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Revista Brasileira de Psicanálise
versão impressa ISSN 0486-641X
Rev. bras. psicanál vol.45 no.4 São Paulo out./dez. 2011
ARTIGOS TEMÁTICOS: CORPO
Quando o corpo irrompe na análise: tratamento por tempo indeterminado
When the body erupts during analysis: Treatment for undetermined time
Cuando el cuerpo irrumpe en el análisis: tratamiento por tempo indeterminado
Admar Horn
Membro efetivo da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro SBPRJ
RESUMO
O autor faz uma reflexão que se situa em torno da articulação somato-psíquica, baseada nas publicações teóricas oriundas de colegas psicanalistas franceses do Instituto de Psicossomática de Paris. (IPSO) e da Sociedade de Psicanálise de Paris (SPP). A partir do relato de vinhetas clínicas acerca de um paciente visto pelo autor no IPSO, podemos observar detalhes da clínica dos pacientes psicossomáticos assim como as diferentes técnicas empregadas na cura desses pacientes.
Palavras-chave: práticas clínicas; psicossomática psicanalítica; depressão essencial; pensamento operatório; reduplicação projetiva; contratransferência; narcisismo de comportamento; narcisismo fálico.
The author poses a reflection around the psychosomatic articulation, based on the academic publications of French psychoanalyst colleagues from the Paris Institute of Psychosomatics (IPSO) and the Paris Psychoanalytic Society (SPP). From the report of clinical vignettes on a patient seen by the author at the IPSO, it is possible to observe details of the treatment of psychosomatic patients, as well as the different techniques employed in the cure of these patients.
Keywords: clinical practices; psychoanalytic psychosomatics; essential depression; operational thinking; projective reduplication; counter-transference; narcissistic behavior; phallic narcissism.
El autor hace una reflexión en torno de la articulación somato-psíquica, basada en las publicaciones teóricas oriundas de colegas psicoanalistas franceses del Instituto de Psicosomática de París (IPSO) y de la Sociedad de Psicoanálisis de París (SPP). A partir del relato de viñetas clínicas sobre un paciente visto por el autor en el IPSO, podemos observar detalles de la clínica de los pacientes psicosomáticos así como también las diferentes técnicas empleadas en la cura de estos pacientes.
Palabras clave: prácticas clínicas; psicosomática; psicoanalítica; depresión esencial; pensamiento operatorio; reduplicación proyectiva; contratransferencia; narcisismo de comportamiento; narcisismo fálico.
Mars
Je suis jeune et riche et cultivé; et je suis malhereux, névrosé et seul...1
(Fritz Zorn)
Muitas são as abordagens possíveis da temática psicossomática psicanalítica, quando estamos empenhados nessas questões relativas ao corpo e a clínica que esses pacientes apresentam.
René Roussillon, da Sociedade de Psicanálise de Paris, em recente troca epistolar, relatou questões por ele trabalhadas naquele momento, referentes às práticas clínicas, que me parecem bastante apropriadas ao tema que estamos tratando neste número da Revista Brasileira de Psicanálise: "Quando temos uma escuta clínica, será que escutamos também os significantes não verbais? Como entramos em relação com o corpo vívido do outro quando temos um olhar clínico direcionado ao mesmo? Será que somos sensíveis aos sentimentos afetuosos? A empatia continua existindo o tempo todo? Poderemos apesar de tudo nos sentirmos tocados, e como? Será que a prática clínica deveria excluir estes modos de expressão da realidade do seu campo de estudos? Em nome do que privilegiamos uma ou outra metáfora, um determinado canal de comunicação e/ou de encontro?"
Acredito que, sem dúvida nenhuma, a clínica psicossomática faz parte dessas chamadas novas práticas clínicas. Ela nos confronta, principalmente, com a fragilidade e a mobilidade dos limites entre sujeito e objeto, físico e psíquico. É uma clínica em que o silêncio, base sobre o qual vêm agir as pulsões de morte, alimenta o desligamento desorganizador. Este traz diretamente a questão do trabalho da pulsão de morte por meio de uma autodestrutividade que surge do mundo interno para atacar a atividade dos pensamentos.
