SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.8 número1Redes sociais e mudança em um grupo de produtores rurais do planalto centralInfluencia del número de competidores en la preferencia de estímulos publicitarios índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

artigo

Indicadores

Compartilhar


Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. v.8 n.1 Florianópolis jun. 2008

 

ARTIGOS

 

Maestros da vida: a influência dos fenômenos mentoria e redes sociais nos executivos de uma empresa de transportes1

 

Conductors of life: the influence of the mentoring and social network phenomena on executives of a transportation company

 

 

Denise Clementino de SouzaI; Sônia Maria Rodrigues Calado DiasII

IUniversidade Federal de Pernambuco denisesouza@ufpe.br
IIFaculdade Boa Viagem soniacaladodias@gmail.com; srcalado@fbv.br

 

 


RESUMO

Esse artigo buscou analisar como os fenômenos mentoria e redes sociais, em conjunto, influenciam no desenvolvimento de executivos. A pesquisa é de base qualitativa e usou como metodologia a história de vida oral. Foi realizada através da rede de mentores de um executivo de uma empresa do segmento de transportes, com atuação nacional e internacional. Foram utilizadas a análise de conteúdo e o software UCINET 6, para dar suporte à construção das redes sociais. Os resultados indicam que a rede de mentores ajuda no desenvolvimento dos profissionais mentorados, dando suporte tanto em aspectos relacionados à carreira, quanto psicossociais, o que causa um diferencial na vida desses executivos. De um modo geral, o estudo contribuiu para um melhor entendimento dos fenômenos mentoria e rede social na realidade brasileira.

Palavras-chave: mentor, mentoria, redes sociais, UCINET 6.


ABSTRACT

The objective of this paper was to analyze how mentoring and social network phenomenon influences the executive development. The research was based in a qualitative perspective and used as methodology the oral life history. It was based in an executive's networking who is a partner and president of a transportation company with national and international actuation. The data analysis technique used was the content analysis and the UCINET 6 software was used to support the networking construction. The current study has concluded that the mentor networking has a positive influence in professional and personal executives development. In general, this study contributed to understand better the mentoring and networking relationships phenomenon in the Brazilian reality.

Keywords: mentor, mentoring, social network, UCINET 6.


 

 

Introdução

O fenômeno mentoria, do inglês mentoring, é o apoio técnico e psicossocial dado por um indivíduo a outro em sua carreira (Noe, 1988). Tradicionalmente, o mentorado, aquele que recebe apoio na carreira, descreve seu mentor como alguém excepcional, mais velho, mais experiente e ocupando nível hierárquico mais alto na organização. Em muitas relações formais, como nas de orientador e orientando, e de médico e residente, a mentoria pode fazer parte do processo de aprendizagem. Essa aproximação e o trabalho lado a lado com um sênior ajudam e instruem o mentorado por um determinado período de tempo (Janasz, Sullivan, & Whiting, 2003).

Especialistas concordam que indivíduos com mentores ganham salários mais altos, estão mais satisfeitos com o trabalho, conseguem mais promoções e são mais comprometidos. Além dos benefícios na carreira, o mentorado recebe suportes que abrangem seu senso de identidade e competência interpessoal. O mentor também tem benefícios em aspectos, como: rejuvenescimento da carreira, despertar para a criatividade, energia e satisfação, novos conhecimentos, status organizacional, reconhecimento pelo desenvolvimento de talentos, aprendizagem social e emocional, feedback e suporte do mentorado (Janasz, Sullivan, & Whiting, 2003).

Contudo, as pesquisas empíricas, em geral, têm focado as relações singulares ou primárias de mentoria, ou seja, as relações que estão baseadas no primeiro mentor nomeado, ou na primeira pessoa considerada pelo mentorado. Esses estudos focam essa primeira experiência, em detrimento das configurações de relacionamentos que ocorreram simultaneamente, além de priorizarem a perspectiva do mentorado (Higgins & Kram, 2001).

No entanto, Higgins e Thomas (2001) afirmaram que as pessoas procuram mais de um indivíduo ou mentor para apoiar suas carreiras, demonstrando que elas recebem suporte de uma constelação de desenvolvedores, com os quais se relacionam como pares, amigos, familiares, subordinados e superiores hierárquicos. Ou seja, recebem suporte de mais de um indivíduo. Esses resultados contribuem para ratificar a importância dos múltiplos mentores e do desenvolvimento das redes sociais (Higgins & Thomas, 2001).

Rede social, rede de relacionamento ou network, é um conjunto específico de ligações entre um determinado grupo de indivíduos (Tichy, Tushman, & Fombrun, 1979). Embora a teoria de redes sociais abranja vários tipos de redes como de amizade ou de conselheiros, o foco deste estudo refere-se a um tipo especial: a rede de desenvolvedores.

Rede de desenvolvedores pode ser entendida como o conjunto de relações interpessoais dos indivíduos, embora não façam parte dela todos os indivíduos com quem o mentorado se comunicou sobre seu desenvolvimento. Refere-se, especificamente, aos que têm uma relação consistente, a qual, em um ponto particular do tempo, foi importante para o desenvolvimento da carreira do mentorado (Baugh & Scandura,1999; Ragins & Cotton, 1999; Whitely & Coetsier, 1993 citados por Higgins & Kram, 2001).

Tendo em vista os benefícios que a relação de mentoria, os múltiplos mentores e as redes sociais trazem para o desenvolvimento da carreira dos profissionais, além da escassez de pesquisas sobre o fenômeno mentoria na realidade brasileira, é importante destacar a relevância dos resultados deste trabalho.

