SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.19 número4Criatividade, inovação e características da tarefa em empresas juniores: estudos de casos múltiplosPercepção de desempenho de pessoas com deficiência e desenho do trabalho índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

artigo

Indicadores

Compartilhar


Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.19 no.4 Brasília out./dez. 2019

https://doi.org/10.17652/rpot/2019.4.17501 

Percepções de teletrabalhadores e trabalhadores presenciais sobre desenho do trabalho

 

Perceptions of teleworkers and face-to-face workers about work design

 

Percepciones de teletrabajadores y trabajadores presenciales respecto del diseño del trabajo

 

 

Gardênia da Silva Abbad; Juliana Legentil; Matheus Damascena; Lisa Miranda; Caroline Feital; Elaine Rabelo Neiva

Universidade de Brasília (UnB), Distrito Federal, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Apesar da crescente adoção do teletrabalho no Brasil, há poucas publicações nacionais acerca dessa modalidade. Esta pesquisa tem como objetivos comparar as opiniões de 270 teletrabalhadores e 266 trabalhadores presenciais em relação ao desenho do trabalho, de acordo com a teoria de Morgeson e Humphrey (2006), e analisar a influência exercida por variáveis sociodemográficas e funcionais sobre características da tarefa e do conhecimento. Os dados foram submetidos a análises fatoriais, testes t e regressões múltiplas. Os principais resultados deste estudo mostraram que as percepções de teletrabalhadores e trabalhadores presenciais diferem em sete das dez características estudadas. Teletrabalhadores perceberam menor autonomia de decisão, variedade, significado, identificação da tarefa, complexidade, solução de problemas e especialização do que os trabalhadores presenciais. São necessários estudos que investiguem antecedentes da escolha da modalidade de trabalho pelo trabalhador e consequências do teletrabalho na motivação, no comprometimento, na saúde, na produtividade e nas interfaces entre o trabalho e a família.

Palavras-chave: Desenho do trabalho; Teletrabalho; Organização pública.


ABSTRACT

Despite the increasing adoption of telework in Brazil, there are few national publications about this modality. This research aims to compare the views of 270 teleworkers and 266 face-to-face workers in relation to the design of the work, according to the Morgeson and Humphrey (2006) theory, and to analyze the influence exerted by sociodemographic and functional variables on task and knowledge characteristics. Data were submitted to factor analysis, t-tests, and multiple regressions. The main results of this study showed that the perceptions of teleworkers and face-to-face workers differ in seven of the ten characteristics studied. Teleworkers perceived less decision-making autonomy, task variety, task significance, task identity, job complexity, problem solving, and specialization than the face-to-face workers. Studies are required that investigate the antecedents of the choice of the modality and the consequences of telework on motivation, commitment, health, productivity, and interfaces between work and family.

Keywords: work design, telework, public organization.


RESUMEN

A pesar de la creciente adopción del teletrabajo en Brasil, hay pocas publicaciones nacionales acerca de esa modalidad. Esta investigación tiene como objetivos comparar las opiniones de 270 teletrabajadores y 266 trabajadores presenciales con relación al diseño del trabajo, de acuerdo con la teoría de Morgeson y Humphrey (2006), y analizar la influencia ejercida por variables sociodemográficas y funcionales sobre características de la tarea y del conocimiento. Los datos fueron sometidos a análisis factoriales, pruebas t y regresiones múltiples. Los principales resultados mostraron que las percepciones de teletrabajadores y trabajadores presenciales difieren en siete de las diez características estudiadas. Los teletrabajadores percibieron menor autonomía de decisión, variedad, significado, identificación de la tarea, complejidad, solución de problemas y especialización que los trabajadores presenciales. Se necesitan estudios que investiguen antecedentes de la elección de la modalidad y consecuentes del teletrabajo sobre motivación, compromiso, salud, productividad e interfaces trabajo-familia.

Palabras claves: diseño del trabajo, teletrabajo, organización pública.


 

 

O teletrabalho surge como uma transformação no modo de se realizar o trabalho, mediado e viabilizado pela tecnologia da informação e da comunicação (TIC). A onipresença da TIC permite que muitas atividades do trabalho sejam realizadas a qualquer hora e em qualquer lugar (Boell, Campbell, Cecez-Kecmanovic, & Cheng, 2013), e, de forma mais ampla, é possível definir o teletrabalho como o trabalho realizado em um local diferente do ambiente organizacional convencional (Aguilera, Lethiais, Rallet, & Proulhac, 2016). Ao expandir os limites de quando e onde é possível se envolver com atividades relacionadas ao trabalho, o teletrabalho não está apenas ultrapassando os limites temporais e espaciais previamente conhecidos como também está mudando o desenho do trabalho em si (Ling, 2008). Em face da crescente adoção dessa modalidade por organizações públicas e privadas, este estudo visa a comparar as opiniões de 270 teletrabalhadores e 266 trabalhadores presenciais à luz da teoria de desenho do trabalho de Morgeson e Humphrey (2006), bem como analisar a influência exercida por variáveis sociodemográficas e funcionais sobre as características da tarefa e do conhecimento.

O construto multidimensional conhecido internacionalmente como Work Design (WD) (desenho do trabalho) descreve como tarefas e funções são estruturadas, executadas e modificadas, bem como o impacto desses fatores nos resultados individuais, de grupo e organizacionais (Baeza, Gonzalez, & Wang, 2018; Brewer, 1998; Deng & Joshi, 2016; Gajendran & Harrison, 2007; Golden, 2007; Grant & Parker, 2009; Hackman, 1980; Hernaus & Pološki Vokic, 2014; Humphrey, Nahrgang, & Morgeson, 2007; Kossek, Lautsch, & Eaton, 2006; Morgeson & Humphrey, 2006; Van Sell & Jacobs, 1994).

O conceito de desenho de trabalho inspirou a construção do instrumento denominado Work Design Questionnaire (WDQ) (Morgeson & Humphrey, 2006), composto por 77 itens associados a uma escala de concordância que contém as seguintes dimensões: (1) características da tarefa (CT); (2) características do conhecimento (CC); (3) características sociais (CS); e (4) características do contexto (CCx). Testado nos cinco continentes, o instrumento mostrou evidências de validade em pesquisa nacional (Borges-Andrade, Peixoto, Pérez-Nebra, & Queiroga, 2019), e há diversos estudos que tratam dos atributos ou características essenciais do trabalho. Contudo, as pesquisas que descrevem as características do teletrabalho de acordo com referenciais teóricos robustos e apoiados em literatura científica são escassas.

