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Revista Brasileira de Psicanálise
versão impressa ISSN 0486-641X
Rev. bras. psicanál vol.45 no.4 São Paulo out./dez. 2011
LANÇAMENTOS
Lançamentos
Antropologia do corpo e modernidade
David Le Breton
Petrópolis: Vozes, 2011, 407p.
O autor, sociólogo e professor da Universidade de Estrasburgo II, é um dos mais conhecidos intelectuais da corporeidade, com diversas obras publicadas na França, tendo alguns de seus livros já publicados no Brasil, como: As paixões ordinárias e A sociologia do corpo. A obra aqui apresentada consiste em uma abordagem antropológica e sociológica do mundo moderno, tomando o corpo como fio condutor. Trata-se de uma antropologia do presente, que toma emprestado frequentemente o "desvio" da etnologia e da história para apreciar, sob um ângulo insólito (porém mais fértil), certo número de práticas, discursos, representações e imaginários que empregam o corpo na modernidade. O corpo é um tema particularmente propício a uma análise antropológica por pertencer de pleno direito à estirpe identificadora do homem. Sem o corpo, que lhe dá um rosto, o homem não existiria. Para o autor, viver consiste em reduzir continuamente o mundo a seu corpo, através do simbólico que lhe encarna. A existência do homem é corporal, e o tratamento social e cultural de que o corpo é objeto, as imagens que lhe expõem a espessura escondida, os valores que o distinguem, falam-nos também da pessoa e das variações que a sua definição e os seus modos de existência conhecem, de uma estrutura social à outra. Por estar no cerne da ação individual e coletiva, no cerne do simbolismo social, o corpo é objeto de análise de grande alcance para uma melhor apreensão do presente.
Clínica de la diferencia: en tiempos de perversión generalizada
José E. Milmaniene
Buenos Aires: Editorial Biblos, 2010, 122p.
O livro configura-se como uma reflexão sobre os efeitos sociais, culturais e clínicos que são gerados quando se desconhece a dualidade essencial masculinidade-feminilidade. O ataque à diferença sexual e à lógica binária assentada no eixo falo-castração subjaz em todas as políticas de gozo assinaladas pelo masoquismo, pela sexualidade fetichista-masturbatória, pela agressividade especular, pela violência segregacionista e pelo consumo compulsivo dos objetos da adição. Entre outros temas de alto interesse atual, o autor aborda psicanaliticamente as patologias do vazio - adições, transtornos alimentares (anorexia-bulimia), atuações transgressivas -, as características das personalidades como se, o fenômeno das tribos urbanas, o valor da marca comercial como traço identificatório e as modalidades não exitosas da sublimação em algumas expressões da arte contemporânea. No texto se descreve como o repúdio da castração busca substituir a lei que inscreve diferenças pela arbitrariedade de uma ordem marcada por gozos pulsionais indiscriminados. Para o autor a degradação da lei paterna, a crise dos valores, a eclipse dos ideais, a falta de limites simbólicos e a desvalorização da palavra configuram um panorama que se pode caracterizar como uma "perversão generalizada", definida pela tendência ao desconhecimento da diferença sexual, ficando o sujeito capturado no gozo autoerótico que procura a repetição infindável do mesmo no narcisismo. O autor reivindica a necessidade de restituir-se o valor dos discursos e práticas que sustentem, sem concessões, a ética da diferença.
Estou falando com as paredes
Jacques Lacan
Rio de Janeiro: Zahar, 2011, 103p.
O livro, incluído na série apresentada por Jacques-Alain Miller, chamada de "Paradoxos de Lacan", foi agora traduzido ao português e editada pela Zahar. Convidado a fazer no Hospital Saint-Anne uma série de seminários mensais, destinados aos internos de psiquiatria, Lacan escolhera como título "O saber do psicanalista", provavelmente confrontando a bandeira do "não-saber" erguida por alguns dos alunos que estavam inspirados pela leitura de Bataille. As três primeiras dessas "conversas" (1. Saber, ignorância, verdade e gozo, em 4/11/1971; 2. Da incompreensão e outros temas, em 2/12/1971; 3. Estou falando com as paredes, em 6/1/1972), como as chamou Lacan, correspondem mais ou menos à ideia original e estão aqui reunidas nesse pequeno volume. As quatro "conversas" seguintes da série foram inseridas, por Miller, no livro 19 do Seminário, por gravitarem em torno das questões abordadas no grande Seminário que ele conduzia na Praça do Panthéon, nos espaços da faculdade de Direito, sob o título de "... ou pior". Estou falando com as paredes, diz Lacan, e isso significa: "Nem com vocês, nem com o Outro maiúsculo. Estou falando sozinho. É precisamente isto que lhes interessa. Cabe a vocês me interpretarem". Aqui Lacan reencontra sua juventude de interno em psiquiatria. Diverte-se, improvisa, deixa-se levar e promove polêmica. Ele indica que a psicanálise provém de um saber suposto, o do inconsciente. Chega-se a ele pelo caminho da verdade (o analisando se esforça por dizer cruamente o que lhe passa pela cabeça) quando ela desemboca no gozo (o analista interpreta os ditos do analisando em termos de libido). Em contrapartida, dois outros caminhos barram o acesso ao inconsciente: a ignorância e o poder (a paixão pela potência oblitera o que o ato falho revela). A psicanálise ensina as virtudes da impotência: ela, pelo menos, respeita o real. Tal "conversa" é verdadeira lição de sabedoria para nossa época, que vê a burocracia de braço dado com a ciência, sonhar mudar o homem no que ele tem de mais profundo, por meios e maneiras pretensiosamente tolas. Trata-se de uma pièce de résistance para o homem.
