxico OtoLálico de Saída contém as Formas OtoLálicas usadas para emitir fala audível. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Expressivo da Fala Audível (Formas OtoLálicas ou Fonológicas) ou da Fala Audibilizável Mentalmente (Formas EndOtoLálicas). Ele pode ser avaliado por testes como o Teste de Vocabulário Expressivo (Capovilla et al., 2011b). Quanto maior o Léxico OtoLálico de Saída, isto é, quanto maior o repositório de representações de palavras faladas, maior a produção da fala com significado, e a habilidade de nomear figuras e objetos e eventos em voz alta e pela escrita, seja pela escolha de palavras (como nos Testes de Nomeação de Figuras por Escolha, ou TNF-Escolha), seja pela produção da escrita à mão livre (como nos Testes de Nomeação de Figuras por Escrita, ou TNF-Escrita).

O Léxico OtoLálico de Entrada permite reconhecer as palavras pronunciadas quando são ouvidas na fala de uma pessoa ou quando são ouvidas em nossa própria fala, como quando lemos um bilhete que nos foi deixado, e temos a experiência de ouvir mentalmente (i.e., audibilizar) nossa própria fala. Nos dois casos, quando ouvimos a fala de outrem e quando ouvimos nossa própria fala ao decifrar uma bula ou um bilhete com palavras cuja escrita é incomum, conseguimos compreender o que nos é dito porque reconhecemos as palavras de ouvido. Nos dois casos compreendemos as palavras ouvidas ou decifradas porque elas coincidem com palavras familiares, cuja representação já se encontra previamente armazenada no Léxico OtoLálico de Entrada

Na compreensão auditiva, o reconhecimento ocorre quando determinados segmentos do fluxo da fala são reconhecidos como palavras. Eles são reconhecidos porque o padrão sonoro corresponde à representação do mesmo padrão sonoro previamente armazenada no léxico. Essa representação de padrão sonoro corresponde à representação mental de uma dada palavra ouvida. Contendo as representações mentais de uma dada palavra ouvida, esse Léxico OtoLálico de Entrada permite “pescar” palavras no fluxo da fala ouvida. Ou seja, reconhecer nesse fluxo de fala ouvida, determinadas palavras ouvidas e, assim, compreender o que ouve. Quando estamos ouvindo o fluxo da fala numa língua estrangeira, de início temos a impressão de não compreender coisa alguma. Contudo, à medida que nos adaptamos aos padrões prosódicos de ritmo e entoação próprios da fala, vamos começando a “pescar” do fluxo sonoro palavras com os ouvidos. Então começamos a reconhecer uma ou outra, aqui e acolá.

Por exemplo, consideremos um observador que observa nossos esforços, como neófito. Num determinado momento, pela nossa expressão facial de insight, ele percebe que estamos começando a compreender, e pergunta: “Que houve? Que ouve?” (i.e., “O que aconteceu? O que está ouvindo?). En passant, pode-se observar que essas palavras “houve” e “ouve” são HomôNimos HomóFonos mas HeteróGrafos. Ou seja, são idênticos à audição, mas diferentes à leitura pela rota Lexical OrtoGráfica. Quem faz Leitura Perilexical pela Rota Fonológica (Capovilla, 2023; Capovilla & Capovilla, 2000; Capovilla et al., 2001) processando apenas “de ouvido” o significado das palavras, não percebe a diferença entre essas palavras. Só quem faz leitura processando visualmente o significado é que percebe que a palavra “houve” é a forma conjugada do verbo “haver”, e que “ouve” é forma conjugada do verbo “ouvir”.

As palavras ouvidas são compostas de uma sequência de OtoLalemas. O fluxo da fala é composto de sequências de OtoLalemas compondo palavras, e de sequências dessas sequências compondo frases. Uma sequência OtoLalemas compõe uma palavra ouvida. Uma sequência de palavras ouvidas compõe uma sentença ouvida. Uma palavra pode ser efetivamente ouvida ou apenas imaginada auditivamente. Nos dois casos trata-se de uma sequência de OtoLalemas ouvidos ou apenas audibilizados mentalmente. Essa imaginação auditiva das palavras ouvidas ocorre frequentemente quando estamos lendo e escrevendo.

Quando ouvimos uma palavra e a reconhecemos ocorre uma combinação positiva (matching) entre o padrão de entrada auditiva do ambiente (palavra ouvida) e uma representação previamente armazenada no Léxico OtoLálico de Entrada (LOL). Essa ativação do Léxico OtoLálico de Entrada produzida pelo reconhecimento da palavra ouvida dá acesso à compreensão dessa palavra. O Léxico OtoLálico de Entrada permite à pessoa reconhecer as palavras quando as ouve pronunciadas por outrem ou mesmo por si própria. Essa Fala Interna produz a experiência da Voz Interna, do fenômeno de audibilizar mentalmente a própria voz ao decifrar uma bula de remédio em voz alta. Esse reconhecimento pode ocorrer quando a pessoa ouve a própria voz, ao decifrar em voz alta palavras, cuja forma ortográfica não é familiar. Pode ocorre também quando a pessoa, ao fazer leitura orofacial, tem a experiência de ouvir mentalmente (i.e., audibilizar) a própria voz.

Quando lemos em voz alta palavras incomuns (e.g., nomes de medicamentos na bula) convertemos a sequência de Grafemas, que se encontram dispostos espacialmente da esquerda para a direita, na correspondente sequência temporal de Lalemas audíveis, de modo a converter a Palavra Escrita na correspondente Palavra Falada. Quando lemos em voz baixa (leitura silenciosa) convertemos a sequência espacialmente disposta de Grafemas, da esquerda para a direita, numa sequência temporal de Lalemas audibilizados. Na Decifragem Grafema - Fonema a representação OrtoGráfica é analisada nos Grafemas componentes. Esses Grafemas são convertidos nos respectivos OtoLalemas. Finda a conversão, ocorre a Junção Fonética emitida com prosódia natural da língua. Essa junção produz uma Forma Fonológica muito similar àquela das palavras ouvidas comumente, facilitando seu reconhecimento. Por isso, o Léxico OtoLálico de Entrada é a porta de entrada não apenas do processamento auditivo da fala para o Léxico Semântico como, também, da Rota de Leitura Perilexical ou Fonológica para o Léxico Semântico, permitindo compreender, de ouvido, o que se lê. Como se a pessoa estivesse ouvindo uma palavra sendo dita por uma outra pessoa.

Léxico OptoLálico de Entrada e de Saída

O Léxico OptoLálico ou OptoLaliTeca contém as representações mentais das palavras faladas vistas.

  • (2a.) O Léxico OptoLálico de Entrada contém as Formas OptoLálicas (representações mentais das palavras faladas que são recebidas por leitura orofacial visual), que são usadas para reconhecer de maneira fenomênica e imediata as palavras faladas quando a Pessoa com Deficiência Auditiva (PcDA), que depende da leitura orofacial visual, as vê sendo articuladas na face de um orador. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Receptivo de Compreensão da Fala por Leitura Orofacial Visual. Pode ser avaliado pela escolha de figuras em presença de seus nomes falados articulados de maneira visível. Esse Léxico Mental de Palavras Faladas Visíveis (UF visív) ou Palavras Faladas Visualizadas mentalmente (UF visualiz) contém as representações mentais das palavras reconhecíveis por leitura orofacial visual (Formas OptoLálicas) ou visualizada (Formas EndOptoLálicas), que permite à PcDA reconhecer essas palavras quando são vistas sendo articuladas pelo interlocutor, ou quando são visualizadas na imaginação visual. Esse Léxico OptoLálico de Entrada é a porta de entrada da leitura orofacial visual para o Léxico Semântico. Quando a Forma OptoLálica já se encontra disponível para a PcDA, esta PcDA reconhece imediatamente a palavra vista articulada na face do interlocutor, sem precisar fazer qualquer tipo de conversão. Igualmente, quando essa Forma OptoLálica já se encontra disponível no Léxico OptoLálico da PcDA, a PcDA reconhece imediatamente o resultado do processo de Leitura por Conversão dos OptoGrafemas em EndOptoLalemas. Esse processo constrói a Forma OptoLálica correspondente à Forma OptOrtoGráfica (OrtoGráfica Visível). Se essa Forma OptOrtoGráfica não for forte o suficiente para permitir à PcDA fazer o reconhecimento visual direto da Palavra Escrita pela Rota Lexical de Leitura Alfabética, a PcDA tem de fazer a leitura alfabética dessa Palavra Escrita por meio da Rota Perilexical. É por isso que a PcDA empreende a Decifragem dos OptoGrafemas em OptoLalemas, de modo a construir a Forma EndOptoLálica correspondente à Forma OptOrtoGráfica que essa PcDA não é capaz de reconhecer de maneira visual direta. Se essa PcDA tem a Forma OptoLálica bem estabelecida, ela consegue reconhecer como familiar a Forma EndOptoLálica que ele construiu por decifragem. Graças a isso, então, a PcDA consegue ler e compreender aquela Palavra Escrita, cuja Forma OptOrtoGráfica não lhe era familiar à visão.

  • (2b.) O Léxico OptoLálico de Saída contém as Formas OptoLálicas usadas para emitir fala legível orofacialmente, que é passível de leitura orofacial visual pelo interlocutor. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Expressivo da Fala Visível ao interlocutor. Neste caso, a Pessoa com Deficiência Auditiva (PcDA), que aprendeu a oralizar, resgata mentalmente, com rapidez e facilidade e presteza, de seu Léxico OptoLálico de Saída, a Forma OptoLálica completa, a articulação visível da fala. A PcDA não precisa fazer conversão serial estrita, um a um, na Decifragem de OptoGrafemas nos seus correspondentes OptoLalemas. Ela pode usar seu Léxico OptoLálico de Entrada para reconhecer e compreender, pela Rota Lexical, a Palavra Escrita, sem ter de usar a Rota PeriLexical de Conversão de OptoGrafemas em OptoLalemas. Assim, ela não precisará inspecionar, com seu Olho Interno, a Forma EndOptoLálica construída por essa conversão na tentativa de fazer reconhecimento da Forma OptoLálica para, então, finalmente, poder compreender o que lê.

A Pessoa com Deficiência Auditiva (PcDA) pode fazer Reconhecimento Visual Direto da Palavra Escrita porque faz uso da Rota Lexical e reconhece a Forma OptoGráfica da Palavra Escrita, e recupera de seu Léxico OptoLálico de Saída a Forma OptoLálica correspondente à Palavra Falada. Ela a emite, e ela é compreendida pelo seu interlocutor, que também tem a Forma OptoLálica disponível em seu Léxico OptoLálico de Entrada. Ou seja, ao ver a Palavra Escrita, essa PcDA pode emitir diretamente a articulação visível da Palavra Falada, que será compreendida por sua interlocutora, que também é uma PcDA.

O Léxico OptoLálico de Saída contém também as Formas OptoLálicas usadas para emitir uma fala mental passível de legibilidade orofacial visualizável pela própria PcDA leitora. Esse léxico corresponde ao Vocabulário Expressivo da Fala Visualizável pela própria PcDA leitora. Neste caso, a PcDA leitora imagina visualmente com rapidez e facilidade e presteza a Forma OptoLálica completa, a articulação visualizada da fala, correspondente a uma Palavra Escrita visível ou apenas visualizada, sem ter de fazer Decifragem de Grafemas (ou EndOptoGrafemas) nos correspondentes EndOptoLalemas.

