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Revista Psicologia Organizações e Trabalho
versão On-line ISSN 1984-6657
Rev. Psicol., Organ. Trab. v.8 n.2 Florianópolis dez. 2008
ARTIGOS
Bases de poder do supervisor, conflitos intragrupais e comprometimento organizacional e com a equipe
Supervisor's power bases, intra-groups conflicts, and organizational and team commitment
Vanessa da Fonseca GuimarãesI; Maria do Carmo Fernandes MartinsII
IMestre pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia. End. Eletrônico: vanessa1212@gmail.com
IIDoutora pelo Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília. End. eletrônico: mcfernandesmartins@yahoo.com.br
RESUMO
A interação do trabalhador com seu meio e com seus colegas de trabalho produz reflexos no seu comprometimento com a organização e com sua equipe de trabalho. Para investigar tais relações, este estudo teve como objetivo testar a capacidade de predição das bases de poder do supervisor e dos tipos de conflitos intragrupais percebidos na equipe de trabalho sobre o comprometimento organizacional e o comprometimento afetivo com a equipe de trabalho. Para medir as variáveis, foram aplicadas escalas válidas e fidedignas a 148 trabalhadores formais de Uberlândia e região. Resultados de análises de regressão múltipla revelaram que base de poder de recompensa e conflito de relacionamento explicaram 30% da variância de comprometimento afetivo com a equipe e que base de poder de perícia e conflito de relacionamento explicaram 24% do comprometimento organizacional afetivo do empregado. Resultados foram discutidos e comparados com achados da área. Sugestões para novas investigações foram propostas.
Palavras-chave: bases de poder do supervisor; conflitos intragrupais; comprometimento organizacional; comprometimento afetivo com equipe.
ABSTRACT
The employee interaction among his the environment and colleagues produces effects on the level of organization commitment and team commitment expressed by him. Its study intended to test a capacity of prediction of intragroups conflicts and supervisor power bases on organizational commitment and team affective commitment. In order to investigate these relations, reliable scales were applied in 148 employees in organizations from Uberlândia and region. Results of regressions analysis indicated that the reward power base and the relationship conflict explained 30% of the variance of affective team commitment, and the expert power base and the relationship conflict explained 24% of the employee's affective organization commitment. Results were discussed and compared with another studies. Further researches were proposed.
Keywords: Supervisor's power bases, intragroups conflicts, organizational commitment and affective team commitment.
1. Introdução
As organizações atuais defrontam-se, a todo instante, com novas demandas e desafios que devem ser superados. Para responder adequadamente a esses desafios, elas buscam maximizar os resultados de suas ações através da descentralização do poder, delegando a seus gerentes e supervisores uma série de responsabilidades definidas por meio de objetivos a serem alcançados. Nessa rede de inter-relação social, existe permanente troca de poder, ou seja, há, de fato, relações de influência entre indivíduos e entre indivíduos e grupos.
Bennis e Nanus (1985) ressaltam o caráter distinto do poder social nas relações humanas, destacando que esse fenômeno é essencial na compreensão da organização, o que possibilita nela atuar de forma mais efetiva e produtiva. As trocas de poder acontecem no cenário das relações interpessoais, entre dois indivíduos, entre um indivíduo e um grupo e entre dois grupos. As equipes de trabalho, definidas como grupos com características únicas que lhes fornecem identidade, são o cenário principal onde ocorrem as trocas de poder. Na organização, elas são influenciadas por seus supervisores, que buscam alcançar objetivos propostos, além de constituírem cenário para as trocas de influência entre seus membros.
As relações de poder que prevalecem no relacionamento grupal e interpessoal podem influenciar outros aspectos igualmente relevantes, como o conflito no grupo e o comprometimento do empregado com o grupo e com a organização. Vargas (1998) afirma que "as relações de poder, quando bem administradas, podem desempenhar importante papel como agente mediador na prevenção e na resolução de conflitos, assegurando a manutenção do equilíbrio e do crescimento organizacional" (p. 90).
Este artigo apresenta um estudo que testou um modelo explicativo de comprometimento organizacional e de comprometimento afetivo com a equipe de trabalho composto por bases de poder utilizadas pelo supervisor e por conflitos percebidos na equipe de trabalho. Mas, antes de relatar o estudo, é necessário tornar claros os conceitos das variáveis estudadas.
Poder é um fenômeno que foi alvo de estudos da Filosofia, da Sociologia e das Ciências Políticas. Paz, Martins e Neiva (2004) salientam que os primeiros pensamentos sobre o tema focaram a análise do poder no âmbito estatal, voltando atenções para o controle do poder nas atuações do Estado e do Clero, como relataram Hobbes (1988) e Maquiavel (1513/1972). Ao longo do tempo, a análise do fenômeno do poder foi sendo ampliada para outras entidades sociais, como se pode observar, por exemplo, nas idéias de Weber (1991) e de Mintzberg (1983). Eles afirmavam que, como em outras instituições sociais, o exercício do poder nas organizações produz impacto nos seus resultados, nas decisões e no comportamento das pessoas e das equipes de trabalho que nelas atuam. Nesse sentido, Brito, Brito, Capelle e Borges (2001) afirmam que o poder social, no contexto organizacional, pode ser encarado como um fenômeno que emerge do processo de interação social provocado pelas práticas organizacionais. Segundo Santos Filho (2002), a análise desse fenômeno nas organizações deve ser compreendida através da interação política de indivíduos e grupos que buscam a satisfação dos seus interesses pessoais ou profissionais. Isso torna este tema complexo e multifacetado.
