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Avaliação Psicológica

versão impressa ISSN 1677-0471

Aval. psicol. vol.11 no.1 Itatiba abr. 2012

 

 

Estresse, ansiedade, crenças de autoeficácia e o desempenho dos bacharéis em Direito

 

Stress, anxiety, self-confidence beliefs and the pe rformance of Law Bachelors

 

Estrés, ansiedad, creencias de autoeficacia y el rendimiento de Licenciados en Derecho

 

 

Tânia Mara Brito Loricchio; José Roberto Leite1

Universidade Federal de São Paulo

 

 


RESUMO

Foram avaliados os níveis de estresse, ansiedade e as crenças de autoeficácia de 237 bacharéis em Direito, em fase de preparação para ingresso na Ordem dos Advogados do Brasil - OAB. O objetivo desta pesquisa foi avaliar as relações entre estresse, ansiedade e crenças de autoeficácia com o desempenho, nas duas fases do exame da Ordem. Os participantes responderam aos inventários de Ansiedade Traço-Estado do Spielberger - IDATE, ao Inventário de Stress de Lipp - ISSL e a um Inventário de Autoeficácia. Foram encontradas correlações positivas entre os níveis de estresse, ansiedade e crenças de autoeficácia. As correlações entre os parâmetros obtidos nesses inventários e o desempenho nos exames foram positivas para os graus de estresse e de ansiedade-traço. Os resultados deste estudo demonstraram que candidatos sem sintomas de estresse têm duas vezes mais chance de serem aprovados em relação a candidatos com estresse.

Palavras-chave: estresse; ansiedade; ansiedade de desempenho; autoconfiança; crenças de autoeficácia.


ABSTRACT

Stress, anxiety and the self-efficacy beliefs levels were evaluated in 237 Law bachelors in preparation phase to be admitted at Ordem dos Advogados do Brasil - OAB. The purpose of this research was to evaluate the relationships between stress, anxiety, and self- efficacy beliefs related to the performance on both phases of the OAB. The subjects who answered this research were students of preparatory courses to the OAB exam. The Shait-Trait Anxiety Inventory of Spielberger, Inventário de Sintomas de Stress de Lipp - ISSL and Self-Efficacy were employed. Positive correlations were found between levels of stress, anxiety and self-efficacy beliefs. The correlations between the parameters obtained in these inventories and examinations performance were positive for the stress index and trait anxiety. The results of this study showed that candidates without stress symptoms have a twofold chance to be approved on the test than the candidates with stress symptoms.

Keywords: stress; anxiety; performance anxiety; self-efficacy beliefs.


RESUMEN

Fueron evaluados los niveles de estrés, ansiedad y las creencias de autoeficacia de 237 licenciados en Derecho, en fase de preparación para ingreso en la Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). El objetivo de esta pesquisa fue evaluar las relaciones entre estrés, ansiedad y creencias de autoeficacia con el desempeño, en las dos fases del examen de la OAB. Los participantes respondieron a los inventarios de Ansiedad Trazo-Estado del Spielberger - IDATE, al Inventario de estrés de Lipp - ISSL y a un Inventario de Autoeficacia. Fueron encontradas correlaciones positivas entre los niveles de estrés, ansiedad y creencias de autoeficacia. Las correlaciones entre los parámetros obtenidos en esos inventarios y el desempeño en los exámenes fueron positivas para los grados de estrés y de ansiedad-trazo. Los resultados de este estudio demostraron que candidatos sin síntomas de estrés tienen dos veces más chances de seren aprobados en relación a candidatos con estrés.

Palabras-clave: estrés; ansiedad; ansiedad de desempeño; autoconfianza; creencias de autoeficacia.


 

 

Este trabalho parte da suposição de que a situação dos bacharéis em Direito que desejam advogar oficialmente consiste num agente estressor, dado que esta categoria profissional enfrenta um exame para admissão à entidade da classe, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O Exame da Ordem é dividido em duas fases: a primeira consiste numa prova objetiva, composta por 100 questões de múltipla escolha, e a segunda é dissertativa: o candidato responde a questões relacionadas às áreas do Direito que previamente elegeu - Civil, Penal, Direito do Trabalho e Direito Tributário, dentre as demais (Lobo, 1996).

Este estudo pretende pesquisar o nível de estresse, de ansiedade e de crenças de autoeficácia de bacharéis que farão o exame da OAB, e verificar possíveis relações desses fatores com a aprovação ou reprovação no exame (desempenho). Com média de reprovações de 70%, segundo o Senado (2010), ser aprovado nessa prova envolve fatores desafiadores relacionados à identidade profissional, emprego, carreira e questões financeiras, dentre outras (Silva, 2006).