Quando a PcDA vidente faz leitura orofacial visual da fala de um interlocutor e reconhece uma dada palavra falada, ocorre uma combinação positiva (matching) entre o padrão de entrada visual do ambiente (padrão visual na face do interlocutor quando ele articula uma dada palavra) e uma representação previamente armazenada no Léxico OptoLálico de Entrada da PcDA. Essa representação previamente armazenada no Léxico OptoLálico de Entrada é chamada simplesmente de Forma OptoLálica. Essa ativação do Léxico OptoLálico de Entrada produzida pelo reconhecimento da palavra lida orofacialmente por visão dá acesso à compreensão dessa palavra. O Léxico OptoLálico de Entrada permite à PcDA reconhecer as palavras quando as vê articuladas por outrem ou quando as imagina sendo articuladas, como quando a PcDA visualiza mentalmente a pessoa amada dizendo “eu te amo”. Esse reconhecimento pode ocorrer visualmente quando a PcDA vê alguém articulando uma palavra, ou mentalmente quando essa PcDA, ao ler uma palavra desconhecida, converte cada Grafema na correspondente forma de boca imaginada visualmente até obter uma palavra toda passível de reconhecimento visual na imaginação. Ou seja, mesmo que uma PcDA não reconheça um dado nome escrito, quando converte mentalmente os Grafemas em OptoLalemas visualizados mentalmente (i.e., EndOptoLalemas), ela constrói uma Forma OptoLálica passível de reconhecimento pelo Olho Interno. Construindo a representação mental em sua imaginação visual da pronúncia de uma determinada palavra, essa PcDA pode usar o Léxico OptoLálico de Entrada para reconhecer aquela pronúncia visualizada como sendo a pronúncia de um nome familiar.

Por exemplo, a PcDA pode reconhecer a palavra como sendo o nome algo incomum de seu novo amigo indiano, o seu querido Shankaradesh. Porque a PcDA nunca tinha lido o nome “Shankaradesh” escrito antes, ela não reconhece esse nome quando o vê escrito. Então ela analisa o nome escrito nos Grafemas componentes (“sh”, “an”, “k”, “a”, “r”, “a”, “d”, “e”, “sh”) converte, em série, cada um desses Grafemas em seu correspondente OptoLalema ({\ʃ\}, {\ɐ̃\}, {\k\}, {\a\}, {\ɾ\}, {\a\}, {\d\}, {\ɛ\}, {\ʃ\}), e, assim, constrói a Forma OptoLalêmica ou OptoLálica {\ʃɐ̃kaɾa’dɛʃ\}. Como essa Forma OptoLálica ({\ʃɐ̃kaɾa’dɛʃ\}) já tem representação lexical no Léxico OptoLálico dessa PcDA, inspecionando essa Forma OptoLálica com seu Olho Interno, ela se torna capaz de reconhecer a Forma OptoLálica {\ʃɐ̃kaɾa’dɛʃ\} como sendo familiar e de compreender que se trata do nome de seu novo amigo indiano. A PcDA já tinha essa Forma OptoLálica armazenada em seu Léxico OptoLálico porque ela já tinha visto amigos se referindo ao seu novo amigo com uma Forma OptoLálica correspondente àquela Forma EndoOptoLálica. Mas ela nunca havia lido o nome escrito, nem sequer se dado ao trabalho de examinar os OptoLalemas componentes para convertê-los nos Grafemas de sua forma escrita. Não até aquele momento, em que precisou ler o inusitado nome escrito de seu amigo Shankaradesh pela primeira vez.

Em suma, neste caso, como a Forma OrtoGráfica (i.e., a forma escrita) do nome não é conhecida, ela não pode ser reconhecida de maneira visual direta pela Rota de Leitura Lexical. Para que essa Palavra Escrita não familiar possa ser lida, primeiro ela tem de ser convertida numa forma mais familiar, no caso, a forma legível orofacialmente na imaginação visual. Quando a PcDA ou a pessoa surda oralizada consegue fazer isso, ela consegue reconhecer a articulação construída, na imaginação, pela conversão dos Grafemas em OptoLalemas visualizados mentalmente (EndOptoLalemas), desde que já tenha armazenada a representação mental daquela Palavra Falada imaginada visualmente (i.e., a Forma OptoLálica). A PcDA consegue reconhecer a pronúncia que construiu visualmente por Decifragem de OptoGrafemas em EndOptoLalemas porque o aspecto geral dessa articulação construída mentalmente (i.e., a Forma EndOptoLálica construída) coincide com uma representação previamente armazenada no Léxico OptoLálico (i.e., a Forma OptoLálica armazenada). Como os itens do Léxico OptoLálico (i.e., as representações orofaciais visíveis ou visualizáveis das palavras faladas) estão associados aos respectivos itens do Léxico Semântico, essa PcDA consegue compreender a Palavra Escrita que acaba de ler apesar de a Forma OptoGrafêmica (OrtoGráfica) dessa palavra ser completamente nova e não passível de reconhecimento visual direto pela Rota de Leitura Lexical. O surdo vidente oralizado (ou a PcDA vidente) experiente só se torna capaz de ler a Palavra Escrita, de modo a articular a correspondente Palavra Falada de um modo legível à visão, porque consegue fazer essa conversão dos OptoGrafemas dessa Palavra Escrita nos respectivos OptoLalemas imaginados mentalmente (EndOptoLalemas). E ele só tem necessidade de fazer essa conversão para conseguir ler palavras novas, cujas Formas OptoLálicas ainda não estão bem estabelecidas em seu Léxico OptoLálico. Ele tem de usar a Rota de Leitura Perilexical de decifragem justamente porque não pode usar a Rota de Leitura Lexical de reconhecimento visual direto, já que até então nunca tinha visto aquela Palavra Escrita. Como a Forma OrtoGráfica da Palavra Escrita ainda lhe é totalmente estranha e não familiar, se ele não decifrar essa Palavra Escrita (i.e., se não convertê-la em fala imaginada visualmente) ele não conseguirá reconhecê-la e compreender seu significado. E se tentarem “ensinar” à PcDA a fazer leitura por mero emparelhamento visual, por mera memorização grosseira sem decifragem, essa PcDA cometerá ParaLexias LogoGráficas ao tentar ler essa palavra. E cometerá ainda mais ParaGrafias LogoGráficas ao tentar escrevê-la. Ou seja, para poder constituir um Léxico OrtoGráfico, é crucial, antes, ter aprendido a decifrar, convertendo Grafemas em Lalemas, sejam esses Lalemas audíveis (OtoLalemas ou Fonemas para ouvintes, ainda que cegos), visíveis (OptoLalemas para surdos oralizados videntes ou PcDA videntes), ou tateáveis (HaptoLalemas para surdocegos).

Léxico HaptoLálico de Entrada e de Saída

O Léxico HaptoLálico ou HaptoLaliTeca consiste num repositório mental de Formas HaptoLálicas, que podem ser usadas pela Pessoa Surdocega e pela Pessoa com Deficiências Auditiva e Visual (PcDAV) para compreender, pelo tato, a fala emitida por um orador, bem como para fazer-se compreender, também pelo tato da própria fala. As representações mentais das palavras faladas tateáveis (Formas HaptoLálicas) contidas nesse Léxico Mental de Palavras Faladas Tateadas (Léxico HaptoLálico), podem ser usadas para fins receptivos, de reconhecimento por leitura orofacial tátil, bem como para fins expressivos, de fazer-se compreender por meio de fala tateável.

O Léxico HaptoLálico de Entrada, ou HaptoLaliTeca, contém as representações das palavras faladas (Formas HaptoLálicas) armazenadas de maneira tátil, proprioceptiva e cinestésica. A leitura orofacial tátil da articulação da fala de um dado orador produz, no receptor, uma determinada configuração de sensações. Essas sensações se dividem em três tipos: táteis, proprioceptivas e cinestésicas. As sensações táteis são produzidas na pele da palma da mão e dos dedos que tateiam a fala na face do orador.

Essas sensações táteis envolvem a recepção da vibração da laringe, que permite distinguir as consoantes vozeadas das desvozeadas, bem como da narina, que permite distinguir entre HaptoLalemas vocálicos nasais e orais, bem como entre HaptoLalemas consonantais nasais e orais. Assim permite distinguir entre HaptoLalemas vocálicos nasais (<\ɐ̃\>, <\ẽ\>, <\ĩ\>, <\õ\>, <\ũ\>) e orais (<\a\>, <\ɐ\>, <\ɔ\>, <\e\>, <\ɛ\>, <\i\>, <\ɪ\>, <\o\>, <\u\>, <\ʊ\>). Permite também distinguir entre HaptoLalemas de Ditongos nasais crescentes (<\jɐ̃\>, <\jõ\>, <\wɐ̃\>, <\wẽ\>, <\wĩ\>) e Ditongos nasais decrescentes (<\ɐ̃j̃\>, <\ɐ̃w\>, <\ɐ̃w̃\>, <\ẽj\>, <\ẽj̃\>, <\õj\>, <\õj̃\>, <\ũj̃\>) e Ditongos orais crescentes (<\ja\>, <\jɐ\>, <\jɔ\>, <\je\>, <\jɛ\>, <\jo\>, <\ju\>, <\wa\>, <\wɐ\>, <\wɔ\>, <\we\>, <\wɛ\>, <\wi\>, <\wɪ\>, <\wo\>, <\wʊ\>) e Ditongos orais decrescentes (<\aj\>, <\ɐj\> <\aw\>, <\ɔj\>, <\ɔw\>, <\ej\>, <\ew\>, <\ɛj\>, <\ɛw\>, <\ij\>, <\iw\>, <\ɪw\>, <\oj\>, <\ow\>, <\uj\>, <\uw\>, <\ʊw\>). Permite ainda distinguir entre HaptoLalemas de Tritongos nasais (<\wɐ̃w̃\>, <\wẽj̃\>) e Tritongos orais (<\jaw\>, <\waj\>, <\waw\>, <\wɔj\>, <\wej\>, <\wew\>, <\wɛj\>, <\wiw\>, <\wjo\>, <\wju\>, <\wow\>). Permite por fim distinguir entre HaptoLalemas consonantais nasais (nasal bilabial: <\m\>, nasal alveolar <\n\>, nasal palatal <\ɲ\>) e HaptoLalemas consonantais orais (plosivas bilabiais <\p\> e <\b\>, plosivas alveolares <\t\>, <\d\>, aproximante lateral alveolar <\l\>, lateral palatal <\ʎ\>, dentre outras orais, como plosivas velares <\k\> e <\g\>, fricativas labiodentais <\f\> e <\v\>, fricativas alveolares <\s\> e <\z\>, fricativas pós-alveolares <\ʃ\> e <\ʒ\>, africadas <\tʃ\> e <\dʒ\>, aproximante alveolar <\ɹ\>, fricativa glotal <\h\>, vibrante alveolar <\ř\>, tap alveolar <\ɾ\>).

