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Revista Brasileira de Psicodrama

versão impressa ISSN 0104-5393versão On-line ISSN 2318-0498

Rev. bras. psicodrama vol.24 no.1 São Paulo jun. 2016

https://doi.org/10.15329/0104-5393.20160004 

ARTIGOS INÉDITOS

 

As relações interpessoais entre adolescentes: o teste sociométrico como recurso para superar conflitos e violências escolares

 

Social relationships between adolescents: the sociometric test as a resource for overcoming violence and conflict in schools

 

Las relaciones interpersonales entre adolescentes: el test sociométrico como recurso para la superación de conflictos y violencias en las escuelas

 

 

Adriana LiraI; Edenir Christine CerqueiraII; Candido Alberto GomesIII

IUniversidade Católica de Brasília (UCB) - e-mail: adrianaliraucb@gmail.com
IIUniversidade Católica de Brasília (UCB) - e-mail: edenir.cerqueira@hotmail.com
IIIUniversidade Católica de Brasília (UCB) - e-mail: candidoacg@gmail.com

 

 


RESUMO

Este artigo tem por objetivo apontar o teste sociométrico como recurso capaz de subsidiar o trabalho do professor em sala de aula no acompanhamento das relações interpessoais entre adolescentes para mediar conflitos, ensinar-lhes a conviver e superar violências. O mapeamento foi realizado em uma turma do 6º ano do ensino fundamental de uma escola pública, com histórico de violências, na periferia de Brasília. O resultado do teste sociométrico demonstrou que a professora, desconhecendo os adolescentes e a origem dos conflitos nas relações interpessoais dos alunos, adotava medidas reativas por ensaio e erro, contribuindo para o ciclo das violências e consequentemente para o seu desestímulo profissional.

Palavras-chave: relações interpessoais, adolescência, conflito, violência escolar, sociometria


ABSTRACT

This paper aims to illustrate the sociometric test as a resource for supporting the work of teachers in the classroom in accompanying interpersonal relationships between adolescents, in order to mediate conflicts, to teach them how to live together, as well as overcoming violence. The test mapped social relationships detecting aversions and attractions in a 6th grade class of a public school known for violent occurrences in the suburbs of Brasília, Brazil. Its results revealed that the teacher, uninformed about the students and the reason for the conflicts in their interpersonal relationships adopted reactive measures by trial and error. This behavior contributed to the worsening violence, at the same time causing professional stress.

Keywords: interpersonal relationships, adolescence, conflict, school violence, sociometry


RESUMEN

Este artículo objetiva destacar el test sociométrico como recurso para subsidiar el trabajo docente en clase en el acompañamiento de las relaciones interpersonales entre los adolescentes para mediar los conflictos, educarlos para la convivencia social y la superación de la violencia. El mapa de la tela de relaciones se diseñó en una clase de sexto grado de la educación primaria de una escuela pública, conocida por sus ocurrencias violentas y ubicada en la periferia urbana de Brasília, Brasil. Sus resultados indicaron que la maestra, al desconocer los estudiantes y las orígenes de los conflictos entre ellos, intentaba experimentar medidas reactivas en sus tentativas. Como consecuencia, el ciclo de violencia se incrementaba, lo que contribuía para su pérdida de interés en la profesión.

Palabras-clave: relaciones interpersonales, adolescencia, conflicto, violencia escolar, sociometría


 

 

INTRODUÇÃO

Na literatura há uma gama de interpretações acerca da definição de adolescência, uma vez que ela envolve aspectos físicos, psicológicos, sociais, jurídicos e históricos. A Organização das Nações Unidas (1981), por exemplo, define a adolescência como um período compreendido entre 15 e 24 anos de idade. Neste artigo, no entanto, tomamos por base o conceito de adolescência adotado pela Organização Mundial de Saúde (1985), como a faixa etária compreendida entre 10 e 19 anos.

Em meio aos diversos estudos, é possível constatar uma tendência de os adolescentes, sobretudo brasileiros, serem destacados como as principais vítimas de violência pelo envolvimento com drogas e criminalidade. Além disso, nos últimos anos, é cada vez maior o número de mortes de adolescentes por homicídio (Waiselfisz, 2007). Por esse motivo, a adolescência ganhou conotação negativa, sendo associada à delinquência.