French e Raven propuseram, em 1959, a teoria da troca social, na qual apresentaram o conceito de bases de poder social. Essa teoria, pioneira na área de Psicologia Social, tem sido uma importante referência para os estudos das relações humanas. De acordo com French e Raven, bases de poder são fontes utilizadas por uma pessoa para influenciar a outra. Entretanto, cada uma dessas fontes possui características diversas, como se pode observar no Quadro 1.
Ao falar de bases de poder em 1959, French e Raven basearam-se em conceitos de influência social, sem se importarem com medidas ou com sua possível utilização em ambientes específicos, como nas organizações, tal como a perspectiva deste estudo. Entretanto, estudos posteriores à sua proposição teórica (Aguinis & Henle, 1998; Hinkin & Schriesheim, 1989; Pearson, Ensley & Amason 2002; Podsakoff & Schriesheim 1984; Rahim & Afza 1993; Ward, 2001) confirmaram a adequação do conceito e a relevância das bases de poder para os estudos das organizações e sua utilidade para explicar como o supervisor maneja o poder, revelando relações entre as bases e outras variáveis como a percepção de suporte do supervisor e do suporte organizacional, a satisfação com a supervisão e com o emprego e o desempenho do indivíduo no trabalho.
Se, segundo Rahim, Antonioni, Krumov e Ilieva (2000), o gerenciamento de conteúdos grupais é permeado por relações sociais e de poder, parece lógico supor que os tipos de bases de poder utilizados pelos supervisores possam produzir impacto nos resultados dos membros dessas equipes e em outros resultados organizacionais.
Conflito, segunda variável que interessa a este estudo, foi definido por Rahim, Antonioni, Krumov e Ilieva (2000) como um processo manifesto de incompatibilidade, desacordo ou dissonância entre entidades sociais como pessoas, grupos ou organizações. No contexto organizacional, existem inúmeras atividades que requerem interação e coordenação de esforços e podem gerar tendências para a ação, constituindo, consequentemente, uma fonte potencial de conflito (Deutsch, 2003). Situações de conflitos são frequentemente encaradas como momentos que envolvem competição, discordância ou dissociação. Por vezes, supervisores e empregados negam ou fogem de situações conflitantes, deixando de lidar adequadamente com esse tipo de processo (Guetzkow, Gyr, 1954). Apesar disso, autores como Amazon (1996) e Simons e Peterson (2000) ressaltam que uma situação de conflito pode influenciar positivamente os membros da equipe de trabalho, levando-os a terem novas idéias sobre os processos organizacionais, a serem mais criativos ao lidar com problemas da organização e a criarem oportunidades para pessoas colocarem em prática suas capacidades, desde que não envolvam aspectos afetivos. Assim, processos que envolvem momentos de conflitos ou discordâncias, além de serem inerentes à vida organizacional e grupal, podem impulsionar a inovação e o desempenho, constituindo peça fundamental no processo decisório, na evolução profissional dos empregados e no desenvolvimento das equipes de trabalho e da organização (Dimas, Lourenço & Miguez, 2005).
Assim como o poder social, os tipos de conflitos podem ocorrer em diferentes dimensões, em relação ao indivíduo ou em relação ao grupo social. Relacionando-se ao indivíduo, o conflito pode ser classificado em intrapsíquico e psicossocial. Relacionando-se aos grupos ou equipes, podem-se classificar os conflitos em intragrupais ou intergrupais (Bowditch & Buono, 1999). Rahim (1989) afirma que o gerenciamento adequado dos conflitos está intimamente ligado à capacidade de o indivíduo contribuir para o desempenho grupal e organizacional, satisfazendo, simultaneamente, as necessidades sociais, morais e éticas dos membros do grupo ou equipe.
O conflito intragrupal, segunda variável deste estudo, é diferenciado em dois focos, o conflito de tarefa e o conflito de relacionamento. Entre as definições mais atuais dos tipos de conflitos intragrupais, Simons e Peterson (2000) consideram que o conflito de tarefa ou conflito cognitivo é a percepção de desacordos entre membros de um grupo sobre o conteúdo de suas decisões e envolve diferenças entre pontos de vista, ideias e opiniões. Conflito de relacionamento ou conflito afetivo é definido como a percepção de incompatibilidade interpessoal e geralmente envolve tensão, irritação e raiva entre os membros do grupo. Sendo assim, segundo Amason (1996), quando o conflito é de relacionamento, possui um caráter disfuncional, pois tende a ter uma base emocional e a focalizar-se nas incompatibilidades ou nas disputas individuais. Mas o conflito de tarefa é considerado funcional para a equipe de trabalho, pois auxilia o grupo, através da discussão e do debate, a ter novas ideias e a encontrar diferentes soluções, o que geralmente enriquece a decisão final adotada pela equipe (Jehn, 1997; Pearson et al., 2002).
