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Psicologia: teoria e prática

versão impressa ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. vol.17 no.3 São Paulo dez. 2015

 

AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA

Validade de construto da Escala de Amor Apaixonado

 

Construct validity of Passionate Love Scale

 

Validez de constructo de la Escala de Amor Apasionado

 

 

José Augusto Evangelho HernandezI
I Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro – RJ – Brasil

Endereço para correspondência

 

 


Resumo

Na nossa cultura, o amor apaixonado é de grande importância, portanto a diminuição ou ausência desse sentimento poderá levar ao distanciamento entre os membros do casal de amantes e até ao término da relação amorosa. Esta investigação buscou evidências de validade de construto para a Escala de Amor Apaixonado. Foram examinadas as respostas de 578 participantes de ambos os sexos por meio de Análise Fatorial Exploratória. Os resultados revelaram que o instrumento adaptado para o idioma brasileiro possui um único fator, que explicou 64,2% da variância comum. Essa medida do amor apresentou excelente consistência interna e correlações de moderadas a fortes com a Escala Triangular do Amor-R e suas subescalas. Neste estudo, foram geradas algumas evidências de validade fatorial, validade convergente e fidedignidade para a versão brasileira da Escala de Amor Apaixonado.

Palavras-chave: psicologia do amor; amor apaixonado; relacionamentos íntimos; validade de construto; fidedignidade.


Abstract

In our culture, is passionate love of great importance, therefore, a reduction or absence of that feeling, can lead to estrangement between members of a couple of lovers until the end of a relationship. This research sought evidence of construct validity for the Passionate Love Scale. The responses of 578 participants of both sexes were examined through Exploratory Factor Analysis. The results revealed that the instrument adapted for the Brazilian language has a single factor, which explained 64.2% of the common variance. This measure showed excellent internal consistency and correlations with the Triangular Love Scale-R and its subscales, which ranged from moderate to strong. In this study some evidence of factorial validity, internal consistency and convergent validity for the Brazilian version of Passionate Love Scale were generated.

Keywords: psychology of love; passionate love; close relationships; construct validity; reliability.


Resumen

En nuestra cultura, es el amor apasionado de gran importancia, por lo tanto, una reducción o ausencia de ese sentimiento, puede conducir a la alienación entre los miembros de una pareja de enamorados hasta el final de una relación. Esta investigación buscó evidencia de validez de constructo de la Escala de Amor Apasionado. Las respuestas de 578 participantes de ambos sexos fueron examinados mediante Análisis Factorial Exploratorio. Los resultados mostraron que el instrumento adaptado a la lengua brasileña tiene sólo un factor que explicó 64,2% de la varianza común. Esta medida mostró una excelente consistencia interna y correlaciones con la Escala de Amor Triangular- R y sus subescalas, que varió de moderado a fuerte. En este estudio, algunas evidencias de validez factorial, índices de consistencia y validez convergente internos se obtuvieron para la versión brasileña da Escala de Amor Apasionado.

Palabras clave: psicología del amor; amor apasionado; relaciones íntimas; validez de constructo; fiabilidad.


 

 

Nas primeiras abordagens sobre as relações amorosas, estavam presentes, principalmente, dois tipos de amor, o companheiro e o apaixonado. O primeiro, mais ligado aos sentimentos de apego, compromisso, confiança e intimidade, e com uma carga amena de emoções. O segundo, mais ao desejo sexual, à excitação e a uma forte carga emocional. Ambos oscilam ao longo do tempo de duração de uma relação amorosa. No geral, a paixão relatada por recém-casados é intensa e tende, gradativamente, a diminuir no decorrer do relacionamento. Contudo, há estudos que indicam que a paixão pode reaparecer em casais mais velhos e ser comparada àquela sentida no início dos relacionamentos (Hatfield, Pillemer, O’Brien, & Le, 2008).

