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Construção psicopedagógica
versão impressa ISSN 1415-6954
Constr. psicopedag. vol.24 no.25 São Paulo 2016
Editorial
Mais uma vez, a revista "Construção Psicopedagógica" busca contemplar os leitores com um conteúdo atual e sob múltiplos olhares. Neste volume, mais recheado, traz em sua trama vários temas que conversam entre si. Destaca-se a questão do trabalho psicopedagógico, principalmente na questão da intervenção do profissional nas diferentes dificuldades que os aprendizes possam apresentar, seja por estresse, por transtornos psiquiátricos ou de aprendizagem, seja na leitura e escrita, seja no desenvolvimento de habilidades sociais, emocionais ou integradas num aspecto socioemocional, com uma forte ênfase na mediação do professor na construção da escrita e da autoria, quer pela conscientização de si mesmo, quer pelas narrativas pessoais e de contos de fada.
O enfoque dos autores favorece um exercício de reflexão dinâmico, ora mantendo um olhar amplo sobre as dificuldades de aprendizagem, em contexto escolar e clínico, ora trazendo reflexões numa linha sócio histórica sobre a constituição do sujeito leitor e escritor.
O primeiro artigo O DESENVOLVIMENTO DAS HABILIDADES SOCIOEMOCIONAIS COMO CAMINHO PARA A APRENDIZAGEM E O SUCESSO ESCOLAR DE ALUNOS DA EDUCAÇÃO BÁSICA, escrito por Anita Lilian Zuppo Abed, psicóloga e psicopedagoga, que nos traz a síntese de um estudo que o Conselho Nacional de Educação - CNE (MEC) encomendou à UNESCO sobre a inserção intencional de práticas pedagógicas voltadas ao desenvolvimento de habilidades socioemocionais como caminho para o sucesso escolar na educação básica. Esta pesquisa está servindo como subsídio filosófico e teórico para a elaboração de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento das habilidades socioemocionais nas instituições escolares:
A função da escola vai muito além da transmissão do conhecimento, pois é urgente e necessário fortalecer muitas e variadas competências nas nossas crianças e jovens, que lhe possibilitem construir uma vida produtiva e feliz em uma sociedade marcada pela velocidade das mudanças. Motivação, perseverança, capacidade de trabalhar em equipe e resiliência diante de situações difíceis são algumas das habilidades socioemocionais imprescindíveis na contemporaneidade... E no futuro dos nossos alunos.
O artigo ESTABELECENDO CONEXÕES ENTRE MODELOS DE APRENDIZAGEM: PSICOPEDAGOGIA E COACHING EM RESILIÊNCIA, escrito por Cristina Fonseca Monteiro, Psicóloga (PUC-SP), Psicopedagoga (Instituto Sedes Sapientiae) e Coach em Resiliência SOBRARE - Sociedade Brasileira de Resiliência) , nos traz um estudo entre o estilo adotado no Coaching em Resiliência e a atuação do psicopedagogo, abordando questões referentes ao crer, querer e criar a partir de uma relação saudável com figura de autoridade que conduz à possibilidade de aprender hábitos e comportamentos:
As políticas educativas têm o papel de promover concepções pessoais mais dinâmicas e construtivas, apostando no desenvolvimento pessoal, nos aspectos emocionais e na promoção de relações interpessoais. A exemplo disso, a Psicopedagogia bem como o Coaching em Resiliência (Coaching Cognitivo Comportamental ou CCC) podem auxiliar a fim de conscientizar, por meio de recursos de integração social, organismos públicos e instituições educacionais da importância de lidar bem com o stress. Ambos podem consistir em processos de treinamentos em habilidades sociais, com a presença de uma figura de autoridade que os auxilia a rever comportamentos e ressignificar crenças, atuando no autoconceito e na aprendizagem.
O artigo seguinte NARRATIVAS DE SI EM INTERFACE COM O PROCESO DE CONFECÇÃO DE UMA "COLCHA DE RETALHOS": RELATO DE EXPERIÊNCIA nos traz um relato da experiência realizada pela professora e Doutora Norinês P. Bahia, da Umesp, dentro disciplina "Formação de professores: memórias e identidade", para mestrandos e doutorandos do PPGE - Programa de Pós-Graduação em Educação, da UMESP - Universidade Metodista de São Paulo. Esta disciplina tem como foco analisar e discutir o contexto sócio histórico dos processos de formação de professores e a constituição do ser professor, em interface com as trajetórias formativa e profissional (as narrativas de si) e que culmina na realização de um workshop intitulado "Colcha de Retalhos: nossas memórias, nossas histórias...". Nele os alunos têm a oportunidade de trazer as narrativas de si para a recuperação das trajetórias formativa e profissional:
As histórias narradas e que registram, muito particularmente, os caminhos percorridos pelos diferentes alunos em suas trajetórias, têm revelado uma riqueza de conhecimentos e saberes por eles construídos, e que desvelam as escolhas, os acertos, os erros, os conflitos, as seguranças, as inseguranças, as alegrias e as tristezas.