Constatou-se, na literatura investigada, que conflito intragrupal é antecedente de diferentes variáveis do campo de estudos denominado Comportamento Organizacional. Investigadores dessa área encontraram resultados que confirmam relações tanto funcionais quanto disfuncionais entre os tipos de conflitos intragrupais existentes na equipe e fenômenos como satisfação no trabalho, comprometimento organizacional, qualidade da decisão do grupo, aceitação afetiva do grupo (Amason, 1996; Jehn, 1997; Simons & Peterson, 2000); desempenho e satisfação na equipe (De Dreu & Weingart, 2003) e confiança do indivíduo na equipe (Simons, Peterson, 2000). Esses achados demonstram que conflitos intragrupais são motores de mudanças individuais, grupais e organizacionais porque estimulam o debate de ideias e levam à busca de soluções novas e mais criativas para os problemas enfrentados pela equipe de trabalho.
A terceira variável da qual se tratará é o comprometimento com dois focos: o organizacional e o afetivo com a equipe. O vínculo que o trabalhador desenvolve com a organização foi nomeado comprometimento organizacional por Becker (1960). Mowday, Steers e Porter (1979) definiram-no como "um estado no qual um indivíduo se identifica com uma organização particular e com seus objetivos, desejando manter-se afiliado a ela com vistas a realizar tais objetivos" (p. 225). Esse construto também foi alvo de estudos de Allen e Meyer (1990).
Conhecer melhor esse fenômeno social é estratégico para a gestão de pessoas e políticas no meio organizacional, uma vez que, atualmente, as organizações vivem em ambientes instáveis, enfrentando desafios e problemas inéditos que requerem soluções inovadoras. Nesse contexto turbulento, as organizações necessitam contar com empregados comprometidos com o seu trabalho e empenhados em alcançar as metas propostas pela organização (Guimarães, 2004). Em uma perspectiva micro-organizacional, compreender os vínculos que o empregado estabelece em seu meio de trabalho possibilitaria uma melhor instrumentalização na análise do indivíduo e de sua trajetória profissional, uma vez que é através de seu trabalho que os empregados esperam receber de sua organização retorno de seus atos e investimentos pessoais realizados em seu favor, ou seja, receber retribuições capazes de satisfazer suas necessidades pessoais, familiares e profissionais (Siqueira & Gomide Jr., 2004). Além disso, o comprometimento organizacional tem-se revelado, juntamente com satisfação e envolvimento com o trabalho (Ferraz & Siqueira, 2006), um aspecto importante que, na concepção de Siqueira e Padovam (2004), seria denominado bem-estar no trabalho.
Nota-se, a partir das evidências encontradas pelos estudos anteriormente citados, que o comprometimento organizacional é fenômeno complexo, relevante para o desempenho do empregado e que possui diferentes focos (Bastos, 1994). Diversas abordagens teóricas buscaram explicar a dinâmica do comprometimento organizacional por meio de confirmações empíricas que foram se estabelecendo como partes de arcabouços teóricos, como se constata em Meyer e Allen (1988), Meyer, Paunonem, Gellathly, Goffin e Jackson (1989), Mowday, Porter e Steers (1982) e em Reichers (1985).
Entre as teorias propostas para explicar comprometimento organizacional, há duas correntes de pensamentos que se destacam. A primeira, proposta por Mowday, Porter e Steers (1982), descreve o tipo de comprometimento organizacional afetivo, e a segunda é a visão de Becker (1960), que descreve o comprometimento organizacional calculativo, englobando questões de ganhos e perdas por pertencer à organização ou abandoná-la. Melhor explicando: Becker defendia que o vínculo do indivíduo com a organização se firmava através de ponderações entre perdas e ganhos referentes a continuar na empresa ou a deixála. Allen e Meyer (1990), ao diferenciar esses conceitos, destacam que indivíduos com alto grau de comprometimento organizacional afetivo permanecem na organização porque desejam, enquanto empregados com forte comprometimento organizacional calculativo permanecem na organização porque precisam. Segundo Allen e Meyer, os antecedentes e consequentes dessas duas formas de comprometimento seriam igualmente diferentes.
Allen e Meyer (1990) aprofundaram essas idéias ao propor um modelo tridimensional que fornecia uma distinção conceitual bem clara entre três tipos de comprometimentos organizacionais: afetivo, calculativo e normativo. Segundo eles, comprometimento organizacional afetivo (COA) poderia ser diferenciado pelo vínculo, pelo envolvimento e pela identificação afetiva com a organização; o comprometimento organizacional calculativo (COC) estaria relacionado aos custos percebidos pelo empregado caso saísse da organização de trabalho, ou seja, uma derivação da teoria dos "side-bets" ou dos ganhos secundários; e o comprometimento organizacional normativo (CON) se traduziria no sentimento de dever para com a organização, que se refletiria numa obrigação em permanecer nela. Rego e Souto (2004) confirmam a consistência teórica desse modelo trifatorial, citando fontes que fornecem suporte empírico para ele (Meyer & Allen, 1996; Allen & Smith, 1993; Hackett, Bycio & Hausdorf, 1994; Pavuls, 2000, citados por Rego & Souto, 2004).
Estudos da área comprovam a relevância dessa variável, seja em relação ao bem-estar do empregado no trabalho (Ferraz & Siqueira, 2006), seja em relação ao seu desempenho (Medeiros & Enders, 1998), ou em relação a comportamentos favoráveis ao ambiente de trabalho como cidadania organizacional (Siqueira, 2001).
