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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. v.5 n.2 Florianópolis dez. 2005

 

ARTIGOS

 

Mobbing(assédio psicológico): relações com transtornos mentais e copingem trabalhadores do gasoduto Brasil-Bolívia

 

Mobbing: relationship between mental disorders and coping in Brazil-Bolívia gas pipeline workers

 

 

Liliana A. M. GuimarãesI; Éveli Freire VasconcelosII; Paulo Renato AndradeIII; Ignez Charbel StephaniniIV; Renata Marques RegoV

IDoutora em Saúde Mental pela Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP-SP. Docente do Curso de Mestrado em Psicologia da Universidade Católica Dom Bosco - UCDB/MS. Professora colaboradora do Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP. Coordenadora do Núcleo de Estudos Multidisciplinares em Psicologia (NEMPSI) e do Laboratório de Saúde Mental, Qualidade de Vida e Trabalho da UCDB/MS e da UNICAMP (lguimaraes@mpc.com.br)
IIMestre em Psicologia pela UCDB. Docente do Curso de Psicologia da UCDB e da UNIGRAN/ DOURADOS/MS. Membro do Laboratório de Saúde Mental e Qualidade de Vida no Trabalho da UCDB/MS, ligado ao curso de Mestrado em Psicologia e Núcleo de Estudos Multidisciplinares em Psicologia (NEMPSl) (evelivasconcelos@uol.com.br)
IIIMestre em Psicologia pela UCDB. Docente do Curso de Fisioterapia da UCDB e da Faculdade Estácio de Sá de Campo Grande/MS. Membro do Laboratório de Saúde Mental e Qualidade de Vida no Trabalho da UCDB/MS, ligado ao curso de Mestrado em Psicologia e Núcleo de Estudos Multidisciplinares em Psicologia (NEMPSI) (prafisio@terra.com.br)
IVPsicóloga. Mestre em Psicologia pela UCDB. Membro do Laboratório de Saúde Mental e Qualidade de Vida no Trabalho da UCDB/MS, ligado ao curso de Mestrado em Psicologia e Núcleo de Estudos Multidisciplinares em Psicologia (NEMPSI) (ignezstephanini@uol.com.br)
VPsicóloga. Membro do Laboratório de Saúde Mental e Trabalho do DPMP/FCM/UNICAMP (renatamarquesrego@yahoo.com.br)

 

 


RESUMO

o Mobbing(assédio psicológico no trabalho) tem sido considerado um importante fator psicossocial de risco à saúde física/mental do trabalhador. Pesquisas têm mostrado que características do trabalhador/trabalho estão associadas ao desenvolvimento do Mobbing.Este estudo objetiva determinar a prevalência e níveis de Mobbinge sua relação com a presença de Suspeição Transtornos Mentais (STM) e Coping.Uma amostra de 74 trabalhadores do gasoduto Brasil-Bolívia respondeu ao Leymann Inventory Psychological Terrorization(LIPT), ao Questionário de Morbidade Psiquiátrica do Adulto (QMPA) e à Escala de Copingde Billings & Moos (BMCS). Encontrou-se uma elevada prevalência de STM (30,9%) e de Mobbing(19,1 %). A maioria dos participantes (80,9%) utilizou o método de Coping ativo-cognitivo (focado no problema) e este não foi correlacionado com presença de Mobbingede STM. O Mobbingno trabalho foi correlacionado significativamente com STM, o que indica que o mesmo está presente como fator psicossocial de risco para a ocorrência de Transtornos Mentais.

Palavras-chave: Mobbing;assédio psicológico no trabalho; assédio moral; coping;transtornos mentais.


ABSTRACT

Mobbing or psychological harassment in the workplace has been considered an important psychosocial risk factor, bringing harm ful effects to the worker's physical/mental health. Researches have demonstrated that characteristics of the workplace/worker are associated with the development of Mobbing. This study aims to investigate the prevalence and level of Mobbing and its relationship with Mental Disorders and Coping. A sample of 74 workers of the Brazil-Bolivia gas pipeline replied to the Leymann Inventory Psychological Terrorization (LIPT), the Adult Psychiatric Morbidity Questionnaire (QMPA) and the Billings and Moos Coping Scale (BMCS). High prevalence of Suspected Cases of Mental Disorders (SCMD) (30.9%) and Mobbing (19.1 %) was found. Most of the participants (80.9%) used the cognitive - active Coping method focusing on the problem. Mobbing was significantly associated with SCMD, which indicates that the former is a psychosocial risk factor for Mental Disorders.