Estresse

De acordo com Selye (1936), o conceito de estresse se baseia na observação de que diferentes tipos de condições físicas ou psicológicas que ameaçam a homeostase do organismo eliciam o mesmo conjunto de alterações corporais - a chamada "Síndrome de Adaptação Geral". Os estímulos ou situações que provocam tal síndrome são denominados estressores.

Segundo Graeff (2007), a resposta mais característica do estresse é a ativação do eixo Hipotálamo - Pituitária - Adrenal (HPA) com a qual ocorre a ativação do núcleo paraventricular do hipotálamo e a produção do hormônio liberador de corticotrofina (CRH). Então, o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) e corticóides (cortisol, em humanos, e cortisona, em ratos) são liberados na corrente sanguínea. O autor descreve a atuação do CRH em suas duas vias:

1. Estimula a pituitária, que produz e libera, na circulação sanguínea, o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). O ACTH ativa as glândulas adrenais para liberar glicocorticóides no sangue. Os glicocorticóides controlam o metabolismo de glicose e o ciclo de sono-vigília, e uma de suas principais tarefas é aumentar os níveis de glicose para fornecer energia aos músculos e ao sistema nervoso - estes hormônios estão associados à atenção, vigilância e excitação.

2. Via conexão com o locus cereleus, no tronco encefálico, que funciona como um tipo de circuito elétrico neural, ligando as áreas produtoras de ACTH ao sistema nervoso autônomo, portanto, relacionadas, entre outras funções, ao controle da respiração, pressão, digestão.

As Três Fases do Estresse

Selye (1959) observou que o estresse apresenta três fases sucessivas, que representam o esforço, a persistência e a falência do mecanismo de adaptação aos agentes estressores. A fase de alerta é caracterizada por reações do eixo HPA em resposta ao evento estressor – trata-se de uma resposta de luta ou fuga que objetiva a preservação da vida. A fase de resistência se apresenta quando o estressor permanece presente por períodos prolongados ou se é de grande dimensão. O organismo, então, tenta recuperar o equilíbrio homeostático. Na fase de exaustão, o estresse ultrapassou a possibilidade de gerenciamento em virtude de o organismo ter exaurido a sua energia adaptativa. Essa fase está associada ao aparecimento de diversos problemas, tais como úlceras, gengivites, psoríase, hipertensão arterial, depressão, ansiedade, problemas sexuais, entre outros. Lipp (2003) propôs uma fase intermediária entre a resistência e a exaustão para o estresse emocional: a fase de quase-exaustão. Cada fase envolve uma sintomatologia diferenciada, que é acompanhada de mudanças hormonais correspondentes.

Os estudos realizados por Deakin e Graeff (1991) demonstraram que um mecanismo importante para lidar com o estresse crônico é o desenvolvimento gradual de uma desconexão – como no esquecimento – entre o estressor e suas consequências comportamentais. Isso permite que a pessoa funcione normalmente, apesar da presença de eventos irritativos dos quais não consiga fugir ou evitar.

Segundo Lazarus e Folkman (1994, citados por Lipp, 2000), a maneira como o indivíduo interpreta os eventos ambientais é fundamental no processo de estresse. Além da avaliação cognitiva, a personalidade também pode ser fonte significativa de estresse, na medida em que fornece parâmetros para reação diante dos eventos da vida.

Ansiedade

De acordo com Peregrino (1996), a ansiedade é um estado emocional desconfortável caracterizado por pressentimento de perigo iminente, atitude de espera em relação ao perigo, desestruturação ante o perigo, com sensação de estar desprotegido. Esse autor descreve a ansiedade como um medo sem objetivo, uma situação ou uma imagem mental – e o indivíduo que a experimenta sabe que não se trata de uma ameaça objetiva.

Andrade, Gorenstein, Vieira, Tung e Artes (2001) descrevem a ansiedade como uma resposta de adaptação do organismo que é propulsora do desempenho e possui componentes psicológicos e fisiológicos. Trata-se de um estado emocional transitório ou uma condição do organismo humano, caracterizada por sentimentos desagradáveis de tensão e apreensão, conscientemente percebidos.

Para Kaplan e Sadock (1990), a ansiedade patológica é descrita como uma resposta inadequada a um determinado estímulo em virtude de sua intensidade ou duração. Consideram que sentir ansiedade ou desconforto em situações de exposição pessoal é normal. A patologia é definida a partir do momento em que o sofrimento trouxer prejuízo à pessoa em função dos comportamentos de fuga e esquiva de situações importantes da vida acadêmica, social ou profissional do indivíduo. Segundo Shapiro, Shapiro e Schwartz (2000), os Transtornos de Ansiedade são, entre as condições psiquiátricas, os mais frequentes na maioria das populações estudadas, requerendo persistente intervenção dos serviços de cuidado da saúde.