Apesar dos estudos sobre comprometimento apresentarem-se mais concentrados no comprometimento organizacional, Bastos (1994) e Tamayo, Souza, Vilar e Ramos (2001) afirmam ser possível encontrar, na literatura da área, mais cinco focos diferentes de comprometimento: (1) com o trabalho; (2) com o emprego; (3) com a carreira; (4) com o sindicato e (5) com a equipe. Reichers (1985) já havia destacado esses diferentes focos, explicando que o indivíduo poderia vivenciar diferentes vínculos com diferentes entidades existentes na sua organização, incluindo a equipe de trabalho. Mais recentemente, Bishop, Scott, Goldby e Cropanzano (2005) também estudaram comprometimento com foco na equipe e ressaltaram a importância de diferenciar esse tipo de comprometimento do comprometimento com a organização, pois, aparentemente, o empregado estabelece diferentes vínculos com esses dois aspectos presentes em sua vida profissional.
Pearce e Herbik (2004) sugerem que o comprometimento afetivo com a equipe (CAE) é análogo ao comprometimento afetivo organizacional (COA), exceto que, no primeiro, o alvo do vínculo é a equipe de trabalho à qual o empregado pertence. Outras pesquisas como as de Ellemers e Van den Heuvel (1998) e as de Bishop, Scott e Burroughs (2000) também confirmam essas semelhanças e diferenças entre os dois construtos, considerando que ambos enfatizam a identificação do indivíduo com objetivos, missão e valores daquilo que constitui o foco do comprometimento. No CAE, o foco é a equipe de trabalho mais próxima do empregado, e ele se estabelece a partir da identificação e do envolvimento do sujeito com sua equipe. As principais características do CAE são (1) crença e aceitação dos objetivos e valores da equipe; (2) esforço para o sucesso dela e (3) vontade de permanecer nela (Puente-Palácios, Silva, Carneiro, et al., 2005). CAE é um construto recente e, apesar dessa semelhança com COA, alguns estudos comprovaram empiricamente a discriminação entre ambos os construtos (Bishop, et al, 2000; Ellemers & Van den Heuvel, 1998). Ellemers e Van den Heuvel concluem que, aparentemente, o grau de comprometimento orientado para a equipe pode variar diferentemente do grau de comprometimento orientado para a organização em um mesmo indivíduo. Embora comprometimento afetivo com a equipe seja um tema novo na área do Comportamento Organizacional, autores como Bishop, et al. (2000), Bishop, et al. (2005), Ellemers e Heuvel (1998) e Pearce e Herbik (2004) conseguiram demonstrar empiricamente a discriminação entre CAE, COA e outras variáveis como comportamentos de cidadania organizacional, suporte organizacional e suporte da equipe, confirmando a existência única do CAE, discriminado de outras variáveis.
1.1 Justificativa
De acordo com French e Raven (1959), Hinkin e Schriesheim (1989), Pearson, et al. (2002), Podsakoff e Schriesheim (1984), Rahim e Afza (1993) e Rodrigues e Assmar (2003), há diferentes formas de uma pessoa ou de um grupo influenciar outra pessoa ou outro grupo, utilizando-se de diferentes bases de poder. Isso permite supor que há bases de poder mais adequadas para se alcançar um melhor resultado do empregado e da equipe. Estudos têm confirmado que os tipos de bases de poder do supervisor são bons preditores de satisfação com a supervisão, do desempenho da equipe e do comprometimento organizacional (Hinkin & Schrieshein, 1989; Podsakoff & Schrieshein, 1984; Rahim & Afza, 1993; Rodrigues & Assmar, 2003; Ward, 2001). Além disso, os tipos de conflitos intragrupais foram identificados como fontes influenciadoras de satisfação no trabalho, desempenho da equipe e comprometimento organizacional e com a equipe (Amason, 1996; Cox, 2003; De Dreu & Weingart, 2003; Jehn, 1997; Simons & Peterson, 2000). Sabe-se ainda que o conflito intragrupal pode influenciar, de forma positiva ou negativa, a efetividade da equipe e, consequentemente, sua produtividade e seus resultados (Amason, 1996; Cox, 2003; De Dreu & Weingart, 2003; Jehn, 1994, 1995).
Como afirmam Pearson et al. (2002), Podsakoff e Schriesheim (1984) e Rahim e Afza (1993), é através da interação do indivíduo com seu meio, com sua organização, com seu supervisor, com sua equipe e com seus colegas que o empregado, provavelmente, vai desenvolver comprometimento com a organização e com sua equipe. Nesse contexto de trocas entre o meio e o indivíduo, processos cognitivos e afetivos são vivenciados pelo empregado num caráter adaptativo e regulador, permitindo-lhe reconhecer, ao mesmo tempo, os diferentes objetos de seu ambiente, atribuindo-lhes um valor e um significado pessoal (Siqueira, 1995). Esses achados permitem supor que os comprometimentos organizacionais afetivo e calculativo e o comprometimento afetivo com a equipe sofram influências das bases de poder do supervisor e dos tipos de conflitos vivenciados no interior de suas equipes de trabalho. Seguindo essa linha de pensamento, este trabalho se propôs a investigar a capacidade de um modelo explicativo composto pelos tipos de bases de poder utilizadas pelo supervisor e pelos tipos de conflitos intragrupais percebidos na equipe de trabalho e nos tipos de comprometimentos organizacionais e no comprometimento afetivo com a equipe.