Keywords: Mobbing; psychological terrorization; coping; mental disorders.


 

 

1. Introdução

1.1 Mobbing

Uma nova concepção sobre o universo do trabalho supõe que, juntamente com os já bem estabelecidos riscos tradicionais para as doenças profissionais ou acidentes de trabalho do tipo traumático, novos riscos têm aparecido e que implicam em novas formas de adoecimento, os denominados fatores psicossociais de risco, relacionados diretamente à organização do trabalho.

Alguns fatores de risco são mais dificeis de detectar e se manifestam através de processos psicológicos (e.g., estresse) podendo ocasionar conseqüências biopsicossociais deletérias ao trabalhador. Um fenômeno que, nos últimos anos, tem colocado em evidência a necessidade da realização de avaliações dos riscos psicossociais nos ambientes de trabalho é o Mobbing,ou assédio psicológico no trabalho.

Mobbing é um termo introduzido na década de 1980 por Leymann, na Suécia, e utilizado no contexto ocupacional, sendo uma forma de violência psicológica (Leymann, 1996; Leymann e Gustafsson, 1996). O Mobbing pode existir em todos os cenários ocupacionais, com variações, a depender da cultura e, em particular da cultura organizacional (Hiriegoyen, 2001).

São várias as expressões para designar o fenômeno: Mobbing(molestar) - Estados Unidos, países nórdicos, bálticos e da Europa Central; Assédio moral, assédio psicológico, Mobbing-Brasil; Harcèlementmoral (assédio moral) - França; Bullying, Bossing, Harassment(tiranizar)- Inglaterra, Austrália; Murahachibu(ostracismo social) - Japão; Coacção moral-Portugal; Acoso moral, acaso psicológico ou psicoterroâsmo- países hispânicos (Guimarães e Rimoli, 2005).

Mobbing é

[ ... ] o fenômeno em que uma pessoa ou grupo de pessoas exerce violência psicológica extrema, de forma sistemática e recorrente ao menos uma vez por semana e durante no mínimo 6 meses-sobre outra pessoa ou grupo: de pessoas no local de trabalho, com o objetivo de destruir sua rede de comunicações. sua reputação, seu exercício profissional e conseguir que final mente essa(s) pessoa(s) acabe(m) se demitindo (Leymann, 1996, p.165).

Esta definição exclui aqueles conflitos passageiros e localizados em um momento concreto, dado que, esses são inevitáveis no contexto das relações humanas e, portanto, no contexto ocupacional.

Existe Mobbing quando ocorre 1 ou vários dos 45 comportamentos hostis descritos no Leymann Inventory of Psychological Terrorization (LIPT)- instrumento desenvolvido por Leymann em 1982.

Leymann (1996) classifica as estratégias de Mobbingem cinco grupos: (1) limitação da comunicação - o assediador impõe com sua autoridade aquilo que pode ser dito ou não. À vítima é negado o direito de se expressar ou de se fazer ouvir; (2) limitação do contacto social - não se dirige a palavra à vítima, procurando além disso que ninguém o faça. São cortadas suas fontes de informação, e é imposto um isolamento físico de seus companheiros; (3) desprestigiar a pessoa perante seus colegas - brincadeiras, gozações e humilhações sobre a vítima, sua família, origens, antecedentes e meio; (4) Desacreditar a capacidade profissional - À vítima se atribui tarefas muito acima ou abaixo de sua capacidade, ou não lhe é permitido que faça nada, criticam-se seus menores erros ou defeitos, deprecia-se seu trabalho e suas competências; (5) comprometimento da saúde - além dos ataques diretos, a simples submissão a uma situação de Mobbingjá tem efeitos negativos, psicológicos e psicossomáticos, embora o que se avalie no LIPT sejam as condutas do (s) assediador (es) e não sua repertussão no assediado.

Uma prevalência de 3,5% de Mobbingna população trabalhadora sueca foi identificada por Leymann e Tallgren (1989). Os estudos realizados pelos autores fizeram com que uma lei sobre as condições de trabalho, se viabilizasse na forma de um decreto específico sobre a vitimização no trabalho em 1994. O Mobbing é considerado um fator psicossocial de risco à Saúde Mental do trabalhador que tem apresentado uma incidência cada vez mais elevada (Piñuel e Zabala, 2002; Di Martino, 2005; Chapell e Di Martino, 2001; Di Marino, Hoel e Cooper, 2003).

O conceito continuou a ser difundido nos anos de 1990 entre investigadores que trabalham no campo do estresse ocupacional, sobretudo nos países escandinavos e logo a seguir nos países de língua alemã. Em 1993, Leymann publica o livro"Mobbing:a perseguição no trabalho", tendo o mesmo sido traduzido para vários idiomas, mas não para o português.

Nos países escandinavos (Suécia, Dinamarca, Finlândia), na Suíça e Alemanha segue-se utilizando o termo Mobbinge esta linha de investigação continua ativa. Na Alemanha, o principal pesquisador sobre Mobbingé o professor Zapf da Universidade de Frankfurt (Zapf, 1999; Zapfe Einarsen, 2003). O presente estudo adota, portanto, a denominação Mobbingda linha escandinava, a conceituação e abordagem original de Leymann (1996) sobre o fenômeno propondo, no entanto, algumas variações relacionadas à forma de correção e interpretação do LIPT.

1.2 Suspeição para Transtornos Mentais (STM)

Nessa investigação, definiu-se Transtorno Mental como "[...]o conjunto de transtornos psiquiátricos incluídos e definidos na Classificação Internacional de Doenças - CID - 10ª Revisão" em consonância com o Questionário de Morbidade Psiquiátrica do Adulto (QMPA), instrumento utilizado neste estudo para detectar STM.

No Brasil, através da utilização do QMPA, validado para uso em populações ativas por Guimarães (1992) encontrou-se uma prevalência anual para suspeição de Transtornos Mentais (TM) de 15,8% em trabalhadores de mineração de ferro da cidade de Itabira, MG. Outro estudo em nosso meio utilizando o mesmo instrumento (com validação para população geral), em uma amostra de 108 trabalhadores de uma indústria farmacêutica da cidade de São Paulo, obteve 43,4% de prevalência para TM, sendo esta maior em mulheres (62,7%) do que em homens (25,5%). Não foi observada diferença na ocorrência de TM quando considerados a idade e os diferentes se tores da fábrica (Rêgo, 1993).

1.3 Coping

o Copingpode ser definido como

[ ... ] estratégias utilizadas pelo indivíduo no enfrentamento de eventos estressantes, internos ou externos, com o objetivo de administrar suas reações de estresse ou modificar alguma ocorrência ambiental, avaliada pelo mesmo como excessiva para seus recursos (Billings e Moos, 1991; Folkman, 1986, p. 992).

Várias definições sobre Copingforam examinadas (Folkman, 1986; Latack e Halvlovic, 1992; Lazarus e Folkman, 1984; Tamayo e Tróccoli, 2002) concluindo-se que existe consenso de que esse fenômeno advém da interação pessoa-ambiente, quando o indivíduo avalia uma situação como estressante e seus recursos são avaliados como insuficientes para enfrentá-la (Latack e Havlovic, 1992).

Existem três tipos de método de Coping,descritos a seguir: (1) ativo-cognitivo - ênfase no controle do valor da situação de estresse (lado positivo/experiências anteriores) atitude positiva; (2) ativo-comportamental - ênfase no comportamento diretamente relacionado com a situação de estresse (vê o problema e seus efeitos/tomada de decisão rápida); (3) evitação-fuga - ênfase na evitação do problema (evita confronto, busca meios alternativos para aliviar a tensão, comer, fumar, preparar-se para o pior, guardando seus sentimentos para si) (Billings e Moos, 1991).

Lazarus e Folkman (1984) consideram dois os focos de Coping:(1) focado no problema - utilização de esforços cognitivos e comportamentais para modificar ou administrar a origem do problema, analisando e definindo a situação, considerando os seus custos e beneficias, buscando alternativas para resolvê-las; focado na emoção - utilização de esforços cognitivos e comportamentais dirigidos a reduzir ou administrar o estresse emocional, objetivando manter a esperança e o otimismo, negando a situação quanto as suas conseqüências ou atuando como se as circunstâncias não importassem.

Alguns autores (Gil-Monte e Peiró, 1997; Tamayo e Tróccoli, 2002) referindo-se à relação entre Burnout e Coping afirmam que o uso de estratégias de Coping centradas no problema (de controle) previne o desenvolvimento do Burnoutenquanto que a utilização de estratégias de escape, evitação ou centradas na emoção, facilitam sua aparição. Outros autores (Tamayo e Tróccoli, 2002; Cordes e Dougherty, 1993; Guimarães e Vasconcelos, 2004) acrescentaram que a disponibilidade de recursos de Copingmodera a relaçao entre os estressores (e.g., Mobbing)e a exaustão emocional.

O objetivo deste estudo foi identificar a presença de Mobbing(assédio psicológico no trabalho), de STM e os métodos e focos de Coping apresentados pela amostra de estudo, bem como, sua relação, utilizando-se escalas multifatoriais adaptadas à realidade brasileira.

 

2. Casuística e Método

2.1 Locusde Pesquisa: Gasoduto Brasil-Bolívia

O objetivo principal da construção do gasoduto foi atender a necessidade de mudança da matriz energética brasileira, contribuindo para o aumento de consumo do gás natural. Entre as possíveis alternativas de importação analisadas pela Petrobrás, o gás natural boliviano mostrou-se a mais viável: abundância nas reservas do país, alto poder de queima do gás e a proximidade com o Brasil (Instituto Ethos, 2005).

A construção do Gasoduto Bolívia-Brasil (GBB) atravessa 135 municípios, 5 estados (Mato Grosso do Sul, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul), num trecho de 2.593 quilômetros de extensão do território brasileiro que entrou em operação em junho de 1999. No Mato Grosso do Sul, o GBB corta 700 km do Estado, passando por quatro diferentes unidades ambientais: o Pantanal, a região do planalto, a região do cerrado e as áreas próximas ao rio Paraná (Instituto Ethos, 2005).

Durante os quatro anos de sua construção, foram investidos cerca de US$ 1.7 bilhão no projeto, em solo brasileiro, dos quais US$ 30 milhões em ações sócio-ambientais. A construção do GBB tem gerado 25 mil empregos diretos e indiretos e cerca de dez mil pessoas trabalharam diretamente na obra (Instituto Ethos, 2005).

2.2 Sujeitos

Participaram do estudo todos os 74 trabalhadores em linha (trecho Corumbá) do GBB, sediados em Corumbá, MS. Destes, 97,3% são do gênero masculino e a maioria (23%) é composta por ajudantes gerais.

2.3 Procedimentos

Depois de obtida a autorização da empresa para a viabilização do estudo, os participantes foram contatados individualmente pelos pesquisadores. Todos os trabalhadores foram convidados a assinar o Termo de Consentimento Livre e Informado e preencher os 3 instrumentos de auto-aplicação (apresentados na próxima seção), em uma única etapa. Cabe ressaltar que quando ocorreram problemas relativos à compreensão do conteúdo das medidas aplicadas, ou o fato de o trabalhador ser analfabeto, a aplicação foi feita de maneira assistida. Não houve recusa quanto à participação. A coleta de dados em campo foi realizada no mês de junho de 2004.

2.4 Instrumentos

Leymann Inventory of Psychological Terrorization(LIPT) (Leymann e Tallgren, 1989): composto por 45 questões dicotômicas tipo S/N. Detecta a ocorrência e os níveis de Mobbing.Um únicocomportamento assinalado entre os 45 apresentados (ocorrido pelo menos 1 vez por semana, durante o período mínimo de 6 meses) coloca o participante como vivenciando Mobbing.Diferentemente, no presente estudo (parte integrante da amostra composta para a validação brasileira que está sendo realizada pelos autores deste estudo) optou-se por classificar os níveis de Mobbingem: leve, moderado e grave, sendo que, o nível leve equivaleria na classificação de Leymann ao indivíduo estar exposto ao Mobbing.

Questionário de Morbidade Psiquiátrica para Adultos (QMPA) (Santana, 1992): validado para uso em populações ativas no Brasil, versão utilizada no presente estudo. Compõe-se de 43 questões dicotômicas (tipo S/N) e seu objetivo é detectar a STM. Neste questionário, considera-se "Suspeitos" os indivíduos com escore global > sete (7) ponto de corte e "Não suspeitos" todos os indivíduos com escores globais < sete (7). Contêm questões que agrupam enfermidades em seis principais grupos sindrômicoso neuroses, psicoses, alcoolismo e outras adições, síndromes orgânico-cerebrais, deficiência Mental (oligofrenias) e sem anormalidade psiquiátrica evidente.

Escala de CopingdeBillings & Moos (BMCS) (Billings e Moos, 1991): traduzida, adaptada e validada para uso no Brasil (Guimarães, Coelho e Freire, 2005) em uma amostra composta por 466 estudantes universitários da cidade de Campo Grande/ MS. Obteve-se um α = O, 72, indicando uma boa consistência interna do instrumento. Tem por objetivo identificar o método e o foco de Copingutilizados no enfrentamento de eventos estressantes, tais como o Mobbing.Compõe-se de 19 questões dicotômicas (tipo S/N).

2.5 Análise dos dados

Realizou-se uma análise preliminar visando a identificação dos valores extremos. Foram identificados 3 casos (extremos) multivariados por meio da distância de Mahalanobis(α = 0,001) que não foram considerados nas análises. Foram também feitas, análise exploratória de dados, correlações lineares de Pearsone regressões múltiplas entre os instrumentos, o teste t de Swdente a ANOVA para as análises comparativas. O softwareestatístico utilizado para a análise dos dados foi o MINITAB para Windows - versão 14.13.

2.6 Aspectos éticos

o presente estudo, para sua viabilização, cumpriu todos os preceitos preconizados pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP), Resolução n. O 16/2000, de 21 de dezembro de 2000 e pelo Conselho Nacional de Saúde para pesquisa junto a seres humanos e pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) Resolução n. 196, de 10 de outubro de 1996. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Católica Dom Bosco (UCDB-MS).

 

3. Resultados

As correlações lineares de Pearson(Tabela 1) mostram que o Mobbing no trabalho está correlacionado à STM (p < 0,05). As correlações do LIPT e do QMPA com a Escala de Copingforam baixas e não significativas.

 

 

A Tabela 2 mostra que a maior parte dos trabalhadores do gasoduto Brasil-Bolívia refere sofrer Mobbinuno trabalho (79,4%), sendo 41 (60,3%) forma leve, 10 (14,7%) moderada e 3 (4,4%) forma grave. A prevalência para STM foi de 30,9%. O método de Copingmais utilizado foi o ativo-cognitivo focado no problema (80,9%).

 

 

As correlações entre o instrumento de Copinge o LIPT foram muito baixas e não significativas, Para o QMPA, as correlações foram um pouco maiores, porém não significativas. Não foram encontradas diferenças significativas entre participantes suspeitos ou não para TM com relação ao Mobbing(teste t de Student;p = 0,096), Com relação às estratégias de Coping,não foram encontradas diferenças significativas entre a utilização de distintos focos (teste t de Student;p = 0,857) e métodos (ANOVA; p = 0,703) com relação à ocorrência de Mobbing.

Também não foram encontradas diferenças significativas entre o método de Coping utilizado no enfrentamento e manejo do Mobbing com relação a STM (ANOVA; p = 0,263). Também não foram encontradas diferenças significativas entre os focos de Coping utilizado no manejo do Mobbing com relação a STM (teste t de Student;p = 0,426).

Foi realizada análise de regressão linear múltipla para verificar o poder de predição da STM e métodos de Coping com relação à ocorrência de Mobbing.A análise da primeira regressão linear múltipla (Tabela 3) evidencia que apenas 5,3% da variância do Mobbingno trabalho é explicada pelas variáveis STM e método-foco de Coping.Deve-se observar, no entanto, que apenas a variável STM contribuiu significativamente para a variância explicada.

 

 

A análise da segunda regressão linear múltipla (Tabela 4) mostra que a variância do Mobbingnão é explicada pelos fatores das variáveis STM, método-foco de Coping.