Ansiedade, Estresse e Desempenho Acadêmico

Lipp e Melagris (2001) observaram que a ansiedade promove estresse, o que pode interferir nos recursos envolvidos com aprendizagem e desempenho. Basicamente, as alterações hormonais envolvidas na ativação do eixo HPA produzem respostas que tendem a ocasionar aumento de motivação e entusiasmo, o que gera maior produtividade (fase de alarme do estresse), o oposto do que ocorre como resposta de níveis altos de estresse e/ou ansiedade.

No início do século XX, Yerks e Dodson (1908) demonstraram que a execução eficiente de uma tarefa requer certo grau de ansiedade. Esse princípio foi disseminado por meio da Lei de Yerks- -Dodson, que prediz que existe um ponto ótimo de ansiedade necessário para a execução de determinada atividade. Esse ponto depende do grau de dificuldade da tarefa e, de acordo com Brunner e Suddarth (1994, citado por Correia & Rocha, 2000), as respostas orgânicas à ansiedade leve determinam o aprendizado. Entretanto, a concentração, o aprendizado e a percepção aumentam ou são distorcidos quando ocorre um aumento na intensidade da ansiedade.

Ferreira (2004) realizou uma pesquisa, a partir de uma amostra de 210 estudantes universitários, sobre a relação entre ansiedade e desempenho acadêmico. Os resultados demonstraram que altos níveis de ansiedade foram bons preditores de baixo desempenho acadêmico. No entanto, não foi possível concluir que baixos níveis de ansiedade sejam bons preditores de bom desempenho acadêmico. Oliveira e Duarte (2004) citaram que, em alguns casos, a ansiedade com relação a um bom desempenho acadêmico é uma resposta relacionada com a esquiva de notas baixas – o que representa uma punição e não a busca pelo acerto ou pela aprovação.

Desempenho Acadêmico e Crenças de Autoeficácia

Para Bandura (1997), dentre os mecanismos pelos quais a pessoa exerce influência sobre suas ações, o mais central se refere às crenças de autoeficácia, que são definidas como a confiança na capacidade pessoal para organizar e executar certas ações. As crenças de autoeficácia influenciam as escolhas dos cursos de ação que são realizados, o quanto de esforço será empenhado nos objetivos pessoais, o tempo de perseveração em relação a obstáculos e fracassos, os padrões de pensamento de paralização ou de ação, o grau de estresse e depressão vivenciados com as demandas do ambiente e o nível de realização que alcançam. As crenças de eficácia controlam também a ação dos indivíduos, a autorregulação do processo de pensamento, da motivação e de estados afetivos e fisiológicos (Bandura, 1997).

Bandura (2001) conceitua desempenho como a maneira pela qual o indivíduo soluciona os seus problemas. Portanto, um bom desempenho acadêmico envolve, basicamente, o ato de solucionar problemas de maneira eficiente. O autor enfatiza que, além da capacitação, as crenças pessoais de autoeficácia e de avaliações futuras são os fatores que subjazem ao desempenho. Constituem o principal fator do desempenho – além da capacitação – as crenças pessoais de eficácia e de avaliação posterior ao desempenho. Os tipos de resultados que as pessoas antecipam às suas ações dependem do julgamento feito sobre as sua capacidade de agir em determinadas situações: aquelas que se julgam altamente eficazes irão esperar resultados favoráveis das suas ações, o oposto do que ocorre com indivíduos com baixa crença de autoeficácia (Nunes, 2008).

As crenças pessoais nas próprias capacidades também estão relacionadas aos processos afetivos, influenciando o nível de estresse e ansiedade experimentados frente a situações percebidas como ameaçadoras. A percepção de uma situação aversiva pode não ser tão estressante quanto a crença na ineficácia pessoal para administrá-la (Barrera, 2010; Sá, 2006). Assim, segundo essas considerações, a crença de autoeficácia é fator determinante do nível de ansiedade, da autoconfiança e nas respostas relacionadas ao desempenho de tarefas.

 

Método

A pesquisa foi realizada no período de 31 de julho a 31 de agosto de 2009, em cursos preparatórios para o exame de Ordem da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). O exame foi realizado no dia 13 de setembro e correspondeu ao exame número 139. Foi feito um levantamento dos cursos preparatórios da cidade de São Paulo. O segundo passo foi alocar os cursos em 6 estratos amostrais, cada um localizado em regiões específicas de São Paulo. Os estratos 1, 2, 3, 4, 5 e 6 correspondem às regiões da Paulista / Consolação, Norte / Santana, Leste, Centro, Sul e Oeste, respectivamente. A seleção dos cursos consistiu em uma unidade de ensino escolhida aleatoriamente de cada estrato. Todos os alunos da unidade selecionada foram convidados a participar do estudo.

A pesquisa foi realizada com nove turmas, sendo sete do período noturno e duas do período matutino e os testes foram aplicados nos intervalos das aulas. Os participantes foram escolhidos de acordo com a disponibilidade das turmas e períodos disponibilizados pelos coordenadores dos cursos preparatórios.

Instrumentos

A amostra foi composta de 237 bacharéis em Direito, alunos de cursos preparatórios para o exame da Ordem dos Advogados (OAB-SP). Tinham idade entre 21 e 74 anos – em média, 32,9 anos, sendo 54% do sexo feminino. Dentre os participantes, 73% eram de cursos matutinos e 27% de cursos noturnos. Deles, 80% foram reprovados anteriormente – em alguns casos, mais que uma vez, em alguma fase do exame da Ordem. Dos alunos entrevistados, 66 candidatos (28%) foram aprovados na primeira fase do exame da OAB. Os demais, 171 bacharéis (72%), foram eliminados.

Procedimentos

Após a obtenção da aprovação pelo Comitê de Ética e Pesquisa (CEP) da UNIFESP e dos termos de consentimento para a realização da pesquisa com os dirigentes dos cursos preparatórios, foram marcadas as datas. Cada participante assinou o termo de consentimento de autorização para a realização do estudo e respondeu aos inventários apresentados. O pesquisador descreveu aos participantes os objetivos do trabalho e esclareceu que a participação era de livre escolha e que poderiam deixar de participar, a qualquer momento, sem prejuízo. A aplicação dos inventários foi realizada em grupos que variaram entre 10 a 60 pessoas.

Instrumentos

A sintomatologia e o nível de estresse foram avaliados pelo Inventário de Sintomas de Estresse para adultos de Lipp - o ISSL (Lipp, 2000). Em pesquisa realizada com uma amostra de 1843 pessoas, Lipp obteve valor de alfa de Cronbach de 0,91, indicando boa consistência interna entre os itens do instrumento (Lipp, 2000).

O ISSL é composto de três quadros, cada quadro se referindo a uma das fases do processo de estresse, de acordo com o modelo trifásico de Selye (1959). Esse inventário possibilita identificar a fase de estresse em que o indivíduo se encontra e avaliar os sintomas de estresse tanto no nível cognitivo como no nível somático. O participante é solicitado a indicar se ocorreu o sintoma de estresse especificado em cada quadro: nas últimas 24 horas, na última semana ou em até um mês. O primeiro quadro se refere à fase de alarme, o segundo, à fase de resistência e quase-exaustão e o terceiro, à fase de exaustão. Os dois primeiros quadros são compostos por 15 itens e o terceiro quadro consiste em 23 itens. Cada item corresponde a um sintoma físico – tais como: boca seca, tensão muscular, formigamento nas extremidades; ou psicológico, como: dúvida quanto a si mesmo, aumento súbito de motivação, perda do senso de humor. A avaliação é feita em termos das tabelas percentuais de correção do inventário.

A ansiedade foi avaliada pelo inventário de Ansiedade Traço-Estado, o IDATE. Esse inventário foi desenvolvido por Spielberger, Gorsuch e Lushene em 1970 e adaptado no Brasil por Biaggio (1979). As análises descritas na avaliação da estrutura fatorial do IDATE demonstraram índices de consistência altos nas duas escalas, sendo que o alfa de Cronbach em três amostras variou entre 0,82 e 0,89 (Fioravanti, Santos, Maissonette, Cruz & Landeira- Fernandez, 2006).

O IDATE agrupa itens relacionados a humor, cognição, comportamento, estado de hiperalerta, sintomas somáticos, entre outros. A escala mede dois elementos que compõem a ansiedade: ansiedade-estado, que se refere a um estado emocional transitório, caracterizado por sentimentos subjetivos de tensão relacionados a um contexto, e ansiedade-traço, referente a um estado emocional mais constante, caracterizado por sentimentos subjetivos de tensão. De acordo com esse inventário, a escala-estado requer que o participante descreva como se sente "agora, neste momento" em relação a 20 itens apresentados em uma escala Likert de 4 pontos, significando: 1 = absolutamente não; 2 = um pouco; 3 = bastante; 4 = muitíssimo. De maneira semelhante, a escala-traço também é composta por 20 itens, mas o participante recebe a instrução de que deve responder como geralmente se sente, também de acordo com uma escala Likert idêntica à anterior.

A crença de autoeficácia foi avaliada pela Escala de Crença de Autoeficácia, uma escala Likert composta por 14 itens, correspondendo a cada uma das 14 matérias que compõem a primeira fase do exame. Cada item foi respondido pelo participante sobre o "quão confiante" está se sentindo em relação a cada uma das matérias do exame da OAB. A escala varia de 1 a 5 pontos, significando: 1 = nada confiante, 2 = pouco autoconfiante, 3 = mais ou menos confiante, 4 = confiante e 5 = muito confiante.

Como a crença de autoeficácia é a confiança de um indivíduo em sua habilidade em desempenhar com sucesso ou completar uma tarefa e não existem escalas adaptadas especificamente ao exame da Ordem, utilizou-se uma adaptação da Escala de Crença de Autoeficácia na solução de problemas matemáticos. A escala foi desenvolvida por DoBarro (2007) e apresentada na sua tese de doutorado. A consistência interna do instrumento foi considerada satisfatória – o alpha de Cronbach resultante foi de 0,77 para uma amostra de 213 pessoas. Nessa escala, composta por 12 problemas, cada um era avaliado pelo sujeito em uma escala Likert de 5 pontos (1 - nada confiante até 5 - totalmente confiante) sobre a sua confiança em solucionar os problemas. Os problemas abrangiam três níveis de demanda cognitiva - cálculo, compreensão e aplicação, partindo do pressuposto que a resolução de problemas envolve diferentes demandas cognitivas aliadas ao reconhecimento do indivíduo em relação ao seu preparo (Bandura, 1993). O estudo original foi desenvolvido por Betz e Hackett em 1983 e a alterações posteriores tiveram a confiabilidade confirmada por Langenfeld e Pajares em 1993 (citados por Dobarro, 2007).

Avaliação Estatística

Foi realizada pelo Centro de Estatística Aplicada (CEA) da Faculdade de Estatística da Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP (Soler, Silva, Lee & Barbosa, 2009; Paula, Huang & Oliveira, 2010). A amostra foi caracterizada considerando as seguintes variáveis: presença ou ausência de estresse, fase de estresse, grau de ansiedade- -traço, grau de ansiedade-estado, graus de crenças de autoeficácia, além de idade, sexo, período cursado e insucessos anteriores. Também foram realizadas comparações entre essas variáveis e o desempenho - compreendido como aprovação ou reprovação, na primeira e segunda fases do exame da OAB.

Foram realizados cálculos de medianas, quartis, intervalos de confiança, correlações de Pearson, teste t para igualdade de médias e P-valores. Também foram calculados testes t-independentes para ansiedade-estado, ansiedade–traço e autoeficácia em relação à presença de estresse com 95% no intervalo de confiança na diferença das médias dessas variáveis, como demonstrado na Tabela 1.

 

 

Avaliou-se ainda a probabilidade de ocorrência de sucesso no exame com a utilização de Regressão Logística – uma análise inferencial. Trata-se de uma técnica estatística utilizada quando a resposta de interesse é uma variável binária, nesse caso: sucesso ou fracasso – o que possibilita o cálculo da probabilidade do evento de interesse ocorrer. As variáveis explicativas utilizadas são compostas por variáveis demográficas dos candidatos e pelos índices de estresse, de ansiedade-estado de ansiedade- traço e de autoeficácia.

 

Resultados

Por meio dos inventários aplicados, foi demonstrado que grande parte dos bacharéis (71%) estava em alguma fase de estresse: mais da metade dos participantes (53%) estava na fase de resistência e 16% na fase de quase-exaustão. Em apenas 29% dos candidatos diagnosticou-se ausência de estresse. Ocorreu um número maior de aprovações no sexo feminino: 58% no grupo dos aprovados e 53% no grupo dos reprovados.

Desempenho, Grau de Estresse e Período de Curso

Dos participantes que foram aprovados, 64% estavam em alguma fase de estresse e 36% não apresentaram sintomas. Dentre os candidatos que apresentaram sintomas de estresse, 48% estavam na fase de resistência. Essa diminuição da proporcionalidade, quando comparada ao perfil geral - 71% de presença de estresse no total dos participantes - indica que a presença de estresse pode influenciar no desempenho do candidato ao submeter-se ao exame.

Trinta e quatro (34%) dos alunos de cursos matutinos e 25% dos alunos de cursos noturnos passaram na primeira fase do exame, sendo que a amostragem era de 73% de alunos de cursos matutinos e 27% dos alunos de cursos noturnos. Essas proporções também diferem do percentual total, que é de 28% de aprovação para a amostragem total. Considerando a amostragem total, foram aprovados 67% dos alunos de cursos matutinos e 33% dos alunos de cursos noturnos. A proporção de aprovados no exame é a mesma tanto para os participantes que nunca prestaram o exame no passado, quanto para os que já o fizeram anteriormente, embora este estudo não tenha avaliado a quantidade de vezes que os participantes tenham realizado o exame.