O fato é que a escola, ressentindo a violência da sociedade, acaba sustentando esta percepção negativa da adolescência principalmente porque uma parte das escolas não tem conseguido encaminhar os conflitos oriundos das relações interpessoais dos estudantes.

O Art. 26º da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948) prevê para a educação formal o papel de desenvolvimento pleno da personalidade humana e o preparo para oconvívio social. Para tanto, subentendemos que a instrução deve promover a compreensão ea tolerância entre os indivíduos em suas peculiaridades, especialmente hoje em que os conflitos tão presentes na relação entre os estudantes tendem a resultar em violências dentro e fora da escola. Daí a convivência ser um desafio para os professores.

Assim como a definição de adolescência, a violência foge a uma definição única, pois este fenômeno surge de modo relativo a certa época, a um meio social, a circunstâncias particulares (Debarbieux, s.d.). Então, não pretendendo reproduzir uma série de conceitos, visto que eles se tornam complementares, destacamos aqui a definição de Chauí (2002) que considera a violência como o uso da força física e do constrangimento psíquico para obrigar alguém a agir de modo contrário à sua natureza e ao seu ser, violando a integridade física e/ou psíquica da dignidade humana.

Por suas variadas formas de manifestação no convívio entre os indivíduos, as violências acabam associadas erroneamente a outros, como a indisciplina. Para Soeiro (2003), esse equívoco é propiciado especialmente pelos meios de comunicação que acabam por utilizar essas definições como sinônimas. Essa generalização é para Estrela (2002) um tanto quanto abusiva, visto que a indisciplina escolar, na maior parte dos casos, não é violência. Contudo, é preciso destacar que, entre os seus vários motivos, a ocorrência de violências se dá também pela indisciplina dos estudantes e pela dificuldade de convivência entre eles, como registram levantamentos feitos, por exemplo, por (Abramovay & Rua, 2002).

Assim sendo e preocupados com as ações da escola para a superação das violências, averiguamos a importância de os professores compreenderem a origem dos conflitos nas relações entre os estudantes, que nem sempre recorrem ao diálogo para resolver suas diferenças. A partir disso, verificamos na literatura que a sociometria pode constituir um meio eficaz para subsidiar o professor no sentido de promover a convivência entre os estudantes.

 

AS RELAÇÕES INTERPESSOAIS, A SOCIOMETRIA, O TESTE SOCIOMÉTRICO E A ESCOLA

Comellas (2007), em seus vários estudos com base na sociometria, destaca que a adoção de qualquer medida para prevenção e superação dos conflitos entre os estudantes requer que os educadores conheçam esses estudantes e, ainda, suas preferências para formar seus grupos e, assim, compreendam como eles se relacionam. É preciso identificar a existência de preconceitos e a origem dos conflitos entre eles para encaminhar de maneira proativa os problemas advindos da dificuldade de convivência e promover um relacionamento a fim de educar para o respeito às diferenças. Nesse sentido, o teste sociométrico permite ao educador desenhar a teia de relações entre os estudantes e identificar a atração e a rejeição entre eles, para compreender as dificuldades convivenciais. Em especial na adolescência, período de busca da subjetividade e protagonismo, esta questão educativa é estratégica. No entanto, nesta fase, a aplicação do teste requer alguns cuidados éticos e técnicos para que não sejam desencadeados conflitos latentes no grupo, desarticulando-o. Daí a necessidade de um psicodramatista para subsidiar a aplicação do teste.

Considerando que na adolescência as mudanças ocorrem também na esfera psicossocial, a integração entre pares é aspecto fundamental que requer maior atenção dos adultos dada a sua importância na constituição do ser adolescente. Nesta perspectiva, Rocha et al. (2003) destacam que o relacionamento interpessoal pode tornar-se e manter-se harmônico e prazeroso, permitindo um trabalho cooperativo, em equipe, com integração de esforços ou, ao contrário, pode tornar-se tenso, conflitante, levando à desintegração de esforços, à perda de energias e à crescente deterioração do desempenho grupal e até mesmo à sua dissolução.