 

 

4. Discussão

Foi encontrada uma prevalência anual de Mobbingde 19,1%, não tendo sido incluídos os casos com Mobbingleve (a maioria 60,3%). Obteve-se 14,7% de Mobbingo moderado e 4,4% de grave, índices considerados para o cálculo geral da prevalência.

Cabe ressaltar que as investigações que têm sido realizadas sobre o tema baseiam-se em diferentes conceituações (Mobbing,violência no trabalho, bullying,entre outros) e métodos, tornando dificil a realização de estudos comparativos.

Estudo realizado na Espanha (Piñuel e Zab ala, 2002) revela uma prevalência de 11,4%; a ILO (Di Martino, 2005; Chapell e Di Martino, 2001) uma taxa de 5% e em 2000, um aumento para 7% (Di Martino, Hoel e Cooper, 2003).

A European Foundation for theImprovement of Living and Working Condition(2005) refere que a avaliação da violência no trabalho entre 1996 e 2000, em sete países da União Européia, (participantes do European Working Conditions Survey and National Surveys)mostra consenso quanto ao gênero feminino sofrer mais violência no trabalho que o masculino e que, houve um aumento da prevalência de 7% para 11%, sobretudo em ocupações ligadas à saúde e à educação.

A prevalência de Mobbing identificada no presente estudo (19,1%), portanto, é superior à encontrada em outros países, concluindo-se por uma prevalência elevada. Se considerada a classificação original (Leymann, 1990) a prevalência teria que estar composta por todos os níveis (leve, moderado e grave) perfazendo 70,9%, índice não assumido como prevalência global encontrada no presente estudo, mas que aponta para o fato de que outras investigações deverão ser feitas com a mesma amostra, para confirmação ou não, dos altos índices obtidos. Em nosso meio inexistem estudos com conceituação e metodologia similar, inviabilizando comparações com taxas de prevalência nacionais.

Encontrou-se uma prevalência anual de STM de 30,9% na amostra estudada. Comparado a estudos realizados com outros grupos ocupacionais, utilizando-se o mesmo instrumento (QMPA) e delineamento de uma etapa (screening),este índice foi aproximadamente o dobro daquele obtido por Guimarães (1992), 15,6% e menor do que o encontrado por Rêgo (1993) em trabalhadores de uma indústria farmacêutica do Estado de São Paulo (43,4%).

Cabe acrescentar que a versão do QMPA utilizada no presente estudo foi validada para uso específico em populações ativas, apresentando os seguintes índices: sensibilidade, 95,8%; especificidade, 97,1%; e Taxa de Classificação Incorreta, 3,1%, considerados robustos do ponto de vista psicométrico, o que talvez tenha possibilitado resultados mais fidedignos que aqueles obtidos por Rêgo (1993). Por outro lado, estudos internacionais (Kesessler e Frank, 1997; Lehtinen, Riikonen e Lehtinen, 2005) mostram uma prevalência entre 18,2 e 20% para TM em trabalhadores adultos., semelhante à obtida no presente estudo, podendo-se dizer que esta taxa (30,9%) foi efetivamente alta.

Andreoli (1997) refere que os seguintes componentes - ansiedade, depressão, alcoolismo - mostram uma pobre capacidade de predição dos diagnósticos clínicos correspondentes, apresentando melhor desempenho quando as variáveis demográficas são incluídas no modelo de predição. Quanto aos resultados do QMPA, o autor acrescenta ainda que as manifestações psicopatológicas representadas pelos três componentes, anteriormente citados, podem ser interpretadas como expressões de estresse não específico.

No entanto, considerando-se a finalidade e a limitação do presente artigo, pode-se dizer que o QMPA foi utilizado em uma única etapa (de rastreamento para suspeição), não tendo sido realizada entrevista clínico-psiquiátrica (padrão-ouro) para confirmação da existência ou não de "caso psiquiátrico". Não foram também realizadas análises buscando-se associações dos instrumentos utilizados com as variáveis sociodemográficas e categorias ocupacionais, sendo estas, objetivo de próximas publicações.

O método de Copingmais utilizado pela amostra de estudo (80,9%) foi o ativo-cognitivo (tentativa de controle da situação estressora com base em experiências anteriores, com uma atitude positiva), com foco no problema (utilização de esforços cognitivos e comportamentais para modificar ou administrar a origem do problema, analisando a situação e considerando seus custos e benefícios, buscando alternativas para resolvê-la). Pode-se dizer que os trabalhadores da amostra têm enfrentado o Mobbingno trabalho, de forma ativa, buscando alternativas para resolvê-lo, o que pode ser considerado como bom prognóstico relacionado à sua Saúde Mental (Guimarães e Vasconcelos, 2004).

O Coping tem duas funções: (1) modificar a relação entre a pessoa e o ambiente, controlando; ou (2) alterar o problema causador de distress(estresse negativo) adequando a resposta emocional ao problema (Lazarus e Folkman, 1984; Tamayo e Tróccoli, 2002). Um Copingcom foco no problema, como o apresentado pela maioria dos participantes do presente estudo, é mais provável de ocorrer quando o evento estressor (no caso, o Mobbing)é avaliado como sendo de fácil controle e manejo. Um Copingcentrado na emoção é mais passível de ocorrer quando há uma avaliação de que nada pode ser feito para modificar as condições de dano, ameaça ou desafio ambientais, o que não ocorreu nesta investigação.

Dadas as propriedades psicométricas da Escala de Copingde Billings & Moos (Coping geral) obtidas na validação brasileira, indicando uma boa consistência interna (α = 0,72) e sua rapidez de preenchimento através de 19 respostas dicotômicas (S/N), optou-se por sua utilização nesta amostra de trabalhadores, apesar de sua não especificidade em contextos ocupacionais.

As medidas de Copinggeral como a de Billings e Moos (1981) utilizada neste trabalho não levam em conta os fatores contextuais específicos e, quando o fazem, utilizam episódios de diferentes tipos, aos quais as pessoas devem se reportar para identificar a estratégia de Coping que utilizariam. A maior parte das medidas que avalia estratégias de Copingé aplicável a uma variedade de estressores da vida, não estritamente à área ocupacional (Terry, 1994).

É possível, que a assertiva acima explique em parte os dados obtidos nesta investigação, que mostram que, tanto o método, quanto o foco de Copingutilizados pela amostra não estiveram associados a uma maior ou menor exposição ao Mobbingeà STM, o que seria esperado. Supunha-se, inicialmente, que o tipo de método e o foco de Coping utilizados poderiam atuar como fator de proteção ou de risco à maior ou menor exposição ao Mobbinge à STM. Pode-se considerar, portanto, que a não especificidade do instrumento de Coping para o contexto ocupacional, possa explicar em parte os resultados obtidos. Outros estudos deverão ser viabilizados utilizando medidas específicas de Coping ocupacional.

Nesta direção, no contexto ocupacional pode-se obter uma melhor compreensão dos processos adaptativos (Parkes, 1994), utilizando-se para tanto, instrumentos construídos especificamente para avaliar o Copingno trabalho, como a Escala de CopingOcupacional de Latack, já validada para nosso meio (Leiter, 1991; Latack, 1986).

 

5. Conclusões

Foi obtida uma alta prevalência de STM (30,9%) e de Mobbing(19,1%). Encontrou-se associação significativa entre Mobbingno trabalho e STM, pois o primeiro pode contribuir para a ocorrência do segundo. O método e o foco mais utilizados pelos participantes do estudo foram o ativo-cognitivo, centrado no problema (80%). Neste estudo, tanto o método como o foco de Copingnão foram identificados como fatores de risco ou de proteção à exposição para a ocorrência ou não de Mobbinge STM.

A alta prevalência de STM encontrada e a existência de correlação entre Mobbinge Suspeição para TM, alertam para a magnitude do problema do Mobbing na amostra de trabalhadores estudados, como uma, entre outras variáveis a serem consideradas no entendimento da dinâmica de interação trabalhador/trabalho e suas repercussões na Saúde Mental.

Os achados obtidos poderão auxiliar os profissionais das áreas da Saúde Mental e do Trabalho, bem como as empresas, no refinamento do diagnóstico clínico e organizacional, individual e coletivo dos trabalhadores, e apontam para a necessidade da implantação de medidas e intervenções apropriadas para seu adequado enfrentamento.

 

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Recebido: 08/05/06
Revisado: 25/08/06
Aceito: 20/10/06

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