Investigou-se a seguinte problemática: o tipo de base de poder utilizado pelo supervisor, no dia a dia com seus subordinados, e o tipo de conflito intragrupal percebido pelos empregados em suas equipes de trabalho influenciam seu comprometimento organizacional afetivo, seu comprometimento organizacional calculativo e o comprometimento afetivo com a equipe?
1.2 Participantes
Participaram deste estudo 148 trabalhadores. Do total, a maioria era do sexo feminino (53,4%), com idade média de 25 anos (DP = 6,46) e 83% possuíam nível superior incompleto. Havia, em média, 18 pessoas em cada equipe de trabalho (DP = 19,5), mas o valor do DP informava que o tamanho das equipes era muito diversificado, sendo cinco o número mais frequente de componentes nos grupos (Moda=5 correspondendo a 16 % das respostas válidas).
A maior parte dos respondentes (45%) trabalhava em funções administrativas internas, como, por exemplo, auxiliar de escritório. Os demais trabalhavam em ocupações com características operacionais (almoxarife, operador de máquinas), de atendimento (operador telemarketing, secretária, vendedor), supervisão (supervisor, gerente) e educacionais (professor, treinador) (Tabela 1).
2. Método
2.1 Procedimentos
Para testar o modelo cuja variável consequente foi comprometimento afetivo com a equipe (COA), participaram 108 dos 148 trabalhadores da amostra total. Em todos os modelos, o tamanho da amostra atendeu adequadamente às exigências da regressão múltipla (Tabachnick, Fidell, 2001). Os participantes foram voluntários abordados em seu local de trabalho em empresas e em seu local de estudo (escolas técnicas e faculdades da região) da cidade de Uberlândia, MG e região, que concordaram em participar do estudo. Informações e esclarecimentos adicionais foram fornecidos aos participantes, a fim de atender às normas éticas sobre pesquisas com seres humanos.
Os dados obtidos foram analisados por meio do pacote estatístico SSPS (Statistical Package for Social Sciences) for Windows, versão 12.0 e submetidos a análises descritivas (frequências, médias, desvio padrão e cálculo das médias fatoriais das escalas), à análise do "Alpha de Cronbach", ao cálculo de correlações de Pearson. Para o teste dos modelos, foram utilizadas análises de regressão padrão, à luz das quais os resultados foram interpretados (Abbad & Torres, 2002; Tabachnick & Fidell, 2001).
2.2 Instrumentos
Para avaliar as variáveis antecedentes tipos de bases de poder do supervisor e tipos de conflitos intragrupais, foram utilizadas a Escala de Bases de Poder do Supervisor (Martins & Guimarães, 2007) e a Escala de Conflitos Intragrupais (Martins, Guimarães, & Oliveira, 2006), adaptadas e validadas no Brasil e com índices de fidedignidade adequados. Para avaliar o comprometimento afetivo e o comprometimento calculativo foram utilizadas a ECOA (Escala de Comprometimento Organizacional Afetivo) e a ECOC (Escala de Comprometimento Organizacional Calculativo), ambas desenvolvidas e validados por Siqueira (1995). Para medir o comprometimento afetivo com a equipe, utilizou-se a ECAE (Escala de Avaliação do Comprometimento Afetivo com a Equipe), desenvolvida e validada por Puente-Palácios e Caixeta (2006) (Tabela 2).
Informações pessoais - como gênero, escolaridade, função ou cargo que exercia na organização e o número de pessoas compunham da equipe de trabalho - foram obtidas por meio de um questionário anexado no final do conjunto de instrumentos entregue para os participantes.
3. Resultados e discussão
Analisados os pressupostos da análise de regressão múltipla, pôde-se constatar que não havia valores extremos entre as variáveis antecedentes e entre as consequentes, as correlações eram honestas, não havia valores ausentes, as distribuições dos dados eram normais, não ocorreu singularidade ou multicolinearidade entre as Vis, e os erros de predição eram independentes um do outro (Tabachnick & Fidell, 2001). Confirmou-se que os dados atendiam aos pressupostos da técnica.
Partiu-se, assim, para o teste dos modelos hipotéticos do estudo, tentando-se identificar o poder de predição das bases de poder e dos conflitos intragrupais nos dois tipos de comprometimento organizacional e no comprometimento afetivo com a equipe, por meio de três análises de regressão múltipla padrão.
No modelo um, avaliou-se o poder de predição dos tipos de bases de poder do supervisor e dos tipos de conflitos intragrupais percebidos pelos empregados no comprometimento afetivo com a equipe (CAE). O modelo explicou significantemente 30% da variância total explicada (R2 =0,30, F= 7,07, p< 0,001), confirmando uma das hipóteses principais deste estudo (Tabela 3).