Por sua vez, Pimentel & Sigrist (1976) consideram que os estudantes em grupo podem aprender muito no que refere às relações humanas e podem ser levados a adquirir a maturidade social desejada: saber conviver com os outros, saber dar e receber, saber falar e ouvir, sentir sua responsabilidade perante o grupo e atuar no sentido de resolver os conflitos, entendendo as outras pessoas e os seus comportamentos e adequar as suas atitudes em função do bem social.

Portanto, compreendemos que, se a escola é um dos agentes responsáveis pela integração da criança e do adolescente na sociedade, não pode ignorar os conflitos entre os estudantes. Comellas (2007) corrobora esta posição quando destaca que, numa sociedade com mudanças tão profundas e aceleradas como as nossas, a educação deve ser aquela capaz de construir a convivência entre os estudantes. Portanto, o papel da instituição escolar deve ser o de reforçar a coesão social e a compreensão dos povos, tendo em vista a heterogeneidade que compõe a sala de aula. A mesma autora alerta que só se pode aprender a viver em grupo entendendo os limites do próprio espaço, os espaços dos outros, partilhando os desejos e as necessidades individuais e coletivas, o que constitui longo processo. Dessa forma, a escola, enquanto grupo social secundário de crianças e adolescentes, é a chave para fortalecer os eixos comuns que devem aumentar o entendimento comum entre os indivíduos (Comellas, 2007). Contudo, ainda hoje, cuidar da socialização dos estudantes tem sido um desafio para os educadores, que, algumas vezes, se apoiam em desculpas como a falta de recursos ou a falta de projetos sofisticados, uma vez que desconhecem ferramentas capazes de mapear as relações humanas, e o teste sociométrico é uma delas.

Embora explorado em décadas anteriores, principalmente por profissionais da Psicologia no estudo das relações humanas, o teste sociométrico é atualmente pouco conhecido em nosso meio por ser um instrumento específico da prática socionômica. Estudos anteriores comprovam que este recurso pode constituir uma ferramenta importante para o professor que deseja reverter as situações de conflitos entre os estudantes. Por exemplo, Rocha et al. (2003), por meio do teste sociométrico, buscaram compreender como se processa a relação de amizade entre as crianças e os pré-adolescentes, identificando aspectos desta relação e possíveis interferências do professor nessa relação. Os resultados apontaram que, na perspectiva dos professores, os grupos são formados por afinidade, o que pode envolver preconceitos entre os alunos e competições, aspectos para os quais os professores devem estar atentos.

Diversos estudos realizados com base no teste sociométrico já conduziram a importantes recomendações. Desse modo, a sociometria de Jacob Levy Moreno se apresenta como instrumento que subsidia a vida cotidiana na medida em que dá suporte ao grupo para perceber a realidade do outro, apreciar este outro ser e se relacionar com este outro em um sentido verdadeiramente interacional. A partir de Moreno, verificamos que a sociometria consiste em um meio eficaz de descobrir as indiferenças, as aceitações e as rejeições de um grupo em si. Assim, o teste sociométrico é uma ferramenta que pode contribuir para o trabalho de orientadores educacionais, professores, famílias, psicólogos e, de forma geral, de todos aqueles que tenham responsabilidade de trabalho e/ou assistência a grupos humanos.

A literatura sobre a sociometria converge para a constatação de que se trata de um teste versátil e universal (Alves, 1974; Bustos, 1979). Com o teste sociométrico, a falta de recursos não pode ser justificativa para não alcançar resultados para o problema das violências que atingem a escola, pois a sociometria constitui um recurso de baixo custo para subsidiar o trabalho do professor, uma vez que possibilita ao professor, com o apoio de um psicodramatista, intervir pedagogicamente no grupo, melhorando o processo de socialização dos estudantes.

Diante deste cenário, verifica-se também que este é o momento para se reconhecer um novo tempo em que, ao contrário de projetos sofisticados, técnicas como o teste sociométrico podem contribuir para a construção de um clima favorável na escola e na sala de aula. Desse modo, é possível vislumbrar um novo modo de pensar, de atuar com alunos isolados e líderes para promover a convivência.

 

METODOLOGIA

A pesquisa, que se caracteriza como um estudo qualitativo de caráter exploratório, foi realizada, ao longo de três meses do segundo semestre de 2012, por meio do teste sociométrico, cujo questionário era composto de quatro questões que permitiram analisar as relações entre os estudantes, desde as aceitações e as rejeições ao perfil dos líderes e colíderes: "a) Quais os dois colegas, em ordem de preferência, com quem você mais gosta de se sentar?"; b) Quais os dois colegas, em ordem de preferência, com quem você menos gosta de se sentar?; c) Quais os dois colegas que você acha que mais gostam de sentar com você?; d) Quais os dois colegas que você acha que menos gostam de sentar com você? Assim sendo, adotaram-se, com base nas observações de Alves (1974), os critérios de diagnóstico que visavam coletar informações a partir de pessoas especiais, conforme o resultado do teste. A fim de esclarecer os resultados obtidos nos sociogramas, realizou-se um grupo focal com estudantes listados na tabela de entrada e saída.

Conforme prevê a metodologia de estudo de caso, outras técnicas como a observação de aulas e a entrevista com a professora subsidiaram a análise dos sociogramas. Por fim, também foi feita a análise documental que focalizou especialmente o Projeto Político-Pedagógico e as fichas individuais dos alunos na secretaria escolar. No caso das últimas, obtivemos dados sobre o perfil dos estudantes (idade, religião, situação escolar etc.).

 

O CENÁRIO DA PESQUISA

O contexto

O estudo foi realizado numa turma do 6º ano do turno matutino de uma escola da rede pública da periferia do Distrito Federal (DF) com destaque nos jornais pelo alto nível de violência interna e em suas proximidades.

A turma foi escolhida por ser considerada "a mais difícil", tanto pelo gestor como pelos professores. Presumiu-se que o fato de a escola oferecer os anos posteriores (7º, 8º e 9º anos) possibilitaria imediato retorno dos resultados da pesquisa, para discuti-los e subsidiar o trabalho dos docentes nos anos posteriores. Assim, a pesquisa envolveu também a dimensão do serviço à comunidade.

Os participantes

A pesquisa contou com a participação de 34 estudantes. Deste total, 74,1% estavam na turma desde o início do ano letivo, 23,5% declararam-se repetentes do 6º ano e 2,4% mencionaram ter chegado à escola naquele bimestre. No que se refere ao sexo, 41,1% eram meninas e 58,9% eram meninos. Os estudantes tinham entre 12 e 14 anos, sendo 40,7% estudantes de 12 anos, 40,7% de 13 anos e 18,6% de 14 anos ou mais.

Também fez parte da pesquisa a professora de Língua Portuguesa, que preencheu um questionário com questões abertas e fechadas a cerca da interação dos estudantes, concedeu entrevista individual, permitiu a observação de suas aulas e, ainda, disponibilizou parte de seu tempo para aplicação do teste sociométrico e realização de grupos focais com os estudantes, cujos dados complementariam a análise do teste. Esta se dispôs durante a análise do sociograma a prestar esclarecimentos que foram fundamentais para a análise dos resultados do teste sociométrico.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Constatações do teste sociométrico

Por meio dos resultados do teste sociométrico, foi possível perceber que os estudantes do sexo masculino eram os mais preferidos em sala de aula (56,0%), sugerindo, pois, maior popularidade. Entretanto, eles também ocupavam lugar de destaque quando analisada a posição de rejeição (58,0%).

Quem era o (a) líder da sala? Com quase 20,0% dos votos, a estudante "A" foi a preferida dos colegas. Em grupo focal, os estudantes informaram que é uma pessoa gentil, alegre e educada com todos: "Ela demonstra gostar de estar com a gente. Mesmo sendo patricinha, ela não faz acepção (distinção) de pessoas. Ela é educada, alegre e gentil com todos" (Estudante, sexo masculino, 13 anos). Indagados sobre o que é ser "patricinha", um dos estudantes afirmou: "É estar sempre arrumadinha, acompanhando a moda, mas geralmente é metida e não se mistura com ninguém, tem nariz empinado". A professora ficou surpresa, pois achava que o escolhido e mais popular da turma seria o estudante "B", pelo fato de ele ser um estudante esforçado, responsável e ajudar todo mundo.

