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Psicologia: ciência e profissão

versão impressa ISSN 1414-9893

Psicol. cienc. prof. v.9 n.1 Brasília  1989

 

EDITORIAL

 

 

Um assunto que, inevitavelmente, tem surgido nos encontros, congressos e reuniões de psicólogos, diz respeito à questão da formação profissional, em especial ao problema do currículo dos cursos de Psicologia. Obviamente, o assunto continuará em pauta, principalmente neste ano em que se pretende realizar o I Congresso Nacional de Psicologia.

Vários estudos e pesquisas têm revelado diferentes facetas do problema da formação profissional do Psicólogo. Registre-se inicialmente que, hoje, no Brasil, existem cerca de 81 cursos de Psicologia, dos quais 70% são particulares. Em São Paulo, onde se concentra quase metade dos 61.000 psicólogos brasileiros, a relação é mais contrastante: dos 25 cursos existentes, apenas três são ministrados por escolas públicas. Sem entrar no mérito desses cursos, pode-se perceber que o problema da formação profissional envolve questões muito mais amplas e complexas como a relação ensino público-ensino particular, a Universidade como transmissora e/ou produtora de conhecimentos, a relação de trabalho dos professores determinando seu compromisso com a docência e a pesquisa e muitas outras questões inseridas no contexto da atual política educacional brasileira.

Além disto, deve-se relembrar que o atual Currículo Mínimo dos cursos de Psicologia é o mesmo que foi definido pelo Parecer n° 403, aprovado pelo Conselho Federal de Educação e implantado a partir de 1963. O modelo curricular, reproduzido por todo o País, teve como base, com raras exceções, o projeto curricular pioneiro implantado no curso de Psicologia da Universidade de São Paulo, naquela mesma época.

Em 1982, uma comissão de profissionais, através do CRP-06, realizou uma análise quantitativa do currículo de 16 faculdades de Psicologia. Eis alguns dos principais resultados: a) é um currículo fundamentalmente teórico, em que a formação prática corresponde, em média, a cerca de 11% da carga horária total; b) os conteúdos e práticas são dirigidos fundamentalmente para a formação do psicólogo clínico (25% da carga horária total); c) além da Clínica, apenas duas outras áreas — Educação e Empresa — são contempladas (em média 7% da carga horária total, para cada uma delas); d) os estágios geralmente concentram-se no último ano, sendo que o pouco de organização existente também se dá na área de Clínica; e) na maioria dos cursos há um grande descompasso entre as disciplinas teóricas e os estágios; f) nos cursos particulares (a maioria) praticamente inexiste a atividade de pesquisa.

Têm-se observado, nos últimos anos, tentativas isoladas de superação dos problemas existentes, com alterações curriculares promovidas por grupos de professores e alunos, em alguns cursos. No entanto, não se chegou ainda a uma nova proposta que represente uma alternativa efetiva ao modelo tradicional. Vários problemas têm impedido o desenvolvimento de uma proposta curricular mais eficiente e atualizada. Um deles diz respeito à própria estrutura e funcionamento das Faculdades e Departamentos de Psicologia, onde o poder se concentrou na mão de poucos e, freqüentemente, é exercido de forma autoritária e antidemocrática, impedindo, assim, a realização do contínuo processo de revisão e avaliação do ensino, por parte dos professores e dos alunos, processo este fundamental para o desenvolvimento curricular. Além disto, temos um Conselho Federal de Educação, órgão que deveria fiscalizar o funcionamento dos cursos, comprometido com os interesses privativistas na Educação.

Como se vê, os desafios são imensos e exigirá um esforço redobrado por parte da categoria e das entidades representativas. Neste sentido, a revista PSICOLOGIA-CIÊNCIA E PROFISSÃO não poderia deixar de dedicar uma edição à questão da formação profissional, demonstrando que o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Psicologia têm se preocupado continuamente com a questão. Com isto, pretende-se subsidiar a discussão que deverá ocorrer durante o primeiro semestre de 1989, em todos os Estados, e que culminará com a realização do I Congresso Nacional de Psicologia, de onde deverá surgir uma nova política na área para a atuação da autarquia.