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Psicologia: teoria e prática

versão impressa ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. v.8 n.2 São Paulo dez. 2006

 

ARTIGOS

 

Avaliando linguagem receptiva via teste de vocabulário por imagens peabody: versão tradicional versus computadorizada1

 

Evaluando lenguaje receptiva via test de vocabulario por imagenes peabody: version tradicional versus computadorizada2

 

Evaluating receptive language by peabody picture vocabulary test: computerized versus traditional versions

 

 

Elizeu Coutinho de MacedoI; Fernando César CapovillaII; Marcelo DuduchiIII; Maria Eloísa Famá D'AntinoI; Lyzandre dos Santos FirmoI

I Universidade Presbiteriana Mackenzie
II Universidade de São Paulo
III Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Instrumentos padronizados de avaliação da linguagem permitem detecção precoce de atraso de linguagem e intervenção precoce para prevenir fracasso escolar. Este estudo comparou o desempenho de pré-escolares nas versões tradicional e computadorizada do Teste de Vocabulário por Imagens Peabody, correlacionou as pontuações nessas versões e descreveu a evolução do vocabulário receptivo em função de idade e série escolar. Noventa crianças de 4 a 6 anos de idade do ensino infantil de uma escola particular da cidade de São Paulo foram avaliadas nas duas versões. Anovas Unifatoriais revelaram crescimento significativo da pontuação nas duas versões como função da idade. Houve também correlação positiva significativa entre as versões. Tais resultados sugerem a validade da versão computadorizada do Teste de Vocabulário por Imagens Peabody para detecção precoce de dificuldades de aprendizagem resultantes de vocabulário receptivo pobre.

Palavras-chave: Linguagem, Compreensão, Teste Peabody, Neuropsicologia.


RESUMEN

Instrumentos padronizados de evaluación de lenguaje permiten detección precoz de atraso de lenguaje e intervención precoz para prevenir fracaso escolar. Este estudio comparó el desempeño de pre-escolares en las versiones tradicional y computadorizada del Test de Vocabulario por Imágenes Peabody ,correlacionó las puntuaçiones en esas versiones y describió la evolución del vocabulario receptivo en función de edad y serie escolar. Noventa niños de 4 a 6 anos de edad de la Enseñanza Infantil de una escuela particular de la ciudade de São Paulo fueron evaluados en las dos versiones. Anovas Unifactoriales revelaron crecimento significativo de la puntuación en las dos versiones como función de la edad. Hubo también como correlación positiva significativa entre las versiones. Tales resultados sugieren la validad de la versión computadorizada del Test de Vocabulario por Imágenes Peabody para detección precoz de dificultades de aprendizaje resultantes de vocabulario receptivo pobre.

Palabras clave: Lenguaje, Comprensión, Test Peabody, Neuropsicología.


ABSTRACT

Standardized language tests permit early detection of language delay, and early intervention aimed at preventing school failure. The present study compared preschooler’s performance under two Peabody Picture Vocabulary Test versions (traditional versuscomputerized ones). It assessed the correlation between them and described the evolution of receptive vocabulary as function of age and preschool level. Ninety preschoolers from 4 to 6 years of age of a private São Paulo city school were subjected to the two test versions. Unifatorial ANOVAs revealed significant increase of test scores as a function of age for both versions. In addition, a significant positive correlation was found between scores from both versions. Such results suggests that the computerized Peabody Picture Vocabulary Test may be valid for early detection of learning problems related to poor receptive vocabulary.

Keywords: Language, Comprehension, Token Test, Neuropsychology.


 

 

Introdução

A linguagem pode ser avaliada sob diversas habilidades (fonologia, sintaxe, semântica e pragmática) e essa observação do uso funcional que a criança faz da linguagem orientará o clínico no emprego de provas diagnósticas adicionais e, muitas vezes, ditará o tipo de testagem a ser feito (LEONARD, 1982).

Com a finalidade de testar habilidades da linguagem, foram desenvolvidos diversos testes e medidas formais. Dentre tais testes destacam-se o Teste Token for Children (DI SIMONI, 1978), que examina a capacidade da criança em seguir instruções faladas de comprimento e complexidade lingüística crescentes, e o Teste de Vocabulário por Imagens Peabody – Revised (DUNN; DUNN, 1981), que avalia as habilidades receptivas de compreensão de palavras.

A avaliação da linguagem poderá fornecer uma descrição de como a criança utiliza a linguagem, a história do caso, a comparação do desempenho da criança com o grupo controle, além de contribuir para um entendimento claro do problema de linguagem apresentado (LEZAK, 2004).

Nos últimos anos, versões computadorizadas de testes foram criadas com o intuito de avaliar a linguagem, abrangendo todo o seu desenvolvimento lexical, as habilidades de leitura, o nível de consciência fonológica, a prontidão e a maturidade para a leitura, a compreensão auditiva, os raciocínios categorial e seqüencial. Essas versões são de grande importância para a avaliação neuropsicológica e ampliam as fronteiras da psicometria, permitindo abarcar populações especiais como as de paralisados cerebrais, disléxicos, afásicos, surdos, portadores de distrofia muscular progressiva e esclerose múltipla, dentre outras (CAPOVILLA et al., 1997).

Dentre os testes psicométricos padrão, foram computadorizados por Capovilla, Capovilla, Macedo e Duduchi (2000) os seguintes: 1) Teste de Vocabulário por Imagens Peabody; 2) Teste de Maturidade para Leitura; 3) Teste de Prontidão para Leitura; 4) Reversal Test; 5) Teste Token para adultos e para crianças; 6) Test Boston para Diagnóstico Diferencial das Afasias; 7) Teste de Boston de Nomeação; 8) Subtestes de arranjo de figuras do WISC e o WISC III-R; 9) WAIS; 10) Escala de Maturidade Mental Colúmbia.

Essas versões computadorizadas usam voz digitalizada para administrar as instruções, aplicam critérios de término de testagem e calculam resultados finais automaticamente. Podem ser operadas pelos avaliados, diretamente, via telas sensíveis ao toque e por mouse e, indiretamente, por varredura automática e seleção via dispositivos sensíveis a sopro, gemido, movimentos e piscar. Introduzindo um atraso customizável no input da tela sensível ao toque, pode controlar erros de acionamentos produzidos por ataxias e, também, ajustar parâmetros temporais de varredura para avaliar examinandos com maiores comprometimentos motores. Possibilitam avaliar capacidades de comprometimento motor, obter resultados em parâmetros comparáveis àqueles empregados na clínica e no sistema escolar regular, além de avaliar pessoas, até então, não testáveis devido a distúrbios motores e/ou da fala, possibilitando calibrar os procedimentos de ensino (CAPOVILLA; THIER; MACEDO, 2002).

Segundo Thiers, Capovilla, Charin, Duduchi e Macedo (2000), as versões computadorizadas dos sistemas de avaliação permitem o acompanhamento psicopedagógico de crianças com severos distúrbios motores e de fala, ao considerar as necessidades especiais e recursos potenciais de crianças que, até então, devido aos seus problemas de ordem motora, não podiam ser adequadamente avaliadas por meio de testes psicométricos em suas formas tradicionais. A seguir, são descritos, de forma detalhada, os dois testes para avaliação de vocabulário receptivo usado no presente trabalho.

O Teste de Vocabulário por Imagens Peabody (TVIP) teve a sua versão original em inglês (DUNN, 1959), foi revisado pelo mesmo autor em 1981 e adaptado a outras línguas, como o espanhol (DUNN et al., 1986). O objetivo do teste de vocabulário por imagens é avaliar a linguagem receptiva-auditiva de crianças a partir de 2 anos e 6 meses de idade até os 18 anos. O teste é composto de um caderno com 144 itens, com quatro figuras em cada página e o sujeito deve identificar a figura correspondente àquela indicada pelo orientador. Os itens são apresentados em ordem crescente de dificuldade, com conceitos de palavras concretas e de palavras abstratas intercaladas. A tarefa do sujeito consiste simplesmente em selecionar, dentre as quatro alternativas, a figura que melhor representa a palavra falada pelo examinador. O teste demanda de 10 a 15 minutos administrados individualmente e é pouco recomendado para crianças com perda auditiva ou visual acentuada.

O teste é indicado para avaliar o vocabulário receptivo em pré-escolares, bem como em crianças ou adultos que não lêem, não escrevem e mesmo nos que não falam. Segundo Capovilla et al. (1997), o teste pode, também, ser empregado como prova de aproveitamento escolar ou de inteligência verbal, sendo ideal em estudos longitudinais para avaliar o efeito de diversas variáveis sobre o desenvolvimento do vocabulário durante períodos extensos de tempo.

Capovilla et al. (1997) avaliaram o desempenho de 687 crianças de pré 3 a 8ª série (6- 14 anos) em uma escola pública do Rio de Janeiro. Foram conduzidas aplicações coletivas em sala de aula, objetivando adaptar o teste ao contexto escolar e derivar normas para aplicação coletiva. Análises estatísticas indicaram sensibilidade do teste em discriminar entre níveis sucessivos de idade e de escolaridade.

Capovilla et al. (1997) examinaram a validade concorrente do TVIP, comparando a pontuação simples com o desempenho escolar em sala de aula; para as crianças de 2ª a 8ª série foram avaliados os boletins de língua portuguesa e para as de pré 3 e 1ª série foram examinadas as fichas de avaliação da professora cobrindo escrita, leitura, fala e desempenho geral. No pré 3, foram obtidas correlações positivas com fluência da fala e desempenhos total e médio na aula. Assim, aquele estudo validou o TVIP, por comparação com o desempenho escolar de leitura, escrita, comunicação oral e língua portuguesa.

Capovilla, Thiers e Macedo (2002) conduziram o primeiro estudo com pré-escolares brasileiros de uma escola particular usando a versão computadorizada do TVIP e correlacionando com o desempenho nos seguintes testes: Escala de Maturidade Mental Colúmbia, Teste de Figuras Invertidas, Teste de Maturidade para Leitura, Teste de Prontidão de Leitura e o Teste Token. Os resultados revelaram que os testes computadorizados discriminaram entre as sucessivas séries pré-escolares da mesma forma que as versões tradicionais, em uma população de pré-escolares com desenvolvimento normal. Além disso, os autores encontraram correlações altas entre as versões tradicional e computadorizada. No entanto, não foram derivadas fórmulas de correspondência de pontuação entre as duas versões.

A presente pesquisa tem por finalidade avaliar a linguagem receptiva em crianças pré-escolares por meio do TVIP computadorizado, comparar as pontuações dos pré-escolares nas versões tradicional e computadorizada do teste, e derivar fórmulas para estimar a pontuação na versão tradicional a partir da aplicação da computadorizada.

 

Método

Participantes

Foram avaliadas 90 crianças das três séries do ensino infantil de uma escola particular do município de São Paulo com idade variando de 4 a 6 anos. A amostra foi composta de: 30 crianças do infantil I (15 meninos e 15 meninas) com idade média de 4 anos; 30 do infantil II (17 meninos e 13 meninas) com idade média de 5 anos e 30 do infantil III (18 meninos e 12 meninas) com idade média de 6 anos.

Material

Foi usada a versão tradicional e computadorizada do TVIP (MACEDO; CAPOVILLA; CHARIN; DUDUCHI, 1998). A versão computadorizada do TVIP foi produzida a partir da adaptação hispano-americana desenvolvida por Dunn et al. (1986). Esta versão apresenta na tela do computador quatro figuras dispostas da mesma forma que na versão tradicional. As mensagens solicitando que a criança escolha uma das figuras são emitidas a partir de arquivos de sons digitalizados e salvos no formato WAV. Além disso, o programa pode ser modificado para ser usado com periférico de input que registre a resposta de examinandos com diversas e severas deficiências motoras. Entre tais periféricos destacam- se: tela sensível ao toque e mouse comum dotado de pequena alavanca adaptada a um de seus botões ou acionamento ocular (BAPTISTA et al., 2006).

Essa versão computadorizada possui um módulo de varredura que ilumina seqüencialmente cada uma das figuras da tela, o que permite avaliar a linguagem receptiva de pessoas com severos impedimentos motores e incapacitadas de apontar ou manipular objetos. Outra vantagem da versão computadorizada do teste em relação à versão tradicional é a de registrar todas as respostas do avaliando, bem como o tempo consumido em responder. Além disso, essa versão pode ser configurada rapidamente para apresentar os comandos verbais, escritos ou, ainda, em diferentes línguas.

A versão computadorizada foi aplicada por meio de computadores ligados em rede, equipados com Windows XP e monitores de 17 polegadas. Todos os computadores dispunham de acesso à internet e recursos de multimídia. Cada criança tinha a sua disposição fone de ouvido, de modo que só ela ouvia a mensagem solicitada, não ouvindo as mensagens das demais crianças.

 

Procedimento

Foi encaminhado o termo de consentimento livre e esclarecido aos pais que seriam avaliadas apenas as crianças devidamente autorizadas. Foram realizadas duas sessões de aplicação, separadas por uma semana. Na primeira avaliação, a primeira metade das crianças foi submetida à versão tradicional, e a segunda metade, à versão computadorizada. Na segunda avaliação, uma semana depois, a primeira metade foi submetida à versão computadorizada, e a segunda metade, à tradicional.

As avaliações com a versão tradicional foram feitas individualmente em uma sala de aula disponível. Todas as avaliações foram conduzidas pelo mesmo avaliador. Nessa avaliação, o avaliador cuidou para manter constantes, durante as instruções, a intensidade, o timbre, o sotaque e a entonação da voz. A versão computadorizada foi aplicada coletivamente no laboratório de informática do ensino fundamental. Esse laboratório dispunha de 50 computadores, e as crianças sentavam-se lado a lado, mas sem qualquer possibilidade de inspecionar o que a vizinha estava fazendo. As instruções foram dadas coletivamente. Depois das instruções, as professoras colocavam os fones de ouvido em cada uma das crianças, dando início à avaliação. Caso a criança necessitasse de alguma ajuda, ela levantava o braço até que uma das professoras pudesse atendê-la.

Ao término do teste, era disponibilizado o acesso a jogos computadorizados da própria escola a fim de que aquelas que terminassem antes não interferissem no desempenho das demais. Quando todas as crianças terminavam, o examinador salvava os arquivos com os resultados e os transferia para disquetes para proceder às análises.

 

Resultados

Foram conduzidas análises de variância a fim de comparar o desempenho nas versões tradicional e computadorizada. Análise dos resultados, a partir do Teste t de medidas pareadas, revelou que, em média, as crianças acertaram 13 itens a mais na versão tradicional do que na computadorizada (t = 11,331; p = 0,000) e que levaram em média 6 minutos a menos na versão computadorizada (t = 4,926; p = 0,000).

Análise de variância (ANOVA) do efeito da idade sobre o escore no teste TVIP indicou efeito significativo para a versão tradicional (F[2,89] = 24,878; p = 0,000) e computadorizada (F[2,89] = 11,890; p = 0,000). Análises de comparação por pares Fisher LSD revelaram que crianças de 6 anos acertaram mais do que as demais nas duas versões, e as de 5 anos acertaram mais do que as de 4 anos na versão tradicional. A Figura 1 ilustra o efeito da idade sobre a pontuação obtida nas versões tradicional e computadorizada.

 

 

Figura 1. Escore obtido no TVIP na versão tradicional (TVIP-Trad) e computadorizada (TVIP-Comp) em função da idade.

 

Embora tenha sido observada discrepância na pontuação entre as duas versões, a análise de regressão do escore na versão tradicional em relação à versão computadorizada revelou correlação positiva (r = 0,646; r2 = 0,418) significativa entre os desempenhos nas duas versões (F[1,89] = 63,187; p = 0,000). A Figura 2 representa o correlograma, com reta de regressão e intervalo de confiança, entre os desempenhos nas versões tradicional e computadorizada do TVIP.

 

 

Figura 2. Correlograma, com reta de regressão e intervalo de confiança, entre o escore obtido no TVIP versão computadorizada (TVIP-Comp) e na tradicional (TVIP-Trad).

 

A equação de regressão que permite estimar o valor da pontuação na versão tradicional a partir da computadorizada pode ser assim descrita: TVIP_Trad = 45,202 + 0,524*TVIP_Comp, em que: TVIP_Trad é o valor do escore estimado na versão tradicional e TVIP_Comp é o valor do escore obtido na versão computadorizada. Desta forma, uma criança que acertasse 50 itens na versão computadorizada poderia ser comparada com uma que acertasse 69 itens (45,202 + 0,524X50) na versão tradicional.

Análise de variância (ANOVA) do efeito da idade sobre o tempo para realização do teste TVIP revelou efeito significativo para a versão tradicional (F[2,89] = 4,868; p = 0,010), mas não a computadorizada. Análises de comparação por pares Fisher LSD mostraram que crianças com 6 anos foram mais rápidas do que as com 4 anos, e não houve diferença entre as crianças com 5 anos e as demais. A Figura 3 ilustra o efeito da idade sobre o tempo para a realização do TVIP nas versões tradicional e computadorizada.

 

 

Figura 3. Tempo médio em segundos para a realização do Teste de Vocabulário por Imagens Peabody nas versões tradicional (TVIP-Trad) e computadorizada (TVIP-Comp) em função da idade.

 

Análise de variância a partir do Teste t para medidas independentes não revelou efeito de sexo para tempo e pontuação dos testes TVIP nas versões tradicional e computadorizada. Não foi observado efeito da ordem de aplicação dos testes sobre o tempo de execução ou dos escores obtidos nas duas versões. Assim, a realização da primeira avaliação não influenciou o desempenho da segunda avaliação.

Análise de freqüência de acertos na versão computadorizada indica alta similaridade com as da versão tradicional. Os itens mais difíceis foram: ler, canguru, elipse, fragmento, ascender, jubilosa e perpendicular.

 

Discussão

Não foram encontradas diferenças significativas entre meninos e meninas para nenhuma das duas versões. Embora as meninas acertassem mais do que os meninos, não foram observadas diferenças significativas. Vários estudos vêm tentando distinguir as performances entre os gêneros, incluindo as habilidades lingüísticas. Hedges e Nowel (1995), por exemplo, analisaram seis diferentes estudos conduzidos nos Estados Unidos ao longo dos últimos 34 anos. Os autores constataram que, apesar de as mulheres terem mantido respostas mais consistentes do que os homens ao longo dos anos, a diferença entre a maioria das habilidades testadas não foi significativa. Exceções foram observadas nas provas de compreensão escrita, velocidade perceptual e memória associativa. Nessas foi constatado melhor desempenho das mulheres. No entanto, Kimura e Harshiman (1984) relatam que as mulheres tendem a se sair melhor do que os homens em provas que avaliaram a velocidade perceptual, fluência verbal, coordenação motora e aritmética mental. É possível que a ausência de efeito de sexo nos testes esteja relacionada com o fato de terem sido avaliados apenas o vocabulário receptivo e a compreensão verbal. Assim sendo, a aplicação de outras provas poderia ter produzido maior poder discriminativo entre os sexos.

A pontuação na versão informatizada foi inferior à obtida na versão tradicional. Tais resultados estão de acordo com aquele encontrado em outros estudos comparativos entre versões tradicionais e computadorizadas. Macedo et al. (no prelo) indicam que essas discrepâncias podem ser explicadas por fatores como: 1) a complexidade da resposta, que é maior na versão computadorizada; 2) a qualidade acústica das instruções, que é menor na versão computadorizada; 3) a restrição à modalidade auditiva para acesso às instruções, com ausência de acesso à leitura orofacial na versão computadorizada; 4) a proximidade do avaliador, que é menor na versão computadorizada; 5) a ausência de pistas indiretas sugestivas de desempenho oferecidas pelo avaliador, que ocorre na versão computadorizada.