No Brasil, particularmente, não foram identificadas publicações que tenham investigado o teletrabalho com o apoio do WD. As únicas produções científicas localizadas, ainda no formato de dissertações, apoiaram-se na teoria de desenho do trabalho, em especial no WDQ (Morgeson & Humphrey, 2006), para relacioná-la ao desenvolvimento profissional, às estratégias de aprendizagem, ao engajamento no trabalho e ao comprometimento organizacional. Em recente análise da produção internacional de conhecimentos sobre desenho do trabalho nos últimos 100 anos, foram encontradas inúmeras evidências de relacionamento positivo entre percepções de autonomia, significado, identidade, complexidade e suporte social ao trabalho com satisfação, produtividade, bem-estar, presenteísmo, comprometimento, criatividade, saúde mental, saúde ocupacional, qualidade de vida, entre outros resultados importantes para as organizações (Parker, Morgeson, & Johns, 2017).

Embora a literatura aponte que o teletrabalho é marcado pela autonomia (Gajendran & Harrison, 2007; Golden & Gajendran, 2018; Sardeshmukh, Sharma, & Golden, 2012) e propício ao desenvolvimento de atividades complexas (Golden & Gajendran, 2018), alguns autores observaram que a dispersão geográfica dos trabalhadores pode dificultar a solução de problemas. Ainda que os teletrabalhadores afirmem que a tecnologia possibilita a comunicação síncrona, a ausência da comunicação informal faz todos os envolvidos terem de despender mais tempo para solucionar um problema (Koppman & Gupta, 2014).

Visando a identificar as possíveis peculiaridades da modalidade teletrabalho em comparação ao trabalho presencial, optou-se por aplicar todos os itens contidos nas dimensões características da tarefa e características do conhecimento do WQD, agrupados nas subdimensões: autonomia na planificação do trabalho (AUT1), autonomia de decisão e realização do trabalho (AUT2), variedade de tarefas (VAR), significado da tarefa (SIG), identificação da tarefa (IDE), feedback do trabalho (FED), complexidade do trabalho (COM), processamento de informação (PRO), solução de problemas (SOL) e especialização (ESP). Esse conjunto permite explorar algumas características centrais tanto do trabalho desenvolvido presencialmente quanto do teletrabalho. Parker (2014) explica que práticas organizacionais, como o teletrabalho, podem afetar diretamente as características do trabalho, gerar novas características ou, ainda, exercer influência cruzada sobre as características do desenho do trabalho.

Como o desenho do trabalho nem sempre se apoia em resultados de pesquisas científicas, é interessante notar que a adoção de uma modalidade ou o ajustamento das características do trabalho não se relacionam necessariamente de forma linear e positiva com os resultados esperados. Há estudos que apoiam a variabilidade dos efeitos do desenho do trabalho, ou seja, características do trabalho consideradas positivas, em algumas circunstâncias, podem contribuir menos para o bem-estar do trabalhador ou até mesmo prejudicá-lo fortemente, a exemplo da relação entre complexidade do trabalho e esgotamento emocional (Parker et al., 2017).

Nota-se um crescente interesse pela investigação dos atributos do teletrabalho e suas consequências para as organizações e para os teletrabalhadores (Aguilera et al., 2016; Bailey & Kurland, 2002; Bentley et al., 2016; Boell et al., 2013; Boell, Cecez-Kecmanovic, & Campbell 2016; Magno Boonen, 2002; Peters et al., 2018; Pyöriä, 2011). Um estudo recente de Golden e Gajendran (2018) destacou que, no teletrabalho, ao ocorrer mudança do local de trabalho para um novo ambiente, a atividade a ser realizada não costuma vir acompanhada por mudanças no propósito, nem nas responsabilidades concebidas. Todavia, ainda não há consenso quanto aos efeitos do teletrabalho nas organizações e nos indivíduos (Barros & Silva, 2010).

Estudos sugerem que, em níveis de realização da tarefa, o teletrabalho proporciona um aumento da flexibilidade sobre onde e quando o trabalhador efetivamente realizará o seu trabalho (Boell et al., 2013), possibilitando uma diminuição no tempo gasto em deslocamentos e custos para tal (Kanellopoulos, 2011). Também existem resultados de pesquisas que mostram o teletrabalho como uma modalidade que abarca atividades mais complexas, as quais exigem conhecimentos especializados e altos níveis de instrução. Desse modo, o teletrabalhador tende a desempenhar funções que permitem ter autonomia para a tomada de decisão. Noonan e Glass (2012) observaram que, ao contrário do que imaginavam, os trabalhadores com filhos dependentes não estão mais propensos a teletrabalhar do que os demais trabalhadores.

No teletrabalho, o empregado geralmente executa suas atividades em um ambiente doméstico, longe da organização (Golden & Gajendran, 2018). A literatura sugere que essa alternativa proporciona benefícios, uma vez que torna possível a conciliação das responsabilidades profissionais com as necessidades pessoais e familiares (Gajendran & Harrison, 2007; Kanellopoulos, 2011; Raghuram & Wiesenfeld, 2004). Contudo, é necessário considerar que as relações que os indivíduos desenvolvem com seus colegas, subordinados e supervisores no ambiente organizacional são fatores importantes que moldam e dão sentido à experiência de trabalho (Chiaburu & Harrison, 2008). O estudo conduzido por Collins, Hislop e Cartwright (2016) analisou como os teletrabalhadores, os trabalhadores presenciais e os gestores entendiam e davam sentido às relações de suporte social que existiam entre eles. Essa investigação demonstrou que os teletrabalhadores trabalharem em regime integral foi considerado crucial na formação da relação entre eles e os trabalhadores presenciais, e, com o tempo, um sentimento de desconexão social se desenvolveu. Esse estudo também mostrou que, para entender completamente a maneira que os teletrabalhadores realizam seu trabalho e organizam seus mecanismos de apoio social, é necessário levar em conta a relação complexa, dinâmica e evolutiva entre teletrabalhadores, gestores e trabalhadores presenciais.