As noções de negativo e efeito do narcisismo, desenvolvidas por André Green, encontram-se em primeiro plano em nosso trabalho clínico. Atualmente a psicossomática concebe o narcisismo como a primeira forma de investimento, responsável por um início de organização que vem resistir à pressão da pulsão de morte, em um conflito entre a destrutividade e o narcisismo.
Segundo Michel de M’Uzan (1977), os movimentos contratransferenciais do analista revelam fragmentos importantes do mundo interno inconsciente do analisando. Ele descreveu, juntamente com a ressonância afetiva, um tipo de compreensão que resulta num apagamento dos limites do mundo interno. Desse modo, assiste-se ao "vir ao mundo" de uma quimera que constrói os pensamentos paradoxais.
O funcionamento operatório é uma modalidade defensiva do eu adaptada a determinadas situações traumáticas e sempre relacionada com um acontecimento narcísico. É espantoso constatar, algumas vezes em certos pacientes, uma dúvida quanto ao sentimento de identidade, numa vacilação da mesma, onde o que se expressa é a vacilação do pensamento.
Quais são os desafios e como esse tipo de trabalho estimula atividades de representação exercendo uma função de indução que vem remediar as deficiências? Enfatizando a noção de espessura do pré-consciente como reforço da continuidade entre a experiência da satisfação e sua transformação alucinatória, Pierre Marty (1963) falava do empréstimo do pré-consciente do analista ao paciente. Michel Fain (1981) referia-se ao pré-consciente como um arquiteto arruinado que perdera seu papel de arquiteto, de produções de conteúdos substitutivos, financiados pelas representações de coisa inconscientes. Essa falha se traduz numa censura e no recurso à repressão das representações, em vez do recalque.
O inconsciente recebe, mas não emite, escreveu Pierre Marty (1963), descrevendo uma rigidez, um imobilismo da atividade mental com uma intensificação das barreiras de contato. A apreciação da mentalização dentro dessa relação implica numa atenção a todas as particularidades do material verbal, tanto em sua riqueza quanto em sua pobreza. Estabelece-se progressivamente uma ideia da qualidade do trabalho psíquico que leva exclusivamente em conta os elementos desse trabalho. Foi desse modo que a clínica da carência teve sua definição na descrição do pensamento operatório. Marilia Aisenstein (2000) relaciona o discurso operatório a um discurso antipensamento ou mesmo a um adestramento.
Contratransferência
No livro publicado recentemente, Lacan e a contratransferência, Marilia Aisenstein (2011) explica a noção desse conceito a partir da releitura de um artigo de Pierre Marty, publicado em 1952, intitulado "As dificuldades narcísicas do observador em Psicossomática". Segundo a autora, existe aí um duplo processo identificatório que se desenvolve no analista. Por um lado ele é levado a sentir intimamente, por identificação a seu paciente, a fragmentação do corpo e a alteração de sua imagem, por outro lado ele sofre inconscientemente um movimento de identificação da parte do paciente, provocando o apagamento de sua qualidade de objeto e de sua alteridade. Trata-se de uma forma de identificação narcísica primária onde o sujeito se projeta, total ou parcialmente no objeto, acarretando uma confusão psíquica com o objeto, descrita aqui como uma dificuldade no encontro com o paciente somatizante em relação à ideia de autodestruição. Pierre Marty (1952) ressalta, aí, um mecanismo muito próximo ao da identificação projetiva de Melanie Klein.
Retornando aos nossos pacientes psicossomáticos, algumas vezes eles apresentam estruturalmente uma organização narcísica fálica, caracterizada pela compulsão a uma hiperatividade calcada numa passividade insuportável (narcisismo de comportamento). É o terreno da autodestruição que dá conta do trabalho da pulsão de morte.
O narcisismo fálico implica em um comportamento que tem como função principal o contrainvestimento do desamparo infantil. Esse comportamento está ligado a uma supervalorização da atividade por conta de uma passividade inacessível. Ele instaura um narcisismo de comportamento que se opõe a uma aspiração narcísica a um acabamento (Michel Fain, 1981). Trata-se de uma situação de exigência original que investe a libido inacabada de acordo com um modelo que desvaloriza a falta. Assim, se produz uma ruptura entre o ideal narcísico induzido e o ideal de autoconservação. Segundo Michel Fain, no narcisismo fálico há a recusa de admitir que a percepção da diferença dos sexos dá origem a uma teoria sexual infantil, a qual confirma o perigo da castração. A valorização está ligada a uma concepção de virilidade que coloca a feminilidade em situação que atrai apenas desprezo. A autoestima é substituída pelo orgulho. A prematuridade do eu acompanha as carências traumáticas infantis e as situações de abandono.
Contextualizando esses conceitos no relato de algumas vinhetas clínicas relativas a um paciente que acompanhei durante vários anos no IPSO em Paris, lembrei-me de Pierre Marty que, inúmeras vezes, argumentou que esse paciente fazia parte daqueles que deveriam ser acompanhados por toda a vida, ou seja, por tempo indefinido, tal a precariedade do funcionamento mental.
Alberto foi encaminhado ao IPSO por um colega médico endocrinologista. No relato da história clínica do paciente, constava que ele tinha diabetes mellitus insulino-dependente bastante resistente ao tratamento, necessitando, muito frequentemente, de reajuste das doses de insulina, ou seja, um diabetes de difícil compensação metabólica. Havia também menção ao fato do paciente estar apresentando um quadro significativo de polineurite periférica, uma leve hipertensão arterial sistêmica e, concomitantemente, uma obesidade patológica importante.
Marcamos uma primeira entrevista na qual deparei-me com um homem muito grande, obeso, de óculos, com um aspecto juvenil, na faixa dos 30 e poucos anos, vestido de maneira não muito convencional, mas sempre de calça, camisa e paletó, com uma pasta de executivo. Um detalhe insólito: estava sempre calçado com um tênis bastante surrado. Tive a impressão de uma figura simpática e esse primeiro encontro pareceu-me de boa qualidade.
Desde os primeiros momentos dessa terapia percebi que estávamos em presença de um relato factual, onde a reduplicação projetiva acontecia frequentemente; dito de outro modo, o objeto sendo percebido como o duplo do sujeito. Tal percepção implicava dizer que o objeto não emitia nada além do que o duplo. Se adicionarmos a esse fato, como nos diz Claude Smadja (2001), no seu livro A vida operatória, que a realidade então reinante é muito mais aceita com resignação do que criada, poderíamos extrapolar assimilando a um ambiente onde estaria excluída toda capacidade de sonhar. Assinalo que a descontinuidade do funcionamento mental era uma das características marcantes desse paciente.
Alberto teve uma infância e uma adolescência sem acontecimentos marcantes, sempre com muito fausto econômico, tendo sido educado em bons colégios internos na Suíça. Isso ocorreu até a morte do seu pai, um rico comerciante, com atividades comerciais em países africanos. A morte aconteceu de uma forma bastante suspeita e nunca ficou esclarecido, se foi um assassinato ou acidente provocado no seu avião particular, que utilizava regularmente. Nunca se chegou a uma conclusão precisa de como ocorreu. Seguiu-se a esse fato uma importante e significativa degradação econômica familiar.
Estabelecemos desde o início da sua terapia um ritmo hebdomadário, face a face, em atenção à precariedade do seu funcionamento mental. Esse ritmo prolongou-se durante toda a duração da sua cura. Uma das ferramentas mais importantes de que me utilizei, ao longo de toda a terapia, foi a paciência, que sempre devemos ter quando cuidamos de pacientes com uma capacidade de mentalização bastante pobre e reduzida.
Com esses pacientes ditos operatórios é de suma importância a manutenção da continuidade do investimento da relação que prima sobre a atividade interpretativa. Esta última pode ser recebida pelo paciente e assimilada por sua economia psicossomática, na condição de existir uma base de um crédito de libido suficientemente consequente. É isso que justifica em parte a duração desses tratamentos, sempre muito longos e muitas vezes maçantes e a grande dose de paciência necessária ao psicanalista. Em nossa atividade, privilegiamos mais a mobilização dos investimentos do paciente no continente do que no conteúdo: o modo de pensar.
Durante os primeiros tempos de sua análise, Alberto tinha um leit motiv que relatava sempre: tinha sido colega de um dos netos do milionário Paul Getty num internato suíço. Quando esse rapaz foi sequestrado, o fato teve uma grande exploração midiática, especialmente porque os sequestradores enviaram para o seu avô um pedaço de sua orelha antes de receberem o resgate solicitado. Esse acontecimento o marcou profundamente.
De modo geral, seu relato durante as sessões era quase sempre monótono e repetitivo provocando em mim, algumas vezes, uma sonolência importante. Os acontecimentos eram relatados num modo mais biográfico do que histórico. Faltava uma densidade afetiva e representativa que fizesse com que os acontecimentos se inserissem na rede significativa de sua história individual
A ausência de comunicação com o seu inconsciente se revelava verdadeira ruptura com sua própria história. O factual e o atual se impunham todos os dias. O quadro de sua depressão essencial foi tornando-se cada vez mais evidente em um quadro de fadiga que ele relatava cada vez com mais intensidade. Os psiquiatras já fizeram inúmeras vezes menção nesses diferentes estados depressivos da presença de queixas corporais diversas, o corpo se impondo no lugar do psiquismo como um objeto de expressão dolorosa.
Analisando sob o ponto de vista de uma Depressão Essencial, o herói de F. Zorn, Mars, citado como epígrafe neste texto, evoca a ausência de alegria como sendo uma característica comum da sua vida. A partir das observações de Pierre Marty (1963) temos o hábito de referir esse estado a uma categoria clínica de vivências depressivas que chamamos de depressão essencial. Temos diante de nós um estado que se caracteriza, entre outras coisas, por uma banalização da semiologia. A clínica torna-se uma clínica do banal. O sinal pelo qual o paciente se revelaria deprimido ao olhar ou à escuta do psicanalista está desprovido de densidade enigmática, a qual poderia mobilizar e seduzir aquele ao qual essas intensidades estariam sendo dirigidas. Essa depressão sem expressão revela-se por meio da fadiga, parecida com a que todos nós sentimos, mas evidentemente tenaz e persistente, representada por uma frouxidão face à vida.
Parece-me também muito importante sublinhar algo que aconteceu logo nos primeiros tempos de sua terapia. A dose diária de insulina diminuiu significativamente, assim como a dos outros medicamentos, e as hospitalizações, outrora muito frequentes devido às repetidas descompensações do seu diabetes, também diminuíram. Com todo esse equilíbrio readquirido, seu corpo reagiu com uma diminuição importante da obesidade.
Alberto era casado com uma mulher mais velha que ele, religiosa e com uma atividade filantrópica desenvolvida em algumas instituições hospitalares. O casal não teve filhos. Falava pouco dela e só alguns anos após o início da sua terapia é que eu soube que ela também era atendida por um colega psicanalista da IPSO. Esse fato veio à tona num encontro ocasional no cafezinho com o terapeuta de sua mulher, o que me causou grande surpresa.
O comprometimento de sua libido, ocasionado entre outras coisas pelo diabetes sempre foi relatado de um modo sucinto e, propositadamente, sempre me mantive muito atento no modo de lidar e trabalhar com a sua sexualidade, num registro de muita precaução.
Algum tempo após o início da sua terapia, fazer o luto da morte do seu pai tornou-se algo de grande importância, diria mesmo que tornou-se o alvo de sua terapia. Apesar da pobreza evidente da sua vida onírica, fato bastante comum nesse tipo de pacientes, acredito que chegamos a construir juntos o sonho de uma vida para uma atenuação importante do seu sofrimento psíquico.
Christine-Jean Strolich, psicanalista do IPSO e da Société Psychanalytique de Paris, numa conferência apresentada recentemente na Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro, intitulada: Conferência introdutória à psicossomática, falou-nos a respeito da atividade onírica destes pacientes operatórios:
A qualidade da vida onírica é uma referência importante da evolução do paciente e, sobretudo, da evolução do par analítico, cuja bipartição reativa a vitalidade do pré-consciente. Lembramos que a formação da tela encobridora do sonho está estreitamente ligada ao contato íntimo da mãe com a criança através da existência de um espaço psíquico interno derivado da primeira relação de objeto. De fato, é de praxe conceber a ausência de sonhos como demonstração do isolamento do inconsciente ligado à perturbação desta relação primária.