Considerando esse contexto, percebe-se que a teoria das redes sociais e o fenômeno mentoria parecem convergir, contribuindo para o seguinte questionamento: Como os fenômenos mentoria e redes sociais, em conjunto, influenciam o desenvolvimento de executivos? Buscando respondê-lo propõem-se os seguintes objetivos: (1) Mapear e analisar a rede de mentoria dos atores envolvidos; e (2) Investigar como ocorre a influência das redes de mentores no desenvolvimento dos executivos pesquisados. Os conceitos norteadores necessários para o desenvolvimento deste estudo estão expostos nas seguintes seções:1.1 - rede de desenvolvedores, e 1.2 - redes sociais.

Rede de desenvolvedores

Higgins e Kram (2001) advertem que os mentores não são apenas pessoas mais graduadas nas empresas, mas também podem ser colegas, pares, parentes, membros da comunidade ou subordinados. O importante é que eles forneçam suporte psicossocial e auxiliem no desenvolvimento da carreira do mentorado (Kram & Isabella, 1985; Noe, 1988).

São as funções de carreira e psicossociais da mentoria que diferenciam o fenômeno de outros tipos de relacionamentos, como tutoria, orientação etc. As funções de carreira incluem patrocínio, exposição e visibilidade, coaching, proteção e tarefas desafiadoras. Essas funções ajudam no aprendizado do mentorado e em seu desenvolvimento dentro da organização. As funções pscicossociais incluem modelagem de papéis, aceitação e confirmação, aconselhamento e amizade. Em geral, as funções psicossociais são possíveis porque pressupõem confiança e intimidade entre mentor e mentorado (Kram, 1983).

Em uma organização, enquanto as funções de carreira agregam vantagem no desenvolvimento hierárquico do indivíduo, as psicossociais afetam os sujeitos de forma pessoal. Entretanto ambas ajudam o mentorado a enfrentar as mudanças nos estágios da sua carreira e da sua vida (Kram, 1983).

Essas funções sofrem influência da necessidade do mentorado, da percepção do mentor sobre a necessidade do mentorado e da habilidade e motivação do mentor em satisfazer as necessidades do mentorado. As funções de desenvolvimento de carreira impactam na promoção, compensação, socialização e aspirações do mentorado, enquanto que as funções psicossociais envolvem facilitação da socialização do mentorado na organização, senso de competência e eficácia no papel profissional, além de terem impacto na satisfação no trabalho, estresse no trabalho, comprometimento, rotatividade etc. (Ragins, 1997).

Dentre os vários benefícios que a relação de mentoria proporciona para os envolvidos no processo, alguns estudos destacam: satisfação no trabalho, socialização (Chao, Walz, & Gardner, 1992), redução de turnover, desenvolvimento de conhecimento e expertise, progresso e o melhor desenvolvimento na carreira (Zey, 1988), identidade profissional clara e bem definida, senso de competência (Kram, 1983), manutenção da cultura organizacional, desenvolvimento dos profissionais, troca de conhecimento e auxílio no processo de empowerment (Souza, Dourado, & Gomes, 2003). Para o mentor, especificamente, a relação traz benefícios como senso de satisfação e realização, recebidas por promover o desenvolvimento do mentorado. Há também o rejuvenescimento na carreira, energia e criatividade, atualização de tecnologias e tendências de mercado, o que gera um impacto positivo no desempenho do mentor. Assim, torna-se importante analisar as relações que se caracterizam como mentoria entre os profissionais, conforme objetivos específicos deste estudo.

De um modo geral, torna-se difícil para um único mentor proporcionar todos os benefícios requeridos pelo mentorado, fazendo-se necessário o apoio de uma rede de desenvolvedores ao longo da carreira. Estudos apontam que os indivíduos contam com múltiplas pessoas para desenvolverem suporte em sua carreia, fenômeno denominado constelação de relacionamentos (Higgins & Kram, 2001). Essa constelação de relacionamentos é formada por desenvolvedores ou mentores, cuja perspectiva traz quatro conceitos centrais.

O primeiro conceito refere-se ao desenvolvimento das redes. A rede de desenvolvedores de um indivíduo é um grupo de pessoas que têm interesse ativo pelo mentorado, agindo para que ele cresça na carreira, por meio da assistência dada ao seu desenvolvimento. Essa definição não restringe o fenômeno a um relacionamento singular entre dois indivíduos na organização (Higgins & Kram, 2001).

O segundo abrange o desenvolvimento dos relacionamentos. Os desenvolvedores podem não ser "verdadeiros mentores", ou seja, pessoas que desenvolvem ambas as funções de mentoria: suporte psicossocial e de carreira (Higgins & Thomas, 2001) e não se limitam a uma relação formal. Essa definição inclui, mas não restringe, a relação de mentoria como um fenômeno singular com uma pessoa mais graduada dentro da organização (Higgins & Thomas, 2001; Higgins & Kram, 2001).

O terceiro conceito refere-se à diversidade da rede de desenvolvedores. Uma rede de desenvolvedores pode ser abordada sob o ponto de vista do alcance e da diversidade. Alcance diz respeito ao número de diferentes sistemas sociais em que o relacionamento se origina. Diversidade, por outro lado, refere-se à extensão nas quais as pessoas na rede, os desenvolvedores, se conhecem e estão conectadas entre si (Higgins & Kram, 2001).

O quarto aspecto refere-se à força da relação, ou seja, o nível de envolvimento emocional, de reciprocidade e de comunicação. Os relacionamentos com vínculos interpessoais fortes tendem a ser caracterizados pela reciprocidade, mutualidade e interdependência. Esse tipo de relacionamento de laços fortes faz com que as pessoas se sintam mais motivadas para se ajudarem e tendem a proporcionar uma assistência psicossocial mais forte do que as relações com laços fracos (Higgins & Kram, 2001).