Os resultados das pesquisas não são conclusivos sobre as vantagens e desvantagens do teletrabalho para o indivíduo e para a organização, tampouco sobre as diferenças entre o trabalho presencial e o remoto. Em recente revisão da produção científica brasileira publicada entre 1995 e 2018, identificou-se que a maior parte dos trabalhos descreve as percepções dos indivíduos, seja retratando as vantagens e desvantagens dessa modalidade e comparando-as com a literatura, seja apresentando uma visão mais crítica sobre as implicações do teletrabalho para a vida pessoal e profissional do indivíduo (Legentil, Carmo, Silva, Meneses, & Abbad, 2018).

Os autores indicam que as vantagens mais recorrentes no nível do indivíduo referem-se à flexibilidade, à autonomia, à redução ou eliminação dos deslocamentos, ao aumento do bem-estar e à maior produtividade (Aderaldo, Aderaldo, & Lima, 2017; Barros & Silva, 2010; Mello, Santos, Kuniyoshi, Gaspar, & Kubo, 2014; Pardini, Gonçalves, Paiva, & Dias, 2013; Pereira Junior & Caetano, 2009). Há aspectos que são controversos, como a aproximação física da família e as interrupções decorrentes da dificuldade de compreensão dos familiares acerca dessa configuração (Aderaldo et al., 2017; Nohara, Acevedo, Ribeiro, & Silva, 2010; Pereira Junior & Caetano, 2009). Os estudos nacionais que abordam as desvantagens dessa modalidade de trabalho indicam que as queixas mais comuns são a sobrecarga de trabalho e o isolamento social (Barros & Silva, 2010; Nogueira & Patini, 2012; Nohara et al., 2010; Pereira Junior & Caetano, 2009). Também são constatadas preocupações dos teletrabalhadores em relação à administração da flexibilidade de horários, ao aumento do controle da produtividade e à menor visibilidade profissional (Aderaldo et al., 2017; Barros & Silva, 2010; Nogueira & Patini, 2012; Rafalski & Andrade, 2015), além da incompreensão dos colegas que exercem o trabalho presencial (Nohara et al., 2010).

Foram encontrados somente dois estudos que utilizam o WDQ para investigar aspectos do teletrabalho: o primeiro seleciona as subdimensões suporte social, interdependência recebida e interação com pessoas externas à organização para investigar o papel moderador do teletrabalho, em tempo parcial, sobre a exaustão decorrente da interação social (Windeler, Chudoba, & Sundrup, 2017); o segundo investiga em quais condições o teletrabalho pode ajudar ou dificultar o desempenho no trabalho, tendo como base as subdimensões complexidade do trabalho, solução de problemas, interdependência e suporte social (Golden & Gajendran, 2018).

Ao investigar se as características das tarefas e as características do conhecimento diferem entre as modalidades de trabalho, explicitando possíveis associações entre as percepções dos trabalhadores e as variáveis sociodemográficas e funcionais, este artigo integra esse esforço coletivo e almeja reduzir as lacunas teórica e metodológica identificadas. Não se sabe, por exemplo, se os trabalhadores remotos são influenciados pelos diferentes contextos organizacionais observados, tal como aqueles que permanecem na modalidade presencial, o que poderia prover informações valiosas para as organizações aprimorarem suas práticas.

Assim, este estudo descritivo e exploratório buscou ampliar a compreensão sobre o teletrabalho no Brasil em organizações públicas ao (1) descrever e (2) comparar as opiniões de teletrabalhadores e trabalhadores presenciais sobre as características das tarefas e do conhecimento, e (3) analisar a influência exercida pelas variáveis sociodemográficas (sexo, idade, estado civil, familiares dependentes, nível de escolaridade) e funcionais (organização do Poder Judiciário ou do Executivo, modalidade presencial ou teletrabalho, função gerencial ou não, e tempo de serviço na organização) sobre características da tarefa (autonomia na planificação do trabalho, autonomia de decisão e realização do trabalho, variedade de tarefas, significado da tarefa, identificação da tarefa, feedback do trabalho) e características do conhecimento (complexidade do trabalho, processamento de informação, solução de problemas e especialização).

 

Método

Caracterização das Organizações Pesquisadas

Participaram da pesquisa uma organização do Poder Judiciário e outra do Poder Executivo que implementaram o programa de teletrabalho (home office), de modo a permitir a identificação de possíveis diferenças nas características do trabalho. O órgão do Poder Judiciário adota a modalidade teletrabalho desde 2012 e, de acordo com sua norma interna, compete ao gestor imediato fixar metas, deliberar sobre a concessão do teletrabalho ao servidor, além de acompanhar a produtividade individual. É realizado o acompanhamento anual dos teletrabalhadores por meio de entrevistas com psicólogos organizacionais, com o objetivo de identificar se as condições de saúde física e mental continuam adequadas. Observa-se, neste caso, que a implantação do teletrabalho visa a conciliar os anseios dos servidores (aumento da flexibilidade e mais qualidade de vida) com o incremento da produtividade organizacional.

No órgão do Poder Executivo, a primeira tentativa de implantação do teletrabalho ocorreu em 2012, mas somente cinco anos depois a modalidade foi instituída. Observa-se que a preocupação com a metrificação das tarefas e o funcionamento dos mecanismos de controle da produção são os aspectos mais salientes da norma. Até o término da coleta de dados, não havia qualquer programa de acompanhamento instituído com o objetivo de avaliar as condições psicossociais dos teletrabalhadores, como desmotivação, dificuldade de concentração e depressão. Verifica-se, nesse caso, que a implantação do teletrabalho enfatiza o ganho de performance e não estabelece um limite fixo de servidores por unidade administrativa. Embora a concepção da modalidade teletrabalho apresente diferenças importantes entre os órgãos participantes da pesquisa, as metas de desempenho para esse regime são as mesmas em ambos os casos (no mínimo 15% superior à meta fixada para o trabalhador presencial). Logo, o ganho de produtividade, em certa medida, é inerente à implantação da modalidade.

Participantes

Os participantes foram escolhidos de modo não aleatório, por conveniência e acessibilidade. Participaram desta pesquisa 536 trabalhadores, sendo 270 teletrabalhadores, que já trabalharam em regime presencial, e 266 trabalhadores presenciais de duas organizações públicas, uma do Poder Executivo e outra do Poder Judiciário. Nessa amostra, predominam servidores do sexo feminino (60,4%), casados (70,7%), com nível educacional de especialização (55,4%), com familiares dependentes (64,6%) e que não exercem funções gerenciais (67,7%). Os respondentes têm, em média, 45,14 anos de idade (DP = 9,90) e 14,40 anos de serviço (DP = 9,6). Dos 115 teletrabalhadores lotados no órgão do Poder Executivo Federal, 73 (63,5%) responderam ao questionário, ao passo que no Judiciário Federal, dos 96 teletrabalhadores, 46 (48%) participaram da pesquisa.