Distúrbios alimentares: uma contribuição da psicanálise
Cássia Aparecida Nuevo Barreto Bruno (Org.)
Rio de Janeiro: Imago, 2011, 371p.
Esse livro é o resultado do trabalho de um grupo de estudo que teve início no ano de 1999 com o nome: Desvios Alimentares. Inicialmente foi um curso semanal, que resultou na apresentação em reunião científica na sbpsp de trabalhos escritos realizados por cada um dos membros do grupo, com comentários de Maria Olímpia França, no final do ano de 1999. Tais trabalhos estão arquivados na biblioteca da SBPSP. No ano de 2000 o grupo ampliado passou a ser um Grupo de Estudos sobre Compulsões e Desvios Alimentares, que vem atuando ao longo desses anos. O livro é um dos produtos dessas reuniões mensais. Foram convidados para participar do livro todos os colegas da sbpsp que estudaram o tema ou que escreveram textos que orientam a abordagem desse tipo de caso, e apresentou-se agora o resultado ao leitor. A obra está ordenada de modo a apresentar não apenas textos mais abstratos e teóricos, que fundamentam a teoria subjacente à prática psicanalítica aqui apresentada, mas também textos diretamente relacionados à prática clínica. Para atender, desse modo, tanto o público especialista em psicanálise, que pode encontrar elementos para uma discussão das bases teóricas dessa específica abordagem, como também aqueles que buscam um foco mais clínico.
L’actuel malaise dans la culture
François Richard
Paris: Éditions de L’Olivier, 2011, 266p.
François Richard, membro da Société Psychanalytique de Paris e professor na "Université Paris 7 - Denis-Diderot", é autor de importantes obras como, Le processus de subjectivation à l’adolescence (2001), Le travail du psychanalyste en psychothérapie (2002) e La rencontre psychanalytique (2011). O autor nos apresenta nova obra de grande peso intelectual, que apesar de transitar pelo campo teórico da psicanálise acaba por se revelar de interesse prático na clínica psicanalítica contemporânea. Refletindo sobre as condições atuais da vida humana questiona-se sobre a possibilidade de a modernidade estar aproximando-se de um estado de confusão generalizada, mesmo com suas teorias críticas, na qual mal se distinguiriam os discursos que a sociedade tem sobre si mesma, sobre sua própria agitação estéril e seu próprio movimento paralisante. Teorias, "discursos", impregnados com dinâmicas mais pulsionais do que com narrativas, e uma historicidade nova e incerta entram, com a clínica dos sofrimentos psíquicos paradoxais, na definição do mal-estar atual. Trata-se do mal-estar de uma cultura, no centro da qual poderia bem se encontrar um lugar vazio de poder, particularmente inquietante. O mal-estar atual estaria assim na espera de um pensamento, ao qual se opõem curiosamente as "novidades": reformas, tecnologias, "culturas populares" e as histórias contadas, de uma época, sobre si mesma. Richard nos indaga: "Tudo isso, toda essa sucessão de coisas não visaria interditar, impedir ou proibir de pensar a crise contemporânea da modernidade?". O livro é instigante e exigente de atenção para o leitor, deve ser apresentado como texto fundamental para o psicanalista envolvido com a clínica da contemporaneidade.
Violência e masculinidade
Susana Muszkat
São Paulo: Casa do Psicólogo, 2011, 254p.
Esse livro faz parte da coleção "Clínica Psicanalítica", dirigida por Flávio Carvalho Ferraz, composta de obras voltadas para as mais diversas manifestações do sofrimento psíquico, bem como para as expansões da clínica psicanalítica para além do setting clássico. Esta obra é resultado de um projeto que teve como ponto de partida o trabalho desenvolvido na Organização Não Governamental Pró-Mulher, Família e Cidadania (PMFC) junto a famílias de baixa renda vivendo em situações de violência. A autora aponta que o caráter naturalizado da violência deve-se principalmente a rígidas crenças calcadas em uma ideologia hegemônica masculina, compartilhada tanto por homens como por mulheres, as quais os aprisionam em papéis pré-determinados e inflexíveis. O objeto desse estudo é o universo masculino, especificamente representado pelo grupo de homens atendidos na pmfc, universo no qual a autora verificou ao longo dos anos de atendimento, em grupos de reflexão masculinos, o predomínio do tipo de relação pautada pelos padrões hegemônicos de gênero. O recorte desse trabalho desenvolve subsídios teóricos concernentes à construção e à desconstrução da subjetividade nas diferentes masculinidades, assim como de suas expressões na violência em geral e na violência de gênero em especial. Abordando o tema da violência praticada contra mulheres; 1. questiona a adoção de uma lógica não complexa e maniqueísta com a qual habitualmente as políticas públicas enfrentam tal problema, propondo a tese de que os efeitos dessas políticas atuais tendem a cristalizar e perpetuar aquilo que pretendem combater e 2. explicita qual o lugar destinado ou imposto simbolicamente aos homens, procurando identificar quais os determinantes culturais, sociais e psicológicos organizadores da subjetividade masculina, a fim de compreender como os papéis de gênero e as relações resultantes deles são atribuídos, transmitidos e perpetuados pelos gêneros. Sua reflexão é inteiramente ancorada na teoria psicanalítica, tomando como base Freud e sua concepção de desfusão pulsional e de sadismo, além das contribuições de Isabel Kahn Marin que articula o conceito de violência de gênero com o de violência fundamental. Fica evidente no livro, o interesse em ampliar o escopo de utilização da psicanálise para a esfera sociocultural.