As sensações proprioceptivas são produzidas nos tendões dos músculos responsáveis pela manutenção da postura das mãos que tateiam a fala na face do orador. As sensações cinestésicas são produzidas nos tendões dos músculos envolvidos nos movimentos dos dedos e das mãos durante o rastreamento ativo dos movimentos dos lábios do orador, bem como da vibração da laringe (que permite distinguir as consoantes vozeadas das desvozeadas) e da vibração da narina (que permite distinguir entre HaptoLalemas vocálicos nasais e orais, bem como entre HaptoLalemas consonantais nasais e orais. Assim permite distinguir entre HaptoLalemas vocálicos nasais e orais; e entre HaptoLalemas de Ditongos nasais (crescentes e decrescentes) e Ditongos orais (crescentes e decrescentes). Permite ainda distinguir entre HaptoLalemas de Tritongos nasais e orais. Permite por fim distinguir entre HaptoLalemas consonantais nasais e orais. Quando o orador articula uma determinada palavra, esta palavra pode ser distinguida de outras palavras devido à configuração especial de sensações táteis, proprioceptivas e cinestésicas envolvidas.

• Num primeiro exemplo, consideremos as palavras “bico” e “pico”. Elas diferem por um determinado HaptoLalema consonantal, que é <\b\> (“b”) em “bico”, e <\p\> (“p”) em “pico”. Essas palavras são em tudo iguais, exceto por esse HaptoLalema consonantal, que é vozeado em <\b\> (“b”) de “bico”, e desvozeado em <\p\> (“p”) de “pico”. Esses HaptoLalemas consonantais podem ser distinguidos um do outro porque a laringe vibra em <\b\> (“b”) e não vibra em <\p\> (“p”).

• Num segundo exemplo, consideremos as palavras “manhã” e “manha”. Elas diferem por um determinado HaptoLalema vocálico, que é <\ã\> (“ã”) em “manhã”, e <\a\> (“a”) em “manha”. Essas palavras são em tudo iguais, exceto por esse HaptoLalema vocálico que é nasal em <\ã\> (“ã”) de “manhã”; e oral em <\a\> (“a”) de “manha”. Esses HaptoLalemas vocálicos podem ser distinguidos um do outro porque a narina vibra em <\ã\> (“ã”) e não vibra em <\a\> (“a”).

Assim, quando um orador articula uma determinada palavra, o tateamento dessa palavra dispara, na mente do surdocego, uma determinada configuração particular de sensações táteis, proprioceptivas e cinestésicas, à qual corresponde uma determinada palavra específica, cuja representação mental encontra-se armazenada no repositório chamado de Léxico HaptoLálico. É por isso que dizemos que esse Léxico HaptoLálico permite ao examinando senciente surdocego reconhecer as palavras quando ele as tateia articuladas na face do orador. Uma série de fatores contribuem para a eficácia do reconhecimento de palavras durante essa leitura orofacial tátil.

(3a.) O Léxico HaptoLálico de Entrada contém as Formas HaptoLálicas que são usadas pelo surdocego oralizado para reconhecer as palavras faladas quando ele as tateia sendo articuladas na face do orador. Essas Formas HaptoLálicas consistem nas representações mentais das palavras faladas que são recebidas por leitura orofacial tátil. Essa leitura orofacial tátil pode ser feita por meio de sistemas como Tadoma. O Léxico HaptoLálico de Entrada corresponde ao Vocabulário Receptivo de Compreensão da Fala por Leitura Orofacial Tátil. Esse Vocabulário Receptivo de Compreensão da Fala por Leitura Orofacial Tátil pode ser avaliado por meio de uma série de testes, como o da escolha de objetos tridimensionais tateáveis em presença de seus nomes falados articulados de maneira tateável.

Ele permite ao surdocego reconhecer essas palavras faladas quando elas são tateadas na face do orador. Esse Léxico HaptoLálico de Entrada é a porta de entrada da leitura orofacial tátil para o Léxico Semântico. Quando a Forma HaptoLálica já se encontra disponível para o surdocego oralizado, para compreender a fala ele reconhece a palavra que está tateando na face do orador, sem precisar fazer qualquer tipo de conversão. Igualmente, quando essa Forma HaptoLálica já se encontra disponível para o surdocego oralizado, para fazer leitura alfabética de uma dada palavra, ele consegue compreender essa palavra escrita ao fazer Leitura por Conversão de HaptoGrafemas (caracteres da escrita tátil Braille) em HaptoLalemas. Quando o surdocego faz Leitura pela Rota Perilexical, ele converte os HaptoGrafemas Braille nos correspondentes HaptoLalemas. Esse processo constrói a Forma HaptoLálica correspondente à Forma HaptOrtoGráfica (OrtoGráfica Tateável). Se essa Forma HaptOrtoGráfica não for forte o suficiente para permitir ao surdocego fazer reconhecimento tátil direto dessa Palavra Escrita em Braille por meio da Rota Lexical de Leitura Alfabética, o surdocego tem de fazer leitura alfabética usando a Rota Perilexical, de conversão de HaptoGrafemas Braille em HaptoLalemas tateados mentalmente, ou seja, de Endo-HaptoLalemas. É por isso que o surdocego empreende a Decifragem dos HaptoGrafemas Braille nos respectivos HaptoLalemas, de modo a construir a Forma Endo-HaptoLálica correspondente à Forma HaptOrtoGráfica que esse surdocego não é capaz de reconhecer de maneira tátil direta. Se esse surdocego tem a Forma HaptoLálica bem estabelecida, ele consegue reconhecer como familiar a Forma Endo-HaptoLálica que ele construiu por decifragem de caracteres Braille na forma falada imaginada de modo tátil pelo surdocego. Graças a isso, então, o surdocego consegue ler e compreender aquela Palavra Escrita, cuja Forma HaptOrtoGráfica não lhe era familiar ao tato.

(3b.) O Léxico HaptoLálico de Saída contém as Formas HaptoLálicas usadas para emitir fala legível orofacialmente, que é passível de leitura orofacial tátil pelo orador, também surdocego, que recebe a mensagem com as mãos. O Léxico HaptoLálico de Saída corresponde ao Vocabulário Expressivo da Fala Tateável do orador.

Neste caso, o surdocego resgata mentalmente, de seu Léxico HaptoLálico de Saída, a Forma HaptoLálica completa, a articulação tateável da fala, correspondente a uma Palavra Escrita legível por Braille. Do mesmo modo, ele resgata a imagem mental das palavras tateadas durante a leitura alfabética da escrita Braille. O surdocego não precisa fazer conversão serial estrita dos HaptoGrafemas em seus correspondentes HaptoLalemas. O surdocego pode usar seu Léxico HaptoLálico de Entrada para compreender, pela Rota Lexical, a Palavra Escrita, sem ter de usar a Rota PeriLexical de Conversão de HaptoGrafemas Braille nos respectivos HaptoLalemas. Se ele tiver de fazer conversão de HaptoGrafemas Braille nos respectivos HaptoLalemas para construir a Forma Endo-HaptoLálica, ele precisará inspecionar mentalmente essa Forma Endo-HaptoLálica para verificar se a reconhece. Ele faz isso mentalmente tateando, com sua Mão Interna (Baddeley & Wilson, 1985; Campbell & Wright, 1990), a Forma Endo-HaptoLálica construída por essa conversão na tentativa de fazer seu reconhecimento para, então, finalmente, poder compreender o que lê. O Léxico HaptoLálico de Saída permite prescindir disso, uma vez que a Forma HaptoLálica é evocada diretamente pela Forma HaptoGráfica reconhecida diretamente pelo surdocego leitor Braille experiente.

Quando o leitor surdocego experiente faz Leitura Lexical de palavras escritas em Braille, ele faz Reconhecimento Tátil Direto da Forma HaptoGráfica da Palavra Escrita em Braille. O reconhecimento da Forma HaptoGráfica da Palavra Escrita em Braille pelo Léxico HaptoGráfico de Entrada ativa imediatamente a correspondente Forma HaptoLálica (a representação tátil da Palavra Falada correspondente) no Léxico HaptoLálico de Saída. Isso permite ao surdocego emitir a articulação da Palavra Falada passível de tateamento. Essa articulação da Palavra Falada tateável, por sua vez, é tateada pelo seu interlocutor surdocego. Se este interlocutor surdocego tiver em seu Léxico HaptoLálico de Entrada a Forma HaptoLálica correspondente àquela Palavra Falada tateável, esse interlocutor compreenderá a fala. Assim, ao fazer a leitura tátil de caracteres Braille, se o surdocego tiver, em seu Léxico HaptoGráfico (de palavras escritas em Braille) a Forma HaptoGráfica correspondente àquela Palavra Escrita, ele compreenderá o que lê por reconhecimento Tátil Direto pela Rota Lexical. A ativação da Forma HaptoGráfica produzida pelo reconhecimento tátil da escrita, por sua vez, evocará a Forma HaptoLálica no Léxico HaptoLálico de Saída, que permitirá ao surdocego emitir a Palavra Falada tateável correspondente. Se seu interlocutor, igualmente surdocego, tiver armazenada aquela Representação HaptoLálica em seu Léxico HaptoLálico de Entrada, ele reconhecerá, via Tadoma, aquela palavra falada como familiar e compreenderá seu significado.

Portanto, o Léxico HaptoLálico de Saída contém também as Formas HaptoLálicas usadas para emitir uma fala mental passível de legibilidade orofacial tateável pelo próprio surdocego. O Léxico HaptoLálico de Saída corresponde ao Vocabulário Expressivo da Fala Tateável pelo próprio surdocego. Neste caso, o surdocego imagina de maneira tátil a Forma HaptoLálica completa, a articulação tateada da fala, correspondente a uma Palavra Escrita em Braille, sem ter de fazer Decifragem de HaptoGrafemas Braille nos correspondentes HaptoLalemas.

Quando o surdocego faz leitura orofacial tátil da fala articulada de modo tateável na face de seu interlocutor, e reconhece essa palavra, ocorre uma combinação positiva (matching) entre o padrão de entrada tátil do ambiente (padrão tátil na face do interlocutor quando ele articula uma dada palavra) e uma representação previamente armazenada no Léxico HaptoLálico de Entrada. Essa representação previamente armazenada no Léxico HaptoLálico de Entrada é chamada simplesmente de Forma HaptoLálica. Essa ativação do Léxico HaptoLálico de Entrada produzida pelo reconhecimento da palavra lida orofacialmente de modo tátil dá acesso à compreensão dessa palavra pelo tato. O Léxico HaptoLálico de Entrada permite ao surdocego reconhecer as palavras faladas, quando as tateia articuladas por outrem ou quando as imagina sendo articuladas. Isso ocorre, por exemplo, quando o surdocego tateia mentalmente, em sua imaginação, a articulação da fala da pessoa amada dizendo “eu te amo”. Esse reconhecimento pode ocorrer quando o surdocego tateia a face de alguém articulando uma palavra, ou quando esse surdocego, ao ler uma palavra desconhecida escrita em Braille, converte cada Grafema na correspondente forma de boca imaginada de modo tátil até obter uma palavra toda passível de reconhecimento na sua imaginação tátil. Essa é a Rota de Leitura Perilexical do Surdocego. Quando ele tateia um determinado nome escrito e não o reconhece de pronto, significa que ele não tem a Forma HaptoGrafêmica dessa Palavra Escrita em Braille estabelecida em seu Léxico HaptoGráfico de modo forte o suficiente para conseguir fazer o “reconhecimento ao primeiro toque” (ou seja, a Leitura pela Rota Lexical). Portanto, ele precisará recorrer à Rota Perilexical de Leitura Alfabética. Para tanto, ele terá de converter mentalmente os HaptoGrafemas do nome escrito em Braille nos seus respectivos HaptoLalemas tateados mentalmente (i.e., Endo-HaptoLalemas). Fazendo isso, quando ele termina de fazer a conversão, ele terá construído uma Forma HaptoLálica passível de reconhecimento pela sua Mão Interna. Construindo a representação mental em sua imaginação tátil da pronúncia de uma determinada palavra, o surdocego pode usar o Léxico HaptoLálico de Entrada para reconhecer aquela pronúncia tateada como sendo a pronúncia de um nome familiar.