Instrumentos e Medidas

O instrumento adotado neste estudo é uma versão reduzida do WDQ de autoria de Morgeson e Humphrey (2006), traduzida, adaptada para a língua portuguesa e aplicada anteriormente em diversas amostras de trabalhadores brasileiros por Borges-Andrade et al. (2019). O questionário contém dois conjuntos de questões referentes às características da tarefa - CT (24 itens) e às características do conhecimento - CC (20 itens), totalizando 44 itens associados a uma escala Likert de cinco pontos em que 1 corresponde a "discordo totalmente" e 5 a "concordo totalmente". Ao final do questionário, foram inseridos itens sobre os dados sociodemográficos e funcionais.

A estrutura empírica do WDQ para as duas dimensões adotadas (CT e CC) foi parcialmente confirmada pela análise fatorial confirmatória (AFC) realizada neste estudo. Para que os índices do modelo estrutural atingissem valores satisfatórios, foi necessário eliminar um item de CT e quatro itens de CC.

As seis dimensões de CT são: (1) AUT1, que contém três itens com cargas fatoriais estimadas de 0,668; 0,730 e 0,797 e α = 0,77; (2) AUT2, que contém seis itens com cargas estimadas de 0,742; 0,692; 0,750; 0,778; 0,851 e 0,808 e α = 0,90; (3) VAR, que é composta por quatro itens com cargas de 0,889; 0,898; 0,892 e 0,833 e α = 0,93; (4) SIG, formada por quatro itens com cargas estimadas de 0,577; 0,656; 0,949 e 0,932 e α= 0,86; (5) IDE, que contém três itens com cargas fatoriais estimadas de 0,686; 0,967 e 0,894 e α = 0,87; e (6) FED, com três itens com cargas fatoriais de 0,821; 0,921 e 0,917 e α= 0,91. As quatro dimensões de CC são: (1) COM, composta por três itens com cargas fatoriais estimadas de 0,806; 0,901 e 0,859 e α = 0,89; (2) PRO, composta por três itens com cargas estimadas de 0,380; 0,838 e 0,775 e α = 0,66; (3) SOL, formada por seis itens com cargas de 0,512; 0,540; 0,906; 0,906; 0,785 e 0,841 e α = 0,87; e (4) ESP, composta por quatro itens com cargas fatoriais de 0,888; 0,644; 0,907 e 0,872 e α = 0,89. As escalas apresentam índices psicométricos satisfatórios e o modelo estrutural revelado pela AFC obteve bons índices de ajuste (GFI = 0,91; CFI = 0,91; TLT = 0,90; NFI = 0,91; RMSEA = 0,06; LO = 0,057; HI90 = 0,06).

Procedimentos de Coleta de Dados e Cuidados Éticos

A coleta de dados foi realizada de forma on-line por meio do Survey Monkey para os trabalhadores presenciais e teletrabalhadores de ambas as organizações, sendo que no órgão do Poder Judiciário foi possível aplicar o questionário presencialmente, em meio impresso, para 22 teletrabalhadores. Na coleta presencial, os participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assegurando a participação anônima e voluntária. Para a coleta on-line, os participantes receberam um e-mail com um link externo para o questionário, convidando-os a participar da pesquisa. A primeira página do instrumento on-line continha uma declaração da coordenadora da pesquisa, a qual assegurava que os dados seriam divulgados de modo agrupado e solicitava a concordância do participante antes de prosseguir com o preenchimento das respostas.

Procedimentos de Análise de Dados

Para a realização das análises estatísticas descritivas foram utilizados os softwares SPSS v. 21.0 e AMOS 20. As respostas numéricas dos participantes ao questionário foram submetidas às análises estatísticas descritivas e inferenciais de comparação entre médias, testes t, correlações bivariadas (Pearson), AFC e de consistência interna (alfa de Cronbach) e regressões múltiplas padrão. Foram também testados os pressupostos estatísticos da análise de regressão múltipla, conforme recomendações de Hair, Black, Babin, Anderson, & Tatham (2010). O modelo de equação estrutural, adotado para testar a estrutura fatorial do instrumento, foi estimado por máxima verossimilhança por meio do programa AMOS 20 para verificação do ajuste dos modelos a partir dos indicadores apontados por Byrne (2010) e Kline (2005): Goodness-of-Fit Index (GFI), Comparative Fit Index (CFI) e Root-Mean-Square Error of Aproximation (RMSEA).

O cálculo das médias fatoriais utilizadas nas análises de diferenças entre médias e regressões múltiplas foi realizado a partir da estrutura empírica resultante da AFC realizada neste estudo. Foram realizadas 10 análises de regressão múltipla, sendo uma para cada variável critério de desenho do trabalho (médias dos fatores), com variáveis sociodemográficas e funcionais como preditivas. As variáveis independentes categóricas dicotômicas foram submetidas ao dummy coding.

 

Resultados

A Tabela 1 compara as percepções de teletrabalhadores e trabalhadores presenciais em relação às características do trabalho. Os resultados apresentados indicam que a modalidade de trabalho exerce influência sobre as percepções dos indivíduos acerca do desenho do trabalho em quase todas características da tarefa e em todas as características do conhecimento.

 

 

No que diz respeito às CT, observou-se que em AUT2, SIG, IDE e FED houve diferença significativa entre os dois grupos, indicando que os servidores em regime de teletrabalho perceberam menor autonomia de decisão e realização do trabalho, significado, identificação e feedback que os trabalhadores presenciais. Isso pode ser compreendido em função do nível de controle de desempenho e de alcance de metas decorrente das normas que estabelecem que o servidor teletrabalhador deve produzir, no mínimo, 15% a mais que o servidor do regime presencial em sua unidade, sob pena de ser desligado do programa de teletrabalho por desempenho insuficiente. Além disso, o teletrabalhador, ao afastar-se fisicamente de seus gestores e colegas, passa a receber todas as demandas de trabalho por meio eletrônico, o que parece ter afetado suas percepções sobre o desenho do trabalho. Ainda com relação às CT, os grupos de teletrabalhadores e trabalhadores presenciais não diferem com relação às suas percepções acerca de AUT1 e VAR.