Comparando percepções da professora com os resultados do teste sociométrico, buscaram-se outras informações da líder. A estudante "A" teve exatamente 18,5% dos votos de um total de 27 alunos presentes no momento da aplicação do teste sociométrico. Ela votou e foi votada mutuamente duas vezes. Ela era branca, tinha doze anos e era católica. Morava com a mãe e o padrasto. Tinha ótimo comportamento em sala de aula, conforme relatou a professora. Quando tinha problemas em sala de aula, tentava resolver com cordialidade. Compreendia que os problemas surgiam por causa das "gracinhas" dos alunos e apreciava fazer trabalhos em grupo. Ela declarou que gostava da turma porque os colegas eram divertidos e "legais". Gostava da escola por causa dos alunos. Depreendeu-se do grupo focal que o fato de a estudante se "misturar" com os colegas era aspecto bastante valorizado pelos colegas da turma. Era brincalhona, amiga de todos, educada e tratava todos sem diferença. Características estas também do estudante "B", educado, responsável, entretanto, "sempre na dele", mais contido, não se "misturava" muito com os colegas, não gostava de "bagunça" e era mais reservado.

A maioria da turma de adolescentes tinha seus próprios padrões de comportamento, muito opostos às normas da escola, como a "bagunça". Quem não se enquadrava neles não alcançava alto "status" grupal.

O estudante que sofreu maior número de escolhas negativas, incluindo mutualidades e incongruências, foi, conforme o teste sociométrico, o estudante "C", com igual quantidade de votos que a líder, porém votos de rejeição (18,5%). O estudante "C" era moreno, tinha 14 anos, era católico e morava com os pais. Tinha um bom comportamento. Gostava da turma por causa dos amigos e da escola, por considerá-la boa. Era repetente, foi votado quatro vezes em segundo lugar e uma vez em primeiro lugar. O grupo focal realizado por criar um ambiente favorável à discussão permitiu aos participantes manifestar suas percepções e pontos de vista acerca dos conflitos na relação entre os adolescentes e apontou o motivo de ele não ser bem querido pelos colegas: "Ele é até gente boa, mas ninguém gosta muito das brincadeiras sem graça dele e ele atrapalha o desenvolvimento das tarefas" (Estudante, sexo feminino, 13 anos). Para a professora, a exclusão de alguns estudantes, como o caso do estudante "D", estava associada à timidez e a problemas familiares: "O estudante 'D' é tímido, parece deprimido com os problemas de sua casa, fica isolado em sala e pouco se comunica com os colegas".

Quanto às percepções da atração, ficaram, em primeiro lugar, a estudante "B", em segundo lugar, o estudante "E" e o estudante "F" e, em terceiro lugar, a estudante "G" e a estudante "H". No que se refere às percepções das rejeições, ficaram, em primeiro lugar, a estudante "I" e o estudante "F" e, em segundo lugar, o estudante "D" e a estudante "A". Verificou-se que, em geral, os adolescentes tiveram uma visão um pouco mais pessimista do que a opinião dos colegas revelada pelo teste.

Em síntese, o teste revelou que a professora não conhecia tão bem os seus estudantes. Para ela, o líder da sala era o estudante "B". Talvez, pelas características que ela mesma apresentou: procurava ajudar a turma e era esforçado e responsável. E ocorreu o contrário: a turma escolheu a estudante "A", por ser educada com todos, cortês, ajudar a todos e ser sempre gentil, mesmo considerada "patricinha".

A professora esperava que a turma excluísse o estudante "D", por ele ser tímido, ter pouca comunicação com os colegas e, talvez, por fazer tratamento psicológico. No entanto, foi excluído o estudante "C" pelas "brincadeiras sem graça" e por suas piadas de mau gosto.

Assim como as observações de Comellas (2012), verificou-se que nos grupos os indivíduos se organizam de forma espontânea e as simpatias e as antipatias emergem com certa rapidez, fruto de preferências, experiências e empatia entre os seus membros. No entanto, o professor não pode em nenhum caso forçar ou dificultar as relações, mas, sim, favorecer as oportunidades de interação e a aprendizagem de habilidades relacionais, evitando as atitudes excludentes. Dessa forma, estará suavizando a antipatia entre os membros do grupo, especialmente quando fundamentada em estereótipos, uma vez que a escola também exerce um papel importante na socialização secundária dos indivíduos.

A convivência em sala de aula e na escola

Foi elevado o número de estudantes que nos grupos focais declarou gostar da escola (88,9%), apesar dos conflitos em seu interior e da sua falta de atrativos. O principal motivo foi estar com os colegas (55,9%), fato também comprovado por Abramovay, Cunha e Calaf (2009), que consideram possível notar que as percepções dos atores sobre as escolas (estudantes, docentes e membros da direção) estão intimamente vinculadas às interações que conseguem estabelecer nesse ambiente. Também houve aqueles que não gostavam de sua escola (11,1%) por ser "feia, perigosa e bagunçada", o que indica a importância da segurança escolar.

Apesar disso, o maior agravante considerado era a relação conflituosa entre os estudantes, principalmente pelas "gracinhas" ou "brincadeiras de mau gosto", "sem noção e fora de hora", "brincadeiras de luta", por motivo de ciúmes, disputas amorosas, conversas paralelas etc. Uma das estudantes declarou ao grupo focal: "É assim, as brigas acontecem por qualquer coisa, por exemplo, é só passar no corredor sem encarar as pessoas, assim não tem problemas com ninguém, mas se você encarar, já era" (Estudante, sexo feminino, 13 anos).

Em geral, os estudantes afirmaram ter consciência de que o seu comportamento difícil e/ou a indisciplina de alguns dificultavam o trabalho do professor, que passava a ter preferência pelos estudantes "bonzinhos e obedientes". Assim consideraram 70,3% dos estudantes: "Tipo assim, tem professores que gostam mais dos alunos que são bonzinhos, estudiosos, obedientes e que não dão trabalho para eles" (Estudante, sexo feminino, 14 anos). Para os estudantes, os mais queridos dos professores eram a estudante "J", por ser uma "nerd" e o estudante "K". Ambos eram "legais" com os professores, entretanto, estes não eram os preferidos dos colegas. Ou seja, adequavam-se aos padrões de comportamento da escola, não do grupo de colegas.

Para resolução dos conflitos, os estudantes disseram que geralmente revidavam e guardavam rancor: "Tipo assim, eu chamo o bonde e desço o couro" (Estudante, sexo masculino, 14 anos). No grupo focal, um dos alunos informou: "Os professores não sabem resolver nada, encaminham para a direção, brigam com os alunos e também os põem para fora de sala" (Estudante, sexo masculino, 12 anos).

Quanto à resolução dos conflitos em sala de aula, verificou-se contradição de informações entre os estudantes e a professora, que afirmou recorrer, em primeiro lugar, ao diálogo: "Converso com o aluno e, em último caso, encaminho para a direção para entrar em contato com os pais". Outro estudante afirmou: "Os professores nunca resolvem nada. Só pede para a gente ficar quieto e muda a gente de lugar" (Estudante, sexo masculino, 14 anos). De acordo com a docente, os conflitos não tinham momento certo para acontecer: eles aconteciam na sua ausência e mesmo na sua presença. Um agravante era a perda da autoridade, reconhecida por ela própria. Essa justificativa se deu, segundo ela, pelo fato de nem os pais conseguirem mais disciplinar os seus filhos.

Pimentel e Sigrist (1976) destacam a importância do professor no encaminhamento dos conflitos e na promoção da convivência entre os estudantes por meio de uma postura firme, para que eles sejam levados a uma verdadeira vivência grupal que lhes permita um grande avanço em sua socialização e que não se limite às situações escolares, mas possa ser transferida para todas as circunstâncias de vida.

Todavia, verificou-se na fala da professora uma preocupação com as questões de ensino-aprendizagem: "A maior dificuldade está na realização de tarefas para fixar o conteúdo; participação das aulas (esclarecimento de dúvidas); pontualidade na entrega de trabalhos e responsabilidade". Quando lhe indagamos o que fazia para promover a convivência em sala de aula, a professora respondeu: "Converso com a turma sobre o respeito, a disciplina, a responsabilidade e a pontualidade nos prazos estabelecidos. Além disso, trabalho com textos que abordam valores". Entretanto, essas ações, embora relevantes, mostram-se fragilizadas se os professores deixam os estudantes resolverem seus conflitos sozinhos ou fingem não percebê-los, como revelou o grupo focal.

 

CONCLUSÕES

O teste sociométrico possibilitou o mapeamento da relação entre os estudantes, a identificação do perfil dos adolescentes e a origem dos conflitos entre eles. Verificou-se que os adolescentes queriam ser adultos fortes, populares entre os amigos, ao mesmo passo que demonstraram dificuldades em se adaptarem às normas estabelecidas pela escola. Em geral, apresentavam-se bem agitados e conversavam muito. O excesso de energia dos estudantes acabava sendo canalizado para a indisciplina e outros comportamentos indesejados, tais como as brincadeiras de mau gosto, impaciência de uma das partes, empurrões etc. Essa indisciplina dos estudantes fazia com que a professora se sentisse sobrecarregada e, portanto, impotente para lidar com os conflitos e as violências (Estrela, 2002). Por essa razão, as atividades em grupos eram evitadas no afã de que fossem evitados os conflitos na sala de aula. Pergunta-se: estará a escola cumprindo o seu papel, que é o de ensinar a conviver?

Além do tempo ocioso, verificou-se a dificuldade de os adolescentes conviverem em grupos. No entanto, não buscando conhecer a origem dos conflitos entre eles, o clima da sala de aula era ainda mais comprometido com o desencadeamento de outras violências que eram respondidas com medidas contraproducentes, fragilizando ainda mais a relação entre eles e a relação professor-aluno.

Considerando que os conflitos tendem a fazer parte das relações interpessoais e que não existe uma receita pronta para lidar com as violências, fica patenteada a partir deste estudo a necessidade precípua do conhecimento da origem dos conflitos entre os adolescentes, o que pode ser subsidiado pelo teste sociométrico. A aplicação do referido teste possibilita a intervenção e a adoção de medidas mais pontuais e eficazes para que os adolescentes na escola aprendam a conviver a partir dos próprios conflitos com seus pares. Por outro lado, o desconhecimento de possibilidades como as oferecidas pelo teste sociométrico faz com que os professores fiquem em geral à espera de soluções vindas de fora: presença do policiamento, ações de parcerias, jogo de culpabilidade dos alunos e, ainda, prática do ensaio e erro, o que favorece o desestímulo profissional em face das violências escolares.

Em suma, os resultados da pesquisa comprovam a importância do teste sociométrico para subsidiar o trabalho do educador, a fim de melhor conhecer as preferências dos seus estudantes e promover a convivência entre eles. Com isso, os estudantes podem aprender a trabalhar em grupos e a se respeitarem, apesar das suas diferenças. Portanto, o teste sociométrico constitui um meio de elevada valia para superar conflitos, que desencadeiam violências entre os adolescentes.

 

REFERÊNCIAS

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Recebido: 21/02/2016
Aceito: 19/08/2016

 

 

Adriana Lira. Professora consultora independente de Educação. Doutora em Educação pela Universidade Católica de Brasília (UCB). Quadra 03, conjunto H, casa 15, Setor Sul, Gama, CEP: 72410-208. Brasília, DF. Tel.: (61) 3384-3326.
Edenir Christine Cerqueira. Pedagoga pela Universidade Católica de Brasília (UCB). QS 4, conjunto 2, casa 26, Riacho Fundo I, CEP: 71820-402. Brasília, DF. Tel.: (61) 99249-4810.
Candido Alberto Gomes. Assessor Legislativo aposentado do Senado Federal. Doutor em Educação pela Universidade da Califórnia, Los Angeles, EUA. SQS 303, bloco E, apto. 601, Asa Sul, CEP: 70336-050 . Brasília, DF. Tel.: (61) 3224-1648.

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