Alberto tinha uma frequência bastante regular às suas sessões, chegava sempre um pouco antes do seu horário para poder conversar com as secretárias do IPSO. Num contexto institucional somos e formamos uma rede terapêutica que nos ajuda mutuamente, pacientes e analistas.
Como já disse anteriormente o luto pela morte do seu pai foi sempre o pano de fundo da sua terapia. Um fato até certo ponto inusitado fez com que trabalhássemos ainda de um modo mais intenso este luto.
Decidi retornar ao meu país natal e comuniquei este fato ao paciente com um ano de antecedência, ou seja, no transcorrer do quinto ano de sua terapia. Uma data alvo relativa ao final da terapia foi então estabelecida. No início ele praticamente não disse nada a respeito de nossa futura separação, mas alguns meses após eu ter anunciado minha decisão, uma transferência paterna bastante significativa se fez cada vez mais presente, o que nos permitiu falar, por meio da nossa futura separação, da "perda" do pai. Hoje posso constatar que essa decisão foi uma espécie de ponto de virada de sua terapia que durou cerca de seis anos. Os acontecimentos traumáticos da morte do seu pai, o sequestro do seu colega de internato puderam então ser trabalhados após esses longos anos de escuta e elaboração. Sempre que possível evitei ao máximo intervenções que pudessem ter uma conotação intrusiva.
Meses antes de interrompermos a terapia, conversei com um outro colega do IPSO que aceitou dar continuidade ao tratamento. Nós o vimos juntos algumas vezes, prática esta preconizada por Pierre Marty. Ele próprio, pouco tempo antes de falecer, transmitiu seus pacientes aos terapeutas que trabalhavam no IPSO.
Vejo hoje com o devido recuo que a evolução da terapia desse paciente deixou em mim a impressão de ter tido em análise alguém cuja história tinha sempre nuances interessantes e, contrariamente ao que eu imaginava, bastante ativas. Algo que ficou muito claro no decorrer da sua terapia foi uma melhora significativa da sua capacidade de mentalização.
Há uma grande diferença entre aquilo que sentimos frente a um paciente neurótico, no qual a falta nos faz pensar, e aquilo que sentimos com um paciente deprimido essencial (ou operatório) no qual esta falta não nos faz pensar. Num caso, existe mas falta, enquanto que no outro falta porque simplesmente não existe. Nesses pacientes temos sempre uma preocupação constante com a análise do funcionamento mental e com uma visão abrangente da economia psicossomática.
Existe uma distinção clínica entre a doença operatória e os estados operatórios da vida cotidiana. Na doença operatória é o narcisismo que está afetado e o ego submetido a um processo de desobjetalização. Nos estados operatórios da vida cotidiana são os objetos do ego que estão afetados e submetidos a um processo de desinvestimento. Trata-se de objetos momentaneamente doentes, sobrecarregados de excitação. Estes estados operatórios estão presentes na vida cotidiana, como válvulas de segurança, que nos permitem enxugar periodicamente os excessos de excitação inerentes à economia objetal e aliviar o sentimento de culpabilidade inconsciente. A alternância entre a plena atividade psíquica e o estado operatório da vida cotidiana nos faz pensar em outras alternativas na vida do ser humano, tal como por exemplo a do estado de vigília e do sono.
Nesse relato procurei evidenciar a importância do trabalho artesanal que devemos fazer com este tipo de pacientes valorizando a banalidade, a fadiga, a repetição, a pobreza da mentalização, a ausência de uma atividade onírica, os momentos operatórios... esses pacientes, segundo M. Aisenstein (1999), nos permitem exercitar o que ela denominou "a arte de conversar" (l’art de converser).
Como conclusão, parafraseando Michel De M’Uzan (2008), "a noção de mentalização ocupa um lugar central na teoria proposta pela escola de psicossomática de Paris, concomitantemente àquela de causalidade circular e integrada, reunindo assim os dois planos de expressão do psíquico e do somático".
Referências
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Correspondência:
Admar Horn
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Recebido em 29.9.2011
Aceito em 31.10.2011
1 Eu sou jovem, rico e culto; e estou infeliz, neurótico e sozinho... (Mars, Zorn, 1977).