Relações entre o Desempenho e as Variáveis: Ansiedade- Estado, Ansiedade-Traço (inventário IDATE), Crenças de Autoeficácia e Idade

Para avaliar a relação entre as variáveis: ansiedade- estado, ansiedade-traço (inventário IDATE), crenças de autoeficácia, idade e o resultado obtido na primeira fase do exame da OAB, foram calculados os quartis e a mediana. As variáveis foram divididas em três grupos baseados no primeiro e terceiro quartis. O primeiro grupo é formado por candidatos abaixo do primeiro quartil - os 25% menores valores da amostra; o segundo grupo engloba 50% da amostra (entre o primeiro e terceiro quartil) e o terceiro grupo é de candidatos que estão acima do terceiro quartil (os 25% maiores valores da amostra).

Os resultados obtidos no IDATE referentes à ansiedade-estado demonstraram que os candidatos que se encontravam no grupo 2 (valores entre 42 e 58 pontos) apresentaram maior porcentagem de reprovação (77%). Os candidatos que estavam no grupo 3 (valores maiores que 58 pontos) apresentaram menor percentual de reprovação (67%).

Os resultados relativos aos cálculos de ansiedade-traço (IDATE) demonstraram que os candidatos que estavam no grupo 2 (valores entre 37 e 53) apresentaram maior percentual de reprovação (76%). O grupo com valores menores que 37 pontos (grupo 1) apresentou o menor percentual de reprovação (66%). Esses resultados nos permitem sugerir uma possível relação entre o grau de ansiedade-traço e o desempenho na primeira fase do Exame da OAB. Resultado semelhante pode ser verificado na avaliação de ansiedade-traço, nas duas fases do exame: os participantes que obtiveram valores entre 37 e 53 pontos (grupo 2) e aqueles com valores maiores que 53 pontos (grupo 3) apresentaram maiores percentuais de reprovação, ambos com 93%.

A avaliação dos índices de autoeficácia apresentou os seguintes resultados: os participantes que obtiveram valores menores que 38 pontos (grupo 1) foram os que tiveram maior porcentagem de reprovação (77%), e aqueles que apresentaram valores entre 38 a 48 pontos foram os que tiveram menor porcentagem de reprovação (69%). Os valores indicam uma possível relação entre baixa autoeficácia e reprovação.

No grupo dos candidatos aprovados, a idade tende a ser menor e concentrada na média de 33 anos. Os candidatos com 26 anos ou menos (grupo 1) apresentaram 35% de aprovação; aqueles com 40 anos ou mais (grupo 3) apresentaram 13% de reprovação.

Comparação entre os índices e correlações

Os cálculos das correlações de Pearson entre as variáveis contínuas demonstraram uma correlação linear positiva razoavelmente boa entre o grau de ansiedade-traço e ansiedade-estado (IDATE- -Estado e IDATE-Traço): 0,652 para a pontuação total e -0,413 para a média. Comparando-se os índices de ansiedade-estado, ansiedade-traço, crenças de autoeficácia e a presença ou ausência de estresse, conclui-se que a variabilidade do inventário de Ansiedade-Estado e do inventário de Ansiedade- -Traço dos candidatos que apresentaram estresse são maiores do que daqueles que não apresentaram estresse.

Pelos intervalos de confiança para as médias com 95% de confiança, foi calculado que os intervalos não possuem valores em comum, indicando que esta diferença é significativa a 5%. Isso significa que, em média, os candidatos com a presença de estresse são os que apresentam maiores valores de ansiedade-estado e de ansiedade-traço.

Para os índices de autoeficácia, pôde-se verificar que a média, a mediana e a variabilidade dos candidatos que não apresentaram sintomas de estresse eram maiores que aqueles estavam em alguma fase de estresse. Os cálculos resultaram numa diferença de 5% de significância para a média de confiança de 95% – portanto, os candidatos com ausência de estresse são aqueles que apresentaram maior índice de autoeficácia.

correlação de Pearson entre o índice de autoeficácia com os índices de ansiedade-estado e os índices de ansiedade-traço foi de aproximadamente -0,4, indicando que o índice de autoeficácia tem correlação moderada inversa em relação aos outros dois. Esse resultado indica que, quanto maiores forem os índices obtidos nos inventários de Ansiedade- Traço e de Ansiedade-Estado, menores serão os índices de autoeficácia do candidato. Verifica-se, também, que a correlação entre as variáveis é positiva e alta, variando de 0,65 a 0,91.

Como demonstrado na Tabela 1, apenas na variável ansiedade-traço, as variâncias são distintas, apresentando um nível de significância de 5%. Dessa forma, o teste t para a igualdade das médias foi feito considerando variâncias heterogêneas. Pela Tabela 1, pode-se observar que as médias são diferentes, pois o valor 0 não pertence a nenhum dos intervalos de confiança para as três variáveis da tabela (índices de ansiedade-estado, de ansiedade-traço e de autoeficácia), e os três P-valores foram menores que o nível de significância de 5%.

Probabilidade de sucesso nos exames da OAB: análise inferencial

A Regressão Logística é uma técnica estatística utilizada quando a resposta de interesse é uma variável binária, nesse caso: sucesso ou fracasso no exame – o que possibilita o cálculo da probabilidade de o evento de interesse ocorrer. Esta pesquisa tem interesse em avaliar quais as variáveis que mais influenciam nos resultados do exame da OAB. As variáveis explicativas utilizadas são compostas por variáveis demográficas dos candidatos e pelos índices de estresse, de ansiedade-estado de ansiedade- traço e de autoeficácia.

A partir dos resultados obtidos na primeira fase da OAB, foi proposto um modelo logístico (Figura 1) com objetivo de associar esses resultados com as variáveis: grau de ansiedade, crença de autoeficácia, idade, entre outras. Para verificar a discriminação do modelo, a probabilidade de acerto foi calculada como demonstrado na Figura 2. A probabilidade estimada de um candidato ser aprovado na primeira fase, dada a idade e a presença ou ausência de estresse, é indicada por .

 

 

O modelo possui especificidade de 55,6%, que é o percentual de candidatos classificados como reprovados e os que, de fato, foram reprovados. A sensibilidade, calculada em 60,6%, representa o percentual de candidatos classificados como aprovados – e que realmente foram aprovados. Demonstrando acerto total de 57,0%, o modelo classificou corretamente um percentual razoável da amostra total.

A razão de chances é definida como a chance de um candidato sem estresse ser aprovado em relação à chance de outro candidato com presença de estresse ser aprovado, para indivíduos de mesma idade. Assim, a razão de chances estimada obtida entre um participante sem estresse e um com estresse foi de e0,72o = 2,05, ou seja: um candidato sem presença de estresse tem aproximadamente duas vezes mais chance de ser aprovado em relação a um candidato com presença de estresse, considerando indivíduos de mesma idade. O intervalo de confiança para esse valor é dado por: [1,08; 3,90], com 95% de confiança.

Na sequência, analisou-se a probabilidade de o participante ser aprovado nas duas fases do exame, considerando-se que apenas 66 candidatos prestaram a segunda fase do exame e, destes, 23 foram aprovados, dos 237 participantes iniciais. Da mesma forma como na análise para os resultados da primeira fase da OAB, foi aplicado o Modelo de Regressão Logística no intuito de verificar quais variáveis poderiam ser consideradas significativas para o sucesso dos participantes nas duas fases do exame.

Os resultados demonstraram que as variáveis que se mostraram significantes para o resultado de aprovação nas duas fases do exame foram: idade e grau de ansiedade-traço, ao nível de significância de 5%. Verificou--se também que, à medida que a idade e o grau de ansiedade aumentam, a probabilidade de aprovação diminui em ambas as fases – isto pode ser verificado pelo sinal negativo dos parâmetros.

A sensibilidade do modelo foi de 78,3%: 18 candidatos foram classificados como aprovados pelo modelo e 23 foram realmente aprovados nas duas fases – o que significa o quanto o modelo acertou dentro do grupo dos aprovados. A discriminação foi de 63,3%: 150 candidatos foram classificados de maneira correta pelo modelo, dos 237 participantes, o que significa o quanto o modelo acertou de reprovados e aprovados dentro da amostra.

 

Discussão

Os índices de estresse e ansiedade que a população estudada apresentou demonstram que a situação dos bacharéis em Direito, em fase de prestação do exame de habilitação profissional, representa um agente estressor para a maioria dos candidatos. Trata-se de uma situação na qual a perspectiva de aprovação é baixa: a pesquisa demonstrou 80% de insucessos anteriores. Embora não dispuséssemos de outras pesquisas sobre essa categoria profissional, existem evidências da relação entre estresse e desempenho acadêmico, como demonstrado no estudo sobre estresse entre estudantes pré-vestibulandos, desenvolvido por Rolin (2003).

Ao se relacionar estresse, ansiedade e desempenho acadêmico, observa-se um percentual maior de aprovação entre os participantes com grau menor de ansiedade e estresse. Como descreve Lipp (2003), ocorre piora no desempenho eficiente causado por sintomas de estresse, tais como a diminuição da concentração, da atenção e da memória de curto e médio prazo, perdas de estratégias de planejamento e diminuição da autoestima. Considerando a dinâmica fundamentalmente biológica que caracteriza o processo de estresse e as suas consequências - aumento na predisposição a doenças, no caso de o estresse ser patológico - programas de gerenciamento e prevenção devem ser fundamentais também para promover saúde, como parte importante da Medicina Preventiva (Shapiro, Shapiro & Schwartz, 2000).

Quando foram avaliadas as probabilidades de êxito na primeira fase do exame da OAB diante das variáveis: ansiedade-traço, ansiedade-estado, autoeficácia, estresse e idade, os cálculos resultaram numa chance de aprovação duas vezes maior para o candidato que não tem estresse em relação ao candidato que tem estresse, considerando indivíduos de mesma idade. Para os participantes que realizaram as duas fases do exame da OAB, demonstrou-se que existe uma probabilidade menor de aprovação conforme o grau de ansiedade-traço e/ou a idade aumentam. Esses dados corroboram com os resultados obtidos pela pesquisa de Correia e Rocha (2000), demonstrando que o aprendizado é dificultado quando a ansiedade aumenta significativamente.

A presença de estressores externos, tais como o grau de complexidade das provas e a sua importância profissional, somada à maneira como a situação é, individualmente, interpretada, constitui um desafio relacionado ao gerenciamento da ansiedade. A ansiedade é uma resposta de adaptação a uma situação que dependa do desempenho (Andrade e cols., 2001) e promove aumento de motivação ocasionado pela atuação dos hormônios relacionados ao eixo HPA (Lipp & Malagris, 2001). Porém, o aumento dos seus índices dificulta seu gerenciamento, o que pode ser observado nas correlações positivas entre os índices de ansiedade-traço, o aumento dos sintomas de estresse e as reprovações. Esses dados corroboram resultados obtidos nas pesquisas de Coes (1991) e Ferreira (2004) sobre ansiedade e desempenho acadêmico.

As correlações entre os índices de autoeficácia e os graus de estresse e ansiedade também indicam a influência significativa desta variável no desempenho acadêmico. O fato de a maioria dos participantes que foram reprovados terem apresentado valores baixo de autoeficácia confirmam os estudos de Bandura (1997), Barrera (2010), Nunes (2008) e Sá (2006), que indicam ser provável que crenças de ineficiência provoquem aumento de ansiedade e estresse, prejudicando o desempenho acadêmico.

Conclusão

Os resultados indicam que a hipótese de que o exame da OAB representa um agente estressor relevante demonstrou-se confirmada, tanto pelos índices altos de estresse – 71% da amostragem que apresentou sintomas significativos de estresse, quanto pela relação entre desempenho e estresse. A análise inferencial demonstrou que um candidato sem sintomas significativos de estresse tem duas vezes mais chance de ser aprovado do que um candidato com sintomas significativos de estresse para indivíduos da mesma idade.

A variável idade também se mostrou significativa em relação à aprovação no exame da OAB – apenas 13% das pessoas com 40 anos ou mais passaram na primeira fase do exame enquanto 35% das pessoas com 26 anos ou menos foram aprovadas. Este estudo não obteve parâmetro para hipotetizar as causas da influência da idade porque não houve registro de parâmetros, tais como a quantidade de insucessos anteriores ou a utilização de remédios, entre outras possibilidades.

Com relação a gênero, as mulheres obtiveram um percentual de aprovação maior do que os homens – 58% no grupo de aprovados. Os candidatos dos cursos matutinos obtiveram um índice de aprovação maior do que os alunos dos cursos noturnos. Este trabalho aponta para a necessidade da realização de novas pesquisas, principalmente para a avaliação das variáveis gênero e período cursado, em relação ao desempenho no exame da OAB, porque ocorreu uma diminuição significativa na amostragem dos participantes que passaram na segunda fase do Exame - dos 237 bacharéis que realizaram a primeira fase do exame, apenas 23 foram aprovados na segunda fase.

Os participantes com os menores índices de ansiedade-traço obtiveram um percentual maior de aprovação nas duas fases do exame. As correlações entre os níveis de estresse, ansiedade e crenças de autoeficácia demonstraram que quanto maior é o índice de estresse, maior o da ansiedade (ansiedade- -traço e ansiedade-estado) e menor o da autoeficácia.

 

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Recebido em dezembro de 2010
1ª reformulação em maio de 2011
2ª reformulação em outubro de 2011
Aceito em dezembro de 2011

 

 

Sobre os autores:

Tânia Mara Brito Loricchio: BPsicóloga. Pesquisadora do Departamento de Psicobiologia, Unidade de Medicina Comportamental, da Escola Paulista de Medicina.
José Roberto Leite: Psicólogo. Livre Docente pela Escola Paulista de Medicina. Professor adjunto IV da Universidade Federal de São Paulo.


1Orientador da pesquisa.