No que se refere a constelações de relacionamentos, há quatro tipos: 1) empreendedoras, nas quais o relacionamento social se estende por grupos múltiplos ou sub-redes de relacionamentos e são caracterizadas por relacionamentos fortes e uma alta diversidade de mentores; 2) oportunistas, que refletem tanto a abertura do indivíduo para receber assistência quanto sua postura de iniciativa e de cultivo dos relacionamentos, caracterizadas por relacionamentos fracos com uma alta diversidade de mentores; 3) tradicionais, que se caracterizam por poucos desenvolvedores, em média com laços fortes de relacionamento com o mentorado, cujas bases são o respeito mútuo, a confiança e o companheirismo entre o mentor e o mentorado; e 4) receptivas, que são caracterizadas por relacionamentos fracos e do mesmo sistema social.

No que se refere à rede social, a literatura leva a crer que essa rede pode ser formada ou definida por alguns fatores, como nível hierárquico do indivíduo, ambiente de trabalho, estilo de interação do indivíduo, poder formal do mentor, orientação profissional e coeficiente emocional (Higgins & Kram, 2001).

Segundo Ibarra (1993), a combinação do ambiente de trabalho com o nível do indivíduo pode afetar a formação da rede social. Isso leva a pensar que é importante que a organização tenha, ou crie, um ambiente propício para o desenvolvimento dessas redes, pois, por mais que o indivíduo possa provocar mudanças no seu ambiente social, elas podem ser limitadas pelo seu ambiente de trabalho. Assim, torna-se importante investigar a influência das redes de mentores no desenvolvimento dos executivos pesquisados, conforme consta nos objetivos específicos deste estudo. Na seção seguinte, são abordados aspectos referentes ao fenômeno denominado rede social.

Redes sociais

A teoria das redes sociais, ou rede de relacionamentos, é uma teoria que constrói suas análises baseando-se nas relações dos indivíduos entre si e deles com as instituições sociais. Wasserman (1998, citado por Lima, 2004) apresenta características fundamentais da análise, focalizando as relações ou os padrões de relações e atribuindo importância aos relacionamentos entre unidades de interação. A unidade de análise não é o indivíduo, mas uma entidade ou conjunto de indivíduos e os vínculos entre eles.

A literatura, nos estudos organizacionais, faz uma distinção entre a rede formal e informal de relacionamentos. Arede formal é composta de um conjunto de relações formais entre chefe e subordinado e diferentes grupos funcionais representativos que devem interagir para realizar tarefas na organização. Também contempla relações criadas pela "quase estrutura", como: comitê, força de trabalho ou equipe. A rede de relacionamento informal, ou emergente, envolve interações mais arbitrárias, nas quais o motivador da relação pode ser pertinente à manutenção do trabalho, às relações sociais, ou a uma combinação de ambos (Ibarra, 1993).

No ambiente organizacional, a rede emergente tende a ser absorvida pelo arranjo formal da organização, porque os interesses geralmente incluem trabalho e carreira (Thichy, Tushman, & Fombrun, 1979). Mas, como os gerentes usual-mente recorrem à sua rede de relacionamento informal para conseguir alcançar seus objetivos (Kotter, 2000), a rede emergente tende a ser mais ampla que a rede formal (Ibarra, 1993).

Outra distinção que a literatura faz quanto à rede social é que ela pode ser instrumental ou expressiva. A rede instrumental surge das normas de desempenho da atividade e envolve trocas de recursos relativos ao trabalho, que incluem: informação, expertise, conselhos profissionais, acesso político e recursos materiais (Thichy, Tushman, & Fombrun, 1979). Também inclui desenvolvimento de relacionamentos com funções variadas, como direcionamento de carreira, guia, patrocínio, exposição para gerência, ajuda para atingir desafios e tornar as tarefas visíveis (Thomas, 1990).

Por outro lado, a rede social expressiva envolve amizade e suporte social. Contudo, para Lincoln e Miller (1979), a rede de relacionamentos de amizade na organização não é simplesmente uma ligação entre amigos, mas um sistema para tomar decisão, mobilizar recursos, omitir ou transmitir informação, além de outras funções afins aliadas com comportamento no trabalho e interação.

Para Krackhardt (1990), a rede expressiva é caracterizada por um nível de aproximação e confiança mais alto que na rede instrumental. Para Thomas (1990), algumas relações são tanto instrumentais quanto expressivas, como a mentoria, por exemplo, que envolve oportunidades para o desenvolvimento na carreira e suporte psicossocial.

Essa diferenciação entre a relação social expressiva e instrumental é importante, pois o conteúdo do relacionamento define a troca de recursos. O grau no qual a rede social pessoal propicia acesso aos recursos instrumentais ou expressivos dependerá das características dos contatos dos indivíduos e do relacionamento entre as partes da rede (Ibarra, 1993).

Assim, entender as redes sociais através do seu mapeamento e análise ajuda a identificar a influência dessas redes no desenvolvimento dos profissionais pesquisados.

Delineamento da pesquisa

Como metodologia de pesquisa, foi utilizada a história oral de vida. "A história oral é uma história construída em torno de pessoas. Ela lança a vida para dentro da própria história e isso alarga seu campo de ação". Propicia o contato e a compreensão social entre gerações (Thompson, 1992 p. 44).

A possibilidade de utilizar a história para finalidades sociais e pessoais vem da natureza intrínseca da abordagem oral. Ela trata de vidas individuais e baseiase na fala e não na habilidade da escrita, muito mais exigente e restrita. O uso da voz humana, viva, pessoal e peculiar, faz o passado surgir no presente de maneira extraordinariamente imediata. As palavras podem ser emitidas de maneira idiossincrática, através do sentimento próprio de cada pessoa e, por isso mesmo, são mais expressivas. Quando gravadas, demonstram como é rica a capacidade de expressão das pessoas de todas as condições sociais (Thompson, 1992).

A história oral também é uma história do tempo presente, pois implica uma percepção do passado como algo que tem continuidade hoje e cujo processo histórico não está acabado. A presença do passado no presente imediato das pessoas é a razão de ser da história oral. Nessa medida, garante sentido social à vida de depoentes e leitores que passam a entender a seqüência histórica e a sentirem-se parte do contexto em que vivem (Ichikawa & Santos, 2003).

Há uma grande discussão a respeito do status da história oral. Alguns argumentam que a história oral é uma técnica; outros, uma disciplina; e outros, ainda, uma metodologia (Ferreira & Amado, 1996). Para fins deste estudo, entende-se história oral de vida como uma metodologia, seguindo a perspectiva de Thompson (1992). Pois se entende que a história oral, como toda metodologia, estabelece e ordena os procedimentos de trabalho, tais como os diversos tipos de entrevistas e as implicações de cada um deles para a pesquisa, as várias possibilidades de transcrição de depoimentos, suas vantagens e desvantagens, as diferentes maneiras de o pesquisador se relacionar com o entrevistado e as influências disso sobre o trabalho. Esse é o terreno da história oral, o que não permite classificá-la somente como prática (Ferreira & Amado, 1996).

O executivo central da rede de mentoria, denominado aqui de profissionalfocal, foi escolhido para ser o ponto de partida deste trabalho, em função do seu sucesso empresarial e pessoal. Esse profissional-focal é sócio e presidente de uma empresa pernambucana com atuação nacional e internacional no segmento de transporte.

Foi denominado "caso" o profissional-focal e todas as pessoas de sua rede social que contribuíram para o desenvolvimento de sua carreira, os mentores, bem como, as pessoas que foram influenciadas por ele, os mentorados. Optou-se por delimitar o caso, unidade de análise deste estudo (Stake, 2000), por meio da rede, em detrimento da organização na qual o profissional-focal trabalha, porque os mentores e mentorados podem fazer parte de diferentes instituições, importando para o presente estudo entender as relações que se caracterizaram como de mentoria em rede.

É importante ressaltar que a quantidade de casos não pôde ser maior, em face da utilização da metodologia de história de vida. Essa metodologia exige coletas muito longas e requer várias entrevistas (Laville & Dionne, 1999). Outra razão refere-se à opção de estudar todos os indivíduos da rede de mentores e mentorados do profissional-focal. Por se tratar de um estudo em uma unidade de análise única, os resultados deste trabalho não podem ser generalizados. Apesar de profissionalizada, a empresa da qual o profissional-focal faz parte é uma organização familiar, e esse aspecto não foi objeto de análise do estudo, embora suas conclusões permitiram conhecer os fenômenos de forma mais profunda.

A coleta dos dados foi realizada segundo alguns passos. Primeiramente, construiu-se um sociograma da rede de mentoria do profissional-focal. O sociograma é um diagrama que mapeia graficamente as interações preferidas (Thichy, Tushman, & Fombrun, 1979). A partir do sociograma, foram colhidos os testemunhos dos mentores e mentorados do profissional-focal identificados na rede. Também foram analisados documentos institucionais, documentos pessoais, como cartas, e matérias de jornais e revistas que envolviam o profissional-focal. Tomando por base o referencial teórico, foi elaborado um roteiro de entrevista semi-estruturada, com instruções temáticas, que foi aplicado com os sujeitos do caso estudado.

Como técnica de análise para tratamento da história de vida, foi utilizada a análise de conteúdo. Dentre as perspectivas dessa análise, foi utilizada a análise de enunciação, que se apóia no conceito do discurso como palavra em ato e não como um dado, conforme a análise de conteúdo clássica. Aanálise de enunciação considera que, na produção da palavra, é efetuado um trabalho, elaborado um sentido e são operadas transformações. Seu objetivo é aprender, ao mesmo tempo, diversos níveis imbricados, ao contrário da análise de conteúdo escrita, que se apóia essencialmente no registro semântico elementar. Nessa perspectiva, o discurso não é um produto acabado, mas um momento num processo de elaboração, que pode ser, ao mesmo tempo, espontâneo e constrangido pela situação, na qual se confrontam motivações, desejos e investimentos do sujeito, com as imposições do código lingüístico. Também, devido às circunstâncias de espontaneidade e constrangimento, o trabalho de elaboração é, ao mesmo tempo, emergência do inconsciente e construção do discurso (Bardin, 2000).

Também foi realizada a análise das redes sociais, que foram construídas a partir dos testemunhos dos sujeitos do caso pesquisado, com a ajuda do software UCINET 6, que permitiu a construção gráfica da rede.

Juntas, as entrevistas, as histórias de vida construídas a partir das entrevistas, e a análise das redes sociais, constroem uma série de possibilidades de informação, permitindo uma triangulação dos dados (Minayo, 1998) e garantindo uma maior transparência do estudo.

 

Resultados e discussão

A apresentação e a discussão dos resultados estão expostos nas seguintes seções: 3.1 - Caracterização dos membros da rede; 3.2 - A rede de mentoria; e 3.3 - A influência das redes de mentores no desenvolvimento dos executivos.

Caracterização dos membros da rede

O profissional-focal deste estudo é diretor-presidente e acionista majoritário, com 80% das ações de uma transportadora pernambucana de atuação nacional e internacional. Começou na empresa há 40 anos e, no seu segundo ano de trabalho na organização, passou a ser diretor comercial. Posteriormente, quando adquiriu a companhia, juntamente com outros dois funcionários, assumiu a presidência. Sua história confunde-se com a da empresa, cuja situação atual corresponde à concretização do seu sonho. Ele conseguiu vencer as dificuldades financeiras, pelas quais a empresa passava na época. Líder na área de transportes das regiões Norte e Nordeste e vice-líder no mercado nacional, a empresa atende a mais de 7 mil clientes, em mais de 4 mil localidades, em 16 estados do Brasil. Em virtude de acordo operacional com uma empresa norte-americana, atua também em mais de 210 países no mundo. Sob o ponto de vista interno, possui cerca de 3 mil funcionários, uma frota de mais de 700 veículos e movimenta cerca de 450 mil toneladas de carga por ano (Haeckel, 2004; Rapidão Cometa, 2005).

O sujeito central da rede nasceu e cresceu no bairro de Beberibe, na cidade do Recife, fez o curso ginasial e o científico no Colégio Estadual Beberibe e é graduado em economia (A. C. Pereira, 2005). Hoje, é um executivo de destaque na sociedade empresarial pernambucana e nacional. Recebeu diversos prêmios da área de transporte, inclusive a Medalha do Transportador, concedida pela Confederação Nacional dos Transportes - CNT (Associação Brasileira de Movimentação Logística, 2003) e o Prêmio Empreendedor do Ano em 2003 de realização da Ernest & Young. Sob seu comando, a transportadora também recebeu vários prêmios como: Prêmio Qualidade em Tecnologia, no ano de 1997; Desempenho, Maior e Melhor Empresa de Pernambuco em Transporte e Armazenagem, em 1998; Empreendimento XXI, do Banco do Nordeste, em 2002; e Top de Marketing da Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil - ADVB em 2004, dentre outros.

O empresário é membro do Pacto 21, conselho criado pelo Governo do Estado de Pernambuco com o objetivo de repensar o desenvolvimento econômico e social do Estado (Governo do Estado de Pernambuco, 2004). Também atua como conselheiro da Associação Nacional dos Transportadores. A participação nesses conselhos demonstra o reconhecimento obtido pelo empresário como um profissional de destaque e de sucesso na sociedade empresarial pernambucana e nacional. O executivo atua ainda como vice-presidente da Associação Criança Cidadã, uma associação beneficente na cidade de Recife.

O empreendedor, profissional-focal, acredita que o sucesso "somente é alcançado através do equilíbrio na vida profissional, espiritual e física, sendo, também, fundamental ter competência, dedicação, paixão, amor, seriedade, saúde e paz para atingir o sucesso".

Ao conhecer a história desse empresário, percebe-se que ele atribui seu sucesso a seus pais, que sempre o incentivaram a estudar, e também à sua esposa, que sempre o apoiou e incentivou durante sua carreira. Conforme relatado pelo executivo: "... meus pais que, como maestros, souberam me reger no caminho da vida transmitindo os valores da ética e da cultura, indispensáveis na minha formação". Reforça ainda o incentivo de seus pais para que estudasse à noite no colégio e posteriormente na faculdade, o que, nas palavras dele, o "fez despertar para a realidade de que toda verdadeira conquista é precedida de muito esforço".

Embora, na percepção do empresário, características pessoais tais como força de vontade, determinação e valores pessoais tenham sido seu grande diferencial, a partir das entrevistas, observou-se que o executivo contou ainda com outras pessoas que contribuíram para o seu desenvolvimento profissional. Foram pessoas citadas, por ele: um dos atuais executivos e um ex-executivo da empresa, um antigo proprietário da empresa, que também foi seu chefe, além de alguns amigos pessoais.

Quanto à sua rede de mentorados, os depoimentos dos executivos permitiram identificar a influência do profissional-focal no desenvolvimento de diversos funcionários da empresa, bem como em outras pessoas de sua rede social pessoal.

Com relação ao perfil do profissional-focal e dos demais sujeitos, mentores e mentorados, das 18 pessoas citadas, 15 foram entrevistadas, incluindo nesse número o próprio profissional-focal. Os outros três não puderam ser entrevistados porque são falecidos. Dentre as 15 pessoas entrevistas, 11 são executivos da transportadora e dois são ex-executivos da empresa, um é deputado estadual e um é executivo proprietário de outra empresa. Quanto ao gênero, doze são homens e três são mulheres. Aidade média é de 46,1 anos, sendo que o mais novo do grupo tem 33 anos e o de maior idade 65 anos. Dos que trabalham na transportadora, todos têm cinco anos ou mais na empresa. Com referência ao grau de instrução formal dos entrevistados todos têm formação superior, distribuída em: economia, administração, engenharia de processos, direito, teologia ou pedagogia. A Tabela 1 - Perfil dos Entrevistados - apresenta o perfil das pessoas que fazem parte da rede de mentoria do profissional-focal.

A rede de mentoria

A Figura 1 - Rede de Mentoria do Profissional-Focal - mostra que a rede é composta por 46 pessoas. As representações em vermelho correspondem aos funcionários da transportadora; as que estão em amarelo são ex-funcionários e aquelas em azul correspondem às pessoas que nunca foram funcionários da empresa. A direção da seta aponta para os mentores dos pesquisados. Foram entrevistados todos os Executivos com numeração de 1 a 15, simbolizados em formato de triângulo. Os sujeitos não entrevistados receberam, como símbolo, um círculo. Os executivos, associados a letras, de A até N, são mentores ou mentorados dos pesquisados que ocupavam cargos de nível estratégico, mas que não foram entrevistados.

Considerou-se importante destacar os mentores que fazem parte da empresa ou não, como o caso dos parentes, professores, colegas de MBA e médico. Entende-se como Parente, nesta rede, pai, mãe ou tio dos entrevistados. Vale observar que o Parente 6 é pai do Executivo 13, mas não tem grau de parentesco com o Executivo 1. Os Executivos 1 e 11 são pais dos Executivos 2 e 8. Os professores citados eram tanto de nível universitário, quanto não-universitário. Foram destacados também colegas de MBA, pessoas que cursaram pós-graduação com algum entrevistado.

Quanto ao número de mentores, a maioria dos executivos teve dois ou mais mentores, com exceção de um, Executivo 11, que mencionou ter tido apenas um mentor ao longo de sua carreira. Vale ressaltar que a fase ocupacional da carreira profissional desse executivo foi de apenas 5 anos, caso atípico e diferente dos demais entrevistados.

Segundo os resultados obtidos, os quatro executivos que tiveram mais mentores, na quantidade entre 6 e 10, pertenciam à área comercial. Constatou-se também que as relações tinham um maior alcance, ou seja, suas redes tinham mentores de sistemas sociais diversificados, não tendo, os mentores, necessaria-mente relação entre si (Ibarra, 1993; Higgins & Kram, 2001). Esse fato parece demonstrar que o perfil do mentorado pode influenciar no estabelecimento de laços de relacionamentos, pois geralmente profissionais da área comercial são pessoas mais comunicativas e também estão mais expostas ao ambiente externo da organização. Conforme se pode observar na Figura 2 - Redes e Quantidade de Mentores - na qual os círculos tracejados em verde ressaltam os executivos com quantidade de mentores superiores a seis, os números verdes ao redor do círculo representam a quantidade de mentores dos executivos em questão.

Com relação à tipologia das redes sociais (Higgins & Kram, 2001), foi identificado que a maioria dos executivos tinha redes que se caracterizavam como: tradicional, pois tinha poucos desenvolvedores, em média com laços fortes de relacionamento com o mentorado; são bases desse caso o respeito mútuo, a confiança e o companheirismo entre o mentor e o mentorado; ou empreendedora, pois alguns relacionamentos sociais da rede estudada se estendem por grupos múltiplos ou sub-redes de relacionamentos; esse tipo é caracterizado por relacionamentos fortes e uma alta diversidade de mentores, como no caso dos Executivos 1, 2, 4 e 7. O que permite concluir que, independentemente da quantidade de mentores que os profissionais tinham, a relação era sólida, profunda e com laços fortes entre o mentor e o mentorado.

Foram identificados cinco casos de mentoria mútua, na qual um exerce papel de mentor do outro: a) relação do Executivo 1 com 4, que eram colegas de trabalho na transportadora, sendo que o primeiro foi superior hierárquico do segundo e ambos são acionistas; b) Executivo 1 com 11, que são cônjuges, sendo que o segundo foi vice-presidente da empresa; c) Executivo 1 com 12, que trabalham juntos atualmente, sendo o primeiro superior hierárquico do segundo, que também é acionista; d) Executivo 1 com 13, que são amigos, desde a época do curso pré-vestibular e nunca trabalharam juntos; e e) Executivo 2 com 7, que são pares na transportadora. Conforme se pode observar na Figura 3 - Mentoria Mútua -, os elos em verde representam os laços de mentoria mútua entre os executivos pesquisados.

problema pg. 39.

Como 4 das relações de mentoria mútua foram estabelecidas com o presidente da empresa e, em 3 delas, existia uma relação hierárquica, superiorsubordinado, esse fato parece revelar que, quando o profissional chega no nível mais alto da estrutura organizacional, há uma tendência para que ele tenha mentores que são seus subordinados. Diferentemente de quando o mentorado ocupa cargos de nível mais baixo na estrutura, visto que o presidente (Executivo 1) não mencionou ter tido mentores que eram seus subordinados, quando ele ocupava cargos de níveis mais baixos na estrutura da empresa. Esse achado leva a crer que as necessidades dos mentorados podem ser diferentes, a depender do lugar que ele ocupa na estrutura. Os de nível mais baixo precisam de um apoio técnico e psicossocial mais intenso. Já os do nível estratégico, no caso do presidente, parecem fazer mais uso das funções aconselhamento e amizade de seus mentores.

Dos 13 entrevistados que eram funcionários ou ex-funcionários da transportadora, 12 tinham pelo menos um mentor na própria organização, demonstrando que a mentoria informal parece fazer parte da cultura da instituição. Todos os 15 pesquisados tiveram algum mentor que fazia parte de empresas na qual trabalharam, o que permite inferir que pode ser mais fácil estabelecer relacionamentos de mentoria com pessoas de instituições das quais se faz parte, do que com pessoas de outras empresas do mercado em geral. Presume-se que a convivência diária facilita e permite a criação e manutenção desses laços. Desses 15, seis também tinham um ou mais mentores com os quais nunca trabalharam, corroborando com os estudos de Whiting e Janasz (2004, citado por Janasz, Sullivan, & Whiting, 2003), autores que identificaram que, para encontrar múltiplos mentores, o mentorado deve procurar pelo suporte do mentor para além da organização e suas fronteiras geográficas.

Todos os entrevistados tiveram, pelo menos, um mentor que foi seu superior hierárquico, levando a crer que pessoas que trabalham no mesmo departamento ou que têm trabalhos similares tendem a compartilhar alguns valores e linguagens comuns, o que facilita a interação. Oito entrevistados mencionaram ter mentores que eram parentes e três tiveram professores que também foram considerados mentores.

Abaixo será explicado como ocorre a influência das redes de mentores no desenvolvimento dos profissionais entrevistados.

A influência das redes de mentores no desenvolvimento dos executivos

Os mentores do caso estudado exerciam tanto as funções de carreira, quanto as psicossociais, corroborando os estudos de Kram (1983). Em se tratando do profissional-focal, também é possível identificar a função promoção direta e sua influência no desenvolvimento da carreira de seus mentorados, quando comparado à posição hierárquica na qual eles se encontram hoje na empresa e a posição na qual iniciaram.

O mentor também viabilizava o acesso à sua rede social, para facilitar, segundo, Ragins (1987), a socialização do mentorado, garantir sua maior visibilidade e aumentar a exposição de seus mentorados na organização. A ajuda do mentor não se limita aos aspectos organizacionais, mas também a aspectos pessoais, com um foco mais diretivo e motivacional, ajudando o mentorado a superar tensões, assumir responsabilidades e ter confiança em si mesmo.