Quanto às CC requeridas pelas tarefas, observaram-se diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos, indicando que os teletrabalhadores percebem menores COM, PRO, SOL e ESP do que os trabalhadores presenciais. Esses resultados sugerem que o trabalhador presencial pode estar sujeito à maior variabilidade de tarefas e de contingências em sua rotina laboral quando comparado ao teletrabalhador, o que poderia contribuir para explicação da diferença significativa em todas as CC.

A Tabela 2 mostra as correlações entre as variáveis sociodemográficas e funcionais e as variáveis de desenho do trabalho. A Tabela 3 apresenta os principais resultados das análises de regressão múltipla para as dez variáveis de desenho do trabalho com variáveis sociodemográficas e funcionais como preditoras. Dos dez modelos, seis apresentaram baixos coeficientes de regressão múltipla (R) e de determinação (R2), porém estatisticamente diferentes de zero. Apenas quatro equações (SIG, COM, SOL e ESP) alcançaram coeficientes de valores intermediários. Observa-se, na Tabela 3, que a variável "modalidade" está presente como preditora de oito das dez variáveis de desenho do trabalho, indicando que teletrabalhadores e trabalhadores presenciais têm percepções distintas quanto a essas dimensões.

Participantes vinculados à organização do Poder Judiciário relataram maior autonomia de planificação do trabalho do que os servidores do Poder Executivo, conforme resultados apresentados na Tabela 3. As demais variáveis foram excluídas da equação de Regressão Múltipla (RM), mantendo-se apenas a variável organização com coeficiente beta estatisticamente diferente de zero. Os valores de R (0,25) e R2 (0,05) mostram que o modelo explica uma porção pequena da variabilidade das respostas dos participantes à escala AUT1.

O segundo modelo demonstra que apenas três das oito variáveis inseridas na análise explicam uma porção significativa da variabilidade das respostas dos participantes à escala AUT2. Os coeficientes beta mostram que os trabalhadores presenciais, não ocupantes de função gerencial e vinculados à organização do Poder Judiciário relataram maior autonomia do que os demais participantes. Os valores de R (0,27) e R2 (0,06) indicam, entretanto, que esse modelo explica uma porção pequena da variabilidade das respostas à escala AUT2.

A Tabela 3 também mostra que três variáveis (MOD, ORG, GER) explicam uma porção significativa da variabilidade das respostas dos participantes à escala VAR. Os coeficientes beta indicam que os trabalhadores presenciais, não ocupantes de função gerencial e vinculados à organização do Poder Judiciário relataram maior variedade de tarefas do que os demais. Os valores de R (0,26) e R2 (0,05) indicam, todavia, que esse modelo explica uma porção pequena da variabilidade das respostas à escala VAR.

Observa-se, na Tabela 3, que a equação de RM para SIG indica que as variáveis modalidade do trabalho e familiar dependente explicam uma porção significativa da variabilidade das respostas dos servidores à escala. Os coeficientes beta mostram que os trabalhadores presenciais e os com familiar dependente atribuem maior significado às tarefas do que os demais participantes da pesquisa.

Os resultados mostram que três variáveis (MOD, ORG, EC) explicam uma porção pequena (R = 0,24; R2 = 0,07) mas estatisticamente significativa da variabilidade das respostas à escala IDE. Os coeficientes beta mostram que os trabalhadores presenciais, que atuam na organização do Poder Judiciário e que não se declaram casados relataram maior IDE do que os demais participantes da pesquisa.

Apenas a variável ORG apresenta coeficiente beta estatisticamente diferente de zero, explicando uma pequena porção da variabilidade das respostas dos participantes à escala FED.

A equação de RM para COM mostra que as variáveis MOD e FD predizem uma porção significativa da variabilidade de respostas dos participantes a essa escala. Os coeficientes beta indicam que os trabalhadores presenciais e os com familiar dependente percebem maior complexidade do trabalho do que os teletrabalhadores e dos que disseram não ter familiar dependente.

A equação de RM para SOL mostra que as variáveis MOD, FD e SEX predizem uma porção significativa da variabilidade de respostas dos participantes a essa escala. Os coeficientes beta revelam que os respondentes em regime de trabalho presencial com familiar dependente e sexo feminino informaram que as tarefas que realizam exigem mais solução de problemas do que as realizadas pelos teletrabalhadores sem familiar dependente e do sexo masculino.

A equação de RM para ESP mostra que as variáveis MOD, ORG, GER, FD e SEX predizem uma porção significativa da variabilidade de respostas dos participantes a essa escala. Os coeficientes beta mostram que os servidores em regime de trabalho presencial que atuam no órgão do Poder Judiciário, ocupam função gerencial, têm familiar dependente e são do sexo feminino perceberam que as tarefas que executam exigem maior especialização do que as realizadas pelos teletrabalhadores que atuam no Poder Executivo, não ocupam função gerencial, não têm familiar dependente e são do sexo masculino.

Em suma, levando-se em conta as contribuições de variáveis antecedentes na explicação das variáveis critério, observa-se que os servidores lotados no órgão do Poder Judiciário relataram maior autonomia na planificação do trabalho, maior autonomia de decisão e realização do trabalho, além de maiores identificação e feedback da tarefa e especialização do que os servidores da organização do Poder Executivo, indicando a importância do contexto organizacional para a compreensão dessas diferenças. Como no órgão do Poder Executivo as normas de monitoramento e avaliação da produtividade são mais sistemáticas e rígidas do que as do órgão do Poder Judiciário, supõe-se que esse modelo de gestão tenha implicado na percepção de menor autonomia para planificar a realização das tarefas. Este estudo mostra, também, que a modalidade do trabalho é uma variável relevante e que influencia as percepções dos servidores sobre o desenho do trabalho em quatro das seis dimensões relativas a CT e em todas as dimensões de CC.

Quanto às variáveis sociodemográficas, os resultados revelam pequena contribuição de algumas delas na explicação das variáveis de desenho do trabalho. A idade não foi preditora de nenhuma variável de desenho do trabalho e a variável sexo foi preditora das percepções acerca da exigência de solução de problemas e especialização, indicando que essas características são mais salientes entre as mulheres. Quanto às variáveis funcionais, apenas ocupação de cargo gerencial mostrou-se relacionada positivamente à autonomia de decisão e realização, variedade de tarefas, demanda de processamento de informações e especialização.