Ainda não criaram uma medida para o amor companheiro, mas Hatfield e Sprecher (1986) construíram a Escala de Amor Apaixonado (EAA), considerada uma das medidas mais populares (Graham, 2011; Graham & Christiansen, 2009; Hatfield, Bensman, & Rapson, 2012). As pesquisadoras selecionaram um grupo de itens que representam adequadamente o amor apaixonado. Para isso, foram examinados trabalhos que especulavam sobre o construto e escalas designadas para medir amor e outros tipos de atração interpessoal. Por meio de entrevistas com crianças, adolescentes, recém-casados e casais idosos, obtiveram-se informações adicionais sobre quais dimensões constituem o amor apaixonado. Todas essas fontes sugeriram que esse amor é mais bem identificado como um intenso desejo de união com outra pessoa e pode se manifestar por meio de cognições, emoções e comportamentos (Hatfield & Sprecher, 1986).

No primeiro estágio do trabalho, Hatfield e Sprecher (1986) reuniram 165 itens que foram testados com 136 adolescentes de ambos os sexos da Universidade de Wisconsin. Os critérios que decidiram quais os itens seriam retidos foram: os que obtiveram médias acima de cinco numa escala de nove pontos, os que apresentaram correlações item-total maiores ou iguais a 0,50 e os que se correlacionaram fortemente (acima de 0,70) com diversas outras medidas.

Os 76 itens retidos foram testados com 164 adolescentes (53 do sexo masculino e 111 do feminino) da Universidade de Wisconsin que estavam namorando ou em relacionamentos mais sérios. A idade média dos participantes foi de 20 anos, e o tempo médio de duração do relacionamento foi de 21 meses (Hatfield & Sprecher, 1986). Diversas análises foram conduzidas para determinar quais itens seriam selecionados para a versão final da EAA. Os critérios usados para essa escolha foram: itens que tiveram médias mais elevadas em amor apaixonado do que amor companheiro e itens que foram considerados por mais de 60% da amostra como pertencentes ao amor apaixonado. Ao final do processo, ficaram 30 itens (versão completa) e, destes, foram selecionados, aleatoriamente, 15 itens para uma versão reduzida (EAA-R). Conforme Hatfield e Sprecher (1986), a EAA-R é mais adequada para a maioria das investigações, porém, se o objetivo do investigador é identificar os componentes cognitivo, emocional e comportamental, é recomendável usar a versão completa (EAA).

Os componentes cognitivos compreendem os pensamentos intrusivos e as preocupações com o parceiro. Por exemplo, os amantes, com frequência, gastam muito de seu tempo pensando sobre o outro, são pensamentos persistentes e intrusivos. Também compõe a dimensão cognitiva a idealização do outro ou do relacionamento. Os amantes tendem a atribuir características tais como beleza, bondade e inteligência um ao outro. Eles idealizam o relacionamento e acreditam que seus companheiros são perfeitos. Além disso, os amantes apaixonados desejam conhecer e ser conhecidos pelos seus parceiros (Hatfield & Sprecher, 1986).

Os componentes emocionais são representados pela atração pelo outro, especialmente a sexual, os sentimentos positivos e negativos, o desejo de reciprocidade, o desejo pela união completa e permanente, e a intensa excitação fisiológica. O desejo do amante apaixonado por união pode estar refletido numa variedade de comportamentos ou ações direcionados para determinar os sentimentos dos outros (Hatfield & Sprecher, 1986).

No estudo de Hatfield e Sprecher (1986), os escores dos participantes na EAA foram submetidos à Análise de Componentes Principais (ACP). Após a rotação Varimax, um fator principal com autovalor 12,24 explicou 70% da variância total. O coeficiente alfa de Cronbach revelou uma consistência interna de 0,94 para a EAA e 0,91 para a EAA-R. A EAA apresentou correlações estatísticas significativas (p < 0,001) para homens e mulheres com as escalas de Amar e Gostar de Rubin (1970), sendo a relação com Escala de Amar maior e significativamente diferente (p < 0,01) da relação com a Escala de Gostar. Por meio de análise de regressão linear e curvilínea, verificaram-se os efeitos do sexo, tipo e tempo de duração da relação sobre os escores da EAA. Não foram identificadas diferenças no grau de amor apaixonado entre homens e mulheres. No entanto, o amor apaixonado aumentou à medida que o namoro dos participantes foi se tornando mais sério.