Acredito que esse envolvimento têm sido fruto da oportunidade de, não só lhes darmos "voz", mas de os "escutarmos" também, naquilo que é considerado como muito precioso: as suas histórias de vida, repletas de muitas e diferentes experiências, permeadas por amadurecimento.
Dando segmento ao foco presente neste número, temos o estudo ASPECTOS EMOCIONAIS DAS DIFICULDADES DE PRODUÇÃO DE TEXTO, escrito por Carolina Zuppo Abed, Graduada em Letras pela Universidade de São Paulo, pós-graduação em Formação de Escritores e em Psicopedagogia Sistêmica. Atua como professora de redação da Escola Santa Marina e do Colégio Agostiniano São José e ministra oficinas de escrita criativa pela Secretaria Municipal de Cultura de Santos/SP. Este artigo visa a discutir as intervenções psicopedagógicas nas dificuldades de produção de textos, com enfoque nas habilidades socioemocionais envolvidas no ato autoral, sugerindo diretrizes para um olhar psicopedagógico dos problemas de produção textual, para além do domínio estritamente linguístico do texto:
Muito mais do que insistir apenas em lapidar estruturas frasais, outras práticas trarão efeitos extremamente benéficos ao autor incipiente. Fazem parte integrante da intervenção psicopedagógica: 1) fornecer modelos saudáveis de relação com todo o processo de produção de texto; 2) fortalecer a autoestima, a resiliência e a persistência e 3) investir a escrita de novas e mais profundas significações. Dessa forma, mais do que ajudar a escrever melhor, desenvolvendo apenas processos cognitivos, o trabalho do psicopedagogo ampliará a forma como o indivíduo se insere e se comunica socialmente.
Ruth Nassif, Pedagoga, Psicopedagoga e Especialista em Neuroaprendizagem e Transtornos de Aprender nos traz o próximo artigo: SUJEITO COMO SINTOMA (TDAH) NA SOCIEDADE, ESCOLA, FAMÍLIA E A PSICOPEDAGOGIA. Este artigo foi elaborado a partir da tese produzida pela autora em 2013 sobre o Transtorno do Déficit de Atenção (TDA) como sintoma, não apenas de manifestações disfuncionais em crianças e adolescentes, para o que a neurociência contribui com os estudos psiconeurofisiológicos, mas, também, como sintoma social que aponta para dissintonias entre desenvolvimento das características subjetivas contemporâneas e as instituições que interagem na sociabilidade dos sujeitos. A partir desse referencial, a autora nos traz várias reflexões:
O TDAH está presente enfaticamente em muitos casos de dificuldade de sociabilidade e de aprendizagem. Escolas e famílias não hesitam em reconhecer suas crianças como portadoras dos transtornos. Atenta-se aqui, também, para as nuances emocionais e psicológicas que condicionam comportamentos de resistência não conscientes dos sujeitos contemporâneos aos regimes ultrapassados a que são submetidos durante a escolaridade e nas famílias, e que têm sido tratados genericamente como déficits de atenção e concentração.
Muitas vezes, as próprias crianças já levam para a anamnese fragmentos de discursos técnicos que justificavam serem portadoras de TDAH. Noutras, os familiares é que revelam, por outros modos, que uma variedade de atitudes das crianças consideradas indesejáveis na escola ou na família são rapidamente encaixadas no rol de características que descrevem o transtorno. Nada raro é o encaminhamento feito por escolas que colocam os tratamentos medicamentosos como condição para manter a criança matriculada. A tendência à patologização de indivíduos com déficit de atenção é um problema, pois há um enorme índice de crianças encaminhadas pelas escolas e diagnosticadas. Os professores têm dificuldade em se apropriar desses problemas. Será que, por vezes, esse tipo de diagnóstico também não contribui para que se instale nos sujeitos e só neles os problemas adaptativos que, oriundos da sociedade pós-moderna, afetam a todos?
O próximo artigo DESENVOLVENDO HABILIDADES SOCIAIS NA ESCOLA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA escrito por Fabiana Ribas Ferreira, Maria Aparecida Gomes de Carvalho e Cleiton José Senem (Universidade Sagrado Coração, Bauru-SP. O presente trabalho é um relato de experiência desenvolvido na área de psicologia escolar educacional, realizado em uma escola pública do interior de São Paulo. Seu objetivo é apresentar as experiências e ações desenvolvidas por meio de um projeto de intervenção cuja finalidade foi desenvolver habilidades sociais, com 30 alunos do 6º ano do ensino fundamental e seus professores, verificando-se que o desenvolvimento desse projeto possibilitou reflexões e mudanças de comportamento por parte dos participantes.
(...) O psicólogo escolar educacional exerce um trabalho interdisciplinar com ênfase nas relações interpessoais, abrindo espaço para o desenvolvimento de ações junto à comunidade escolar e educacional, permitindo diálogos para que se possa discutir e compartilhar problemas, buscando soluções, estabelecendo, dessa forma, novas maneiras de compreender o aluno, evitando rótulos ou estereótipos (MEDEIROS & AQUINO, 2011).
(...) Essas dificuldades ocorrem, geralmente, devido a um repertório de habilidades sociais pobre, principalmente em termos de empatia, expressão de sentimentos e resolução de problemas (MAIA & LOBO, 2013). Para se tornar socialmente competente, o indivíduo precisa saber fazer, querer fazer, e ser capaz de fazer, ou seja, buscar soluções para conflitos, acreditar em suas ações e ter autocontrole para lidar com suas emoções. Segundo Maia & Lobo (2013), estes três aspectos são considerados essenciais para uma convivência satisfatória.
Gabrielli Teresa Gadens Marcon, Helena Venites Sardagnae Dolores Schussler, da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, nos trazem o artigo O questionário SNAP-IV como auxiliar psicopedagÓGICO no diagnóstico PRELIMINAR do Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Trata-se de umtrabalho de revisão bibliográfica com a função de ampliar o conhecimento sobre o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). A reflexão nos traz ferramentas diagnósticas que permitam aos profissionais da educação realizar um pré-diagnóstico da possível presença desse transtorno em crianças ou jovens inseridos no contexto escolar o mais precoce possível, resultando numa intervenção clínica e psicopedagógica mais efetiva:
TDAH é um transtorno cujo diagnóstico apresenta dificuldades relativas, tanto em relação aos sintomas, os quais podem estar associados ou confundirem-se com uma série de comorbidades, quanto ao contexto no qual tais sintomas se manifestam, geralmente no núcleo familiar ou escolar, sendo, portanto, difícil obter uma avaliação precisa do mesmo apenas em visitas ao consultório, onde o problema tende a ficar latente.
Assim sendo, a utilização do questionário SNAP-IV constitui-se numa excelente ferramenta auxiliar ao diagnóstico de TDAH, sendo de extrema importância que os psicopedagogos a conheçam e utilizem, prestando informação e orientação aos pais e professores sobre a correta utilização do questionário. Além disso, cabe ao psicopedagogo acompanhar a forma como são conduzidas as observações realizadas por pais e professores, a fim de que estes consigam alocar corretamente os sintomas em acordo com a escala de quatro níveis de gravidade, constante no questionário.
A pedagoga Vera Márcia Martens, especialista em Ensino e Aprendizagem e Coordenadora da área de Português do Instituto TCP nos traz o artigo NIVELAMENTO DE HABILIDADES DE LEITURA E ESCRITA: UM FAZER PEDAGÓGICO NAS ESCOLAS PÚBLICAS DE ENSINO INTEGRAL FRENTE AO FRACASSO ESCOLAR. Nele, a autora expõe a importância das aulas do Processo de Nivelamento, pois elas estão diretamente ligadas ao Projeto de Vida dos alunos, com o objetivo de possibilitar que os alunos sejam protagonistas de sua formação. Muitos projetos de vida dependem de um adequado rendimento acadêmico, portanto é importantíssimo que todos os alunos possuam as habilidades e competências necessárias para acompanhar sem dificuldades o conteúdo lecionado na série em que estão matriculados:
As aulas de Nivelamento fazem parte da grade de horário, são ministradas pelos professores de sala de aula e resumem o que sempre se esperou da escola: ela chamando para si a responsabilidade de fazer a sua parte no enfrentamento desse problema, abrindo espaços internos e não apenas repassando "os problemas" para especialistas de fora.
