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Revista Polis e Psique

versão On-line ISSN 2238-152X

Rev. Polis Psique vol.11 no.spe Porto Alegre  2021

 

ENTREVISTA

 

"Por uma psicologia da descolonização" - Entrevista com Liliana Parra-Valencia

 

"For a psychology of decolonization" - Interview with Liliana Parra-Valencia

 

"Por una psicología de la descolonización" - Entrevista con Liliana Parra-Valencia

 

 

Liliana Parra-ValenciaI; Saulo Lüders FernandesII; Simone Maria HüningII

IUniversidad Cooperativa de Colombia (UCC), Bogotá, Colômbia
IIUniversidade Federal do Alagoas (UFAL), Maceió, AL, Brasil

 

 

Realizada por Saulo Lüders Fernandes e Simone Maria Hüning

Liliana Parra-Valencia é psicóloga, professora e pesquisadora na Universidade Cooperativa da Colômbia. É doutora em Ciências Sociais e Humanas pela Pontifícia Universidad Javeriana de Bogotá (PUJ, 2019). Realizou seu mestrado sobre Psicologia Social y Violencia política na Universidad de San Carlos de Guatemala (USAC, 2009) e mestrado em Humanidades e sociedades do século XXI na Universidad de Barcelona (UB, 2004). Foi assessora da Rede nacional de saúde mental da Guatemala e investigadora do pós-conflito e da reconciliação social da Guatemala, em relação com o trabalho psicossocial, a reparação e a reconstrução da memória histórica pós-conflito. Com mais de 20 anos de experiência no acompanhamento psicossocial de comunidades e grupos. Estuda a grupalidade curadora, os saberes e as práticas descoloniais, camponesas e afro-indígenas. Desde 2013, coordena aInvestigación PsicoPaz (Psicologia e iniciativas sociais da paz), do Grupo Boulomai da Universidade Cooperativa da Colômbia (Bogotá). Atualmente faz parte do projeto internacional de pesquisa Psicologia e descolonialidade, Colômbia-Brasil (2019-2022). E compõe o Grupo de Trabalho "Territorialidades, violências, políticas e subjetividades" da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação (ANPEPP).

Nestes percursos como pesquisadora desenvolveu estudos sobre violência estrutural e conflitos armados na América Latina. Os debates críticos propostos por ela sobre os conflitos armados trazem olhares as capacidades de resistência e resiliência dos povos campesinos, afrodescendientes, palenqueros1 e indígenas em suas formas de organização política e comunitária frente às violências historicamente vividas nestes territórios. Há em seus estudos uma referência ao cotidiano comunitário como espaço de produção de cuidado coletivo construído nos encontros e narrativas de grupos diariamente tecidos na vida campesina.

Em um de seus livros lançados em 2016, "Acompanhamento en clínica psicossocial: uma experiência de pesquisa em tempos de construção de paz (Colômbia)", ela busca aprofundar a compreensão das práticas sanadoras presentes no cotidiano das comunidades campesinas colombianas pós conflito armado. A compreensão que ela apresenta sobre estas práticas realiza um deslocamento epistêmico sobre o fazer da psicologia, apontando que o cuidar e o sanar não são conhecimentos restritos aos horizontes da psicologia, mas ele é um ato coletivamente afirmado nos territórios campesinos colombianos, que diante da devastação deixada pelo conflito armado, produzem modos de elaboração coletivos do sofrimento político destes grupos. O encontro com estas grupalidades curadoras, noção que Liliana Parra-Valencia propõe e teoriza, possibilitou a ela realizar uma aliança entre a psicologia comunitária e as práticas clínicas na construção de um acompanhamento psicossocial nestes territórios de Montes de María (Sucre e Bolívar) que afirmam a possibilidade do encontro entre os conhecimentos populares de cuidado e os saberes possíveis à uma psicologia descolonizada.

Liliana Parra-Valencia é esta psicóloga pesquisadora inquieta, que parte de suas reflexões diante das experiências vividas nas comunidades, são destes territórios que ela faz brotar categorias analíticas capazes de descolonizar a psicologia, tensionar seus conceitos, métodos e práticas. Nos últimos anos, a pesquisadora também tem desenvolvido parcerias de pesquisa com instituições e pesquisadoras(es) brasileiras(os), nos permitindo estabelecer redes de cooperação e trocas de experiências na construção de perspectivas descoloniais e contra-coloniais nas intervenções e investigações da psicologia. Nesta entrevista dialogamos sobre estes processos, estabelecendo um diálogo que se localiza desde duas posições distintas de quem conduz esta entrevista, a partir das quais buscamos agregar diferentes elementos para pensar seu trabalho. Para isso, consideramos importante situar esses lugares de onde se produzem nossas interrogações.

Primeiro, o encontro com o professor, aqui entrevistador, Saulo Lüders Fernandes (UFAL), no XIX Encontro Nacional da ABRAPSO em Uberlândia, em 2017, em um minicurso ministrado por ela junto com a professora Dolores Cristina Galindo (UFMT), com a temática "Prácticas intelectuales indígenas, afrodiaspóricas y campesinas: decolonialidad del ser, del saber y del poder". Naquele momento, o que chamou atenção em sua apresentação foram as fotografias apresentadas das comunidades e dos territórios colombianos que expressavam cenários similares das comunidades tradicionais do agreste de Alagoas. Foram os territórios que se encontraram e com eles as possibilidades de trabalhos conjuntos, formalizando-se assim, uma parceria para desenvolvimento futuro do projeto de pesquisa "Psicología y descolonialidad: Mapeo de prácticas para sanar ("Colômbia-Brasil" 2018-2020), que foi renovado e vai para sua segunda edição agora no olhar as relações das comunidades afrodescendentes com a natureza: "Psicología y descolonialidad: relación con la naturaleza en comunidades afrodescendientes (Colômbia-Brasil 2021-2022)".

Em julho de 2019, tal projeto oportunizou a visita de Liliana Parra-Valencia à UFAL e o encontro com a segunda entrevistadora, Simone Maria Hüning (UFAL). Liliana Parra-Valencia compartilhava com a comunidade acadêmica da UFAL sua trajetória e estratégias de pesquisa na Colômbia. A vinculação da pesquisa a territórios vulnerabilizados e desprotegidos pelo Estado, bem como as perspectivas teórico-metodológicas marcadamente dialógicas e descoloniais, despertaram o interesse em conhecer de perto o trabalho realizado pela pesquisadora colombiana, o que ocorreu entre os meses de setembro e dezembro de 2019, em quatro comunidades distintas na Colômbia. Tal experiência, para além da ampla aprendizagem de vida que permeou os encontros ocorridos, também marcou profundamente pelo modo como foi possível vivenciar as relações da pesquisadora com as comunidades.

A emergência do território e da vida comunitária nos estudos de Liliana Parra-Valencia são disparadores para a descolonização dos saberes psi, questão que será o eixo condutor nesta entrevista. Os conhecimentos populares definem limites à psicologia e é neste reconhecimento de limitações que abre-se as possibilidades de construção de alianças, composições e reconhecimento de: outros saberes, modos de vida, cosmovisões e visões sobre o mundo. Paragens que não se restringem aos enquadres normativos e racionalistas impostos pela ciência moderna ocidental. Estar com Liliana Parra-Valencia é compartilhar de uma psicologia que não se pretende universal, mas enquanto mais um horizonte de mundo capaz de cohabitar com outras tantas: visões, olhares, saberes, vistas, vidas e conhecimentos.

Liliana Parra-Valencia - Para mí es un honor participar de esta interesante entrevista de las/los colegas Dra. Simone Hüning y Dr. Saulo Fernandes, académicas/os, investigadoras/es y docentes de alto nivel en Psicología Comunitaria, a quienes admiro y respeto como profesionales y sobre todo como seres humanos, y con quienes he tenido la fortuna de compartir en estos últimos años. Llama poderosamente mi atención los puntos que las/los colegas quieren destacar de mi trabajo, en una trayectoria de co-construcción participativa; señalan aspectos no sólo teórico-prácticos sino y sobre todo metodológicos y epistemológicos. Elementos que no siempre son susceptibles de fácil identificación, pues quizás sólo se pueden advertir en un acercamiento sistemático y riguroso para advertir las sutilezas episte-metodológicas. También tal vez requieran una mirada amplia, sensible y crítica, capaz de advertir las posturas en la construcción de conocimiento y en el trabajo con comunidades en contextos adversos.

No quiero continuar sin antes reconocer que las reflexiones que comparto no serían posibles sin la fortuna del encuentro y la participación de los líderes campesinos de Asocares, las mujeres campesinas de San Francisco, Villa Colombia y Medellín, los médicos tradicionales palenqueros, de San Cristóbal, el médico tradicional Mayor Zenú y el Consejo Comunitario de Comunidades Negras Eladia Ariza. A ellas y ellos, les debo mi principal inspiración.

Saulo Lüders Fernandes - Liliana, nos trabalhos que vimos realizando juntos, principalmente no desenvolvimento da pesquisa Psicología y descolonialidad: Mapeo de prácticas para sanar (Colômbia-Brasil) (2018-2020), sempre percebi a sua inquietude e preocupação para quanto às tensões produzidas entre os pressupostos modernos/coloniais arraigados na psicologia e os conhecimentos e cosmovisões trazidas pelas comunidades palenqueras e quilombolas. Tais conhecimentos questionam, suspendem, friccionam alguns alicerces epistêmicos da psicologia. Com base nestas experiências gostaria de saber como você entende estas tensões e lida com elas para o fazer de outra psicologia possível?

Liliana Parra-Valencia -La Psicología en la que hemos sido formados, desde la década del 40 cuando emerge la profesionalización de la disciplina en Latinoamérica y el Caribe, se apuntala en el modelo moderno/colonial hegemónico de las Ciencias Sociales y Humanas. Es decir, es producto de aquella Ciencia fiel a la racionalidad euronortecentrada, que se presenta rígida ante la disciplinarización del saber (Foucault, 2000), el distanciamiento epistémico, siguiendo a Santiago Castro-Gómez (2010), como mecanismo de reproducción colonial del saber. Además, acrítica de sí misma ante la idea de qué entendemos por ciencia en la separación entre el "sujeto que conoce" y el "objeto conocido", la delimitación de un objeto de estudio reducido al comportamiento humano y la matematización de la consciencia; en una concepción que ha buscado el estatus científico que otrora, en el siglo XVIII, propusiera Immanuel Kant a la Psicología empírica. El afán por seguir esta ruta como la única posible en la concepción de una Ciencia restringida y estrecha, ha llevado a la disciplina psicológica a una supuesta y pretendida neutralidad y objetividad. A mi modo de entender, la ha ubicado distante y ajena a las problemáticas sociales y a las demandas reales de las mayorías populares, como diría Ignacio Martín-Baró (2006). Desde esta orilla también ha reproducido las lógicas de la jerarquización del saber, el racismo y sexismo epistémico de la universidad occidentalizada, a los que se refiere Ramón Grosfoguel (2013), presentes en los cimientos de esta institución.

El estudio de la genealogía de las Ciencias Sociales, incluida la disciplina psicológica, me permite concluir que esta emergencia se apuntala en el silenciamiento epistémico moderno/colonial de los saberes campesinos y afroindígenas (Parra-Valencia, 2019). Desconociendo otras concepciones del conocimiento, como las cosmovisiones que no siguen la división moderna entre lo humano y no humano, siguiendo a Bruno Latour (2007); y como afirma María Lugones (2018), continúan siendo el marco de comprensión y formas de interpretación de la realidad de diversos pueblos y comunidades, que no jerarquizan, no escinden ni fragmentan. La Psicología no ha sido ajena al desarraigo de la sabiduría siguiendo a Aimé Césaire (como se citó en Parra-Valencia y Gómez-Galindo, 2019), ni a las miradas universalistas que desconocen lo local y situado en la construcción de conocimiento.

En este sentido, emerge la perspectiva descolonial con fuerza e incidencia en las últimas dos décadas en el ámbito académico, sin desconocer algunos antecedentes venidos de las reflexiones críticas sobre la descolonización desde el Caribe negro (Césaire, Frantz Fanon, el movimiento de las negritudes), los aportes del colonialismo interno (Pablo González Casanova), la colonialidad del poder (Aníbal Quijano), la filosofía latinoamericana, el pensamiento andino (Silvia Rivera-Cusicanqui), entre muchas otras, que desde el colonialismo europeo mismo resistieron. La perspectiva o el pensamiento descolonial es plural, convoca diversas propuestas críticas, con el fin de develar lo encubierto y resistir a la imposición de la modernidad y de las colonialidades desde diferentes formas de ver el mundo (Lugones, 2018).

El escenario académico y epistemológico actual es favorable para el viraje disciplinar en la labor descolonial, dado que otros campos del saber nos anteceden en dicha reestructuración, ahora es el momento para la Psicología. Comprendo que aquellas corrientes psicológicas que buscan re-pensar de manera crítica el quehacer, encuentran en la perspectiva descolonial el quiebre epistemológico para apuntalar otras psicologías posibles que se configuren dialógicas con los saberes otros campesinos y afroindígenas en la construcción de conocimiento. Por tal motivo, y con este sustento teórico-epistémico nos acercamos a dichas comunidades, en particular a sus prácticas y saberes no modernos para curar. Entendiendo las tensiones y fricciones de ir a contrapelo del paradigma positivista y su historicidad, pero con el convencimiento de flexibilizar y ampliar el horizonte de posibilidades del ejercicio profesional y la formación disciplinar; en deuda histórica con las mayorías populares y sus demandas.

Saulo Lüders Fernandes - No trabalho de pesquisa sobre mapeamento de saberes de cura vi a sua implicação e vínculo com a comunidade palenquera e a atenção que você toma para produzir um espaço de cohabitação de saberes, horizontes de mundo e modos de vida. Gostaria que você falasse um pouco das práticas de cuidado vividas nesta comunidade e quais os limites e possibilidades de encontros destas com a psicologia.

Liliana Parra-Valencia -El acercamiento a los saberes y prácticas de cura afroindígenas, de las comunidades en Montes de María, me permitió advertir la coexistencia de elementos de diferente procedencia. En una forma de yuxtaposición en el sentidoch´ixi, noción que trae la socióloga aimara Rivera-Cusicanqui (2010) para hacer alusión a lo abigarrado, a lo jaspeado, me permite explicar que a diferencia de la asimilación o hibridación colonial, aquí cohabitan, en una suerte de inclusión epistémica aunque de forma contenciosa, diferentes saberes sin que se imponga de manera violenta una episteme sobre otra. Esta es una de las razones por la que prefiero el uso de la noción afroindígena, al referirme a estas prácticas de cura, que no mezcla ni mestiza ni diluye las identidades y tampoco se ubica una por encima de la otra. Lo afroindígena, según Cecília Mello (2003, como se citó en Goldman, 2014) es una forma de interacción entre los mundos africano e indígena.

Los mapeos de saberes y prácticas para sanar comunitarios me permitieron identificar esta convivencia con saberes y prácticas de procedencia occidental. Desde la episteme hegemónica de la Psicología, no hubiera sido posible advertir dicha yuxtaposición, si me lo permiten, euroafroindígena en la cura de las comunidades montemarianas. Una vez llegados aquí, el reto está en las posibilidades del diálogo desde el saber de la disciplina psicológica con los saberes otros. Lo cual, nos ubica en el punto anterior; desde el paradigma científico moderno/colonial de la Psicología, el diálogo con otras formas de ver el mundo y modos de vida, que estén por fuera de dicho marco interpretativo, es limitado. Es más, me atrevería a decir que no interesa.

Entonces, quienes nos interesamos por temáticas como las del cuidado de las comunidades afrodescendientes o las prácticas cotidianas, entendidas como las artes de hacer (De Certeau, 1999) separadas de las ciencias, estamos rondando los saberes considerados no modernos. Los cuales fueron excluidos por aquella frontera racial y epistémica que estableció jerarquías, especialidades, límites, donde la universidad ocupa el lugar privilegiado en la producción de conocimientos legítimos, que instituyó el modelo epistémico moderno/colonial llamado por Castro-Gómez (2007) como hybris del punto cero. Este sitúa a la ciencia moderna occidental desde un presunto punto de vista por fuera del mundo, reservado para los expertos ilustrados, blancos, euronortecentrados. De allí que el diálogo con los saberes de cuidado y de cura de las comunidades afrodescendientes, a contrapelo de las lógicas de escisión, jerarquías, racismo, patriarcalismo y capitalismo, requiere de un movimiento analítico profundo y una perspectiva epistemológica otra; aquella a la que nos invitan los feminismos descoloniales, críticos de las miradas universalistas y los posicionamientos eurocéntricos (Walsh, 2007), y el paradigma de la interseccionalidad afrofeminista entre género, clase y raza (Viveros, 2016). Más aún, para este encuentro se requieren psicologías capaces de reconocer la existencia de diferentes niveles de la realidad, del tiempo y del espacio, multirreferencial y multidimensional, como sugiere la Carta de la transdisciplinariedad (De Freitas, Morín y Nicolescu, 1994).

Entonces, quizás otro interrogante que emerge sería en torno a cuáles psicologías estarían a la altura para reconocer las posibilidades de los saberes afrodescendientes, en la reflexión sobre la cura.

Saulo Lüders Fernandes - Nas escritas compartilhadas com você nestes últimos dois anos vi o seu olhar atento e cauteloso quanto a tradução das experiências vividas nas comunidades diante do processo da escrita acadêmica. Gostaria que você falasse um pouco sobre este problema da tradução das experiências e dos conhecimentos comunitários para o universo acadêmico. Como produzir estas escritas sem cair em dispositivos de colonialidade do saber e do ser?

Simone Maria Hüning - Sobre essa questão da tradução, pude acompanhar ao visitar as comunidades com você, um momento bastante rico em que você fazia uma espécie de devolutiva à comunidade de um processo de pesquisa ainda em andamento. Você apresentava para o grupo falas que eles haviam produzido em momentos anteriores da pesquisa e como você e a equipe de pesquisadoras(es) estavam entendendo o que foi dito. Diante disso eram apresentadas concordâncias e contestações e feitas reformulações nos modos de escrita sobre as questões apontadas pela comunidade. Você pode nos contar um pouco mais sobre essa metodologia de trabalho, como ela é realizada, o que pretende e quais os cuidados importantes em sua condução?

Liliana Parra-Valencia -Así es. Las cuestiones de la traducción han sido un motivo de amplia y profunda reflexión en los procesos de construcción de conocimiento que he emprendido, más aún, cuando el carácter de la investigación es participativo, colaborativo y horizontal. El diálogo con perspectivas críticas del saber complejiza, de manera pertinente, estos análisis no sólo porque nos cuestionan en la reproducción de la colonialidad del poder, del saber y del ser que criticamos desde el pensamiento descolonial. Sino también, porque ponen sobre la mesa el imperativo de reconocer y hacernos responsables de la inevitable violencia epistémica (Spivak, 1998) y el riego del extractivismo epistémico (Grosfoguel, 2016), desde la investigación con comunidades otras y el trabajo académico venido de la universidad occidentalizada de la que hacemos parte en Latinoamérica y el Caribe.

Estas reflexiones sumadas al acuerdo ineludible y consciente que asumí con las comunidades de Montes de María, cuando me abrieron por primera vez la puerta en 2014, no sólo de su comunidad, sino también la de sus casas, sus familias y sus corazones, me ubican en un lugar de compromiso. En aquel primer encuentro con la Asociación de Campesinos Retornados (Asocares), uno de los líderes campesinos me preguntó qué haría con la información de sus comunidades y qué les quedaría a ellas. Este interrogante se ha mantenido vivo y vigente, pues evoca un pacto de reciprocidad que articulé a las estrategias de devolución y socialización constantes: en la lógica de la pregunta por la traducción. Para la academia la devolución está más estructurada en relación con las publicaciones, la formación de estudiantes, las asesorías de las modalidades de grado y la denominada circulación de conocimiento que se materializa en ponencias y talleres en los eventos científicos, y en las redes científicas nacionales e internacionales en las que participo.

En este punto quiero mencionar que mi sensación ha sido la de habitar dos mundos, con dos lenguajes, expectativas e intereses diferentes: el de las comunidades campesinas y afroindígenas, y el de la comunidad academia y educativa (la universidad). Para ambos mundos la dedicación de productos era pensada en una doble corriente. Pronto la fotografía significó la posibilidad de un puente, de un lenguaje común para ambos mundos. Y cuando leí Sociología de la imagen de Rivera-Cusicanqui (2015) encontré una aliada que, a pesar de la distancia geográfica, hacía referencia de manera cercana a esta misma experiencia. Con ella llegó la reflexión y la teorización del uso de la imagen en los procesos de traducción, devolución y socialización para ambos mundos; a la vez, como estrategia y metodología descolonizadora de las prácticas discursivas y la hegemonía del texto escrito.

Así pues, el proceso de construcción de conocimiento en las idas y venidas al territorio incorpora los momentos de socialización y devolución como diálogo constante con las comunidades. Las cuales se conciben como colaboradoras, partícipes y coautoras (Rappaport, 2007) de la investigación. Dichos momentos se configuran en una de las principales fuentes de construcción conjunta y de validación de conocimiento, y a la vez de acompañamiento psicosocial. En este sentido, cada visita al territorio genera el encuentro con las comunidades y espacios de interlocución; los cuales son sistematizados y devueltos al territorio en la visita siguiente. Se trata de un diálogo continuo y por la concepción del proceso de investigación desde una espiral metodológica.

Saulo Lüders Fernandes - Neste tempo que te conheço percebo que os seus trabalhos desenvolvidos não estão cindidos da sua experiência como pessoa no mundo. Sei que a busca pelo o encontro com as comunidades, seus modos de vida e conhecimentos passam e te constroem, como você entende este processo?

Liliana Parra-Valencia -El encuentro con las comunidades genera conocimiento para ellas mismas y para la investigación; y a la vez también me construyen a mí misma, en aquella bidireccionalidad que el líder campesino evocó, en el sentido de una reciprocidad compartida. Sigo las teorías afrofeministas para quienes la experiencia en primera persona de quien investiga también es fuente de información; más aún, en la propia biografía también emergen las preguntas por la grupalidad y las prácticas de cura campesinas y afroindígenas. Comprendo que el acceso a la verdad, siguiendo a Michel Foucault (1994), implica el trabajo sobre sí mismo y en últimas, la transformación del sujeto que compromete el alma misma.

A la vez implica el compromiso político con las comunidades y la autoemancipación desde la experiencia emocional profunda y espiritual, trasversal a las elaboraciones intelectuales, que como afirmaba Edward Said (2008), no son independientes de las apuestas políticas. Me inspira la dimensión política de la corriente afrofeminista, en la generación de conocimiento, que sigue el principio radical de que "lo personal es político y también es cultural" del Combahee River Collective (1982, como se citó en Barriteau, 2011, p. 16). Desde que trabajo con las comunidades de Montes de María, no soy la misma ni en lo profesional ni como persona situada en el mundo. Y ellas tampoco son las mismas desde que llegué al territorio. Una mujer de San Francisco (Ovejas-Sucre), expresaba que desde que llegué con la investigación, no sólo los hombres salen a las reuniones, sino que también las mujeres tienen un espacio para ellas.

Optar por un lugar diferente al de la neutralidad y objetividad de la pretendida hybris del punto cero, de aquel distanciamiento epistémico (Castro-Gómez, 2010), nos acerca al corazón de las comunidades y su ontología; al tiempo que nos acerca al conocimiento de nosotros mismos.

Simone Maria Hüning - Liliana, gostaria de trazer para nossa conversa alguns elementos com os quais pude tomar contato ao te acompanhar em seu trabalho junto às comunidades da Colômbia, então vou conduzir as próximas questões a partir dessa experiência. A primeira delas tem a ver com como fazer pesquisa em psicologia comunitária, especialmente em contextos desfavoráveis: os conflitos armados, a distância, a escassez de recursos... No que pude acompanhar de sua prática como pesquisadora, você faz um enfrentamento muito expressivo neste sentido, a começar pela escolha das comunidades com que desenvolve seu trabalho, desde suas histórias permeadas por violências e resistências, até sua localização geográfica, que implica um grande esforço para alcançá-las. Assim, pergunto: como você entende a permeabilidade e os desafios dos campos científico, ético e político na pesquisa em psicologia social comunitária e em especial nos territórios em que pesquisa?

Liliana Parra-Valencia -La genealogía de la Psicología Comunitaria, apuntalada en el paradigma crítico y como alternativa a la Psicología de raigambre positivista, ha estado permeada por desafíos en escenarios socio-políticos e intelectuales adversos. El contexto de los conflictos armados, las violencias, la pobreza, la desigualdad, el capitalismo, el neoliberalismo, la pandemia son algunos de estos.

Los retos científicos y ético-políticos de la investigación en Psicología Comunitaria parten, en mi entender y experiencia, del posicionamiento epistémico que asumimos; en cuanto que "ocupar un lugar significa responsabilidad en nuestras prácticas" como afirma Donna Haraway (1995,p. 333). La construcción de conocimiento estará permeada por el lugar que asumimos en la investigación, ya sea de distanciamiento epistémico o crítico de la neutralidad del positivismo; por la mirada que creamos del/la otro/a, como víctima pasiva o como sujeto activo y protagónico, que sin desconocer las condiciones de victimización a las que fue sometido, es agente de transformación; desde las explicaciones universalistas o la comprensión local, de la experiencia subjetiva de las comunidades.

En este contexto, el reto de la investigación en Psicología Comunitaria interroga el posicionamiento ético-político, bien para reproducir las relaciones de dominación de la colonialidad del poder, del saber y del ser; o para proponer estrategias y categorías de análisis que identifiquen las posibilidades presentes en las comunidades para transformar sus condiciones y resistir desde sus propios modos de vida e interpretación de la realidad. Desde allí, es posible escuchar y tener en cuenta no sólo las historias dolorosas de la victimización, sino también, las narrativas de resistencia, solidaridad y apoyo mutuo que emergen en la comunalidad de los territorios.

Desde estas perspectivas, los recursos no seguirían la limitada óptica de la gestión de proyectos, sino la movilización de recursos para el acompañamiento y la continuidad de procesos; que a su vez, la comunidad apropia y hace suyos. Y la/el acompañante no sería imprescindible en el territorio de manera definitiva.

Una concepción de ciencia otra, diferente a la hegemónica del modelo moderno/colonial, se configura en un desafío para reflexionar sobre los procesos de acompañamiento psicosocial comunitario. Los cuales concibo como una postura política y epistemológica, en contextos de violencia política, desde el diálogo interdisciplinar y transdisciplinar con perspectivas críticas del saber de las ciencias sociales y humanas (Parra-Valencia, 2020). Bajo esta perspectiva, el campo científico estaría abierto al intercambio con prácticas y saberes para curar descoloniales, campesinas y afroindígenas.

Simone Maria Hüning - Outra questão que me marcou bastante ao acompanhar seu trabalho, que penso sinalizar uma ruptura importante com os modos como muitos de nós nos relacionamos com comunidades onde pesquisamos ou intervimos, foi a condução das atividades, em especial de rodas de conversa em que participavam crianças, jovens, mulheres e homens adultos e idosos. Frequentemente, pensamos ser necessário dividir estes grupos em atividades ou momentos específicos. Em seu trabalho, mesmo tratando de temas dolorosos como a guerras e complexos como a cura e o cuidado, todos falavam e eram igualmente respeitados e escutados, construindo-se uma relação entre as gerações que me pareceu muito mais marcada pelo respeito à experiência e ancestralidade do que por uma autoridade que esvazia o saber e a potência das pessoas mais jovens ou dos "velhos demais". Como isso se desenha como uma proposta teórico-metodológica em suas pesquisas e como dialoga com uma perspectiva descolonial?

Liliana Parra-Valencia -Certo. A esto se refiere la propuesta epistemológica y metodológica de la investigación-acompañamiento que se plantea participativa y situada. El encuentro con las comunidades en su territorio nos mostró que en el trabajo con las mujeres no podíamos dejar de lado a las niñas, los niños y los jóvenes que llegaban con ellas, pues además de mujeres, también son madres, abuelas, tías, cuidadoras y están a cargo de la crianza. Asimismo, el escenario veredal, en el campo, la espacialidad y la manera como se habitan los espacios, no es igual que aquella que delimita, separa, compartimentaliza y finalmente excluye. Y ubica a determinadas personas, en determinados lugares, según una mirada moderna/colonial que además separa lo humano de lo no humano, según Latour (2007). El acercamiento a las comunidades campesinas y afroindígenas, arraigadas a una ontología vinculada a la naturaleza nos permite conocer otras formas de concebir el espacio y la espacialidad, el territorio y la interacción con las y los otros. Estas características demandan perspectivas epistemológicas y metodológicas acordes a estas realidades comunitarias. De allí que, nuestra propuesta es abierta a quienes quieran llegar al espacio del encuentro en el territorio, sin ser nosotros quienes determinen los modos de participación e interacción comunitaria; desde nuestros referentes occidentalizados. Por el contrario, buscamos que en lo posible las comunidades se presenten tal y como ellas son, lo más tranquila y espontáneamente posible, en presencia de nosotros como agentes externos.

Identificamos que esta postura epistemológica y metodológica, a su vez, promueve las relaciones intergeneracionales. En el caso de las mujeres en las comunidades, se mantiene activa y cercana, por sus labores de cuidado, crianza y acompañamiento de las/los niños y jóvenes. Consideramos y escuchamos la voz de cada una/uno de los integrantes de la comunidad. En particular, las voces y las historias casi o nada contadas, siguiendo a la dominicana, activista feminista y antirracial Ochy Curiel (2009), quien desde la teoría del feminismo descolonial, las reconoce como un gesto ético-político de descolonización.

Simone Maria Hüning - Escutei, em um dos grupos que participei com você, um senhor emocionado falar sobre sua presença e pesquisa para a comunidade. Não recordo exatamente as palavras usadas, mas ele dizia algo como: "Quando você chegou aqui, sua pesquisa era apenas de uma pesquisadora. Agora, essa pesquisa é todos nós". O que significa, para você, esse transbordar do trabalho acadêmico que se faz constituindo as comunidades como autoras e sujeitos desse processo?

Liliana Parra-Valencia -Esta pregunta me emociona, al igual que las palabras del líder campesino de Asocares, cuando lo escuchamos bajo el hermoso caney de la sede de la Asociación hace un año. Que evoques aquel momento es muy importante, pues sin duda para mí recoge una de las experiencias más importantes y gratificantes del trabajo como investigadora comunitaria y psicosocial. Que las mismas comunidades y Asocares reconozcan como propio el proceso de investigación, se configura en un acierto del propósito metodológico y epistemológico; del estudio de la grupalidad curadora en Montes de María. Expresa el carácter participativo, colaborativo y horizontal de la investigación en el marco de las ciencias sociales y culturales, siguiendo a Orlando Fals Borda, Joanne Rappaport, Sarah Corona Berkin y Olaf Kaltmeier; al constatar estas palabras surgidas de la práctica y no sólo de las publicaciones. También nos habla de la apropiación del proceso de construcción de conocimiento que queda en las comunidades campesinas; da cuenta de la dinámica de socialización y devoluciones que asumió el acompañamiento y la investigación psicosocial en el territorio. A partir del compromiso asumido a principios del 2014, cuando en ese mismo escenario, sede de Asocares, presentábamos la propuesta de investigación. Y los líderes campesinos preguntaban qué les quedaría a ellos, al interrogar de manera legítima el extractivismo epistémico (Grosfoguel, 2016) y la concreción de la reciprocidad.

Hace un año llegamos de nuevo al territorio montemariano para devolver y agradecer a las comunidades su generosa participación y por abrirnos las puertas para el acompañamiento. Para nuestra grata sorpresa, las comunidades también le hicieron a la investigación su propia devolución, al expresar, de manera sincera y emotiva, lo que para ellas significó participar del proceso. Estas manifestaciones dan cuenta de que las mujeres campesinas, los líderes, los médicos tradicionales afroindígenas, las niñas, los niños y jóvenes de San Francisco, Medellín, Villa Colombia, resguardo indígena Morroa del territorio montemariano fueron actores y sujetos protagónicos del proceso. Repito, significa la gratificación por el reconocimiento y hasta el momento, es el logro más grande en mi carrera profesional. ¡Gratitud!

 

Notas

1 Refere-se aos afrodescendentes da diáspora africana colombiana das comunidades chamadas palenques. Atualmente, refere-se aos habitantes de San Basilio de Palenque. É também o nome da língua falada nesta comunidade.

 

Referências

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Submissão: 01/12/2020
1° avaliação: 01/12/2020
Aceite: 15/12/2020

 

 

Liliana Parra-Valencia é professora e pesquisadora do Programa de Psicologia da Universidad Cooperativa de Colombia (Bogotá). Doutora em Ciências Sociais e Humanas na Pontificia Universidad Javeriana, Bogotá. Mestre em Psicologia Social e Violência Política (USAC). É também Mestre em Humanidades e Sociedades de século XXI (UB).
E-mail: lilianaparrav@gmail.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9411-4513
Saulo Lüders Fernandes é graduado pela Universidade Estadual de Maringá. Realizou doutorado na Universidade de São Paulo. Professor do Instituto de Psicologia e do programa de pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) - Brasil.
E-mail: simone.huning@ip.ufal.br
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2335-0030
Simone Maria Hüning é graduada em Psicologia pela UNISCe docente-pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal de Alagoas (UFAL). É também mestra e doutora em Psioclogia pela PUCRS. Bolsista produtividade do CNPq.
E-mail: simone.huning@ip.ufal.br
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-8080-7733

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