Constatou-se que os preditores significantes foram a base de recompensa e o conflito intragrupal de relacionamento. Nota-se que os dois fatores preditores apresentaram impactos diferentes no CAE. Os valores de β demonstraram que o uso pelo supervisor da base de poder de recompensa predisse positivamente o CAE do empregado (β= 0,182, t= 2,06, p<0,05) enquanto o tipo de conflito de relacionamento o predisse inversamente (β= -0,418, t= -3,66, p<0,001). O valor de β revelou o impacto negativo da variável conflito de relacionamento no CAE e a dimensão quase três vezes maior do que o impacto positivo da base de poder de recompensa. Isso permite dizer que, nessa relação, embora o uso da base de poder de recompensa pelo supervisor tenha um impacto positivo no comprometimento afetivo do empregado com sua equipe de trabalho, o conflito intragrupal de relacionamento causou um impacto maior e inverso nesse tipo de comprometimento. Conflito de relacionamento provoca impacto mais forte que o uso pelo supervisor da base de poder de recompensa no CAE, ou seja, a variável afetiva é um preditor mais poderoso de CAE do que a variável cognitiva.
Sobre o primeiro modelo, nota-se que, dentre as bases de poder, a de recompensa foi a única preditora significativa do CAE. Os resultados demonstraram que a utilização pelo supervisor dos aspectos característicos dessa base de poder, como a prática de aumentos salariais, a concessão de benefícios e promoções, explica essa parte significativa da variância do vínculo de comprometimento afetivo que o indivíduo estabelece com sua equipe de trabalho. Assim parece os respondentes dividem com sua equipe a "responsabilidade" pelas recompensas que recebem em forma de aumentos salariais, benefícios ou promoções conquistadas e concedidas por seus supervisores, porque se identificam com ela, com ela partilham seus valores e para com ela têm comportamentos proaativos. Os resultados deste estudo corroboram outros achados da literatura. Bishop et al. (2005) concluíram que o uso da base de poder de recompensa pelo supervisor provoca um impacto positivo no comprometimento do indivíduo com sua equipe de trabalho, o que favorece atitudes e comportamentos benéficos ao grupo, como percepção de suporte na equipe. Bishop et al. (2000) apontaram que a utilização dessa mesma base favorecia a percepção de cidadania organizacional, e Drach-Zahavy e Freund (2006) identificaram que a utilização dessa base beneficiava a efetividade do grupo. Essa discussão será retomada em aspectos mais aprofundados a seguir, ao se tratar do impacto dos tipos de conflito em COA, pela semelhança dos construtos.
No segundo modelo, mantiveram-se como variáveis independentes os tipos de bases de poder do supervisor e os tipos de conflitos intragrupais, e como variável consequente o comprometimento organizacional afetivo. O modelo predisse significantemente 24% de COA (R2 =0,24, F= 7,49, p < 0,001)
Destacaram-se como preditores significantes a base de poder de perícia e o tipo de conflito intragrupal de relacionamento. Os valores de β confirmam que o uso pelo supervisor do tipo de poder de perícia prediz positivamente o COA do empregado (β= 0,238, t= 2,72 p<0,01), enquanto que o tipo de conflito de relacionamento o prediz negativamente (β= -0,234, t= -2,39, p<0,05). Constatou-se que os β dessas duas variáveis possuem valores próximos, indicando que tanto a base de poder de perícia quanto a percepção do conflito de relacionamento na equipe de trabalho têm impactos de dimensões equivalentes no comprometimento organizacional afetivo do empregado, apresentando, no entanto, sentidos inversos.
Nesse segundo modelo, a base de poder que predisse significantemente o COA foi perícia (enquanto em CAE foi recompensa). Isso significa que, quando o subordinado percebe que o supervisor possui um conhecimento técnico especial que ele respeita e o utiliza para influenciá-lo, isso produz impacto positivo no vínculo que ele estabelece com a organização. Dias (2005) afirma que há situações nas quais os empregados personificam a organização na figura de seu supervisor, percebendo suas atitudes como representativas das intenções da própria empresa. Assim, quando o supervisor se comporta, para o empregado é a própria organização que age. Ora, se a organização age adequadamente, o empregado responde com vínculos positivos como COA e com outros comportamentos proativos (Dias, 2005).
Podsakoff e Schriescheim (1984) encontraram relações de predição entre o uso do tipo de poder de perícia e satisfação do empregado com sua chefia. Rahim (1988) e Rahim e Afza (1993) constataram que o uso do tipo de poder de perícia também estaria ligado à satisfação do empregado no trabalho. Carson, Carson e Pence (2002) identificaram que o uso da base de poder de perícia explicava significativamente a percepção de suporte organizacional. Relações de predição entre poder de perícia e COA foram identificadas em outros estudos, como os de Dunne et. al. (1978, citado por Podsakoff & Schriesheim, 1984), Podsakoff e Schriesheim (1984), Rahim e Afza (1993) e Thambain e Gemmill (1974, citado por Podsakoff & Schriesheim, 1984), reforçando os achados deste estudo, no sentido de que o uso pelo supervisor da base de poder de perícia tem impacto positivo no comprometimento afetivo do indivíduo em relação à sua organização de trabalho.
Ao contrário dos tipos de bases de poder, o conflito intragrupal de relacionamento apresentou-se como preditor negativo de ambos os focos de comprometimento afetivo. Seja no âmbito grupal, seja no âmbito organizacional, a presença desse tipo de conflito explicou negativamente os focos afetivos de comprometimento (com a equipe e com a organização). Esse fato corrobora outros estudos que demonstraram o impacto que tal tipo de conflito pode ocasionar em algumas variáveis da área. Cox (2003) constatou que os dois tipos de conflitos intragrupais, de tarefa e de relacionamento, apresentaram impactos negativos na satisfação no trabalho e no desempenho dos membros da equipe que vivencia tais processos. Os resultados De Dreu e Weingart (2003) também comprovam que a existência dos dois tipos de conflitos intragrupais eram prejudiciais ao desempenho da equipe e à satisfação com os membros da equipe, sendo que o conflito de relacionamento apresentou maior impacto negativo sobre as variáveis citadas. Jehn (1997) encontrou influência negativa do conflito de relacionamento na satisfação e no desempenho do grupo. Parece que as conclusões da área estão se afunilando, o que revela, na maioria dos estudos, que conflito de relacionamento realmente explica negativamente os comprometimentos afetivos.
Guetzkow e Gyr (1954), Gladstein (1984) e Jehn (1995) apresentaram evidências relevantes sobre o efeito prejudicial do conflito de relacionamento no comprometimento do empregado com o grupo e com a organização. Esses resultados foram corroborados pelos obtidos por este estudo, que evidenciaram que o tipo de conflito embasado em afetos e emoções produz um impacto negativo que não se restringe apenas ao meio em que é vivenciado. Seu impacto transcende os limites da equipe de trabalho, prejudicando também, em graus similares, o tipo do vínculo que o indivíduo estabelece com sua organização. Estudos revelam associação entre comprometimento organizacional afetivo e cidadania organizacional (Siqueira, 1995), entre cidadania organizacional e efetividade da equipe (Drach-Zahary & Freund, 2006) e entre conflitos intragrupais e efetividade de equipes (Rahim et al, 2000), revelando, no último caso, que conflitos de relacionamento produzem impactos negativos sobre a efetividade das equipes de trabalho. Cidadania organizacional e comprometimento afetivo estão relacionados à manifestação de comportamentos voluntários em prol da organização e estudos (Siqueira, 1995, por exemplo) revelam o papel preditor de COA sobre cidadania. Conclusões de estudos como os anteriormente citados permitem supor que, se conflito de relacionamento produz impacto negativo em comprometimento afetivo, conforme foi constatado neste estudo, se comprometimento afetivo é preditor de cidadania organizacional (Siqueira, 1995), e se conflito afetivo prediz inversamente efetividade de equipes, pode-se esperar que estudos futuros demonstrem que conflito de relacionamento seja prejudicial à cidadania organizacional, porque ela é predita por variáveis como comprometimento afetivo, por exemplo. Numa interpretação aplicada, é importante dizer que os resultados deste estudo sublinham a necessidade de que, nas organizações, as equipes sejam orientadas a identificar o tipo de conflito de relacionamento, notadamente disfuncional, corrigindo a atuação de seus membros para ações mais objetivas e profissionais, relacionadas às tarefas.
Menos conclusivos são os achados sobre o conflito de tarefa. É importante destacar que autores como Cosier, Dalton e Taylor (1991), Jehn (1997) e Simons e Peterson (2000) ressaltam que, em algumas situações, o conflito de tarefa, percebido como mais cognitivo, pode levar ao de relacionamento. Ainda há contradições quanto ao impacto do conflito de tarefa em variáveis consequentes, como COA, CAE, satisfação no trabalho e desempenho do indivíduo no trabalho.
No terceiro e último modelo proposto, constatou-se que nenhum tipo de base de poder e nenhum tipo de conflito predisseram significativamente o comprometimento organizacional calculativo (COC). Uma explicação para isso poderia ser a fragilidade do instrumento utilizado, que possuía dois fatores com alfas abaixo de 0,70, o que pode ter acarretado erros de medida, e nos resultados relativos a esses dois fatores. Apesar disso, parece que tipos de bases de poder e de conflitos não são preditores significantes de COC. Outra hipótese explicativa para os resultados encontrados parece basear-se na natureza cognitiva do comprometimento organizacional calculativo que é mais objetivamente identificável e se baseia na comparação entre custos e benefícios de continuar ou não na organização. Por ser COC um vínculo de natureza cognitiva, parece razoável supor que seja menos influenciado por conflitos de natureza afetiva, como o de relacionamento. COC, como a própria definição propõe (Allen & Meyer, 1990; Becker, 1960), é uma ponderação entre perdas e ganhos, onde entra, por um lado, o que foi investido e, por outro, os retornos obtidos e possíveis de serem obtidos no futuro. Portanto, parece que uma variável afetiva, como conflito de relacionamento, afeta muito pouco esse construto.
O resultado também demonstrou que o tipo de conflito de tarefa não foi preditor significante das variáveis consequentes pesquisadas. Esse dado surpreendeu, uma vez que o tipo de conflito de tarefa foi percebido como o mais forte pelos respondentes. Contudo não se apresentou como preditor significante dos tipos de comprometimento organizacional e do comprometimento afetivo com a equipe. Uma possível explicação para a falta de significância do poder de predição do conflito de tarefa, neste estudo, poderia estar embasada em fatores culturais, uma vez que as pesquisas anteriormente relatadas foram desenvolvidas com sujeitos dos EUA, país de cultura muito mais individualista (Amason, 1996; Cox, 2003; De Dreu & Weingart, 2003; Jehn, 1997; Simons & Peterson, 2000). Dela Coleta e Dela Coleta, (1997) e Guimarães (2004), afirmam que trabalhadores de países em desenvolvimento, como o Brasil, apresentam, na sua atuação profissional, uma maior influência de conteúdos afetivos na percepção de aspectos profissionais, se comparados a trabalhadores de países mais desenvolvidos, que privilegiam, no ambiente organizacional, uma postura mais cognitiva dos processos vivenciados. A partir disso, pode-se explicar porque, na amostra estudada, o tipo de conflito de tarefa foi percebido como maior, pois os participantes parecem ter considerado o debate de idéias e opiniões inerente ao processo e à execução de um trabalho. Apesar disso, esse debate de caráter cognitivo não foi identificado como algo funcional nem disfuncional, pois o trabalhador brasileiro parece não identificar esse tipo de discussão como algo construtivo, que seja bom para o seu crescimento profissional ou intelectual. Outra hipótese explicativa para este resultado seria uma possível transformação, efetivada pelos trabalhadores, do conflito de tarefas em conflito de relacionamento, devido às suas características culturais. Assim, conflitos que podem ter sido originados por aspectos cognitivos teriam sido 'transformados' em conflitos afetivos, porque, segundo Dela Coleta e Dela Coleta (1997), os trabalhadores brasileiros são bastante influenciados por conteúdos afetivos na percepção de aspectos profissionais. Jehn (1995) verificou esse tipo de transformação e afirmou que conflito de tarefa poderia transformar-se em conflito de relacionamento, a depender de sua intensidade, duração e manejo. Assim, parece que os participantes não perceberam o conflito de tarefas como preditor de aspectos complexos, como vínculos afetivos do empregado com a sua organização ou equipe, porque só o conflito de relacionamento, de características igualmente afetivas, importaria para explicar vínculos da mesma natureza. O debate de idéias é parte integrante do conjunto de tarefas, não parecendo ter sido percebido como conflito autêntico. Pode ser que, para esses trabalhadores, conflito seja sinônimo de conflito relacional ou afetivo, existindo assim, para eles, somente esse tipo de conflito. Desse modo, uma discussão cognitiva não seria suficiente para sensibilizá-los e produzir impacto em vínculos como comprometimentos afetivos. Por outro lado, dependendo de aspectos não avaliados neste estudo, um debate que envolvesse dimensões mais intensas e duradouras (Jehn, 1997) poderia ser percebido como uma questão afetiva, um conflito relacional e ser, por isso, capaz de provocar impacto significante em CAE e em COA.
4. Conclusão
Os resultados deste estudo revelaram o impacto de diferentes tipos de bases de poder utilizadas pelo supervisor e os tipos de conflitos que são percebidos no interior dos grupos e o que podem representar nos vínculos que o indivíduo estabelece com a organização e com sua equipe de trabalho. As evidências empíricas deste estudo confirmaram os resultados encontrados por outros autores, como se demonstrou na discussão dos resultados, permitindo dizer que o tipo de base de poder utilizado pelo supervisor no dia a dia exerce papel importante no desenvolvimento dos focos de comprometimentos afetivos no trabalho, quer sejam com a organização, quer sejam com a equipe. Como demonstram estudos anteriormente relatados, o comprometimento organizacional afetivo é antecedente de aspectos importantes para o desempenho do empregado e da organização, como, por exemplo, menor rotatividade (Medeiros & Enders, 1988), menor absenteísmo (Siqueira & Gomide Jr., 2004) e maior esforço do empregado no trabalho (Pinto Jr., 2005). Pode-se considerar que os tipos de comprometimentos com bases afetivas se destacam como aspectos fundamentais na compreensão do comportamento e de atitudes dos trabalhadores.
Os resultados deste estudo confirmam ainda que as bases de poder de perícia e recompensa, quando utilizadas pelos subordinados, são benéficas para o subordinado, para a equipe e para a organização, corroborando achados de outros estudos (Carson, Carson & Pence, 2002; Rahim & Afza,1993, Rahim et. al. 2000, Ward, 2001). Confirmaram ainda que o tipo de conflito de relacionamento é disfuncional para todas as perspectivas do comprometimento afetivo. Considera-se que estes resultados colaboraram no sentido de trazer um pouco mais de informação para o desenvolvimento do conhecimento científico sobre os temas abordados.
Apesar do cuidado teórico e metodológico deste estudo, muitas questões surgidas durante o seu andamento não foram respondidas adequadamente, e é por isso se propõe uma agenda de pesquisa que contemple tais aspectos. Investigações acerca dessas questões seriam de grande valia para esclarecer incertezas sobre o tema. Sugerem-se estudos que investiguem por que as bases de poder legítimo e de coerção não apresentaram impacto significante no comprometimento do empregado. Sugere-se ainda que conflito de tarefa seja mais bem estudado, porque se questiona se, na população brasileira, ele seria mesmo percebido como algo benéfico para a equipe, como concluíram estudos internacionais sobre o tema e se ele seria mesmo percebido como um tipo de conflito, discriminado do conflito de relacionamento. Propõe-se ainda um aprimoramento das qualidades psicométricas da escala de COC para, posteriormente, se investigarem as relações entre esse tipo de vínculo e as variáveis estudadas nesta pesquisa. Um maior número de estudos sobre bases de poder, conflitos intragrupais e comprometimento organizacional com trabalhadores de outras regiões do País seria essencial para consolidar evidências encontradas neste estudo.
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