Além disso, como apontam Baptista, Mercadante, Macedo e Schwartzman (2006), como as versões computadorizadas requerem do avaliando o manejo de dispositivos de acionamento como mouses para poder responder, essas versões acabam demandando funções práxicas mais complexas que o simples apontar. Embora a qualidade de digitalização da voz tenha melhorado de forma marcante nos últimos anos, possibilitando a criação de arquivos com grande definição e alta taxa de compressão, essa qualidade ainda é inferior à da voz humana ao vivo. Além disso, como a mensagem digitalizada é apresentada automaticamente, o avaliando pode não prestar atenção ao início da mensagem, o que resulta na perda de informação. Nesses casos, a criança terá de usar processos inferenciais mais sofisticados para tentar reconstruir o significado de uma mensagem que foi parcialmente processada, ou seja, processamento do tipo top-down como proposto pelo modelo interativo (EYSENCK; KEANE, 1994). A condução de novos estudos em que a criança possa solicitar a repetição da apresentação da mensagem ouvida pode lançar luz sobre as dificuldades encontradas no processamento de informações apresentadas pelo computador.

Além da qualidade do som, as mensagens gravadas apresentadas ao computador privam o avaliando de acesso a informações contextuais, como aquelas advindas da leitura orofacial. Nesse caso, o desempenho poderia ser melhor se, em vez da exibição de uma mensagem gravada, fosse disponibilizado um vídeo em que aparecesse a imagem do instrutor. A elevada importância da leitura orofacial foi demonstrada por McGurk e MacDonald (1976). Esses autores prepararam um vídeo de alguém repetindo “ba” várias vezes, mas mudaram o canal do som de tal maneira que havia uma voz dizendo “ga” repetidamente em sincronia com o movimento dos lábios. Diante dessa discrepância entre input visual e auditivo, os avaliandos relataram ouvir “da” em vez de “ga” ou “ba”, o que representa quase que literalmente uma fusão da informação visual e auditiva. Esse estudo mostra o caráter interativo das várias informações visuais e auditivas na percepção da fala.

Quando a apresentação das instruções e a coleta das respostas são feitas pelo computador e não pelo avaliador, obtém-se uma maior padronização das condições de aplicação, o que contribui para a maior estabilidade dos achados. Além disso, obtém-se, também, a possibilidade de aferição automática dos resultados, o que contribui substancialmente para reduzir os custos. Ainda assim, esse modo computadorizado de avaliação acaba impondo uma maior distância entre o avaliando e o avaliador, o que possibilita dar um tom mais impessoal e eventualmente frio ao processo de avaliação. Isso pode reduzir o envolvimento de ego na tarefa por parte do avaliando (CAPOVILLA et al., 1996). Além disso, esse maior distanciamento pode inibir a iniciativa da criança de fazer perguntas para aumentar sua compreensão da tarefa. Por fim, essa relativa impessoalidade pode prejudicar diferencialmente crianças para quem a relação pessoal é mais importante.

Embora o desempenho nas versões computadorizadas tenha sido inferior ao da tradicional, foram observadas correlações positivas entre as duas formas de aplicação. Assim, crianças com bom desempenho na versão tradicional estão inclinadas a repetir o mesmo resultado na versão computadorizada. Além disso, a versão computadorizada demandou menos tempo de aplicação, tabulação de dados e aferição de resultados. Como descrito acima, a inclusão da possibilidade de repetição da mensagem emitida pode fazer com que o desempenho na versão computadorizada seja ainda mais parecido com o da versão tradicional.

 

Referências

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Endereço para correspondência
Contato
Elizeu Coutinho de Macedo
Rua da Consolação, 896, Prédio Amantino Vassão, sala 62 – Consolação
São Paulo – SP
CEP 01302-907
e-mail: elizeumacedo@uol.com.br

Tramitação
Recebido em junho de 2006
Aceito em setembro de 2006

 

 

1 Apoio: MackPesquisa, CNPq, Capes.
2
Apoio: MackPesquisa, CNPq, Capes.