Por exemplo, o surdocego pode reconhecer a palavra como sendo o nome algo incomum de seu novo amigo indiano, o seu querido Shankaradesh. Porque ele nunca tinha lido o nome “Shankaradesh” escrito antes, ele não reconhece esse nome quando o tateia escrito em Braille pela primeira vez. Então ele analisa o nome escrito nos HaptoGrafemas Braille componentes (<“sh”>, <“an”>, <“k”>, <“a”>, <“r”>, <“a”>, <“d”>, <“e”>, <“sh”>) converte, em série, cada um desses HaptoGrafemas Braille em seu correspondente Endo-HaptoLalema (<\ʃ\>, <\ɐ̃\>, <\k\>, <\a\>, <\ɾ\>, <\a\>, <\d\>, <\ɛ\>, <\ʃ\>), e, assim, constrói a Forma HaptoLalêmica ou HaptoLálica <\ʃɐ̃kaɾa’dɛʃ\>. Como essa Forma HaptoLálica <\ʃɐ̃kaɾa’dɛʃ\> já tem representação lexical no Léxico HaptoLálico do surdocego, inspecionando essa Forma HaptoLálica com sua Mão Interna ele consegue reconhecer a Forma HaptoLálica <\ʃɐ̃kaɾa’dɛʃ\> como sendo familiar e compreender que se trata do nome de seu novo amigo indiano. O surdocego já tinha essa Forma HaptoLálica armazenada em seu Léxico HaptoLálico porque ele já tinha tateado na face de amigos esse nome articulado quando lhe apresentaram Shankaradesh. Mas ele nunca havia lido o nome escrito, nem sequer se dado ao trabalho de examinar os HaptoLalemas componentes para convertê-los nos HaptoGrafemas de sua forma escrita em Braille. Não até aquele momento, em que precisou ler o inusitado nome escrito em Braille de seu amigo Shankaradesh pela primeira vez.

Em suma, neste caso, como a Forma HaptoGráfica (i.e., a forma escrita em Braille) do nome não é conhecida, ela não pode ser reconhecida de maneira tátil direta pela Rota de Leitura Lexical. Para que essa incomum Palavra Escrita em Braille possa ser lida, primeiro ela tem de ser convertida numa forma mais familiar, no caso, a forma legível orofacialmente na imaginação tátil. Quando o surdocego ou a PcDAV consegue fazer isso, ele consegue reconhecer a articulação construída, na imaginação, pela conversão dos HaptoGrafemas Braille em HaptoLalemas tateados (Endo-HaptoLalemas), desde que já tenha armazenada a representação mental daquela Palavra Falada imaginada de modo tátil (i.e., a Forma HaptoLálica). O surdocego ou a PcDAV consegue reconhecer a pronúncia que construiu de modo tátil por Decifragem de HaptoGrafemas em Endo-HaptoLalemas porque o aspecto geral dessa articulação construída mentalmente (a Forma Endo-HaptoLálica construída) coincide com uma representação previamente armazenada no Léxico HaptoLálico (i.e., a Forma HaptoLálica armazenada). Como os itens do Léxico HaptoLálico (i.e., as representações orofaciais efetivamente tateadas ou apenas mentalmente tateáveis das palavras faladas) estão associados aos respectivos itens do Léxico Semântico, o surdocego ou PcDAV consegue compreender a Palavra Escrita em Braille que acaba de ler, apesar de a Forma HaptoGrafêmica (HaptOrtoGráfica) dessa palavra ser completamente nova e não passível de reconhecimento tátil direto pela Rota de Leitura Lexical. O surdocego oralizado (ou a PcDAV) experiente só é capaz de ler a Palavra Escrita em Braille e articulá-la de modo tateável porque consegue fazer essa conversão dos HaptoGrafemas Braille dessa Palavra Escrita nos respectivos HaptoLalemas imaginados mentalmente (Endo-HaptoLalemas). E ele só tem necessidade de fazer essa conversão para conseguir ler palavras novas, cuja Forma HaptoLálica ainda não está bem estabelecida em seu Léxico HaptoLálico. Ele tem de usar a Rota de Leitura Perilexical de decifragem justamente porque não pode usar a Rota de Leitura Lexical de reconhecimento tátil direto, já que até então nunca tinha tateado aquela Palavra Escrita em Braille. Como a Forma OrtoGráfica da Palavra Escrita ainda lhe é totalmente estranha e não familiar, se o surdocego (ou a PcDAV) não decifrar essa Palavra Escrita (i.e., se não a converter em fala imaginada tatilmente) ele não conseguirá reconhecê-la e compreender seu significado. E se tentarem “ensinar” o surdocego (ou a PcDAV), por mero emparelhamento tátil, a fazer reconhecimento tátil direto e mera memorização tátil grosseira, sem passar pela decifragem, esse surdocego não conseguirá aprender, e estará fadado a cometer muitas ParaLexias LogoGráficas ao tentar ler essa Palavra Escrita em Braille. E estará fadado a cometer ainda mais ParaGrafias LogoGráficas ao tentar escrevê-la em Braille. Não existe mágica na alfabetização de surdocegos e de PcDAV. Para o surdocego sinalizador o acesso ao significado é dado pelo Léxico HaptosSematosêmico. E a conexão entre o Léxico HaptosSematosêmico e o Léxico HaptoGrafêmico é dada pela soletração digital tateável. O foco estará em ensinar os surdocegos a converter HaptoLalemas em HaptoGrafemas na escrita sob ditado da fala recebida por leitura orofacial tátil.

Léxico OrtoGráfico de Entrada (Input) e de Saída (Output)

O Léxico OptoGráfico (ou Léxico OrtoGráfico) ou GrafiTeca contém as representações mentais das palavras escritas vistas.

(4a.) O Léxico OptoGráfico (ou OrtoGráfico) de Entrada contém as Formas OptoGráficas (ou OrtoGráficas), que são as representações mentais das palavras escritas, que são usadas para reconhecer as palavras escritas quando as vemos. Ele corresponde ao Vocabulário de Leitura Alfabética Visual das Palavras Escritas. Pode ser avaliado pedindo que o examinando escolha figuras em presença das palavras escritas, ou que escolha palavras escritas em presença de figuras. Itens cuja escrita é bem familiar podem ser reconhecidos de maneira visual direta, sem depender de decifragem de Grafemas em Fonemas, porque sua representação ortográfica já se encontra bem estabelecida no Léxico OrtoGráfico de Entrada. Igualmente, esses itens cuja escrita é bem familiar podem ser escritos por produção ortográfica direta sem depender de cifragem de Fonemas em Grafemas porque sua representação ortográfica já se encontra bem estabelecida no Léxico OrtoGráfico de Saída.

(4b.) O Léxico OptoGráfico (ou OrtoGráfico) de Saída contém as Formas OptoGráficas (ou OrtoGráficas), usadas para emitir escrita ortograficamente correta. Ele corresponde ao Vocabulário Expressivo de Escrita. Quando escrevemos sob ditado ouvido convertemos a sequência temporal de Lalemas audíveis pronunciados pelo interlocutor numa sequência de Grafemas dispostos sequencialmente no papel da esquerda para a direita. Quando escrevemos sob ditado ouvido internamente, em nossa própria imaginação auditiva, convertemos a sequência temporal de Lalemas audibilizados mentalmente na correspondente sequência de Grafemas dispostos sequencialmente no papel da esquerda para a direita. Quando a produção da escrita de uma dada palavra já se encontra bastante ensaiada, a sua representação ortográfica já se encontra bem estabelecida no Léxico OrtoGráfico de Saída. Deste modo, a forma escrita de uma dada palavra já se torna familiar, de modo a poder ser escrita sem que seja necessário fazer a cifragem de OtoLalemas em Grafemas. Saber como escrever uma dada palavra permite prescindir da Cifragem de OtoLalemas em Grafemas. Isso é vantajoso primeiro porque a Cifragem OtoLaliGrafêmica é usualmente bem mais lenta que a escrita lexical por produção lexical direta via Léxico OrtoGráfico de Saída. É também vantajoso especialmente quando a escrita da palavra envolve irregularidades nas relações entre OtoLalemas e Grafemas. Nesses casos, a escrita de ouvido, por meio da Cifragem de OtoLalemas em Grafemas usualmente resulta em erros ortográficos. Consideremos uma tarefa de escrita por tomada de ditado da fala recebida por audição. Se a palavra ouvida for familiar e evocar no Léxico OrtoGráfico a correspondente Forma OrtoGráfica familiar, a escrita será produzida sem erros pela Rota Lexical, ou seja, pelo Léxico OrtoGráfico de Saída. Isso ocorre no caso de palavras irregulares muito familiares, como “facebook”, “iphone”, “mouse”. Contudo, se as palavras ouvidas cuja escrita é bastante incomum forem também bastante raras (como “kóchia”, “hecquéria”, “zwynancia”), elas não conseguirão evocar qualquer representação escrita familiar no Léxico OrtoGráfico. Como essas palavras de escrita não familiar não têm representação lexical no Léxico OrtoGráfico de Saída, elas só poderão ser escritas “de ouvido” pela Rota PeriLexical, ou seja, por meio do processo de Cifragem de OtoLalemas em Grafemas. Nestes casos, ocorrem muitos erros de escrita, usualmente chamados de ParaGrafias OtoLaloGrafêmicas (ou FonoGrafêmicas ou Fonológicas) especialmente nas relações Fonema-Grafema recessivas (como [\k\]-”k”, [\k\]-”ch”, [\ks\]-”cs”, [\ks\]-”cc”, [\wi\]-”wy”). Assim, por exemplo:

  1. [\’b\ɔ\ks\ɪ\] poderia ser cifrada como “bóquisse” ou “bóquice”, em vez de como “boxe”.

  2. [\k\o\’ks\ɐ̃w̃\] poderia ser cifrada como “coxão”, “coquissão”, ou “coquição”, em vez de como “cocção”.

  3. [\’f\u\ks\jɐ\] poderia ser cifrada como “fúxia” ou “fúquicia” ou “fúquissia”, em vez de como “fúcsia”.

  4. [\’k\ɔ\ks\ɪ\ks\] poderia ser cifrada como “cóquissis” ou “cóquicis” ou “cóquissix”, em vez de como “cóccix”.

  5. [\e\’k\ɛ\ɾ\ja\] poderia ser cifrada como “equéria”, em vez de como “hecquéria”.