Em se tratando das funções de mentoria desempenhadas pelo profissionalfocal deste estudo, podemos destacar que, segundo seus mentorados, ele exerce a maioria das funções de mentoria, dentre elas: apoio na busca de objetivos, apoio motivacional, coaching, aconselhamento, exposição, amizade, desenvolvimento de habilidades comportamentais, proteção e sensibilização para causas sociais.

De um modo geral, constatou-se que, para ser estabelecida a relação de mentoria, um mesmo mentor não precisa necessariamente exercer todas as funções, sendo o exercício de parte delas suficiente para que sejam criados vínculos e seja dado o suporte ao profissional mentorado.

Os mentores dos profissionais entrevistados não se limitaram aos muros da empresa da qual eles faziam parte, embora alguns perdessem o contato com seus mentores, ao longo do tempo, após mudarem de organização. Esse fato pode ter ocorrido muito mais pelo alcance da maturidade conquistada por parte dos mentorados, ou pela necessidade de se relacionarem com outras pessoas e expandirem sua rede social, no novo ambiente de trabalho em que estavam inseridos.

Os resultados permitiram inferir que as redes sociais encontradas eram tanto instrumentais quanto expressivas, caracterizando-as como rede de mentoria, conforme a visão de Thomas (1990). A rede estudada é considerada instrumental, pois foi identificado que os mentores proporcionam recursos materiais, acesso político e informação aos mentorados; e expressiva, pois há um nível de confiança e aproximação alto na relação, além de envolver a amizade e o suporte social do mentor, influenciando assim a vida do mentorado.

Verificou-se que os executivos exercem papel de mentor informal na organização e fora dela e que, apesar de a empresa não ter um programa formal de mentoria, essa é uma prática arraigada na sua cultura. Entretanto, a empresa tem alguns programas formais de desenvolvimento que incentivam o crescimento dos profissionais e os ajudam a criar laços que podem, no futuro, se transformar em relações de mentoria. É o caso do Programa Gerência Interina, no qual o funcionário assume o papel de gerente de unidade, enquanto o responsável está ausente, por exemplo, e tem o suporte dos profissionais de recursos humanos da empresa. Ou do Programa de Apoio às Filiais - PAF, no qual são escolhidas algumas pessoas que participam de projetos a fim de se prepararem para novos desafios, novos cargos. Elas são deslocadas para as filias para atuar nas áreas críticas durante quatro ou cinco semanas. Observou-se que esses programas permitem uma maior exposição dos funcionários e facilitam a expansão de suas redes sociais.

Apesar de identificadas nas relações a presença das funções de carreira e psicossociais da mentoria, elas não eram, necessariamente, exercidas pela figura de um mesmo mentor. Cada mentor contribuía com diferentes aspectos, levando a crer que as pessoas que têm mais de um mentor, ou seja, uma rede de mentores, têm acesso a uma maior quantidade de funções de mentoria, sendo mais beneficiado com a relação. Esses resultados contribuem com os estudos de Janasz, Sullivan e Whiting (2003), segundo os quais é preciso mais de um mentor para que sejam vistos valores em ação, seja desenvolvida perspicácia no negócio e produzido conhecimento.

Terminada a discussão e a análise dos resultados, na seção seguinte serão apresentadas as conclusões e recomendações para novos trabalhos.

 

Conclusões

A literatura acadêmica ressalta vários benefícios de carreira e psicossociais que a relação de mentoria pode trazer para os envolvidos no processo (Kram, 1985; Ragins, 1987; Zey, 1988; Chao, Walz & Gardner, 1992). Assim, a proposta deste estudo foi investigar como os fenômenos mentoria e redes sociais, em conjunto, influenciam o desenvolvimento de executivos.

Os resultados deste trabalho permitem inferir que os fenômenos mentoria e redes sociais influenciam os executivos de forma positiva, pois os múltiplos mentores, como maestros da vida, ajudam no desenvolvimento dos mentorados, dando suporte tanto em aspectos relacionados à carreira, quanto em aspectos psicossociais, o que causa um diferencial na vida desses profissionais.

A rede de mentores faz com que o mentorado tenha acesso a uma maior quantidade de funções de mentoria, pois um único mentor talvez não consiga exercer todas as possíveis funções. Grande parte dos executivos teve mentores dentro e fora da organização na qual trabalhavam.

Amaioria dos entrevistados teve dois ou mais mentores. Dos quatro executivos que tiveram mais mentores, quantidade entre seis e dez, todos eram da área comercial, o que parece demonstrar que o perfil pode influenciar no estabelecimento de laços de relacionamentos.

As necessidades dos mentorados podem ser diferentes, a depender do lugar que eles ocupam na estrutura. Os de nível mais baixo precisam de um apoio técnico e psicossocial mais intenso. Os do nível estratégico, como no caso do presidente, parecem fazer mais uso das funções aconselhamento e amizade de seus mentores.

Verificou-se que os executivos exercem papel de mentor informal na organização e fora dela e que, apesar de a empresa não ter um programa formal de mentoria, essa é uma prática arraigada na sua cultura. Contudo, a empresa tem alguns programas formais de desenvolvimento que incentivam o crescimento dos profissionais e os ajudam a criar laços que podem, no futuro, se transformar em relações de mentoria.

Grande parte dos entrevistados citou o presidente da transportadora como alguém que contribuiu para o desenvolvimento de suas carreiras profissionais. A maioria também mencionou a importância do presidente para seu crescimento pessoal.

Todos os executivos tiveram mentores que foram seus superiores hierárquicos. Assim, sugere-se analisar, em pesquisas futuras, até que ponto os profissionais em cargos de liderança são considerados mentores e a influência da relação de poder no fenômeno mentoria. Outra sugestão seria ampliar o estudo para outros níveis da rede do profissional-focal, entrevistando também as pessoas da rede dos mentores e mentorados. Também se recomenda aprofundar o estudo, levando em consideração o campo de empresas familiares e não familiares, analisando se há ou não diferenças a partir desse aspecto.

De um modo geral, o presente estudo contribuiu para o entendimento do fenômeno rede de mentoria, na realidade brasileira, uma vez que possibilitou aprofundar o conhecimento sobre como os fenômenos mentoria e redes sociais, em conjunto, influenciam o desenvolvimento de executivos pesquisados.

 

Referências

Associação Brasileira de Movimentação Logística (2003). O sucesso do Rapidão Cometa. Notícias. História Vivida, 2, 13. Retirado em 15/12/2004, no World Wide Web: http://www.abml.org.br/noticias/13_02_122003.pdf.         [ Links ]

Bardin, L. (2000). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70.         [ Links ]

Carvalho, I. C. M. (2003). Biografia, identidade e narrativa: elementos para uma análise hermenêutica. Horizontes Antropológicos, 9, 19, 283-308.         [ Links ]

Chao, G. T., Walz, P. M., & Gardner, P. D. (1992). Formal and informal mentorships: a comparison on mentoring functions and contrast with nonmentored counterparts. Personnel Psychology. 45, 619-636.         [ Links ]

Ferreira, M. M., & Amado, J. (Org.). (1996). Usos & abusos da história oral. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas.         [ Links ]

Governo do Estado de Pernambuco. (2000). Pacto estimula desenvolvimento. Jornal do governo, 7, 1. Retirado em 15/12/2004, no World Wide Web: www.pe.gov.br/jornal/jor07/n02.htm.         [ Links ]

Haeckel. F. (2004). Sucesso: o que eles pensam. 119 personalidades, que fazem Pernambuco, contam suas experiências. Recife: Ed. do Autor.         [ Links ]

Higgins, M. C., & Kram, K. E. (2001). Reconceptualizing mentoring at work: a developmental network perspective. Academy of Management Review. 26, 2, 246-288.         [ Links ]

Higgins, M. C., & Thomas, D. A. (2001). Constellations and careers: Toward understanding the effects of multiple developmental relationships. Journal of Organizational Behavior. 22, 3, 223-247.         [ Links ]

Ibarra, H. (1993). Personal networks of women and minorities in management: a conceptual framework. Academy of Management Review. 18, 1, 56-87.         [ Links ]

Ichikawa, E. Y., Santos, L. W. (2003).Vozes da história: contribuições da história oral à pesquisa organizacional. Em Anais do Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração. (p. 27). Atibaia, SP, Brasil.         [ Links ]

Janasz, S. C., Sullivan, S. E., & Whiting, W. (2003). Mentor networks and career success: lessons for turbulent times. Academy of Management Executive. 17, 4.         [ Links ]

Kotter, J. (2000). O que os gerentes gerais eficazes realmente fazem. Em Kotter, J. (Org). Afinal, o que fazem os líderes: a nova face o poder e da estratégia. Rio de Janeiro: Campus.         [ Links ]

Krackhardt, David. (1990). Assessing the political landscape: structure, cognition, and power in organizations. Administrative Science Quarterly, 35, 2.         [ Links ]

Kram, K. E. (1983). Phases of mentor relationship. Academy of Management Journal. 26, 608-665.         [ Links ]

Kram, K. E., & Isabella, L. A. (1985). Mentoring alternatives: the roles of peer relationships in career development. Academy of Management Journal. 28, 110 -132.         [ Links ]

Laville, C., & Dionne, J. (1999). A Construção do Saber. Belo Horizonte: Editora UFMG.         [ Links ]

Lima, R. A. (2004). Centralidade nas redes das ONGs da RMR. Dissertação de mestrado não publicada. Universidade Federal de Pernambuco. Recife, PE.         [ Links ]

Lincoln, J. R., & Miller. J. (1979). Work and friendship ties in organizations: A comparative analysis of relational networks. Administrative Science Quarterly. 25, 181-199.         [ Links ]

Minayo, M. C. S. (1998). O desafio do conhecimento (5ª ed.). São Paulo - Rio de Janeiro: Hucitec-Abrasco.         [ Links ]

Noe, R. A. (1988). An investigation of the determinants of successful assigned mentoring relationship. Personnel Psychology. 41, 457-479.         [ Links ]

Ragins, B. R. (1997). Diversified mentoring relationship in organization: a power perspective. Academy of Management Review.22, 2, 482-521.         [ Links ]

Rapidão Cometa. (2005). Apresentação. Retirado em 13/10/2005, no World Wide Web: www.rapidaocometa.com.br.         [ Links ]

Souza, D. C., Dourado, D. C., & Gomes, R. (2003). A realidade observada de um programa de mentoria: O que a máscara esconde? O caso de uma multinacional de consultoria. Em Anais do Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração. Atibaia (p. 27).São Paulo.         [ Links ]

Stake, R. E. Case Studies. (2000). Em Denzin, N. K., Lincoln. Y. S. (Org). Handbook of qualitative research. (2ª ed.). London: Sage Publications.         [ Links ]

Thichy, N. M., Tushman, M. L., & Fombrun, C. (1979). Social network analysis for organizations. Academy of Work Management Review. 4, 4, 507-519.         [ Links ]

Thomas, D. A. (1990). The impact of race on managers' experience of developmental relationships (mentoring and sponsorship): an intra-organizational study. Journal of Organizational Behaviour. 2, 479-492.         [ Links ]

Thompson, P. (1992). A voz do passado: história oral. Rio de Janeiro: Paz e Terra.         [ Links ]

Zey, M. G. (1988). A mentor for All. Personnel Journal.         [ Links ]

 

 

1 As autoras agradecem as contribuições dos revisores da rPOT, pelas considerações feitas para melhoria do artigo, e a Américo Pereira, presidente do Rapidão Cometa, por permitir que este estudo fosse realizado e publicado.

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons