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Revista Psicologia e Saúde
versão On-line ISSN 2177-093X
Rev. Psicol. Saúde vol.8 no.1 Campo Grande jun. 2016
https://doi.org/10.20435/2177093X2016107
Representação social da psicologia organizacional e do trabalho em contexto escolar
Social representation of organizational psychology when in the school context
Representación social de psicología organizacional y del trabajo en contexto escolar
Idonézia Collodel BenettiI; Joao Paulo Roberti JuniorI; Fernanda Ax WilhelmII; Ana Paula da Rosa DeonII; Jaqueline Silva da RosaII
IUniversidade Federal de Santa Catarina
IIUniversidade Federal de Roraima
RESUMO
O objetivo deste trabalho foi o de pesquisar 20 colaboradores em quatro escolas particulares na região do Alto Vale do Itajaí, Santa Catarina, no intuito de investigar como o corpo administrativo dessas instituições percebe a atuação do psicólogo nessa modalidade de organização. Com delineamento de levantamento de dados, ancorado em parâmetros exploratórios e descritivos e abordagem qualitativa, a pesquisa trouxe como resultado a clara importância do psicólogo nas organizações, porém com uma representação baseada na atuação calcada em modelos clínicos. As questões organizacionais ficaram à deriva; não houve menção à figura do psicólogo como alguém que deveria ter o compromisso de conhecer a realidade do mundo do trabalho, especialmente a realidade social local, para poder compreender os fenômenos que se estabelecem no mundo corporativo. Assim, as instituições laborais continuam necessitando de ajuda nas questões que abrangem tanto a organização, quanto a qualidade de vida e saúde mental do seu quadro funcional.
Palavras-chave: Psicologia organizacional e do trabalho; Representação social; Psicólogo; Contexto escolar.
ABSTRACT
The aim of the present study was to research 20 employees from four private schools in the Itajaí Upper Valley, Santa Catarina, Brazil, with the objective of investigating how the psychologists' work are seen by other workers inside those corporations. Based on a field survey, and qualitative in nature, the results showed the clear importance o the psychologists in organizations, in spite of it is still being based on clinical models. The labour of those kinds of professionals, that should be seen as someone in charge of knowing the corporative world reality, in order to comprehend the phenomena that occur inside corporations, was found invisible in terms of type of typical actions such as professional recruitment, employee's evaluation and training, indicating that the psychologists need to work hard in order to have their work more visible. The labour institutions still need help on the issues that span both the organization and the quality of life and mental health of its workforce.
Key-words: Work and organizational psychology; Social representation; Psychologist; School context.
RESUMEN
El objetivo de este estudio fue de encuestar en cuatro escuelas privadas en la región del Alto Vale del Itajaí, Santa Catarina, 20 colaboradores, con el intuito de investigar como el cuerpo administrativo de estas instituciones perciben la actuación del psicólogo en esta modalidad de organización. Con delineamento del levantamiento de los datos, anclados en parámetros exploratorios y descriptivos y con abordaje cualitativa, la pesquisa trae como resultado la clara importancia del psicólogo en las organizaciones, pero con una representación apoyada en la actuación plasmada en modelos clínicos. Las cuestiones organizacionales se quedaran a deriva; no hace mención a la figura del psicólogo como alguien que deberia tener el compromiso de conocer la realidade del mundo del trabajo, especialmente la realidad social local, para poder comprender los fenómenos que si establecen en lo mundo corporativo. Así, las instituciones laborales continuan necesitando de ayuda en las cuestiones que abarcan tanto la organización cuanto la calidad de vida y salud mental de su cuadro funcional.
Palabras-clave: Psicología organizacional y del trabajo; Representación social; Psicólogo; Contexto escolar.
Com a morte dos feudos, há uma propagação do surto tecnológico - provocado pela Revolução Industrial - e do desenvolvimento dos modos de produção do sistema capitalista. As mudanças se mostram impactantes e vertiginosas, ao comportar o fenômeno da globalização, que mostra sua força. É absolutamente com estas "tintas" que é pintado o cenário da Psicologia Organizacional e do Trabalho, tentando: a) dar suporte ao processo de mudança organizacional, b) atender as novas demandas do mercado, e c) ao mesmo tempo, aprender a lidar com trabalhadores dentro de um contexto de diversidade social e pessoal.
É dentro deste complexo emaranhado de tarefas e desafios que a presente pesquisa tem como objetivo principal investigar grupos de colaboradores de quatro escolas de Ensino Fundamental e Médio da rede particular de ensino para verificar, através de um questionário com perguntas abertas, como esses colaboradores significam a atuação do profissional psicólogo, que se dedica à área organizacional. A preferência por escolas particulares se deveu ao fato de que essas instituições de ensino também são organizações que funcionam em moldes semelhantes a empresas; um lócus laboral onde acontecem não somente a docência, com trabalhos variados que também figuram neste cenário, fazendo parte do cotidiano escolar.
O trabalho exercido nesses espaços laborais, além de gerar fonte de renda, não se prende somente às questões pedagógicas, mas está atrelado a um conjunto de outros profissionais que são imprescindíveis para que o processo ensino/aprendizagem seja operacionalizado. Vale salientar, também, que a dinâmica de uma instituição escolar vive um fenômeno grupal envolvendo um consenso sobre determinadas percepções que englobam aspectos psicológicos, sociais e físicos do ambiente, afetando o comportamento.
Em uma perspectiva bioecológica, a escola impacta, enquanto microssistema1, as pessoas, as quais interferem nos objetivos da instituição/organização, que por sua vez, atrelada a outros microssistemas, interfere no contexto bioecológico (família, comunidade, etc.). Então, o papel do psicólogo nas organizações contemporâneas, incluindo a escola, não é só olhar os interesses das pessoas, mas procurar uma interface entre objetivos pessoais e objetivos organizacionais, procurando promover uma relação em que todos saem ganhando.
Em vista disso, foi, portanto, considerado interessante verificar também o que pensam as pessoas de outras áreas profissionais que vivem a ação globalizante do todo que envolve os afazeres embutidos no processo escolar/empresarial, tendo em vista que, teoricamente, todos numa escola/empresa fazem parte de um ambiente organizacional. É interessante realçar que, nessa região, esta é a primeira pesquisa que investiga o contexto escolar com o olhar voltado para a escola enquanto ambiente organizacional corporativo. Daí, a relevância do presente trabalho.
A Psicologia Organizacional e do Trabalho
A palavra "Trabalho" apresenta vários conceitos, sentidos, significações e valores que dependem da perspectiva teórica, do contexto e das questões culturais. De acordo com a definição de dicionários de uso comum (Fernandes, 2001, p. 83), trabalho pode ser entendido como "Aplicação da atividade física ou intelectual; esforço, tarefa; serviço; obra feita ou que está em via de execução; fadiga; labutação; ação mecânica dos agentes, naturais, lida". Outra definição, mais abrangente no sentido de que o trabalho tem um significado concreto, de transformação da realidade, implica "atividade, prática, produção, transformação, consciência, desenvolvimento pessoal e cidadania" (Franco, 2004, p. 179).
É importante salientar que a Psicologia Organizacional e do Trabalho nasce em um berço puramente tecnicista, em um contexto de expansão tecnológica e influenciada pelo modelo administrativo de Taylor, com a preocupação em colocar "O homem certo no lugar certo" (Aguiar, 1981). É uma Psicologia Industrial (Sampaio, 1998), exclusivamente a serviço da administração da empresa, marcada pelo apelo dos controles individuais dos trabalhadores de "chão de fábrica". Vivia-se a fase inicial da psicologia organizacional, pautada na psicometria, remetendo o psicólogo à atividade principal de mensuração de habilidades e identificação de características de personalidade que pudessem comprometer o ajustamento do indivíduo ao trabalho, visando sempre e, principalmente, à produtividade e ao desempenho.
Porém, com o advento do modelo japonês como novo paradigma de organização do trabalho, outros focos surgem a partir do esgotamento da antiga e desgastada organização do trabalho, em face de novas reestruturações produtivas em tempos de globalização, aceleração tecnológica, que exigem, proporcionalmente, uma nova configuração do trabalhador, demandando plurifuncionalidade, maior capacidade para responder às demandas mutantes da produção, participação, engajamento e disputa feroz em um mercado que se mostra cada dia mais competitivo. Nesse contexto, é que atua a Psicologia Organizacional do Trabalho, tentando se inteirar desse processo díspar e acelerado para poder intervir em um contexto que emerge de transformações paradoxais , as quais, ao mesmo tempo em que globalizam e integram, também promovem espaços de exclusão (Costa-Leão, 2012).
Impelida por mudanças tão significativas, surge, então, a 2ª Face da Psicologia do Trabalho - denominada Organizacional (Sampaio, 1998), que se caracterizou pelo abandono de práticas exclusivamente instrumentais, preocupando-se não somente com os postos de trabalho, mas também em discutir as estruturas da organização. Houve um salto qualitativo no "olhar" desses profissionais com relação ao treinamento para promoção do desenvolvimento dos trabalhadores, e não apenas visando à capacitação para o trabalho (Codo, 2007).
É importante lembrar que, nesse segundo momento histórico, o papel do psicólogo na organização extrapola a prática da análise do indivíduo como um ser isolado, indo além ao vislumbrar a organização como um palco de diferentes circunstâncias e variáveis que deveriam ser consideradas no momento em que se pensa em ajustar o trabalhador em função de suas tarefas. Apesar das modificações, as atividades da área da Psicologia Organizacional continuaram dentro dos parâmetros tradicionais de recrutamento, seleção, treinamento, avaliação de desempenho e análise de função, embora já surgissem técnicas inovadoras, com o objetivo da inserção do homem à organização (Spector, 2006).
No cenário acadêmico, os ventos da modernidade e das transformações no mundo social do trabalho estavam, a essa altura, soprando ainda lentamente. Nas universidades, os cursos de psicologia, apesar de uma série de mudanças no mundo do trabalho, não fizeram significativos progressos nem ajustes com relação às inovações que deveriam estar presentes nos programas e nos conteúdos estudados pelos acadêmicos em sala de aula. A disciplina desenhada para problematizar o assunto "trabalho" era normalmente chamada de Psicologia Industrial, e estava, geralmente, baseada no tripé clássico: recrutamento, seleção e treinamento, focalizados no período de formação do futuro psicólogo (Carvalho, 2008).
Porém a lógica do mercado, baseada nos padrões de qualidade total, qualificação, tecnologia, informatização etc., acaba gerando desemprego e informalidade e, em consequência, uma nova reconfiguração do mercado de trabalho, que agora se afigura mais desigual socialmente. Nessa nova etapa, a 3ª Face da Psicologia (Sampaio, 1998) torna-se preocupação a busca pela discussão de temas envolvendo poder, conflitos, políticas organizacionais, relação homem e trabalho, saúde mental do trabalhador e qualidade de vida, numa tentativa de compreender o homem que trabalha (e mesmo o que se encontra sem trabalho e procurando emprego), porque a realidade social muda constantemente e bruscamente, e o trabalho não escapa a isso. Em outras palavras, o foco está na relação homem/trabalho, tentando resgatar o sentido (significado) do trabalho para o trabalhador.
Ampliam-se e complexificam-se, então, os tipos de atuação e intervenção do psicólogo nas organizações, do qual se exige um perfil mais abrangente, uma vez que estará atento para questões como satisfação no trabalho; estresse ocupacional; burnout - definido segundo Freudenberger (1974) como um distúrbio psíquico de caráter depressivo, precedido de esgotamento físico e mental intenso, caracterizado como "[...] causa está intimamente ligada à vida profissional"; LER/DORT- que são duas denominações da área médica para o conjunto heterogéneo de afecções do sistema musculoesquelético relacionadas ao trabalho: LER - Lesões por esforços repetitivos e DORT - Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho -; segurança do trabalho, políticas sociais, condições do trabalhador e do trabalho, organização do trabalho etc. No meio docente, por exemplo, uma síndrome bastante comum é o Burnout, com sintomas de estresse, que incluem raiva, ansiedade, depressão, fadiga, frustração, abuso de substâncias etc., causando redução de compromisso com os estudantes.
A satisfação e o envolvimento no trabalho ficam comprometidos frente a situações de estresse e burnout; a assiduidade desses profissionais, quando acometidos pela síndrome, é influenciada por uma variada série de fatores, com destaque para uma carga horária relevante em absenteísmo (Pranjic & Males-Bilic, 2014). O estresse no trabalho é o fator mais mencionado quando se fala sobre o burnout e representa atualmente cerca de 40% dos problemas relacionados ao trabalho, quando os níveis de estresse tornam-se incontrolavelmente altos.
Problemas de estresse e saúde mental respondem, também, por 40% dos benefícios previdenciários por incapacidade em longo prazo, por 35 milhões de dias de trabalho perdidos por ano e 40% do volume de negócios nas empresas (McLinton & Dollard, 2010). Assim, exigem-se do psicólogo organizacional posturas que vão além do uso de ferramentas ligadas ao tripé clássico (recrutamento, seleção e treinamento) aprendido na universidade.
Além disso, a saúde mental da organização precisa ser constantemente observada. Pesquisas revelam que 69% dos trabalhadores em geral, relatam que o trabalho é uma fonte significativa de estresse; 41 % dizem que normalmente se sentem tensos ou estressados durante a jornada de trabalho, considerando-se menos produtivos, como resultado de estresse (Thoits, 2010).
Ainda, o número médio de dias longe do trabalho, como resultado de ansiedade, estresse e doenças relacionadas foi de 25 % - substancialmente maior do que a mediana de 6% para todas as lesões não fatais e outras doenças (Aamodt, 2013). O estresse no trabalho tem custado muito em absenteísmo, rotatividade, produtividade diminuída e afastamento para tratamento médico (Carpini, 2012). No ambiente escolar, o absenteísmo e os afastamentos com atestado médico implicam a procura de colegas que cubram as faltas do professor ausente, ou a procura de outro profissional, externo ao quadro docente da escola, gerando transtornos para a administração e, o mais preocupante, complicações no desenvolvimento dos conteúdos acadêmicos, enquanto os alunos esperam pela burocracia da contratação.
Assim, considerando quanto o trabalho em escola é estressante (Carpini, 2012), pode-se perceber o quanto o psicólogo organizacional pode contribuir para melhorar esse quadro, atuando em contexto escolar, devendo ir além das práticas já conhecidas como recrutamento e seleção de pessoal, treinamento, avaliação de desempenho, comportamento organizacional e desenvolvimento organizacional. Deve, também, lançar mão de instrumentos tais como estudos exploratórios (Goulart, 2002) e pesquisa de clima e cultura organizacional, com o objetivo de conhecer a realidade da instituição e desenvolver projetos com vistas à programação de ações de melhoria da qualidade de vida no trabalho.
Dentro das tarefas, agora desempenhadas pelo psicólogo organizacional, podem-se listar as atividades de planejamento e gerenciamento dentro de uma perspectiva de atuação mais questionadora e ativa, sendo ele mesmo agente de um processo de mudança. Nessa nova configuração, as próprias empresas passam a ambicionar um psicólogo que tenha visão estratégica e de consultoria, que se estenda aos vários escalões hierárquicos, buscando soluções de curto, médio e longo prazo. Nesse sentido, o psicólogo passa a desempenhar atividades as quais, em tempos pretéritos, seriam consideradas fora de foco para a estrutura e dinamicidade das organizações.
Assim, a postura desse "novo" profissional passa a albergar o "item" flexibilidade para trabalhar em equipe, além da visão estratégica do negócio e da boa comunicação; é importante que seja generalista, tenha espírito crítico, visão pluralista e jogo de cintura para entender os anseios da empresa e dos colaboradores. Dentro desse quadro, percebe-se que as atividades do psicólogo organizacional requerem, cada vez mais, uma visão do conjunto da organização e do ambiente. Mudam os tempos, (re)configura-se a história, muda o olhar do "fazer" em psicologia e, também, o "Modus Operandi" do psicólogo (Bastos & Gondim, 2010).
As representações sociais
As representações estão baseadas em convenções sociais. Indivíduos e grupos criam representações no curso da comunicação e da interação. Elas nascem, mudam, e mudam outras representações, e dependem das relações sociais, uma vez que as pessoas estão sempre ao sabor de correntes ideológicas dominantes, impostas por suas classes sociais (Moscovicci, 2003). Elas podem ser vistas como uma maneira específica de compreender e comunicar aquilo que conhecemos: são conectoras entre a imagem e o significado.
O uso de uma linguagem de imagens e de palavras, que se tornou propriedade comum através da difusão de ideias, estimula relatos e fertiliza aspectos da sociedade e da natureza com os quais nos ocupamos. Assim, as representações sociais são o "ambiente" em relação ao indivíduo ou grupo, e são específicos para a nossa sociedade.
A representação objetiva da sociedade pode ser alcançada através da criação de mundos discursivos específicos, que são as representações discursivas de quem faz o quê, a quem, quando e onde (Chilton, 2004). Todos estes elementos são significativos, na medida em que essa seleção já tem um impacto na reconstrução desses eventos, principalmente porque sua importância pode desaparecer e reaparecer. O desaparecimento/reaparecimento e a repetição constante de eventos e padrões discursivos podem resultar em eventos particulares ganhando um status mítico, tornando-se elementos fundamentais na construção e perpetuação da identidade, à medida que se infiltram no conjunto de crenças e ideias compartilhadas por uma determinada comunidade (Horwitze & Rabbie, 2010).
Método
Esta pesquisa tem seu delineamento ancorado em objetivos exploratórios e descritivos, apresentando delineamento de levantamento de dados, recorte transversal e abordagem qualitativa (Marconi & Lakatos, 2006). Para a coleta de dados, utilizou-se de um questionário autoaplicado elaborado com vistas a facilitar para que os conteúdos de interesse deste trabalho viessem à tona, na tentativa de obter o maior número possível de informações sobre o tema e maior detalhamento do assunto em questão, segundo a visão do entrevistado.
Para isso, foi observado rigor na condução e elaboração do questionário, que se pautou na clareza e sequência lógica das questões encapsuladas na elaboração do instrumento, na coleta, na organização e na interpretação dos registros fornecidos pelos sujeitos respondentes. Todos os participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) declarando ter informações sobre sua participação na pesquisa.
Contexto e participantes
Após aprovação em comité de ética da universidade local, foram escolhidos colaboradores de quatro escolas particulares de Ensino Fundamental e Médio, todas situadas no Alto Vale do Itajaí, SC. O critério de exclusão previu que os colaboradores participantes não fossem da área da docência.
A escola 1 caracteriza-se por ser uma escola franqueada e tem, como objetivo principal, a preparação dos seus alunos para os principais vestibulares de Santa Catarina. O mote ideológico do "fazef' cotidiano dos profissionais que trabalham nesse lugar é "passar no vestibular". A proposta pedagógica está calcada nas concepções tecnicistas de ensino. Dentro dessa concepção, oferece material didático apostilado e organizado pela própria franquia, que possui unidades de pré-vestibular em 18 cidades catarinenses e colégios de ensino médio nas principais cidades deste estado. Possui um corpo funcional com 12 colaboradores e mantém atividades nos três turnos escolares: matutino, vespertino e noturno.
A escola 2 se caracteriza por ser de orientação Construtivista e entende que aprender faz parte do desenvolvimento humano e, por essa razão, se preocupa com o desenvolvimento das pessoas e formação da cidadania para todo o corpo escolar, e conta com nove colaboradores que trabalham em dois turnos -matutino e vespertino. As escolas 3 e 4 ancoram-se em pressupostos pedagógicos de orientação sociointeracionista, que pressupõe a aprendizagem através da interação entre o meio e outras pessoas, ambientes etc., e é dessa integração que surge o desenvolvimento cognitivo, afetivo, social do aluno; o professor passa de mestre "supremo" a somente mediador do conhecimento, e é papel dele ajudar os estudantes em seu desenvolvimento. A escola 3 atua com 10 colaboradores, e a 4, com 12. Ambas têm expediente nos períodos matutinos e vespertinos.
A coleta foi realizada com 20 participantes (cinco em cada escola - uma amostra não probabilística por cotas), identificados, para manter o anonimato, como P-1, P-2, P-3 etc. (Participante!, Participante 2, Participante 3), no momento da descrição, organização e análise dos dados que, quanto à abordagem, configura-se em um estudo qualitativo, ancorado na Gramática Sistêmico-Funcional (Halliday & Matthiessen, 2004) e na Análise Crítica do Discurso (Fairclough, 2003) que, nesta investigação, têm o objetivo de entender o Contexto de Situação, e mediar a análise das categorias textuais, presentes nos critérios de análise de Halliday e Matthiessen (2004), conforme ilustração da tabela 1, elaborada com exemplos dos discursos dos participantes, a partir de Butt, Fahey, Spinks e Yallop (1995).
Instrumento
Para a coleta de dados, foram feitas três visitas às diferentes instituições, para: 1) efetivar o pedido formal para fazer as entrevistas e coletar os dados; 2) agendar horário para distribuir os questionários, bem como a leitura e explicação destes para o representante de cada instituição e a orientação para que fossem preenchidos por um representante do corpo gerencial - o diretor - e por quatro colaboradores, que exerciam funções diferentes da docência; e 3) recolher os questionários respondidos.
O formato do instrumento de coleta de dados ficou estruturado em duas partes distintas. A primeira teve por objetivo coletar dados biográficos e profissionais dos participantes da pesquisa, tais como: função, escolaridade, gênero, idade, e tempo de trabalho na escola. A segunda parte consistiu das perguntas, a saber: 1) Como os funcionários são selecionados e contratados na escola?; 2) Para você, quais são as atribuições de um psicólogo organizacional?; e 3) Como você vê a atuação do psicólogo organizacional na escola? Essa modalidade de perguntas exigiu uma escrita totalmente livre, podendo ser conduzida no ritmo e na suficiência linguística de cada entrevistado, constituindo-se em depoimentos pessoais.
A intenção era investigar como o corpo institucional via a atuação do psicólogo na sua escola/empresa, mesmo que não houvesse um profissional dessa habilitação trabalhando no local pesquisado. A preferência, também, por outros profissionais que não somente os da administração deveu-se ao fato de que, em se tratando do assunto a ser pesquisado, seria interessante ampliar a investigação junto a outros profissionais, no afã de verificar a representação social do psicólogo organizacional em outra esfera de trabalhadores do mesmo lugar social de trabalho, e que não se reduzissem somente àqueles atuantes na esfera administrativa/gerencial.
Para a análise qualitativa, foram utilizados os postulados da Análise Crítica do Discurso de Norman Fairclough (1989), que se propõe a uma análise do sentido ideológico no discurso. Ambos - discurso e ideologia - estão relacionados à identificação de três componentes principais em uma determinada instância do discurso: a) conteúdo - o que é dito e feito, b) relações - as relações interpessoais presentes no discurso, e c) sujeitos - a posição que o sujeito ocupa - o seu lugar social.
A análise dos dados privilegiou e se baseou nos discursos individuais obtidos através do questionário escrito. Os resultados foram extraídos do corpus que encapsulou as respostas às questões esboçadas no instrumento desenhado para a coleta de dados. Então, a análise de cada uma delas forneceu uma amostra da configuração dos modos como cada sujeito significa e representa sua percepção sobre o trabalho do psicólogo nessas instituições.
Análise e discussão dos dados
Os resultados revelaram que nenhum dos estabelecimentos de ensino possui um psicólogo organizacional, para as demandas internas. Porém, na Escola 1, há a terceirização de serviços temporários de psicologia, visando à orientação profissional e palestras relacionadas à ansiedade e ao estresse que antecedem às provas do vestibular, com foco no aluno e, portanto, o colaborador não entra nos cuidados dispensados pela instituição.
Destacam-se, ainda, os principais resultados da análise biográfica dos participantes desta pesquisa, que foram 20 sujeitos exercendo diferentes funções nos locais investigados. Dos participantes, 13 eram mulheres. A faixa etária variou em um intervalo que se configurou entre 20 e 51 anos.
Quanto ao nível de escolaridade, verificou-se a predominância de colaboradores com curso de graduação completo, somando um total de nove entre os colaboradores desta pesquisa. Os sujeitos que cursaram apenas o ensino médio foram cinco; dois afirmaram ter curso de pós-graduação em nível de especialização, e os demais tinham ensino fundamental completo. Quanto aos cargos ocupados, as funções se diferenciaram desde a zeladoria (serviços gerais) até a direção dos espaços laborais pesquisados. Finalmente, quanto aos anos de trabalho prestados na empresa/escola, o tempo variou entre cinco meses e 17 anos.
Os aspectos relacionados à idade, escolaridade e função exercida na escola podem constituir condições sob as quais muitas das significações embutidas no discurso escrito desses sujeitos acabam por contextualizar, sócio historicamente, suas perspectivas, conferindo-lhes, em esfera individual, formas diferentes de perceber o mundo e significar os eventos e fenômenos ocorridos no seu entorno. Em outras palavras, a percepção sobre a função do psicólogo organizacional nesses lugares sociais de trabalho será "atravessada" por esses "ingredientes" pertinentes a cada participante que colaborou na pesquisa.
O resultado dos dados coletados revela que, em linhas gerais, o psicólogo organizacional é importante e se constitui em uma necessidade no ambiente laboral, mas, em nenhum momento, se destacou a relevância do seu trabalho na função de recrutar, entrevistar, selecionar, aplicar testes psicológicos, e fazer triagens visando obter resultados para toda a organização. Nesse sentido, o psicólogo é considerado de fundamental importância no ambiente de trabalho, mas somente para fazer intervenções junto aos alunos, pais, professores e colaboradores, sempre na expectativa psicopedagógica - para alcançar resultados escolares entre os alunos com dificuldade de aprendizagem, ou de relacionamento (como "cuidador" de emoções); ou em nível de aconselhamento, considerado como alguém que ouve os problemas do colaborador/professor/aluno, já que a hierarquia imediata não sabe ou não tem tempo para lidar com certas situações.
A visão equivocada da atuação do psicólogo organizacional e do trabalho, como um profissional que deve priorizar o cuidado das pessoas e não o lado da administração e dos negócios, fica confirmada e explícita nas falas da Tabela 2.
Tomando como base a pequena amostra previamente transcrita, o discurso evidencia que, para alguns trabalhadores, não existe clareza, ainda, com relação ao que o psicólogo organizacional pode desempenhar, ou seja, alguns sujeitos não pontuaram diretamente o que eles exatamente desejam, ficando vaga a ideia sobre a intervenção do psicólogo. Exemplo disso são algumas palavras sublinhadas nos discursos analisados e trazidos dos questionários para este trabalho: 1) aconselhar sobre o quê ou para quê? 2) opinar em quê? 3) atuando e auxiliando em quê? 4) melhorar o quê?
A partir desses dados, surgem questionamentos preocupantes: Estaria esse discurso incompleto relacionado à falta de conhecimento sobre o trabalho do psicólogo organizacional? Como estão atuando os psicólogos e que imagem eles têm deixado transparecer no seu campo de atuação?
Assim, observa-se que o trabalho de um psicólogo organizacional pode ser dispensável no que diz respeito ao recrutamento e à seleção de pessoal, já que nenhuma das escolas/empresas fez menção a esse tipo de intervenção profissional. Os dados apurados apontaram que, para o recrutamento, seleção e contratação de pessoal, as escolas fazem uma entrevista. A escola de orientação behaviorista foi a única que disse aplicar um questionário para a avaliação de perfil psicológico. Porém nenhuma delas mencionou que o trabalho de recrutamento e seleção é feito por um psicólogo; a pessoa que se encarrega dessa tarefa, nas escolas, é o diretor.
Existem dificuldades no momento da contratação, uma vez que há problema de "mão de obra qualificada e de perfil não condizente com a oportunidade oferecida" (P13, Escola 3).Também há "dificuldades para encontrar profissionais que se encaixem dentro do que a escola necessita" (P20, Escola 4), em outras palavras "que apresentam o perfil da escola" (P6, Escola 2), nisso não houve menção à figura do psicólogo organizacional como alguém que deveria ter o compromisso de conhecer a realidade do mundo do trabalho, especialmente a realidade social local, para poder compreender os fenómenos que ali se estabelecem, bem como os sujeitos, candidatos às vagas oferecidas, que por ali transitam, na tentativa de colaborar com as instituições, assessorando os gestores e, como consequência, trazendo resultados favoráveis a toda a organização.
As escolas, com exceção da escola de orientação behaviorista - a única que admite "contratar profissionais qualificados para ministrar treinamento junto ao grupo" - evitam a palavra "treinamento", por considerarem uma palavra de significado tecnicista. Então, elas optam por declarar que promovem grupos de estudo permanentes, com encontros frequentes, nos quais são discutidas as propostas, as metodologias e os fazeres da escola.
E, mais uma vez, nenhum desses lugares mencionou que o trabalho de treinamento, ou as reuniões para aperfeiçoamento, pode ser, pelo menos, organizado por um psicólogo; aliás, a palavra "psicólogo(a)" foi mencionada em raríssimas ocasiões. Conforme tabela 1, a referência ao psicólogo se faz através da palavra "alguém" e, numa menção mais adequada, "um profissional". Ainda, a tabela 1 ilustra as representações sociais dos participantes desta investigação.
Outros questionamentos surgem, tendo em consideração estes dados: 1) A ausência de um psicólogo para efetuar esse trabalho se deve ao fato de as escolas se perceberem mais como instituição de ensino e menos como empresas? 2) Esses dados podem estar atrelados à questões culturais, ou relacionadas ao porte pequeno dessa cidade? 3) Os psicólogos têm feito um bom trabalho, divulgando a psicologia organizacional e do trabalho na região do Alto Vale do Itajaí?
Ainda em harmonia com as questões pautadas previamente, verificou-se que, mesmo qualificado para atuar na área de psicologia organizacional e do trabalho e poder auxiliar nas questões ligadas à competitividade, produtividade e qualidade do produto à qualidade do trabalho, a atuação e o lugar do psicólogo na empresa parecem ainda estar muito distantes da realidade pesquisada. Apesar de a psicologia organizacional e do trabalho ter tido transformações significativas ao longo da história (Campos, Duarte & Pereira, 2011), a operacionalização de uma concepção mais abrangente é necessária para sua atuação. Também se observou que as empresas ainda não conseguem ver, no profissional psicólogo, alguém que pode investigar e intervir nas organizações, objetivando a melhoria dos vários aspectos que deixam a desejar no ambiente organizacional.
Assim, a presença do psicólogo na instituição, ocupando um lugar de intervenção, planejamento e gerenciamento em uma perspectiva questionadora, ativa e crítica que objetivem processos de mudança, é uma possibilidade ainda a ser construída. Como é possível notar, é muito difícil para os profissionais, independentemente da área em que atuam, satisfazerem todo o coletivo que abrange o local de trabalho. Em muitos casos, parece existir uma expectativa/ilusão expressa na crença de que o psicólogo pode ser o "salvador da pátria", que resolverá os problemas do ambiente laboral, inclusive as dificuldades que vão além dos portões da empresa/escola - "[...] alguém que tentasse resolver nossos problemas" (P10, Escola 2; P19 Escola 4).
Os sujeitos participantes, com exceção de alguns da escola behaviorista, acham que, sozinho, o psicólogo é capaz de, miraculosamente, agir como o Barão de Münchausen (Bock, 1999) se puxando pelos cabelos e saindo, por conta própria, do pântano em que se encontra - "[...] um profissional assim poderia resolver as pendências da escola" (P17, Escola 4). Assim, o trabalho multidisciplinar, em equipe, para que as ações se efetivem na promoção do desenvolvimento do todo que alberga o ambiente de trabalho, inexiste na ótica dos profissionais entrevistados; o que ainda persiste muito fortemente é a visão fragmentada do trabalho do psicólogo, que, muitas vezes, acaba atuando como um "bombeiro apagador de incêndios". Além disso, muitas vezes, o trabalho do psicólogo é confundido com o de outros profissionais, principalmente nas escolas, onde a fronteira entre a pedagogia e a psicologia muitas vezes é difusa. Nesse sentido, foi possível verificar o impacto da história da psicologia na significação sobre a atuação do psicólogo organizacional e do trabalho nos locais investigados. As respostas oferecidas pelas pessoas que trabalham e/ ou já trabalharam em empresas onde havia psicólogos atuando, colocaram o que pensam sobre a atuação dos psicólogos em ambientes organizacionais, conforme a tabela 3.
Finalmente, os resultados revelaram que os psicólogos podem fazer intervenções para melhorar as questões de relações humanas nos locais de trabalho. Essa concepção coaduna com a inserção da psicologia nos processos produtivos em que o psicólogo deve sustentar posições que privilegiem o contexto do trabalho (Cruz & Maciel, 2005). Analisando as respostas, foi possível depreender da percepção dos participantes da pesquisa que o psicólogo é um profissional importante nas relações de trabalho no que tange à integração e à mediação de conflitos, compreendendo e, principalmente, intervindo sobre as causas dos desarranjos vivenciados pelas pessoas nos seus locais de trabalho.
Os resultados observados também permitem inferir que, com exceção de apenas um dos 20 entrevistados, os demais acreditam no trabalho do psicólogo, achando-o relevante, importante e indispensável. Porém, com modelos de organização do trabalho historicamente constituídos, deixaram de vislumbrar as contribuições do psicólogo na gestão organizacional. Ficou evidenciado, também, que o papel e a atuação do psicólogo, ainda que seja em escolas, estão calcados em modelos clínicos de atendimento.
Considerações Finais
Mudanças profundas vêm ocorrendo através dos tempos atingindo o ambiente corporativo, provocando uma verdadeira redefinição nos papéis exercidos por profissionais das mais diversas áreas, nas empresas e instituições. Em outras palavras, novas mudanças, novos rumos, novas posturas. Nesse contexto, poderíamos afirmar que a Psicologia não ficou imune aos avanços e desenvolvimentos ocorridos no mundo do trabalho, haja vista que o foco inicial, que trazia no seu bojo a questão predominante da produtividade, floresceu e se estendeu para abranger outras diferentes áreas e temáticas no cenário empresarial.
Por outro lado, esse florescimento ainda é pequeno se compararmos a realidade do trabalho presente na sociedade moderna. Há muitos profissionais da psicologia que conseguem ser apenas psicólogos organizacionais, esquecendo que, para melhor operacionalização, produtividade e rendimentos, há que se levar em conta o bem-estar do quadro funcional do lócus laboral, entendendo o todo social para poder compreender o elemento humano dentro da lógica do mercado. Esse bem-estar está diretamente relacionado à função de promoção de saúde consubstanciado ao vínculo do psicólogo organizacional e do trabalho.
Mas, como exigir desses profissionais novas posturas, quando a construção da sociedade se encontra baseada em fragmentos? Se analisarmos o paradigma capitalista e os modos de produção nele inseridos, veremos claramente a fragmentação de tarefas como exemplo clássico de divisão do trabalho; universalidade e abandono da categoria da totalidade dão lugar à ênfase na compreensão do singular. Assim, constroem-se ambientes de trabalho onde uns vigiam, outros planejam e outros executam.
O que dizer, então, da própria academia que prepara profissionais, em tese, mais qualificados? O que dizer da formação realizada pelos cursos de psicologia? Se olharmos acuradamente, veremos que os cursos de psicologia estão, dependendo da instituição, ora na área das ciências biológicas, ora nas humanas, representado uma situação confusa, decorrente da fragmentação do conhecimento nas academias. O próprio curso que forma os psicólogos é fragmentado em área, coordenação, subdivisão etc., tudo muito especializado. Como fragmentar uma área do conhecimento que é atravessada por tantas outras situações multidisciplinares? Para responder a essas perguntas, basta que se faça uma retrospectiva histórica do trabalho e também da história da psicologia nas instituições.
Positivismo, tecnicismo, fragmentação, medidas, quantificação, exclusão, produção, recrutamento, seleção e treinamento são "ingredientes" que ainda compõem a receita de muitos psicólogos da contemporaneidade, mesmo em tempos de globalização, qualificação, tecnologia, flexibilização, pluralização, comunicação e informatização. Não é, portanto, de se admirar que, com todo esse histórico, a vida do trabalhador tenha sido (e muitas vezes ainda é, porque essas ideias, apesar de um pouco modificadas, ainda são utilizadas até hoje) selada por um diagnóstico que ditava para sempre sua "capacidade" ou "incapacidade", no qual ele era o "único" a ser responsabilizado por seus sucessos e infortúnios, sendo colocada sobre seus ombros toda a culpa pelo seu fracasso, frente ao mercado de trabalho.
Assim, dependia dele - exclusivamente dele - ter a mesma magia do Barão de Münchausen e, por conta própria e vontade pessoal, "se puxar pelos cabelos" (Bock, 1999) e sair da situação de desconforto, fracasso e desespero. Dentro desse modelo de exclusão, essa diferença puramente individual não aponta para o contexto das diferenças sociais - por exemplo: o aumento desenfreado da tecnologia, a globalização, a falta de oportunidades e políticas públicas - contexto esse muito mais abrangente que, envolvendo o trabalhador fracassado, estava diretamente ligado a essa situação de insucesso.
Essa postura de adequação fatalista, provocada pelos efeitos danosos de uma ideologia perversa, que tem transformado os locais de trabalho em verdadeiros ringues de luta, é consequência de uma ideologia de exclusão cujo lema é: "vença o melhor e excluam-se os perdedores". É importante enfatizar que, num cenário tão assustador, para que o profissional psicólogo tenha sucesso dentro de uma organização, uma boa dose de bom-senso e equilíbrio, além de competência, será bem-vinda.
É necessário que o profissional seja atuante na área de Psicologia Organizacional e do Trabalho, o que equivale dizer que ele deve equalizar testes, seleção, recrutamento, treinamento, qualificação etc., sem deixar de contemplar os indivíduos, seus comportamentos, e seus vínculos, numa abordagem que seja, simultaneamente, psicológica e social, albergando, portanto, uma dimensão psicossocial das relações de trabalho. Atuando nesse sentido, o psicólogo da organização estará muito mais apto para lidar com a frustração e os fracassos, rompendo com o discurso, ao mesmo tempo fatalista e individualizante, que visa transformar os trabalhadores em responsáveis pelo seu próprio fracasso e os impele a "se puxarem pelos cabelos", tentando desesperadamente dar conta de uma situação, na qual, sozinhos, por eles próprios, será impossível viabilizar seu real fortalecimento para sair do fracasso, desespero e exclusão.
Apesar da construção sócio-histórica da Psicologia Organizacional e do Trabalho, e dos consequentes percalços teórico-práticos, encontrados nas academias durante o tempo da formação do psicólogo, essa área de conhecimento da psicologia tem muito, ainda, a oferecer e contribuir para a operação das organizações e para o bem-estar dos funcionários do mundo corporativo. Nisso se insere, a importância da conscientização na área de saúde mental nas organizações, para resgatar-lhes a potencial interface para o bem-estar do quadro funcional. É possível vislumbrar um futuro promissor para os profissionais dessa área, uma vez que as organizações continuam necessitando de ajuda nas questões que abrangem tanto a organização, quanto a qualidade de vida e saúde mental do seu quadro funcional.
É importante que se trabalhe com a finalidade de aumentar a conscientização na área de saúde mental nas organizações. Essa postura, sem dúvida, poderá auxiliar os gestores e quadros executivos a identificar sinais de doença mental nos colaboradores e, assim, intervenções, de forma adequada, poderão ser efetivadas - uma medida essencialmente necessária para uma gestão eficaz e para um ambiente produtivo na organização.
Nesse cenário, os psicólogos podem ser "coartífices" e copartícipes, não somente do desenvolvimento da empresa na esfera organizacional, mas também, e principalmente, da promoção do bem-estar psicológico da coletividade empresarial, trabalhando na redução e/ou erradicação do estigma e da discriminação. Mesmo sendo apenas uma pequena parcela da sociedade, os psicólogos organizacionais terão sua influência na abrangência de outras pequenas esferas (família, grupos de amigos, escolas etc.) e, finalmente, no todo social, no qual todos pretendem estar incluídos.
É importante, entretanto, realçar que este é um trabalho de caráter exploratório e restrito a apenas quatro organizações escolares da rede particular de um município de aproximadamente 70.000 habitantes. Portanto é imperativo que se compreenda que os resultados revelados nesta pesquisa apresentam limitações quanto às possibilidades de generalizações para outras instituições, ainda que na mesma modalidade, de modo que as comparações devem ser feitas de forma cautelosa e, sempre, salvaguardando as devidas proporções.
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Endereço de Contato:
Idonézia Collodel Benetti
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Recebido: 21/08/2015
Última revisão: 04/12/2015
Aceite final: 14/12/2015
Sobre os autores:
Idonézia Collodel Benetti - Psicóloga, Mestre em Psicologia e Doutoranda em Saúde Coletiva na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, Santa Catarina. E-mail: idonezia@hotmail.com
Joao Paulo Roberti Junior - Psicólogo e Mestre em Antropologia Social na UFSC. E-mail: joaoroberti@ gmail.com
Fernanda Ax Wilhelm - Professora doutora do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Roraima (UFRR), Boa Vista, Roraima. E-mail: fernandaax@gmail.com
Ana Paula da Rosa Deon - Professora Mestre do Departamento de Psicologia da UFRR. E-mail: ap.deon@ uol.com.br
Jaqueline Silva da Rosa - Professora Mestre em Administração da UFRR. E-mail: ja.q.s@hotmail.com
1 Termo pertencente à Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano (Bronfenbrenner, 1979), que afirma que o desenvolvimento é influenciado por cinco sistemas ambientais: Microssistema, Mesossistema, Exossistema, Macrossistema e Cronossistema.