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Revista Brasileira de Psicanálise
versão impressa ISSN 0486-641X
Rev. bras. psicanál vol.47 no.2 São Paulo abr./jun. 2013
RESENHAS
Apontamentos psicanalíticos: textos teórico-clínicos e de psicanálise aplicada
Andreas Zschoerper Linhares
Membro associado da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Ribeirão Preto SBPRP e membro fundador do Grupo Psicanalítico de Curitiba
Autora: Vera Marieta Fischer
Editora: Zagodoni, São Paulo, 2012, 121p.
Resenhado por: Andreas Zschoerper Linhares
Vera Marieta Fischer é psicanalista1 já com muitos anos de vivência na prática clínica da psicanálise no atendimento de crianças, famílias e adultos. Sua formação inicial foi em medicina e pediatria. Os que a conhecem sabem de seu interesse, de seu conhecimento e de sua fonte de inspiração a partir dos desenvolvimentos psicanalíticos propostos por Donald Winnicott, o que não torna Vera, porém, refratária aos postulados de Freud, Melanie Klein e também Wilfred Bion.
Neste ano de 2012, Vera revisitou alguns de seus escritos psicanalíticos, editou-os e se propôs a publicá-los. Eles formam o livro Apontamentospsicanalíticos - textos teórico-clínicos e de psicanálise aplicada, permitindo, assim, a um público maior tomar contato com sua experiência e suas impressões a respeito de alguns aspectos do seu trabalho clínico e do seu contato com a teoria psicanalítica. No livro, Vera também revela uma especial sensibilidade na análise de obras cinematográficas, encontrando nelas uma manifestação peculiar do ser humano e seus conflitos, de suas possibilidades e de suas intenções dentro de uma moldura que estimula a própria reflexão do leitor. O livro está dividido em três partes: 1) Trabalhos teórico-clínicos; 2) Conversando sobre o desenvolvimento emocional; e 3) Psicanálise e cinema.
Na primeira parte, a autora apresenta sua reflexão sobre alguns fundamentos da psicanálise, partindo de Freud e chegando a Winnicott. Nestes capítulos podemos encontrar uma estudiosa da psicanálise que "conversa" com as obras que lê. Uma amadurecida reflexão e pesquisa a respeito de temas fundamentais do ser humano e da ampliação que a psicanálise proporcionou. A origem da psicanálise, a partir do método catártico para a associação livre (inclusive com a caracterização da fonte de inspiração para Freud do método de associação livre a partir da obra do escritor Ludwig Borne), a diferenciação entre processo primário-processo secundário e o complexo de Édipo são alguns dos temas freudianos abordados. A seguir apresenta um testemunho clínico: "Por um fio. Considerações sobre a morte em vida", no qual revela a sensibilidade, capacidade de sintonia, presença do psicanalista em entrar em contato com a pessoa que lhe procura e proporcionar a possibilidade de amparo e de elaboração mesmo diante de situações muito precárias. No último capítulo desta parte do livro, a autora comenta sobre o "caso Robin", descrito por Winnicott, e apresenta também como, na sua prática, exerce as possibilidades de atendimento descritas por este autor. Esse capítulo é um exemplo da integração entre teoria e prática quando, de fato, a teoria psicanalítica exerce a sua real função: o psicanalista-leitor, ao tomar contato com a prática e a teoria expostas por um psicanalista-escritor, apreende as circunstâncias que geraram tal postura e tal abstração, de modo que o psicanalista-leitor, ao relacionar-se com sua própria prática, encontre a possibilidade de aplicação do que apreendeu.
Na segunda parte, a autora trata do desenvolvimento emocional. No primeiro capítulo parte da sua experiência da técnica da "observação da relação mãe-bebê", apresentando informações importantes sobre sua origem, aplicações e desdobramentos práticos. No capítulo seguinte, comenta sobre a riqueza e a importância do "brincar" para a criança. A interação entre os profissionais da saúde mental e os pediatras é o tema do capítulo subsequente. E nos dois últimos capítulos desta parte, a autora nos descreve certas sutilezas observadas no desenvolvimento da criança até a adolescência.
Na terceira parte, vamos com a autora ao cinema assistir três filmes, cada um merecedor de um capítulo: Melhor é impossível, de James Brooks; Viver e Sonhos, de Akira Kurosawa. No primeiro capítulo, antes de comentar o filme propriamente dito, a autora tece considerações sobre a relação entre cinema e psicanálise; uma interação que, em nosso meio, tem gerado diversos eventos de divulgação da psicanálise. No filme de James Brooks, a autora se aproxima do contato com o mundo emocional do protagonista Melvin Udall, interpretado por Jack Nicholson, relacionando os sintomas com as experiências emocionais vividas pelo personagem e sua rede de relações, de uma maneira que, em primeiro lugar, gera compreensão e compaixão, sem julgamentos de valor. Nos dois filmes seguintes comentados, do diretor japonês Kurosawa, acontece uma tradução em palavras do que o diretor, em poesia visual, apresenta em seus filmes; o que se correlaciona com o trabalho do psicanalista, de poder colocar em palavras o que o paciente apresenta em cenas e situações. Nesta parte do livro, além do conteúdo dos comentários, percebemos o que podemos chamar de uma metodologia de observação: o observador, ao entrar em contato com o observado (no caso, o filme), tem evocados em sua mente conteúdos emocionais que ampliam o sentido do observado, ampliando as possibilidades narrativas e as dimensões do contato com o fenômeno.
Vale ainda ressaltar outra qualidade presente nos escritos de Vera - a fluidez da escrita e seu poder de concisão. Uma escrita ao mesmo tempo leve e profunda, que não há como não associar ao modo como Winnicott a desenvolveu. Vera demonstra que captou o "seu espírito".
O simpático e belo sorriso que a autora apresenta na foto da contracapa está mais que justificado (sua filha é a fotógrafa!). Vera está de parabéns, e nós, leitores, também felizes de poder desfrutar deste seu trabalho, ficamos aguardando a sua sequência.
Correspondência:
Andreas Zschoerper Linhares
Av. Sete de Setembro, 5388, CJ. 1804
80240-000 Curitiba, PR
Tel.: (41) 3053-0765
azlinhares@uol.com.br