Silvia Lorenzoni Perim Seabra e Claudia Broetto Rossetti, da Universidade Federal do Espírito Santo nos trazem o artigo ASPECTOS COGNITIVOS E MORAIS DO DESENVOLVIMENTO INFANTIL: INVESTIGAÇÃO POR MEIO DE UM CONTO DE FADAS EM VERSÃO MULTIMÍDIA. Com o objetivo de estudar aspectos do desenvolvimento cognitivo e moral de crianças por meio do conto de fadas "João e Maria" em versão multimídia, o presente artigo teve como participantes 24 meninos e meninas de 6, 7, 10 e 11 anos de idade que após terem acesso ao conto de fadas, foram solicitados a reconstituir o conto e responderam a uma entrevista baseada no método clínico piagetiano:
A presente pesquisa encontrou referências nas classificações propostas por Souza (1990) tendo como propósito estudar a reconstituição de um conto de fadas por crianças, e os resultados revelaram que todos os participantes, independentemente da idade foram capazes de reconstituir o conto. Entretanto, é possível verificar que a estruturação da reconstituição apresenta diferenças, indicando um nível de desenvolvimento psicológico característico em cada idade, como por exemplo maior estruturação do pensamento das crianças mais velhas, em contraponto com uma estruturação mais simples das mais jovens, revelada pela reconstituição verbal do conto de fadas, indicando uma evolução ao longo das idades e confirmando a ideia de gênese de Piaget.
O artigo INVESTIGAÇÃO SOBRE ESTRESSE EM CRIANÇAS COM DIFICULDADE DE APRENDIZAGEMproduzido por Lívia Caroline Souza Gonçalves, Cláudia Patrocínio Pedroza Canal e Daniela Dadalto Ambrozine Missawa, da Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, ES, Brasil. O estudo objetivou investigar a manifestação de sintomas do estresse infantil em crianças com dificuldades de aprendizagem e como esse estresse é percebido por essas crianças. Foi aplicado um roteiro de entrevista para avaliação de estresse na criança em 06 escolares com dificuldade de aprendizagem e sem diagnóstico clínico de qualquer transtorno em uma escola pública da cidade de Vila Velha - ES.
Quando o estresse é vivenciado de forma intensa ou prolongada, pode trazer consequências psicológicas que prejudicam a saúde da criança, como: depressão, dificuldades de relacionamento, comportamento agressivo, ansiedade, choro excessivo, gagueira, dificuldades escolares, pesadelos, irritabilidade e insônia. As consequências também podem ser físicas, como: doenças dermatológicas, dores de cabeça e asma (LIPP, et al., 1991).
Dessa forma, o estresse, sobretudo na infância, pode ocasionar prejuízos para o desenvolvimento do sujeito, seu aprendizado e interações sociais. Preocupamo-nos aqui investigar este estresse na vida escolar, considerando que durante o desenvolvimento infantil é comum que na fase de escolarização as crianças possam vivenciar algum estresse emocional, principalmente devido às adaptações que se tornam necessárias para a obtenção de objetivos em comum (LIPP et al., 1991), como execução de tarefas e obtenção de resultados de acordo com o que a escola determina para as avaliações escolares.
E por último, temos a resenha elaborada por Rose Skripka N. Gabriel, trazendo para o nosso conhecimento o livro PSICOPEDAGOGIA: TEORIAS DA APRENDIZAGEM, de BARONE, Leda Maria Codeço, CASTANHO, Marisa Irene Siqueira, MARTINS, Lilian Cassia Bacich (Orgs). São Paulo: Casa do Psicólogo, 2013, 255 pags.
Assim como a ciência e a pesquisa têm a característica de não aceitar o que é limitante, mas questionam, discutem, trazem reflexões e soluções, este livro nos instiga à continuidade da busca pela crítica, à saída das visões restringentes. No final de cada capítulo há sugestões de leituras auxiliares, questões para reflexão, exercícios em grupo e filmes de conteúdo relacionado com as teorias tratadas.
Desta forma, a Revista Construção Psicopedagógica convida você leitor para refletir sobre as diferentes possibilidades do trabalho psicopedagógico nos seus diversos aspectos (emocionais, socioemocionais, neurológicos, linguísticos...) bem como a sua interface com outros campos: educação, linguagem, psicologia, sociologia, entre outras. Além da sua companhia, esperamos também a sua contribuição para a próxima revista. Ela é muito importante para nós!
Marlene Coelho Alexandroff
Editora Científica