  6. [\’k\ɾ\o\m\ɐ\] poderia ser cifrada como “croma”, em vez de como “chroma”.

O Léxico Semântico ou SemanTeca é o repositório das representações semânticas ou significados. Quando os itens lexicais de uma mensagem são reconhecidos como familiares, eles têm acesso ao Léxico Semântico, e a mensagem por eles composta é compreendida.

Em ouvintes, a Língua Materna (L1) é a fala, e as mensagens são recebidas por meio da fala ouvida. O Léxico Fonológico é o repositório das palavras ouvidas da língua falada, com que ouvintes pensam e se comunicam. Na compreensão auditiva e na leitura pela Rota PeriLexical (Fonológica), a porta de entrada do Léxico Semântico é o Léxico Fonológico. Quando uma palavra ouvida tem sua representação previamente armazenada no Léxico Fonológico, ela é reconhecida quando é ouvida. Feito o reconhecimento da forma fonológica da palavra ouvida, dá-se a compreensão, já que, em ouvintes, o Léxico Fonológico é a porta de acesso ao Léxico Semântico. Em ouvintes a leitura de mensagens escritas pode ser feita por meio de dois processos: o de reconhecimento visual direto e o de decifragem da escrita em fala. O processo de reconhecimento visual direto funciona quando as palavras escritas são familiares e têm representação no Léxico OrtoGráfico de Entrada. Por outro lado, quando as palavras escritas não são familiares e não têm representação no Léxico OrtoGráfico de Entrada, elas precisam ser lidas por decifragem das Unidades de Escrita (UE) nas respectivas Unidades da Fala (UF). Essa decifragem envolve um processo em estágios:

  1. quebra da sequência ortográfica em Grafemas,

  2. conversão serial dos Grafemas nos respectivos Fonemas,

  3. junção fonética compondo uma pronúncia o mais natural possível, e

  4. audição da própria pronúncia visando ao seu reconhecimento fonológico.

Se a pronúncia assim construída por decifragem equivaler a uma palavra ouvida cuja representação já estava previamente armazenada no Léxico Fonológico, essa pronúncia é reconhecida como familiar. Quando se dá esse reconhecimento da Forma Fonológica da palavra pronunciada, dá-se a compreensão, já que, em ouvintes, o Léxico Fonológico é a porta de acesso ao Léxico Semântico. Assim, durante a alfabetização, a compreensão de leitura pelo aluno ouvinte é mediada pela fala, que resulta do processo de decifragem da Forma OrtoGráfica. Alfabetizar um aluno ouvinte é ensiná-lo a ler convertendo escrita em fala, e a escrever convertendo fala em escrita. Ou seja: Ensiná-lo a ler pelo processo de Decifragem Grafema - Fonema, em que ele converte a escrita numa pronúncia passível de compreensão, e prestar atenção à própria pronúncia para reconhecer as palavras e compreender o que leu. Ensiná-lo a escrever pelo processo de cifragem de Fonemas em Grafemas, em que ele converte a sequência temporal de Unidades da Fala (a própria palavra falada) na correspondente sequência espacial de Unidades de Escrita (a correspondente palavra escrita). Por sua vez, essa mesma palavra escrita, quando submetida ao processo inverso, de Decifragem Grafema - Fonema, resultará na mesma palavra falada original.

Léxico Sematósico

O Léxico Sematósico ou SematoTeca é o repositório dos sinais de uma língua de sinais.

Em surdos, a Língua Materna (L1) é a sinalização, e as mensagens são recebidas por meio da sinalização vista. O Léxico Sematósico é o repositório dos sinais da língua de sinais, com que surdos pensam e se comunicam. Na compreensão da sinalização e na leitura alfabética mediada pela sinalização, o Léxico Sematósico é a porta de acesso ao Léxico Semântico. Quando um sinal tem sua representação previamente armazenada no Léxico Sematósico, ele é reconhecido quando é visto. Feito o reconhecimento da Forma Sematósica do sinal, dá-se a compreensão do significado, já que, em surdos, o Léxico Sematósico é a porta de acesso ao Léxico Semântico. Em surdos a leitura de mensagens escritas também pode ser feita por meio de dois processos: o de reconhecimento visual direto e o de decifragem da escrita em soletração digital e no uso dessa soletração digital para resgatar o sinal correspondente no Léxico Sematósico. Assim como no ouvinte, no surdo também ocorre que o processo de reconhecimento visual direto funciona quando as palavras escritas são familiares e têm representação no Léxico OrtoGráfico de Entrada. Do mesmo modo, assim como no ouvinte também no surdo ocorre que, quando as palavras escritas não são familiares e não têm representação no Léxico OrtoGráfico de Entrada, elas precisam ser lidas por decifragem. Contudo, diferentemente do ouvinte, essa decifragem não envolve a conversão das Unidades de Escrita (UE) nas respectivas Unidades da Fala (UF), já que a L1 do surdo não é a fala. Como a L1 do surdo é o sinal, seria preciso converter as Unidades de Escrita (UE) nas respectivas Unidades da Sinalização (US). Contudo essa conversão não pode ser direta. Ela precisa ser indireta. Isso porque o código alfabético foi inventado pelos ouvintes para mapear a fala. Ele não foi inventado pelos surdos para mapear a sinalização. Quando um ouvinte é alfabetizado, ele aprende a resgatar a fala por meio da conversão da escrita em fala. Esse processo envolve a decifragem dos Grafemas que compõem as palavras escritas, nos respectivos Fonemas (ou Lalemas Audíveis, também chamados de OtoLalemas) que compõem as palavras faladas correspondentes, as mesmas com que ele pensa e se comunica. Assim como o ouvinte, o surdo também é incapaz de ler palavras cuja forma escrita é desconhecida ou não familiar. Assim como o ouvinte, o surdo também precisa decifrar. O objetivo final é o mesmo: compreender a palavra que está escrita. Ou seja, fazer com que a Palavra Escrita acesse o Léxico Semântico. Isso pode ser feito por meio de dois caminhos. Nos dois casos, será acessado o Léxico Semântico pela porta de entrada do Léxico Sematósico.

  1. O caminho primário de conversão via soletração digital simples e elementar é mais simples e curto, mas também é mais rudimentar. Ele consiste basicamente em converter sequencialmente as letras das palavras escritas nas correspondentes formas de mão soletradas digitalmente, e em subsequentemente usar a sequência de formas de mão da soletração digital para procurar resgatar os sinais lexicais indexados por essas formas de mão. O treino de leitura demanda fortemente a memorização da conexão entre uma dada sequência de formas de mão da soletração digital e o sinal lexical a ela correspondente.

  2. O caminho secundário de conversão via imaginação visual da fala é mais sofisticado. Ele mais elaborado e mais longo, mas oferece recursos poderosos a leitores surdos mais avançados. Ele consiste basicamente em complementar o caminho anterior com o recurso mnemônico de imaginar as unidades de articulação da fala correspondentes às unidades da escrita. Ele consiste em complementar o caminho anterior com a ancoragem mnemônica na fala visível ou visualizada mentalmente. Enquanto o caminho primário se limita a converter sequencialmente as letras das palavras escritas nas correspondentes formas de mão soletradas digitalmente, e em subsequentemente usar a sequência de formas de mão da soletração digital para tentar procurar resgatar os sinais lexicais indexados por essas formas de mão, o caminho secundário faz uso de um processo ulterior para ajudar a fixar as sequências de formas de mão, ancorando-as na fala. A utilidade desse processo visual na percepção da importância de dispor as letras na ordem certa pode ser ilustrada facilmente no caso de ditongos decrescentes em que a boca começa aberta e termina fechada (“pai, “dei”, “dói”, “fui”) versus crescentes em que a boca começa fechada e termina aberta (“fúria, “mútua, “cárie”, “rádio”, “fátuo”), bem como no caso de ditongos consonantais (“al”, “el”, “il”, “ol”, “ul”) versus sílabas simples (“la”, “le”, “li”, “lo”, “lu”). A clara diferença visual na articulação da fala auxilia a fixar a ordem das letras nas palavras. Esse processo visual é importante na leitura e ainda mais importante na escrita. O uso desse processo secundário para aumentar a precisão da leitura e da escrita, e para aperfeiçoar a qualidade ortográfica da escrita em Surdos Sinalizadores oralizados foi amplamente documentada nos estudos de Campbell e colaboradores (Campbell 1987, 1990, 1992, 2006, 2008; Campbell & Dodd, 1985; Campbell et al., 1997; Campbell & Wright, 1988, 19, 1989, 1990; Dodd & Campbell, 1987; Dodd et al., 1983; Kyle et al., 2013; Massaro, 2014). Estudos da legibilidade orofacial do Português brasileiro podem ser encontrados em Capovilla e colaboradores (Capovilla, 2011a, 2011b, 2012, 2015a, 2015b, 2015c, 2018a, 2018b, 2019; Capovilla & Cecconi, 2022, n, no prelo a, no prelo b; Capovilla, De Martino et al., 2009; Capovilla & Graton-Santos, 2015; Capovilla, Graton-Santos, & Sousa-Sousa, 2009; Capovilla, Graton-Santos, & Thomazette, 2011; Capovilla, Raphael, & Mauricio, 2015a, 2015b; Capovilla, Sousa-Sousa et al., 2008, 2009; Capovilla, Sutton, & Wöhrmann, 2011).

Essa decifragem envolve um processo em estágios:

  1. quebra da sequência ortográfica em Grafemas,

  2. conversão serial dos Grafemas nos respectivos Fonemas,

  3. junção fonética compondo uma pronúncia o mais natural possível, e

  4. audição da própria pronúncia visando ao seu reconhecimento fonológico.

Se a pronúncia assim construída por decifragem equivaler a uma palavra ouvida cuja representação já estava previamente armazenada no Léxico Fonológico, essa pronúncia é reconhecida como familiar. Quando se dá esse reconhecimento da Forma Fonológica da palavra pronunciada, dá-se a compreensão, já que, em ouvintes, o Léxico Fonológico é a porta de acesso ao Léxico Semântico. Assim, durante a alfabetização, a compreensão de leitura pelo aluno ouvinte é mediada pela fala, que resulta do processo de decifragem da Forma OrtoGráfica. Alfabetizar um aluno ouvinte é ensiná-lo a ler convertendo escrita em fala, e a escrever convertendo fala em escrita. Ou seja: Ensiná-lo a ler pelo processo de Decifragem Grafema - Fonema, em que ele converte a escrita numa pronúncia passível de compreensão, e prestar atenção à própria pronúncia para reconhecer as palavras e compreender o que leu. E ensiná-lo a escrever pelo processo de cifragem de Fonemas em Grafemas, em que ele converte as unidades da própria fala nas correspondentes unidades da escrita, produzindo uma Forma OrtoGráfica a qual, uma vez decifrada, reproduzirá a forma da fala que a produziu originalmente.

Este artigo propõe que as representações escritas das palavras no Léxico OrtoGráfico se encontram indexadas pelas representações dos sinais armazenadas no Léxico Sematósico. Para compreender profundamente o conceito de um Léxico Mental de Sinais, ou de uma SemanTeca é preciso fazer uma breve incursão na ampla perspectiva dos estudos no campo.

Nosso modelo compreensivo de arquitetura cognitiva do escolar surdo foi inspirado nos estudos seminais clássicos de neurolinguística de Surdos Sinalizadores publicados por Howard Poizner, Edward Klima, Úrsula Belluggi, Karen Emmorey, David Corina, Scott Liddell, dentre outros (e.g., Bellugi, 1980, 1983; Bellugi & Fischer, 1972; Bellugi & Klima, 1972, 19, 1976; Bellugi et al., 1975, 1983, , 1983, 1988, 1989a; 1989b, 1993; Bellugi & Siple, 1974; Bellugi & Studdert-Kennedy, 1980; Emmorey, 2001, 2003, 2003; Emmorey & Corina, 1990; Klima & Bellugi, 1979; Klima et al., 1988; Poizner et al., 1987; Poizner et al., 1981). De especial impacto foram os estudos sobre afasia em Surdos Sinalizadores (e.g., Bellugi et al., 1983) e dislexia em Surdos Sinalizadores (e.g., Bellugi et al., 1989b).

O clássico The Signs of Language (Klima & Bellugi, 1979) descreve a estrutura da Língua de Sinais Americana, e mostra como a forma dos sinais pode ter inspiração gestual na forma do referente representado, ou do comportamento em relação a ele. Essa ideia foi demonstrada amplamente na Língua de Sinais Brasileira por Capovilla e colaboradores em estudos sobre a descrição da estrutura morfêmica de Libras (Capovilla, Capovilla, Raphael, & Macedo, 2005; Capovilla, Mauricio & Raphael, 2009a). Nesses estudos, os autores descrevem o modelo de morfemas molares e moleculares das línguas de sinais, e arrolam uma vasta amostra desses morfemas em Libras.

O clássico What the hands reveal about the brain (Poizner et al., 1987) descreve os quadros clássicos das afasias em Surdos Sinalizadores, bem como o efeito de lesão cerebral nas mais distintas áreas sobre o comportamento linguístico dos surdos. Quanto à perturbação das competências visoespaciais, descrevem como a lesão hemisférica direita compromete a descrição de tudo aquilo que diga respeito à distribuição visoespacial de objetos; e como a lesão hemisférica esquerda compromete a competência de fazer uso do espaço da sinalização, bem como da escrita, para fazer referência a qualquer relação. O estudo clássico de Bellugi et al. (1989b) descreve como surdos dos EUA podem cometer erros de leitura e escrita de palavras do Inglês (fork, por exemplo) induzidos por características da forma dos sinais. Estudando crianças surdas sinalizadoras norte-americanas do 2º ano do Ensino Fundamental, os autores descobriram que elas tendem a basear a sua escrita em sua própria língua de sinais materna. Esses autores observaram que, quando solicitadas a escrever os nomes de figuras de um índio (i.e., Indian) e de um garfo (i.e., fork), essas crianças tendem a escrever palavras incorretas. O interessante é que, apesar de serem muito diferentes, as palavras incorretas produzidas costumam iniciar-se com as letras F e W, respectivamente. Quando solicitadas a explicar seus erros, essas crianças surdas norte-americanas mostraram que, na Língua de Sinais Americana (Costello, 1983, 1994; Sternberg, 1990; Wilbur, 1990), os sinais INDIAN e FORK são articulados com as mesmas formas de mão usadas na soletração digital das letras F e W, respectivamente. Ou seja, ao ter de escrever as palavras Indian e fork frente às figuras de um índio e de um garfo, respectivamente, as crianças primeiro evocam do Léxico Sematósico os sinais INDIAN e FORK (que são articulados com a mão em F e em W, respectivamente) para nomear as figuras e, então, usam esses sinais como indexadores para buscar resgatar do Léxico OrtoGráfico as palavras escritas em Inglês que deveriam estar associadas àqueles sinais. Contudo, quer devido à pobreza do Léxico OrtoGráfico ou à pobreza das associações entre certos elementos desse Léxico OrtoGráfico e do Léxico Sematósico, as crianças surdas podem falhar. O curioso é que, ao falhar, elas apresentam um elemento em comum: As palavras produzidas incorretamente começam com as letras F e W, respectivamente, que são as mesmas letras com as quais os sinais espontaneamente evocados (i.e., INDIAN e FORK) em presença das figuras são articulados na Língua de Sinais Americana.

Tais trocas na escrita (i.e., ParaGrafias) por contaminação Sematósica revelam a mediação da sinalização interna e são tão típicas dos alfabetizandos Surdos Sinalizadores (e tão estranhas aos ouvintes) quanto as ParaGrafias por Regularização FonoGrafêmica são típicas dos alfabetizandos ouvintes e estranhas aos alfabetizandos Surdos Congênitos sinalizadores, conforme demonstrado por Capovilla, Viggiano, Capovilla, Raphael, Mauricio, e Bidá (2004). Uma série de estudos conduzidos com surdos brasileiros por Capovilla e colaboradores (Capovilla, 2006a, 2008a, 2011a, 2011d, 2011e, 2011f, 2011g, 2012, 2015b, 2015c, 2018b, 2020; Capovilla & Ameni, 2008; Capovilla & Cecconi, 2022; Capovilla & Mazza, 2008; Capovilla, Capovilla, Viggiano, & Bidá, 2004; Capovilla, Capovilla, Viggiano, Bidá, & Mauricio, 2004; Capovilla, Capovilla, Viggiano, Mauricio; & Bidá, 2005; Capovilla, De Martino, Macedo, Sousa- -Sousa, Graton-Santos, & Maki, 2009; Capovilla & Garcia, 2011; Capovilla, Giacomet, Mazza, Ameni, Neves, & Capovilla, 2006; Capovilla, Macedo, Penna, & Capovilla, 2006; Capovilla & Raphael, 2004a, 2004b, 2005a, 2005b, 2005c) documentam como se dão as ParaLexias Sematósicas e ParaGrafias Sematósicas de surdos brasileiros, cuja língua materna é Libras, durante a leitura e a escrita em Português. Esses estudos documentam centenas de ParaGrafias Sematósicas ao ter de nomear por escrito figuras e sinais de Libras; bem como ParaLexias Sematósicas ao ter de escolher, dentre palavras escritas, aquelas que correspondem a figuras e sinais da Libras. Por exemplo, ao ter de escrever o nome da figura de peteca, surdos escreveram “café”. Ao ter de nomear hipopótamo, surdos escreveram “Pernambuco”. Ao ter de nomear computador, surdos escreveram “caipira”. Ao ter de nomear abajur, escreveram “lula”.

Analisando centenas desses erros de escrita (ParaGrafias) de 5.400 alunos surdos sinalizadores, Capovilla propôs que eles constituem casos de ParaGrafias Sematósicas, já que envolvem a mediação por sinalização interna. Capovilla propôs que, ao ter de nomear figuras por escrito, o primeiro passo, tanto para ouvintes quanto para surdos, consiste em nomear as figuras usando a sua própria língua materna (L1), que é Português para o ouvinte e Libras para o surdo sinalizador. Nessa tarefa de nomear por escrito uma figura, para os ouvintes, o primeiro passo é nomear essa figura internamente (i.e., em voz baixa) usando a fala. O segundo passo é converter a sequência de Fonemas na respectiva sequência de Grafemas, produzindo, assim, a palavra escrita nessa tarefa de nomeação por escrito. Nessa mesma tarefa, para os surdos, o primeiro passo é nomear essa figura internamente (i.e., em sinalização contida) usando o sinal correspondente. O segundo passo é usar esse sinal como indexador para tentar resgatar, do Léxico Ortográfico de Saída, a palavra escrita correspondente. Se ele não souber como escrever a palavra correspondente ao sinal que usou para nomear internamente a figura, ele busca resgatar alguma palavra escrita que corresponda a algum sinal semelhante ao sinal da figura. No caso de nomeação escrita da figura de peteca, ele acaba escrevendo “café” porque o sinal CAFÉ é semelhante ao sinal PETECA, e ele sabe escrever a palavra “café” porque a palavra escrita “café” é mais familiar que a palavra escrita “peteca”.

Capovilla propôs que a probabilidade de uma ParaGrafia Sematósica é função inversa do Grau de Familiaridade Ortográfica da Palavra Alvo a ser Escrita (i.e., a familiaridade ortográfica da palavra “peteca” que deveria ser escrita é menor que a da palavra “café” que acabou sendo escrita), e função direta do Grau de Semelhança Sematósica entre o sinal (PETECA) correspondente à figura alvo (peteca) a ser nomeada por escrito e o sinal (CAFÉ) correspondente à palavra que acabou sendo escrita (“café”) pelos surdos. O Grau de Semelhança Sematósica entre o sinal PETECA, correspondente à figura alvo peteca a ser nomeada por escrito, e o sinal CAFÉ é alta, já que a Proporção de Sematosemas em Comum e entre esses sinais é muito elevada. Essa proporção é elevada, já que em ambos a mão de apoio se encontra aberta, com os dedos juntos e a palma para cima, ao lado da mão direita que se move para cima, estando com as pontas de dedos unidas e tocando o polegar. De fato, no sinal CAFÉ a mão de apoio aberta representa o pires e a mão dominante representa a xícara que se move num arco para cima em direção à boca; e no sinal PETECA a mão de apoio aberta representa o bater na peteca de baixo para cima, e a mão dominante representa a peteca que se move em arco para cima. Assim, a estratégia dos surdos é a de nomear a figura com o sinal e então tentar se lembrar como se escreve aquele sinal ou como se escreve um sinal semelhante, na esperança de que possam ser cognatos (aparentados em significado) mas sob risco de que venham a ser falsos cognatos.

De fato, as ParaGrafias Sematósicas dos surdos se dividem entre Cognatos e Falsos Cognatos. São exemplos de ParaGrafias Sematósicas Cognatas o nomear por escrito a figura de sol como “acordar”; a figura de apito como “tosse”, a figura de binóculos como “engenheiro”. São exemplos de ParaGrafias Sematósicas Falsas Cognatas o nomear por escrito a figura de peteca como “café”; a figura de hipopótamo como “Pernambuco”; a figura de abajur como “lula”; e a figura de computador como “caipira”. Essa importante dupla dissociação entre o tipo de ParaGrafia presente na escrita (i.e., ParaGrafia por Contaminação Sematósica no surdo versus ParaGrafia por Regularização FonoGrafêmica no ouvinte) e o sistema de representação primário (i.e., linguagem de sinais no surdo versus linguagem falada no ouvinte) revela claramente a tendência de ancorar o sistema de representação secundário (i.e., a escrita) no sistema de representação primário (i.e., a fala no caso do ouvinte e a sinalização no caso do surdo).

A noção de unidade linguística de sinais, já havia sido proposta por William Stokoe (1960) para tratar do fenômeno linguístico. Originalmente, ele propôs o termo chereme (Quirema, unidade da mão). Mais tarde ele substituiu chereme por phoneme, e passou a falar de fonologia dos sinais. Contudo, Capovilla e colaboradores (Capovilla, 2011d, 2011f, 2012, 2015b, 2015c; Capovilla & Cecconi, 2022; Capovilla & Garcia, 2011; Capovilla & Oliveira, 2015) já haviam apontado que esses termos não podem ser aceitos. Chereme não é suficientemente representativo dos parâmetros linguísticos dos sinais. De fato, Stokoe propôs a Expressão Facial como um desses parâmetros. Como bem lembrou Capovilla, “está na cara” que Expressão Facial “está na cara”, e não na mão. Portanto, não é de modo algum um Quirema. Capovilla propôs o termo mais amplo Sematosema para fazer referência à unidade linguística de sinais.

