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Revista Brasileira de Psicanálise

versão impressa ISSN 0486-641Xversão On-line ISSN 2175-3601

Rev. bras. psicanál v.41 n.3 São Paulo set. 2007

 

RESENHAS DE LIVROS

 

 

Luciana Estefno Saddi*

 

 

Sexualidade começa na infância: Para pais, educadores e profissionais de saúde Desenvolvimento sexual infantil de 0 a 6 anos: como implantar um trabalho de orientação sexual

Maria Cecília Pereira da Silva (org.). São Paulo: Casa do Psicólogo, 2007, 238 p.

A psicanálise apresentada nesta obra extrapola os consultórios e se entranha em nosso dia-a-dia e na educação de crianças pequenas. Ao lutar contra a ignorância e o preconceito, produz formas criativas de conhecimento. Compreendendo o desenvolvimento sexual infantil de 0 a 6 anos, Maria Cecília Pereira da Silvam concebe um trabalho de orientação sexual que oferece um conhecimento indispensável ao leitor leigo, ao educador que busca aprimoramento e aos pais carentes de informação. Trata-se de uma forma mais efetiva de multiplicar esse saber para participar da vida das pessoas, ao responder a suas dúvidas. Por isso, esta obra é indispensável àqueles que ousam ver e perguntar mais do que os outros.

Aprendemos aqui que a curiosidade infantil é patrimônio de todos nós, e a escrita agradável, coloquial e respeitosa dos textos demonstra isso. Transformar o pensamento difícil em escrita fácil é o objetivo desta publicação, que trata da sexualidade em crianças pequenas, da masturbação infantil, da existência ou não da homossexualidade na infância e de como proceder quando há suspeita de abuso e violência sexual. Também são abordadas situações complexas para a escola e para os pais, como crianças com aids e a sexualidade de crianças portadoras de deficiências. Os assuntos delicados, os temas tabus, são tratados com delicadeza nos diversos artigos para que leitor e autor possam atravessar os preconceitos.

Este é o ponto mais significativo do trabalho em orientação sexual infantil: o preconceito, ao ser ultrapassado com sua desconstrução, revela-nos apenas a auto-referência de quem o enunciara; jamais nos revela um saber, e sim apenas um ponto-de-vista, ou, mais precisamente, um pontinho de vista, frágil e narcisista. Essa simplicidade é assustadora, porque todos sabem da potência destrutiva e violenta desses pontinhos de vista, que agem como verdadeiras bombas atômicas (pouca massa, muita energia) na sociedade e nas capacidades individuais de educar, pensar e produzir conhecimento.

Para vencer o preconceito e ajudar a quem precisa de informações claras – criança, educador, pai, mãe –, os autores propõem um diálogo com os leitores, dão dicas, pedem ao leitor que se remeta à própria infância, recomendam livros e filmes, aguçam a sensibilidade de quem está sendo despertado para adentrar em um novo mundo de experiências.

Também são apresentados relatos de educadores da rede pública municipal de São Paulo que fizeram o projeto de orientação sexual e o relatório da avaliação independente contratada para oferecer parâmetros externos aos coordenadores do projeto. Transparência é palavra de ordem na questão da orientação sexual, assim como nos gastos com verbas públicas e nos resultados de programas educacionais inovadores, como o descrito. Transparência também é um excelente meio para atacar a ignorância, ao compartilhar um conhecimento que não pode e não deve ser detido nem por uma pessoa nem por um grupo. O livro é escrito numa linguagem simples e acessível para cumprir a função de educar e trata o leitor da forma como recomenda tratarmos a criança pequena: com atenção e respeito à curiosidade infantil.

O conhecimento é um instrumento a serviço do bem-estar e do desenvolvimento, muitas vezes o único recurso disponível a crianças e educadores contra o abuso e a violência. Para isso é necessário vencer a ignorância e os preconceitos, pois ainda há desconfiança com o trabalho de orientação sexual em escolas.

Com esta publicação temos a oportunidade de observar como o conhecimento psicanalítico sobre a sexualidade infantil se fez presente em nossa vida cotidiana e transformou-se em práticas educacionais e em medidas “curativas” para a cultura.

 

 

* Membro associado da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo SBPSP.

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