Hendrick e Hendrick (1989), com uma amostra de 391 estudantes solteiros (189 homens e 202 mulheres) do curso de Psicologia de uma grande universidade do sudoeste norte-americano, buscaram evidências de validade e fidedignidade para a EAA. Foi realizada uma ACP com rotação Varimax. Os escores dos itens da escala, com exceção do item 1, apresentaram fortes saturações num único fator, que foi responsável por 54% da explicação da variância total. A correlação média interitem foi de 0,51 e o alfa de Cronbach de 0,97. Os pesquisadores concluíram que a EAA é uma medida unifatorial. O instrumento também apresentou significativa (p < 0,05) e elevada correlação positiva com as três subescalas de Sternberg (1997). Hendrick e Hendrick (1989) reconheceram que a EAA é uma medida consistente, mas que abrange especificamente os elementos maníacos do amor.

Carreño e Serrano (1995) examinaram os escores de 545 estudantes universitários espanhóis (322 mulheres e 204 homens) dos cursos de Letras e Ciências. A ACP com rotação Varimax encontrou, nos escores dos participantes, cinco fatores para a EAA que, juntos, explicaram 58% da variância total. A solução de cinco fatores apresentou coerência com o modelo de Hatfield e Sprecher (1986). No primeiro fator, carregaram itens que se referem à dependência e necessidade da outra pessoa. No segundo, itens de altruísmo, entrega e preferência pela pessoa amada. No terceiro, apareceram itens da excitação física diante da pessoa amada. No quarto, os itens se referem à confusão mental como consequência do amor. Por fim, no quinto, os itens que manifestam o desejo pela outra pessoa. Ainda que parecesse haver um fator predominante de amor apaixonado, também apareceram as dimensões cognitivas, afetivas e comportamentais. A correlação média interitem foi de 0,33, e a item-total, 0,56. O coeficiente alfa de Cronbach para a escala toda foi de 0,94.

A fidedignidade dos escores da EAA mostrou-se suscetível à influência das etnias das amostras numa metanálise realizada por Graham e Christiansen (2009) a partir dos bancos de dados Social Sciences Citation Index e PsycINFO com o termo “amor romântico”. Após a triagem, analisaram-se 127 estudos, 152 amostras, que compreenderam 38.132 participantes no período de 1970 a 2006. O estudo se limitou a coletar os coeficientes alfas de Cronbach dos relatos selecionados. O coeficiente de consistência interna médio para os 30 itens da EAA foi de 0,93 e o dos 15 itens, versão reduzida, foi de 0,88.

Graham (2011) realizou uma metanálise com Modelagem de Equações Estruturais em 103 amostras de 88 estudos envolvendo 19.387 indivíduos e abrangendo 40 anos de investigações sobre o amor. Foram investigados os fatores subjacentes às principais medidas do amor, entre elas a EAA de Hatfield e Sprecher (1986) e a Escala Triangular do Amor de Sternberg – Etas (Sternberg, 1997), consideradas as medidas mais populares de amor. Graham (2011) concluiu que a maioria das medidas examinadas possuía o mesmo fator geral subjacente. O pesquisador sugeriu que a ETAS seria unidimensional e que, no lugar de três componentes independentes, teria três facetas, como a EAA (Hatfield & Sprecher, 1986), que possui as facetas cognitivas, afetivas e comportamentais. Sternberg (1997) identificou, para os seus componentes do amor, facetas de naturezas motivacionais (paixão), afetivas (intimidade) e cognitivas (decisão/compromisso).

Yildirim e Hablemitoglu (2014) avaliaram a fidedignidade e validade de uma versão turca da EAA-R com estudantes universitários. Por meio do coeficiente alfa de Cronbach e da Análise Fatorial Confirmatória, os pesquisadores concluíram que a EAA-R mostrou-se válida e fidedigna para medir o amor na população turca.