Capovilla deixa clara sua posição de que a expressão “fonologia dos sinais” é inaceitável, já que o termo fonologia advém de phoné (voz) e de logos (palavra ou estudo), e se existe algo que o sinal não tem, esse algo é precisamente a voz. Sinal não é palavra, e não tem voz. Sinal é sinal. Sinal em Grego é sematos. Unidade mínima em Grego é –ema. Portanto, logicamente, a unidade mínima do sinal é o Sematosema. Para Capovilla, os Sematosemas se dividem em dois: os que dizem respeito ao articulador mão(s), que são designados, estes sim, como Quiremas (ou, em Latim Manusículos); e os que dizem respeito ao articulador face, que dizem respeito à expressão facial, e que podem ser designados como Mascaremas (ou, em Latim Personalículos). Assim, os Sematosemas se dividem em Mascaremas e Quiremas. Os Quiremas se dividem em QuiriFormemas (ou ManusModusículos) para o parâmetro forma de mão, QuiriToposemas (ou ManusLocusículos) para o parâmetro local de mão, e QuiriCinesemas (ou ManusMotusículos) para o parâmetro movimento de mão. Capovilla explorou todos esses conceitos originais em diversos estudos sobre Revisão Etimológica da nomenclatura e sobre a nova Taxonomia Matricial, como parte do Paradigma Matricial da Linguagem Oral, Escrita e de Sinais (Capovilla, 2011d, 2011f, 2011i, 2012, 2015a, 2015b, 2015c, 2018b, 2019, 2020, 2021; Capovilla & Cecconi, 2022; Capovilla & Garcia, 2011; Capovilla & Oliveira, 2015; Capovilla, Mauricio, & Raphael, 2009b, 2015).

Inspirados nos estudos e demonstrações seminais de estudo de Bellugi, Poizner, Klima e colaboradores (e.g., Bellugi, 1983; Bellugi et al., 1983, 1988, 1989b; Hanson, 1991; Hanson & Fowler, 1987; Klima & Bellugi, 1979; Klima et al., 1988; Poizner et al., 1981, 1987), 1987), propusemos os conceitos de ParaLexias Sematósicas para fazer referência aos erros de leitura (i.e., misreading) mediados por sinalização interna, e de ParaGrafias Sematósicas para fazer referência aos erros de escrita (i.e., misspelling) mediados por sinalização interna.

Desenvolvemos esse modelo numa série de estudos ao longo dos últimos 25 anos (e.g., Capovilla, 1997, 1998a, 1998b, 1998c, 1998d, 2000a, 2000b, 2004, 2006a, 2006b, 2008a, 2008b, 2009, 2010, 2011b, 2011c, 2011d, 2011e, 2011f, 2011g, 2012, 2015a, 2015b, 2015c, 2018a, 2018b, 2021a, 2021b, 2021c, 2021d, 2023; Capovilla & Ameni, 2008; Capovilla, Capovilla, Viggiano, & Bidá, 2004; Capovilla, Capovilla, Viggiano, Bidá, & Mauricio, 2004; Capovilla, Capovilla, Viggiano, Mauricio; & Bidá, 2005; Capovilla & Cecconi, 2022; Capovilla, De Martino, Macedo, Sousa-Sousa, Graton-Santos, & Maki, 2009; Capovilla & Garcia, 2011; Capovilla, Giacomet, Mazza, Ameni, Neves, & Capovilla, 2006; Capovilla, Macedo, Penna, & Capovilla, 2006; Capovilla, Martins, & Oliveira, 2018; Capovilla & Mazza, 2008; Capovilla & Oliveira, 2015; Capovilla & Raphael, 2004a, 2004b, 2005a, 2005b, 2005c; Capovilla et al., 2011c; Capovilla & Temoteo, 2014; Capovilla, Viggiano, Bidá, Capovilla, Raphael, Neves, & Mauricio, 2005; Capovilla, Viggiano, Capovilla, Raphael, Bidá, & Mauricio, 2004; Capovilla, Viggiano, Capovilla, Raphael, Bidá, Neves, & Mauricio, 2005; Capovilla, Viggiano, Capovilla, Raphael, Mauricio, & Bidá, 2004; Capovilla, Viggiano, Raphael, Bidá, Capovilla, Neves, & Mauricio, 2005; Capovilla, Viggiano, Bidá, Capovilla, Raphael, Neves, & Mauricio, 2005).

Nosso Modelo de Mediação por Sinais das Relações entre Escrita e Significado, com sua hipótese de indexação sematosêmica do Léxico OrtoGráfico, e de mediação por sinalização interna na leitura e escrita alfabéticas, propõe explicar fenômenos tipicamente encontrados em Surdos Sinalizadores confrontados com a tarefa de dominar a leitura e a escrita alfabéticas. Dentre tais fenômenos apresentados pelos Surdos Sinalizadores, destacam-se os de ParaLexias Sematósicas observadas na leitura alfabética e de ParaGrafias Sematósicas cometidas durante a escrita alfabética. Segundo essa hipótese, durante a leitura, a compreensão de palavras escritas e de textos por parte do surdo envolve não apenas Decifragem Grafema-QuiriFormema de forma de mão por meio de soletração digital, como também evocação de sinalização interna Lexical correspondente, sendo que, no Leitor Surdo Sinalizador, o acesso ao Léxico Semântico se dá pela porta de entrada do Léxico Sematósico, que contém as imagens visuais e articulatórias dos sinais que são relevantes ao processamento cognitivo e linguístico do surdo durante o comunicar-se consigo mesmo (i.e., o pensar) e o comunicar-se com outrem (i.e., o conversar). Do mesmo modo, durante a escrita, a produção de palavras escritas e de textos por parte do surdo sinalizador se dá sob controle de sinalização interna, sendo que o Léxico Sematósico é a porta de saída do Léxico Semântico, intermediando a produção escrita alfabética, frequentemente por conversão de QuiriFormemas nas respectivas letras escritas por meio de soletração digital. Ou seja, codificando o significado em sinais de Libras e usando esses sinais como indexadores das palavras escritas correspondentes em Português no Léxico OrtoGráfico, o surdo consegue evocar as imagens ortográficas gerais das palavras correspondentes em Português, as quais são, então, convertidas nas sequências apropriadas das letras escritas por meio da conversão de QuiriFormemas nas respectivas letras escritas por meio de soletração digital que auxilia a produção da escrita. Ou seja, inicialmente codificando o significado em sinais de Libras e, em seguida, usando esses sinais como indexadores das palavras escritas correspondentes em Português, o surdo consegue evocar as imagens ortográficas gerais das palavras correspondentes em Português, as quais são, então, convertidas nas sequências apropriadas de letras escritas por meio da conversão de QuiriFormemas nas respectivas letras escritas por meio de soletração digital (cf. Capovilla, 2012, 2015a, 2015b, 2015c, 2018a, 2018b; Capovilla & Cecconi, 2022).

Tal hipótese fundamenta-se em modelos teóricos da abordagem de processamento de informações e encontra suporte empírico numa série de achados experimentais da neuropsicologia cognitiva que vêm sendo obtidos desde a década de 1980. A língua escrita é um sistema de representação secundário e se baseia num sistema de representação primário, que é a língua falada para o leitor ouvinte e a língua de sinais para o leitor surdo. A comparação entre os padrões de erro de escrita alfabética cometidos por crianças ouvintes e surdas revela isso com clareza. De fato, na Fase Alfabética ao escrever, as crianças ouvintes tendem a cometer erros de Regularização Grafema-Fonema (Capovilla, 2018a, 2023; Capovilla, Coelho et al., 2017; Capovilla & Raphael, 2004c; Luria, 1970) que revelam a mediação pela Fala Interna (Baddeley, 1986; Baddeley & Hitch, 1974; Baddeley et al., 1984; Baddeley & Wilson, 1985; Capovilla, Gonçalves, Macedo, & Duduchi, 1998; Capovilla, Capovilla, & Macedo, 2001; Halliday et al., 1990). Tais erros revelam que, nessa Fase Alfabética, as crianças ouvintes tendem a escrever por Cifragem Grafema-Fonema, como se estivessem transcrevendo os sons da Fala Interna (Capovilla, 2018a, 2023; Capovilla, Coelho et al., 2017; Capovilla & Raphael, 2004c). Em contraste, as crianças surdas, ao escrever, tendem a cometer trocas visuais de letras e palavras com base na semelhança visual entre a Palavra Alvo e a Palavra Escrita (Capovilla & Raphael, 2004c). Na leitura, tais trocas constituem ParaLexias literais e semânticas, que revelam um padrão consistente com o padrão de Leitura LogoGráfica das crianças ouvintes pré-alfabetizadas. Contudo, as crianças surdas tendem a cometer também outro tipo de ParaLexia que é própria e exclusiva do leitor surdo, ou seja, trocas radicadas em sinais, mais propriamente na similaridade entre o Sinal Mediador subjacente à palavra correta que a criança deveria ler e o Sinal Mediador subjacente à palavra incorreta que ela acaba lendo (Capovilla & Ameni, 2008; Capovilla, Giacomet et al., 2006; Capovilla & Mazza, 2008). Tal similaridade entre os sinais é de Natureza Sematósica, e se deve a um certo número de elementos em comum na Composição SubLexical dos sinais envolvidos, em termos de forma de mão, orientação da palma, local de articulação, movimento e expressão facial associada. Tais trocas radicadas em sinais ocorrem não apenas na leitura (i.e., ParaLexias), como também na escrita (i.e., ParaGrafias).

O estudo de Bellugi et al. (1989b) demonstra isso com clareza. Comparando o desempenho de escolares surdos e ouvintes de primeira série numa tarefa de nomeação escrita de figuras, os autores descobriram que as crianças surdas sinalizadoras tendem a basear a sua escrita em sua própria língua de sinais materna. Segundo os autores, quando solicitadas a escrever os nomes de figuras de um índio (Indian) e de um garfo (fork), as crianças surdas cometeram ParaGrafias, escrevendo palavras incorretas. O interessante é que, apesar de serem muito diferentes, essas palavras incorretas costumavam iniciar-se com as letras F e W, respectivamente. Quando solicitadas a explicar seus erros, as crianças surdas mostraram que, na Língua de Sinais Americana, os sinais INDIAN e FORK são feitos com as mesmas articulações de mão usadas na soletração digital das letras F e W, respectivamente. Ou seja, ao ter de escrever as palavras Indian e fork frente às figuras de um índio e de um garfo, respectivamente, as crianças primeiro evocavam do Léxico Sematósico os sinais INDIAN E FORK (que são articulados com a mão em F e em W, respectivamente) e, então, buscavam resgatar do Léxico OrtoGráfico as palavras escritas em inglês que deveriam estar associadas àqueles sinais. Contudo, devido à pobreza do Léxico OrtoGráfico ou à pobreza das associações entre certos elementos desse Léxico OrtoGráfico e do Léxico Sematósico, as crianças falharam. Contudo, curiosamente, ao falhar, apresentaram um elemento em comum: As palavras produzidas começavam com as letras F e W, respectivamente, as mesmas letras com as quais os sinais espontaneamente evocados (INDIAN E FORK) são articulados na Língua de Sinais Americana.

Tais trocas na escrita (i.e., ParaGrafias) por contaminação Sematósica revelam a mediação da sinalização interna e são tão típicas de alfabetizandos Surdos Sinalizadores e tão estranhas aos ouvintes quanto as ParaGrafias por Regularização Grafema-Fonema são típicas dos alfabetizandos ouvintes e estranhas aos alfabetizandos Surdos Congênitos sinalizadores. Essa dupla dissociação entre tipos de ParaGrafias (OptoLálica versus Sematósica) na escrita e tipos de sistema de representação primário (i.e., linguagem falada versus linguagem de sinais) revela claramente a tendência de ancorar o sistema de representação secundário (i.e., escrita) no sistema de representação primário (i.e., a fala no caso do ouvinte e a sinalização no caso do surdo).

Os testes de leitura e escrita (e.g., Teste de Competência de Leitura de Palavras e Pseudopalavras, Testes de Nomeação de Figuras e de Sinais por Escolha e por Escrita, em Capovilla & Ameni, 2008; Capovilla, Giacometi et al., 2006; Capovilla & Mazza, 2008; Capovilla & Raphael, 2004a, 2004b, 2005a, 2005b, 2005c; Capovilla, Viggiano, Bidá, Capovilla, Raphael, Neves, & Mauricio, 2005; Capovilla, Viggiano, Capovilla, Raphael, Bidá, & Mauricio, 2004; Capovilla, Viggiano, Capovilla, Raphael, Bidá, Neves, & Mauricio, 2005; Capovilla, Viggiano, Capovilla, Raphael, Mauricio, & Bidá, 2004; Capovilla, Viggiano, Raphael, Bidá, Capovilla, Neves, & Mauricio, 2005; Capovilla, Viggiano, Bidá, Capovilla, Raphael, Neves, & Mauricio, 2005) avaliam a tendência típica de Surdos Sinalizadores e cometer erros de leitura baseados em sinais subjacentes (ParaLexias Sematósicas) e a cometer erros de escrita baseados em sinais subjacentes (ParaGrafias Sematósicas). Tais ParaGrafias Sematósicas foram documentadas pela primeira vez no estudo de Bellugi et al., (1989b). Esses autores compararam o desempenho escolar entre crianças surdas e ouvintes do 2º ano EF em uma tarefa de nomeação escrita de figuras. Eles descobriram que as crianças surdas sinalizadoras tendem a basear a sua escrita em sua própria língua de sinais materna. Os autores observaram que, quando solicitadas a escrever os nomes de figuras de um índio (i.e., Indian) e de um garfo (i.e., fork), crianças surdas norte-americanas tendem a cometer ParaGrafias, escrevendo palavras incorretas. O interessante é que, apesar de serem muito diferentes, as palavras incorretas produzidas costumavam iniciar-se com as letras F e W, respectivamente. Quando solicitadas a explicar seus erros, essas crianças surdas norte-americanas mostraram que, na Língua de Sinais Americana (Costello, 1983, 1994, 1994; Sternberg, 1990; Wilbur, 1990), os sinais INDIAN e FORK são feitos com as mesmas articulações de mão usadas na soletração digital das letras F e W, respectivamente. Ou seja, ao ter de escrever as palavras Indian e fork frente às figuras de um índio e de um garfo, respectivamente, as crianças primeiro evocam do Léxico Sematósico os sinais INDIAN e FORK (que são articulados com a mão em F e em W, respectivamente) e, então, buscam resgatar do Léxico OrtoGráfico as palavras escritas em inglês que deveriam estar associadas àqueles sinais. Contudo, quer devido à pobreza do Léxico OrtoGráfico ou à pobreza das associações entre certos elementos desse Léxico OrtoGráfico e do Léxico Sematósico, as crianças falham. O curioso é que, ao falhar, elas apresentam um elemento em comum: As palavras produzidas começam com as letras F e W, respectivamente, que são as mesmas letras com as quais os sinais espontaneamente evocados (i.e., INDIAN e FORK) em presença das figuras, são articulados na Língua de Sinais Americana. Tais trocas na escrita (i.e., ParaGrafias) por contaminação Sematósica revelam a mediação da sinalização interna e são tão típicas dos alfabetizandos Surdos Sinalizadores e tão estranhas aos ouvintes quanto as ParaGrafias por Regularização Fonema - Grafema são típicas dos alfabetizandos ouvintes e estranhas aos alfabetizandos Surdos Congênitos sinalizadores, conforme demonstrado por Capovilla, Viggiano, Capovilla, Raphael, Mauricio, e Bidá (2004).

Todos esses erros pertencem a uma taxonomia original de erros de escrita (ParaGrafias) em alunos surdos ou com deficiência auditiva, cometidos durante a tomada de ditado. Essa taxonomia classifica os erros em:

(1) Erros de recepção da fala a ser cifrada. Esses erros de má compreensão da fala a ser cifrada podem ocorrer devido a semelhança entre as unidades ouvidas (ParaGrafias OtoLalêmicas) ou devido a semelhança entre as unidades lidas orofacialmente por visão (ParaGrafias OptoLalêmicas). Assim, esses erros se dividem em

(1.1) erros de recepção auditiva (ParaGrafias OtoLalêmicas) da palavra falada;

(1.2) erros de recepção visual (ParaGrafias OtoLalêmicas) da palavra falada;

(2) Erros de vocabulário de escrita. Esses erros consistem em problemas de evocação de palavra escrita a partir de sinal indexador que é usado livremente para nomeação (ParaGrafias Sematosêmicas). Esses erros refletem pobre vocabulário de escrita a ser produzida. A pobre indexação, pelos sinais, das palavras escritas dá origem à confusão na evocação das palavras raras indexadas por sinais semelhantes.

(3) Erros específicos de cifragem da fala (ParaGrafias LaloGrafêmicas), em que as trocas na escrita se devem a relações Lalema-Grafema dominantes que se imiscuem nas relações Lalema-Grafema recessivas (Capovilla, 2023; Capovilla, Coelho et al., 2017).

Essa taxonomia é de vital importância para prevenir erros de leitura e escrita em surdos.

Considerações

Este artigo conceitual apresentou uma taxonomia para a descrição sistemática de vários tipos de repositórios de representações mentais envolvidas na produção e reconhecimento de palavras faladas recebidas por audição, visão e tato, de palavras escritas recebidas por visão e tato, e de sinais recebidos por visão e tato por parte de pessoas neurotípicas (videntes e ouvintes), cegas, surdas e surdocegas.

O artigo descreveu sistematicamente esses repositórios de representações mentais, chamados Léxico Mental. Cruzando modalidade linguística de expressão (fala, escrita, sinalização) e modalidade sensorial de recepção (audição, visão, tato), o artigo identifica: sete léxicos linguísticos, sendo três léxicos de recepção da fala (por audição, visão, tato), dois léxicos de recepção da escrita (por visão, tato), e dois léxicos de recepção da sinalização (por visão, tato).

Cada um desses sete léxicos se subdivide em um Léxico de Entrada para reconhecimento linguístico, e um Léxico de Saída para produção linguística. O artigo descreveu procedimentos para avaliar cada um deles, e identificou uma série de instrumentos normatizados e validados para fazê-lo. No interior de cada léxico existe uma estrutura particular com diversas coordenadas e escalas de valores para a indexação precisa dessas representações lexicais.

O artigo descreveu sistematicamente a estrutura de cada léxico em termos das diversas configurações de coordenadas a partir das quais cada item lexical se encontra distribuído para armazenamento lexical (permitindo aprendizagem e memorização), comparação lexical (permitindo reconhecimento de padrões na recepção linguística de fala, escrita e sinais) e recuperação lexical (permitindo evocação de padrões na expressão linguística por fala, escrita e sinais). Por exemplo, considerando as representações de palavras faladas recebidas por tato, o artigo descreveu como o surdocego pode reconhecer as palavras ao tatear a configuração de formas e movimentos de boca e lábios, e vibrações de narinas e laringe, que é característica de cada palavra. Descreveu como a abertura da boca e a protrusão dos lábios permitem distinguir entre as vogais; e como a vibração das narinas permite distinguir entre vogais e consoantes nasais e as orais.

O artigo descreveu como a sequencialidade de grau de abertura da boca permite distinguir entre ditongos crescentes, decrescentes, e tritongos. Descreveu também como a vibração da laringe permite distinguir consoantes vozeadas das desvozeadas. Assim, cada palavra tateada pode ser reconhecida por uma dada sequência temporal de configurações de diferentes padrões de formas e vibrações, que constitui seu endereço preciso no léxico de reconhecimento de palavras tateadas (Léxico HaptoLálico). Isso é feito de modo sistemático para cada léxico.

Para compreender a importância do Léxico OrtoGráfico, basta considerar que a leitura, tanto a alfabética quanto a orofacial, pode se dar por dois processos: o sublexical de decifragem (empregado para palavras faladas e escritas novas) e o lexical de reconhecimento visual direto (para palavras faladas e escritas familiares). O processo lexical tende a ser muito mais rápido e eficaz que o sublexical. Mas sua eficácia depende da força e qualidade da representação.

A força da representação depende basicamente do grau de familiaridade da forma lexical. Quanto maior a qualidade de uma representação, mais precisa ela é. Representações precisas são indexadas de modo sistemático e parametrizado para armazenamento durante a aprendizagem. Quanto mais precisa for a representação de um item, melhor seu armazenamento, processamento e recuperação. Representações precisas são mais fáceis de reconhecer quando aparecem itens semelhantes em tarefas de compreensão de fala e escrita. Representações precisas são mais fáceis de evocar (resgate lexical) para expressão linguística na fala, escrita e sinalização.

A eficácia do ensino-aprendizagem aumenta quando compreendemos a estrutura de cada léxico, e o endereço preciso de um dado item lexical no cruzamento entre as dimensões que o caracterizam. Quando ensinamos um dado conceito, ajudamos o aluno a indexar sua representação num sistema de coordenadas em seu léxico mental.

Quando ressaltamos as características distintivas de um item, o aluno passa a reconhecer esse item quando o vê. Quando usamos as coordenadas certas, podemos ajudar o aluno a fazer resgate lexical do item, a evocá-lo para expressão por fala, escrita e sinal.

O artigo almejou ajudar a compreender como um dado léxico deve ser construído sistematicamente de modo a aperfeiçoar sua eficácia no reconhecimento lexical e no resgate lexical direto da fala, escrita e sinal. A presente sistematização é de importância crucial para o planejamento sistemático de procedimentos de avaliação e intervenção educacionais e clínicas no campo da linguagem.

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Trabalho realizado no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

Recebido: 09 de Maio de 2023; Aceito: 15 de Junho de 2023

Correspondência: Fernando Cesar Capovilla Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo Avenida Professor Mello de Morais, 1721 – Butantã – São Paulo, SP, Brasil – CEP 05508-030 E-mail: fernando.capovilla@usp.br

Conflito de interesses: O autor declara não haver.

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