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Revista Brasileira de Psicodrama

versão impressa ISSN 0104-5393versão On-line ISSN 2318-0498

Rev. bras. psicodrama vol.24 no.1 São Paulo jun. 2016

https://doi.org/10.15329/0104-5393.20160013 

CARTA AO EDITOR

 

Sergio Perazzo

Email: serzzo@terra.com.br

 

 

GRANATO E O PSICODRAMA BRASILEIRO

Morreu Ivald Granato nesta semana, com 66 anos. Morreu dormindo, encerrando sua explosão de cores em seus quadros e o movimento de suas performances artísticas, que atravessaram décadas e pelas quais era particularmente conhecido.

Granato era casado há muitos anos com Laís Machado, que, para quem não sabe, integrou o grupo pioneiro dos fundadores da Sociedade de Psicodrama de São Paulo (SOPSP). Ou seja, Laís pertence ao time de desbravadores do tempo heroico do Psicodrama brasileiro.

O nome dos dois está indissoluvelmente ligado não só à Revista da Febrap, atual Revista Brasileira de Psicodrama, como também ao intercruzamento do Psicodrama com manifestações artísticas de diversas fontes e gêneros que aconteciam nos idos dos anos de 1970.

Com a fundação da Febrap (Federação Brasileira de Psicodrama) em 1976, com Içami Tiba, como seu primeiro presidente, e Laís Machado, como integrante da primeira diretoria, foi logo construído um projeto de publicação de uma revista própria, a ser lançada em 1978, por ocasião do 1º Congresso Brasileiro de Psicodrama, em Serra Negra, um cartão de visitas do Psicodrama brasileiro.

Este primeiro número, neste primeiro ano de sua existência, teve sua edição entregue a Ivald Granato e Massao Ohno, que cuidaram de cada detalhe gráfico, e, na capa, um fragmento de tela de Granato de 1977, em tinta acrílica, com ilustrações de Vera Rodrigues no corpo da revista. O editorial deste primeiro número era assinado por Laís.

O formato (grande) da revista e sua fisionomia herdada das artes plásticas persistiram ainda durante alguns anos, e seis números: o 2º número com a reprodução de um acrílico sobre tela de Antônio Peticov; o 3º com desenho de Silvana e Lígia Beatriz Echenique Becker; o 4º com uma foto em preto e branco de Wlademir Pereira Neto; o 5º com uma montagem das capas anteriores, e assim por diante, continuando o projeto inicial de Granato - que foi o responsável só até o 3º número -, até mudar seu formato e sua proposta gráfica em 1984.

Mas o que importa mesmo é destacar, com este pequeno registro histórico, a fisionomia inicial do Psicodrama brasileiro, fusão de um teatro espontâneo com um teatro terapêutico, embalada no colorido das artes plásticas, que, na época, era o que se vivia, período de confluência e expressão de todas as manifestações artísticas, vigiadas pela repressão política e pela censura oficial, que empurravam cada um de nós a procurar um respiradouro para nosso desejo de liberdade, trajetória essa a que o Psicodrama brasileiro também não se furtou.

Lembro ainda que Laís, em uma aula sobre espontaneidade que ela dava para a minha turma no início dos anos de 1970, levou Granato, seu marido, como ego-auxiliar, que provocou uma performance radical, a qual não teve muito apoio nem adeptos entre nós, alunos. Não nos entendemos muito bem, uma questão de linguagem, talvez.

Ficou a lição e a história, outra história. Quis ele, um mestre das cores, submeter-nos a um teste de espontaneidade? Nunca vamos saber. Naquele caldo de excessos que marcou aqueles anos, não éramos tão anarquistas assim, certamente, como os personagens dirigidos pelo Zé Celso, um par de meses antes, em uma montagem teatral, que atiravam pedaços de peixe cru em cima da plateia, em Na selva das cidades, de Brecht - caminhos, meio de percursos, quem sabe.

Enfim, obrigado, Granato! Obrigado pelas lindas cores que embelezaram nossas capas e envolviam sentimentos tão intensos, com tantos convites à reflexão, tantas ideias revolucionárias, nem sempre bem-sucedidas ou recolocadas.

Valeu, cara, como os parangolés e as instalações perto do happening do seu amigo Hélio Oiticica, dois contestadores. Como Moreno no seu tempo.

São Paulo, 9 de julho de 2016.

 

 

Sergio Perazzo
Médico Psiquiatra. Professor Supervisor Didata de Psicodrama pela Sociedade de Psicodrama de São Paulo (SOPSP) e do Convênio SOPSP-PUC (Pontifícia Universidade Católica). Tem exercido atividades didáticas e participações em congressos no Brasil e no exterior. Autor de quatro livros, artigos publicados em revistas de psicodrama e de psiquiatria do Brasil e exterior, capítulos e prefácios de livros. Rua Artur de Azevedo, 1767, cj. 131, Pinheiro, CEP 05404-014. São Paulo, SP. Tel.: (11) 3067-5931.

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