Feybesse, Neto e Hatfield (2011) buscaram evidências de validade de construto para a uma adaptação portuguesa da EAA por meio dos escores de 204 estudantes universitários da Universidade do Porto (51,3% do sexo feminino) com idades entre 18 e 27 anos, média de 20,3 (DP = 2,05). Todos os participantes eram solteiros, e apenas 46,7% estavam em relação amorosa com tempo de duração médio de 13,7 meses (DP = 20,66). Os resultados da ACP com rotação Varimax extraíram um componente que explicou 45,37% da variância total. Todos os itens saturaram numa dimensão com cargas fatorial > 0,45, exceto o item 1. Os resultados foram semelhantes para os escores da versão curta, um fator explicou 49,3% da variância total, e todos os 15 itens saturaram > 0,45 no mesmo fator. Os alfas de Cronbach obtidos para a versão longa foi 0,96 e para a curta 0,92. A EAA apresentou as seguintes correlações com as subescalas da Etas (Sternberg,1997): 0,84, 0,62 e 0,64, respectivamente com paixão, intimidade e compromisso. Os autores concluíram que a adaptação portuguesa da EAA é unidimensional e tem validade fatorial, elevada consistência interna e validade concorrente. Nas conclusões, recomendaram a aplicação da EAA em amostras brasileiras.

Com efeito, no Brasil, não foram encontrados estudos psicométricos sobre a EAA (Cassepp-Borges & Andrade, 2013; Hernandez, Plácido, Araújo, Neves, & Azevedo, 2014). No intuito de colaborar para o preenchimento dessa lacuna, considerando a importância dessa medida do amor, esta pesquisa procurou gerar evidências de validade de construto e fidedignidade para os escores de brasileiros numa versão brasileira da EAA. Além disso, foram verificadas as relações dos escores da EAA com algumas variáveis sociodemográficas, tais como sexo, idade, tipo de relação, tempo de relação, coabitação e filhos na relação.

 

Método

Participantes

Por meio de uma amostra não probabilística, analisaram-se os dados de 578 respondentes, 323 (55,9%) do sexo feminino e 255 (44,1%) do sexo masculino. A idade variou de 18 a 63, com média de 29,9 anos, desvio padrão de 9,64 anos. A escolaridade dos sujeitos ficou distribuída da seguinte forma: 19 (3,3%) no primeiro grau, 84 (14,5%) no segundo grau, 408 (70,6%) no terceiro grau, 65 (11,2%) no quarto grau e 2 (0,3%) não forneceram o dado. Quanto ao tipo de relação, o grupo ficou assim distribuído: 225 (38,9%) casados/companheiros, 41 (7,1%) noivos, 291 (50,3%) namorados, 2 (0,3%) amantes e 19 (3,3%) não forneceram a informação. O tempo de relação variou de 1 a 372 meses (31 anos), com média de 85,2 meses (aproximadamente 6,7 anos), desvio padrão de 90,8 meses e 42 (7,2%) sujeitos não registraram esse dado . Os participantes que não residem com o parceiro foram 326 (56,4%), os que residem com o parceiro foram 234 (40,5%) e 18 (3,1%) não forneceram esse dado. Dos examinados, 544 (94,1%) declararam que praticam sexo com o parceiro, enquanto 18 (3,1%) declararam o contrário, e 16 (2,8%) não forneceram essa informação. Quanto ao número de filhos, a análise dos dados revelou: 378 (65,4%) sem filhos, 55 (9,5%) com um filho, 85 (14,7%) com dois filhos, 36 (6,2%) com três filhos, 5 (0,9%) com quatro filhos e 19 (3,3%) não deram essa informação. Dos 578 participantes, 395 (68,3%) sem filhos na relação atual, 164 (28,4%) com filhos na relação atual e 19 (3,3%) não responderam a esse item. Os sujeitos foram recrutados da população de pais e alunos do ensino médio, superior e pós-graduação de uma instituição educacional da Região Sul do Brasil.

Instrumento

Foi apresentada aos examinados a EAA de Hatfield e Sprecher (1986). Esse instrumento tem 30 itens que são frases afirmativas as quais os sujeitos avaliaram por meio de uma escala do tipo Likert de 5 pontos: 1 = “nada verdadeiro”, 5 = “totalmente verdadeiro” e 2, 3 e 4 = graduações intermediárias entre os pontos extremos.

Também foi respondida a Etas na versão brasileira reduzida (Etas-R) de Gouveia, Fonseca, Cavalcanti, Diniz e Dória (2009) com 15 itens, igualmente divididos entre os componentes paixão, intimidade e compromisso. Para responder ao instrumento, os sujeitos usaram uma escala do tipo Likert de 7 pontos, em que 1 = “nada verdadeiro”, 4 = “moderadamente verdadeiro” e 7 = “totalmente verdadeiro”; os pontos intermediários indicaram níveis intermediários de sentimentos.

Coleta de dados

Todos os participantes foram devidamente informados dos objetivos da pesquisa, preencheram e assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido conforme as diretrizes contidas na Resolução n. 466/2013 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). O presente projeto foi aprovado pelo Parecer n. 499.496 do Comitê de Ética em Pesquisa da instituição a que se encontra vinculado. Os dados foram coletados de forma coletiva em reuniões e salas de aula durante o período letivo regular.

Análise de dados

Para verificar a estrutura fatorial da EAA (30 itens) e EAA-R (15 itens), adotou-se a Análise Fatorial Exploratória (AFE), em que se utilizou o software Factor 9.2 (Lorenzo-Seva & Ferrando, 2013) com o método de extração Unweighted Least Squares. O SPSS 20 foi utilizado para o cálculo da consistência interna das medidas (alfa de Cronbach) e busca de evidências de validade de critério para o instrumento (Coeficiente de Correlação de Pearson na verificação da relação entre as medidas EAA, EAA-R e Etas-R, e teste t de Student e Análise de Variância na comparação entre as variáveis sociodemográficas).

 

Resultados

A versão brasileira da EAA foi obtida por meio do processo de back translation realizado por dois psicólogos bilíngues. Além disso, essa adaptação foi comparada com a versão portuguesa da EAA (Feybesse et al., 2011) para ajustes na formulação de alguns itens.

Na preparação para a AFE, a medida de adequação amostral KMO foi de 0,97, classificada como excelente. O teste de esfericidade de Bartlett, χ²(435) = 11.737,10, p < 0,001, confirmou a utilização do método de análise fatorial para os dados. Na primeira AFE realizada, método de extração Unweighted Least Squares, todos os itens da EAA (30 itens) e EAA-R (15 itens) apresentaram cargas fatoriais mais fortes (> 0,50). No entanto, o item 1, pertencente apenas à EAA, foi exceção, haja vista que apresentou saturação próxima a zero (0,003) e comunalidade zero, e, por esse motivo, foi excluído da análise (Ferrando & Anguiano-Carrasco, 2010; Lloret-Segura, Ferreres-Traver, Hernández-Baeza, & Tomás-Marco, 2014).

 

 

Uma nova AFE com mesmo método foi executada para os 29 itens. Extraíram-se quatro fatores com autovalores > 1,0. Porém, a análise paralela, implementação otimizada (Timmerman & Lorenzo-Seva, 2011), baseada em Minimum Rank Factor Analysis, recomendou a retenção de apenas um fator subjacente aos dados (Tabela 1). Essa solução extraiu um único fator que foi responsável por 64,2% da explicação da variação comum total. Todos os 29 itens apresentaram cargas fatoriais > 0,50 na dimensão extraída (Tabela 2).

 

 

A observação da distribuição de frequência dos resíduos apresentou-se aproximadamente normal. A Root Mean Square of Residuals (RMSR), medida descritiva da magnitude média das correlações residuais, foi de 0,05 e 0,04, indicando um ajuste aceitável para o modelo para a EAA e EAA-R, respectivamente. O Goodness of Fit Index (GFI), medida normalizada de qualidade de ajuste do modelo, foi de 0,99, para ambas, EAA e EAA-R. Esse valor, considerado como ótimo ajuste, indica a proporção de covariância entre as variáveis explicada pelo modelo proposto (Ferrando & Anguiano-Carrasco, 2010).

O coeficiente alfa de Cronbach, com base em itens padronizados para a EAA (29 itens), foi de 0,96, e a correlação interitem apresentou uma média de 0,48 com uma variação de 0,20 a 0,78. A exclusão do item 1, com fraca carga fatorial e correlação item-total negativa, não alterou o alfa da EAA. Para a versão da EAA-R (15 itens), o alfa de Cronbach ficou em 0,93. A correlação interitem teve média de 0,49, variando de 0,34 a 0,68, e a correlação item-total variou de 0,51 a 0,78. As correlações de Pearson entre a EAA, a EAA-R e a Etas-R e suas subescalas variaram de moderadas a fortes (Tabela 2).

A Anova identificou um efeito interativo significativo do sexo dos participantes e tipo de relação sobre os escores médios da EAA, F(1, 555) = 9.093, p < 0,01, ηp2 = 0,016. A análise do efeito simples, t(311) = 3.200, p < 0,01, d = 0,38, revelou que as mulheres casadas/companheiras (M = 3,5, DP = 0,96) apresentaram escores médios menores do que as mulheres noivas/namoradas/amantes (M = 3,8, DP = 0,78).

Por meio de Anova, também foi encontrado um efeito interativo entre o sexo dos participantes e a coabitação sobre os escores médios da EAA, F(1, 556) = 4.728; p < 0,05, ηp2 = 0,008. A análise do efeito simples, t(313) = 2.456, p < 0,01, d = 0,28, revelou que as mulheres que residem com os parceiros (M = 3,5, DP = 0,95) apresentaram escores médios menores do que as que não residem (M = 3,8, DP = 0,79).

Além disso, a Anova revelou um efeito interativo entre sexo dos participantes e ter filhos ou não na relação sobre os escores médios da EAA, F(1, 555) = 6.869, p = 0,009, ηp2 = 0,012. A análise do efeito simples, t(313) = 2.808, p = 0,006, d = 0,37, revelou que as mulheres que têm filhos na relação (M = 3,4, DP = 1,02) apresentaram médias significativamente menores do que as mulheres que não têm filhos na relação (M = 3,8, DP = 0,78). No caso dos homens, não foram encontradas essas diferenças relativas aos efeitos das variáveis sexo dos participantes, tipo de relação, coabitação e filhos na relação sobre a EAA.

O coeficiente de correlação de Pearson apurou uma correlação inversa significativa (r = -0,14, p < 0,001): conforme aumentava a idade dos participantes, diminuíam seus escores médios na EAA. A correlação entre o tempo de duração da relação e a EAA não foi significativa.

 

Discussão

O presente estudo gerou evidências de validade fatorial para a EAA. A AFE mostrou que o instrumento adaptado possui um único fator, conforme o modelo original de Hatfield e Sprecher (1986). Todos os itens analisados, exceto o item 1, estavam predominantemente relacionados com essa única dimensão, que explicou 64,2% da variância comum.

O péssimo desempenho psicométrico do item 1 ( “Desde que me envolvi com ______ minhas emoções estão como numa montanha-russa”) já havia sido citado por Hendrick e Hendrick (1989), que não discutiram o problema e, portanto, não forneceram uma explicação. Já Feybesse et al. (2011) creditaram o fraco desempenho desse item à sua formulação. A expressão “montanha-russa” (roller coaster, no original) tenta expressar a intensa oscilação emocional produzida pelo amor apaixonado, mas certamente não foi compreendida da maneira esperada pelos respondentes portugueses e também pelos brasileiros no estudo atual. Carreño e Serrano (1995) traduziram o item para o espanhol de forma diferente: “mis emociones han sido como un barco moviéndose” e não relataram nenhum problema psicométrico com ele. Sugere-se que uma formulação mais adequada desse item possa ser testada com brasileiros numa pesquisa futura.

Os alfas calculados neste estudo para a EAA e EAA-R indicaram elevada consistência interna para ambas, semelhantes aos encontrados nos estudos anteriores (Carreño & Serrano, 1995; Feybesse et al., 2011; Graham & Christiansen, 2009; Hatfield & Sprecher, 1986; Hendrick & Hendrick, 1989; Yildirim & Hablemitoglu, 2014), o que confere forte evidência de fidedignidade para a versão brasileira.

O presente estudo também produziu fortes evidências de validade convergente para os escores da EAA e EAA-R, representadas pelas robustas correlações obtidas com os escores da Etas-R e suas subescalas (paixão, intimidade decisão/compromisso). Conforme vários estudos (Carreño & Serrano, 1995; Graham, 2011; Hendrick & Hendrick, 1989), a Etas deveria ser considerada uma medida unidimensional semelhante à EAA. Nessa perspectiva, os supostos componentes do amor (paixão, intimidade e decisão/ compromisso) seriam facetas emocionais, afetivas e cognitivas, respectivamente, do construto chamado de amor. Da mesma forma, os itens da EAA poderiam ser identificados como pertencentes às facetas afetivas, cognitivas e comportamentais (Graham, 2011). Com base nisso, podemos considerar que a relação entre os escores da EAA e ETA-R são evidências de validade convergente, haja vista que representariam um mesmo construto, o amor.

Na presente pesquisa, a interação entre sexo dos participantes, tipo de relação, coabitação e presença de filhos na relação afetou apenas os escores femininos na EAA. No caso das mulheres que estavam envolvidas em relacionamentos mais sérios (casamento ou união estável), coabitavam com seus parceiros e possuíam filhos com eles, os escores foram menores do que aqueles apresentados por mulheres em relacionamentos menos sérios (noivado/namoro), que não coabitavam e não tinham filhos com os parceiros. No entanto, os tamanhos desses efeitos interativos sobre os escores da EAA foram pequenos.

Hatfield e Sprecher (1986) também registraram que o status da relação afetou os escores da EAA, mas de maneira igual para homens e mulheres. Contudo, a amostra destas pesquisadoras contemplou somente indivíduos em relação de namoro, menos ou mais sérios, ou compromissados. Assim, não é possível comparar esses resultados com os obtidos no estudo atual.

Nos estudos que buscaram relação entre o amor apaixonado e sexo dos participantes, foram encontrados resultados variados e contraditórios (Villar, Villamizar, & López-Chivrall, 2005) ou não houve diferenças entre homens e mulheres (Hatfield & Sprecher, 1986). Hatfield et al. (2008) também não encontraram diferenças na quantidade de amor apaixonado entre homens e mulheres. Os pesquisadores consideraram que o fato de homens e mulheres amarem mais ou menos parece depender do tipo de amor considerado, de como é medido e, possivelmente, das idades e dos estágios de vida dos amantes.

Os resultados atuais também revelaram uma relação negativa significativa entre a idade dos amantes e o amor apaixonado, sendo esse tipo de relação responsável pela explicação de uma pequena variância dos dados, ou seja, tamanho do efeito pequeno. Em Sumter, Valkenburg e Peter (2013), os adultos com mais de 50 anos relataram os mais baixos níveis de paixão quando comparados com adultos mais jovens.

Neste estudo, foram geradas algumas fortes evidências de validades fatorial, convergente e consistência interna para a EAA. Os escores obtidos com a versão brasileira do instrumento apresentaram um bom desempenho psicométrico, corroborando o modelo proposto por Hatfield e Sprecher (1986). Isso sugere que a medida é adequada para a avaliação subjetiva global do amor apaixonado e que o item 1 deveria sofrer uma reformulação ou ser excluído do instrumento.

Deve-se considerar que uma porção considerável da amostra atual (mais de 40%) experimentava algum tipo de relação amorosa mais séria (noivado e casamento/união estável) do que as utilizadas em estudos anteriores (Carreño & Serrano, 1995; Feybesse et al., 2011; Hatfield & Sprecher, 1986; Hendrick & Hendrick, 1989), em que a maioria dos participantes era universitária, solteira ou não vivenciava um relacionamento amoroso. No entanto, a abrangência da presente amostra está distante de cobrir a diversidade cultural existente no país, mas futuras investidas poderão preencher essa lacuna.

 

Referências

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Endereço para correspondência:
José Augusto Evangelho Hernandez
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de Psicologia
Rua São Francisco Xavier, 524, 10º andar, sala 10.028D, Maracanã
Rio de Janeiro – RJ – Brasil
E-mail: hernandez.uerj@gmail.com

Submissão: 24.9.2014
Aceitação: 10.8.2015

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