 

Discussão

Embora Golden e Gajendran (2018) tenham afirmado que a adoção do teletrabalho não está necessariamente associada a mudanças no propósito do trabalho, este estudo identificou que os trabalhadores presenciais e os teletrabalhadores têm percepções distintas em relação às CT e CT, tal como previsto por Parker (2014). Ling (2008) afirma que o teletrabalho está mudando o desenho do trabalho em si e os resultados desta pesquisa também apontam nessa direção.

Apesar de a literatura mencionar que o teletrabalho é marcado pela autonomia (Gajendran & Harrison, 2007; Golden & Gajendran, 2018; Sardeshmukh et al., 2012), verifica-se que os trabalhadores presenciais percebem maior autonomia de decisão e realização do trabalho do que os teletrabalhadores. Nota-se, ainda, que as opiniões dos servidores dos Poderes Executivo e Judiciário também diferem entre si em cinco das dez características do trabalho investigadas.

No tocante ao significado da tarefa, os resultados da metanálise realizada por Humphrey et al. (2007) indicam que a significância da tarefa afeta inúmeros resultados atitudinais, como a satisfação no trabalho, o comprometimento organizacional e a motivação para o trabalho. O significado da tarefa também emergiu como um importante construto que afeta o engajamento dos trabalhadores (Deng & Joshi, 2016) e relaciona-se positivamente com o comportamento orientado para a mudança (Hernaus & Pološki Vokic, 2014). Diante dessas evidências, é relevante realizar mais pesquisas para investigar por que os teletrabalhadores perceberam menor significado da tarefa, apesar de estarem realizando, em grande parte, as mesmas atividades que realizavam antes de migrarem do trabalho presencial para o teletrabalho.

Em que pese a literatura apontar que o teletrabalho é propício ao desenvolvimento de atividades complexas (Golden & Gajendran, 2018), os trabalhadores presenciais relataram maior complexidade do trabalho que os teletrabalhadores, o que pode indicar que o desenho do teletrabalho, ao estabelecer metas e controles rígidos de desempenho, reduz a designação de tarefas urgentes e não planejadas aos teletrabalhadores, enquanto mantém os trabalhadores presenciais sujeitos a contingências do ambiente de trabalho, que são geralmente imprevisíveis e podem acarretar uma percepção de sobrecarga cognitiva. Golden (2007) ressalta que o teletrabalho pode alterar o escopo e a carga de trabalho dos que permanecem no escritório, levando-os a assumir responsabilidades adicionais.

Desse modo, mais estudos são necessários para investigar como enriquecer o desenho do teletrabalho e, ao mesmo tempo, não sobrecarregar os trabalhadores presenciais lotados na mesma unidade organizacional, visando ao equilíbrio entre as características motivadoras do trabalho e as expectativas de eficiência (Hackman, 1980). Há evidências de que teletrabalhadores que desenvolvem atividades de alta complexidade podem aproveitar melhor o tempo e a capacidade de integrar e sintetizar informações complexas durante períodos mais prolongados de trabalho e, assim, alcançar maior desempenho (Golden & Gajendran, 2018).

Os trabalhadores presenciais perceberam que suas tarefas requerem mais soluções criativas para problemas do que os teletrabalhadores. Embora trabalhos que exigem altos níveis de resolução de problemas possam ser mais bem desempenhados na modalidade teletrabalho (Golden & Gajendran, 2018), há estudos demonstrando que a distribuição virtual da equipe prejudicou a capacidade de resolução de problemas, além de ter sido associada à perda de oportunidade de interação informal e espontânea em um contexto que demandava geração de novas ideias e soluções (Koppman & Gupta, 2014).

No tocante à especialização, a qual representa a profundidade do conhecimento e das habilidades necessárias à execução do trabalho, a metanálise elaborada por Humphrey et al. (2007) sugere que os benefícios da especialização podem transcender os ganhos de eficiência, contribuindo também para tornar o trabalho mais motivador, mas alerta que essa variável é pouco estudada. Como o maior nível de especialização foi relatado por trabalhadores do regime presencial, acredita-se que esses trabalhadores permaneçam no regime presencial oferecendo suporte aos seus superiores hierárquicos, contrariando o senso comum de que o alto nível de especialização está necessariamente associado ao teletrabalho.

Nesta pesquisa, observou-se que tanto os trabalhadores presenciais quanto os teletrabalhadores relataram ter familiares dependentes, corroborando os achados de Noonan e Glass (2012) de que a existência de familiares dependentes não é uma característica que distingue os teletrabalhadores. Porém, os resultados desta pesquisa não possibilitam a compreensão das razões pelas quais ter dependentes está relacionado às percepções de variedade e significado da tarefa, complexidade do trabalho, solução de problemas, processamento de informações e grau de especialização, uma vez que não foram investigados as idades e o tipo de dependência desses familiares, nem as interfaces entre trabalho e família.

A abordagem teórica de desenho do trabalho e a versão reduzida do WDQ utilizadas neste estudo foram capazes de revelar diferenças significativas entre o desenho do teletrabalho e do trabalho presencial em duas organizações públicas brasileiras. Entre as limitações desta pesquisa estão a não inserção das dimensões características sociais e do contexto contidas no instrumento original de Morgeson e Humphrey (2006), bem como a falta de informações sobre a motivação do servidor para o ingresso na modalidade de teletrabalho, o conteúdo das tarefas dos respondentes, a gestão do tempo e a equidade da distribuição e do monitoramento de tarefas nas duas modalidades.

 

Considerações Finais

Os resultados não são generalizáveis em função do uso de amostras de conveniência e disponibilidade e devem ser interpretados com cautela, pois os modelos não têm coeficientes de determinação altos, indicando que não foram incluídas variáveis com maiores valores preditivos. Essa limitação é, em parte, devida à natureza exploratória e descritiva deste estudo e ao estágio incipiente desse campo de pesquisas no Brasil. Além disso, o modelo teórico WD é comumente adotado para o estudo do desenho de trabalhos presenciais e a literatura especializada em teletrabalho ainda carece de referenciais teóricos específicos que viabilizem pesquisas conclusivas e mais robustas.

O teletrabalho como implantado nos órgãos estudados revela um desenho com menor autonomia e menor complexidade quando comparado ao do trabalho presencial. Esses achados indicam uma demanda de novas pesquisas, preferencialmente longitudinais, que analisem efeitos do teletrabalho sobre a motivação dos trabalhadores, sobre o vínculo do trabalhador com a organização e com o grupo de trabalho, sobre as interfaces trabalho-família e sobre as estratégias de aprendizagem e de enfrentamento de desafios, como a gestão do tempo para alcance de metas de desempenho. Para tanto, sugere-se que novas pesquisas exploratórias contemplem diferentes setores, identificando as características sociais (suporte social, interdependência, interação com pessoas internas e externas à organização e feedback dos pares) e as do contexto de trabalho (normas, frequência de realização do teletrabalho, responsabilidade pela concessão de infraestrutura, equipamentos utilizados, suporte de informática, ferramentas de comunicação síncrona e assíncrona, mecanismos de monitoramento de desempenho). Como destacado por Brewer (1998), a vantagem competitiva da adoção do teletrabalho não derivará de uma "solução rápida e fácil para resolver um problema", mas de concepção e implementação mais apropriada do desenho do trabalho.

 

Referências

Aderaldo, I. L., Aderaldo, C. V. L., & Lima, A. C. (2017). Aspectos críticos do teletrabalho em uma companhia multinacional. Cadernos EBAPE.BR, 15,511-533. doi: 10.1590/1679-395160287        [ Links ]

Aguilera, A., Lethiais, V., Rallet, A., & Proulhac, L. (2016). Home-based telework in France: characteristics, barriers and perspectives. Transportation Research Part A: Policy and Practice, 92,1-11. doi: 10.1016/j.tra.2016.06.021        [ Links ]

Baeza, M. A., Gonzalez, J. A., & Wang, Y. (2018). Job flexibility and job satisfaction among Mexican professionals: a socio-cultural explanation. Employee Relations, 40(5),921-942. doi: 10.1108/ER-12-2016-0236        [ Links ]

Bailey, D., & Kurland, N. (2002). A review of telework research: findings, new directions and lessons for the study of modern work. Journal of Organisational Behaviour, 23(4),383-400. doi: 10.1002/job.144        [ Links ]

Barros, A. M., & Silva, J. R. G. (2010). Percepções dos indivíduos sobre as consequências do teletrabalho na configuração home-office: estudo de caso na Shell Brasil. Cadernos EBAPE.BR, 8(1),71-91. doi: 10.1590/S1679-39512010000100006        [ Links ]

Bentley, T. A., Teo, S. T. T., McLeod, L., Tan, F., Bosua, R., & Gloet, M. (2016). The role of organisational support in teleworker wellbeing: a socio-technical systems approach. Applied Ergonomics, 52,207-215. doi: 10.1016/J.APERGO.2015.07.019        [ Links ]

Byrne, B. M. (2010). Structural equation modeling with AMOS (2nd ed.). New York: Routledge.         [ Links ]

Boell, S. K., Campbell, J., Cecez-Kecmanovic, D., & Cheng, J. E. (2013). Advantages, challenges and contradictions of the transformative nature of telework: a review of the literature. AMCIS 2013 Proceedings, Paper 4. Recuperado de http://aisel.aisnet.org/amcis2013/EndUserIS/GeneralPresentations/4/        [ Links ]

Boell, S. K., Cecez-Kecmanovic, D., & Campbell, J. (2016). Telework paradoxes and practices: the importance of the nature of work. New Technology, Work and Employment, 31(2),114-131. doi: 10.1111/ntwe.12063        [ Links ]

Borges-Andrade, J. E., Peixoto, A. L. A., Queiroga, F., & Pérez-Nebra, A. R. (2019). Adaptation of the work design questionnaire to Brazil. Revista Psicologia: Organizações e Trabalho, 19(3),720-731. doi: 10.17652/rpot/2019.3.16837        [ Links ]

Brewer, A. M. (1998). Work design, flexible work arrangements and travel behavior: policy implications. Transport Policy, 5(2),93-101. doi: 10.1016/S0967-070X(98)00003-1        [ Links ]

Chiaburu, D. S., & Harrison, D. A. (2008). Do peers make the place? Conceptual synthesis and meta-analysis of coworker effects on perceptions, attitudes, OCBs, and performance. Journal of Applied Psychology, 93(5),1082-1103. doi: 10.1037/0021-9010.93.5.1082        [ Links ]

Collins, A. M., Hislop, D., & Cartwright, S. (2016). Social support in the workplace between teleworkers, office-based colleagues and supervisors. New Technology, Work and Employment, 31(2),161-175. doi: 10.1111/ntwe.12065        [ Links ]

Deng, X., & Joshi, K. D. (2016). Why Individuals Participate in Micro-task Crowdsourcing Work Environment: Revealing Crowdworkers' Perceptions. Journal of the Association for Information Systems, 17(10),648-673. doi: 10.1038/ajg.2009.234        [ Links ]

Gajendran, R. S., & Harrison, D. A. (2007). The good, the bad, and the unknown about telecommuting: meta-analysis of psychological mediators and individual consequences. Journal of Applied Psychology, 92(6),1524-1541. doi: 10.1037/0021-9010.92.6.1524        [ Links ]

Golden, T. (2007). Co-workers who telework and the impact on those in the office: Understanding the implications of virtual work for co-worker satisfaction and turnover intentions. Human Relations, 60(11),1641-1667. doi: 10.1177/0018726707084303        [ Links ]

Golden, T. D., & Gajendran, R. S. (2018). Unpacking the Role of a Telecommuter's Job in Their Performance: Examining Job Complexity, Problem Solving, Interdependence, and Social Support. Journal of Business and Psychology, 1-15. doi: 10.1007/s10869-018-9530-4        [ Links ]

Grant, A. M., & Parker, S. K. (2009). Redesigning Work Design Theories: the rise of relational and proactive perspectives. The Academy of Management Annals, 3(1),317-375. doi: 10.1080/19416520903047327        [ Links ]

Hackman, J. R. (1980). Work redesign and motivation. Professional Psychology: Research and Practice, 11(3),445-455. doi: 10.1037/0735-7028.11.3.445        [ Links ]

Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., Anderson, R. E., & Tatham, R. L. (2010) Multivariate Data Analysis (7th ed.). Prentice Hall, Upper Saddle River.         [ Links ]

Hernaus, T., & Pološki Vokic, N. (2014). Work design for different generational cohorts. Journal of Organizational Change Management, 27(4),615-641. doi: 10.1108/JOCM-05-2014-0104

Humphrey, S. E., Nahrgang, J. D., & Morgeson, F. P. (2007). Integrating motivational, social, and contextual work design features: a meta-analytic summary and theoretical extension of the work design literature. Journal of Applied Psychology, 92(5),1332-1356. doi: 10.1037/0021-9010.92.5.1332        [ Links ]

Kanellopoulos, D. N. (2011). How can teleworking be pro-poor? Journal of Enterprise Information Management, 24(1),8-29. doi: 10.1108/17410391111097401 l        [ Links ]

Kline, R. (2005). Principles and practices of structural equation modeling (2n ed.). New York: Guilford Press.         [ Links ]

Koppman, S., & Gupta, A. (2014). Navigating the mutual knowledge problem: a comparative case study of distributed work. Information Technology and People, 27(1),83-105. doi: 10.1108/ITP-12-2012-0153        [ Links ]

Kossek, E. E., Lautsch, B. A., & Eaton, S. C. (2006). Telecommuting, control, and boundary management: correlates of policy use and practice, job control, and work-family effectiveness. Journal of Vocational Behavior, 68(2),347-367. doi: 10.1016/j.jvb.2005.07.002        [ Links ]

Legentil, J., Carmo, E., Silva, J., Meneses, P., & Abbad, G. (2018). O estado da arte da pesquisa sobre teletrabalho: uma revisão sistemática da literatura brasileira de 1995 a 2018. Em Seminários de Administração, XXI, Semead USP: Universidade de São Paulo (p. 15). São Paulo, SP.         [ Links ]

Ling, R. S. (2008). New Tech, New Ties: How Mobile Communication is Reshaping Social Cohesion. Cambridge : MIT Press.         [ Links ]

Magno Boonen, E. (2002). As várias faces do teletrabalho. E&G Economia e Gestão, 2(4),106-127. Recuperado de http://periodicos.pucminas.br/index.php/economiaegestao/article/view/104/97        [ Links ]

Mello, Á. A. A., Santos, S. A., Kuniyoshi, M. S., Gaspar, M. A., & Kubo, E. K. de M. (2014). Teletrabalho como fator de inclusão social e digital em empresas de call center/contact center. Revista de Administração da UFSM, 7(3),373-388. doi: 10.5902/198346598794        [ Links ]

Morgeson, F. P., & Humphrey, S. E. (2006). The Work Design Questionnaire (WDQ): developing and validating a comprehensive measure for assessing job design and the nature of work. Journal of Applied Psychology, 91(6),1321-1339. doi: 10.1037/0021-9010.91.6.1321        [ Links ]

Nogueira, A. M., & Patini, A. C. (2012). Trabalho remoto e desafios dos gestores. Revista de Administração e Inovação, 9(4),121-152. doi: 10.5773/rai.v9i4.800        [ Links ]

Nohara, J. J., Acevedo, C. R., Ribeiro, A. F., & Silva, M. M. (2010). O teletrabalho na percepção dos teletrabalhadores. Revista de Administração e Inovação, 7(2),151-170. Recuperado de http://www.revistas.usp.br/rai/article/view/79174        [ Links ]

Noonan, M., & Glass, J. (2012). Monthly Labor Review, June 2012: the hard truth about telecommuting. U.S. Department of Labor, Bureau of Labor Statistics, 135(6),38-45. doi: 10.1136/jnnp-2016-314005        [ Links ]

Pardini, D. J., Gonçalves, C. A., Paiva, Â. M. M., & Dias, A. T. (2013). Os significados da virtualização do trabalho: manifestações discursivas das percepções tecnológicas, processuais e pessoais nas relações intraorganizacionais. Cadernos EBAPE.BR, 11(1),85-103. doi: 10.1590/S1679-39512013000100007        [ Links ]

Parker, S. K. (2014). Beyond motivation: job and work design for development, health, ambidexterity, and more. Annual Review of Psychology, 65(1),661-691. doi: 10.1146/annurev-psych-010213-115208        [ Links ]

Parker, S. K., Morgeson, F. P., & Johns, G. (2017). One hundred years of work design research: looking back and looking forward. Journal of Applied Psychology, 102(3),403-420. doi: 10.1037/apl0000106        [ Links ]

Pereira Junior, E., & Caetano, M. E. S. (2009). Implicações do teletrabalho: um estudo sobre a percepção dos trabalhadores de uma região metropolitana. Revista Psicologia: Organizações e Trabalho, 9(2),22-31. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpot/v9n2/v9n2a03.pdf        [ Links ]

Peters, P., Tijdens, K. G., Wetzels, C., Contreras, O. E., Rojas, I. R., Atkyns, R., ... Bommer, W. (2018). Employer liability for telecommuting employees. Transportation Research Procedia, 17(2),291-298. doi: 10.1016/S0921-3449(02)00082-4        [ Links ]

Pyöriä, P. (2011). Managing telework: risks, fears and rules. Management Research Review, 34(4),386-399. doi: 10.1108/01409171111117843        [ Links ]

Rafalski, J. C., & Andrade, A. L. (2015). Home-office: aspectos exploratórios do trabalho a partir de casa. Temas em Psicologia, 23(2),431-441. doi: 10.9788/TP2015.2-14        [ Links ]

Raghuram, S., & Wiesenfeld, B. (2004). Work-nonwork conflict and job stress among virtual workers. Human Resource Management, 43(2-3),259-277. doi: 10.1002/hrm.20019        [ Links ]

Sardeshmukh, S. R., Sharma, D., & Golden, T. D. (2012). Impact of telework on exhaustion and job engagement: a job demands and job resources model. New Technology, Work and Employment, 27(3),193-207. doi: 10.1111/j.1468-005X.2012.00284.x        [ Links ]

Van Sell, M., & Jacobs, S. M. (1994). Telecommuting and quality of life: a review of the literature and a model for research. Telematics and Informatics, 11(2),81-95. doi: 10.1016/0736-5853(94)90033-7        [ Links ]

Windeler, J. B., Chudoba, K. M., & Sundrup, R. Z. (2017). Getting away from them all: managing exhaustion from social interaction with telework. Journal of Organizational Behavior, 38(7),977-995. doi: 10.1002/job.2176        [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
Gardênia da Silva Abbad
Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília, Campus Darcy Ribeiro
CEP 71910-900
E-mail: gardenia.abbad@gmail.com

Recebido em: 14/01/2019
Primeira decisão editorial em: 18/04/2019
Versão final em: 20/05/2019
Aceito em: 22/05/2019

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons