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Psicologia em Revista

versão impressa ISSN 1677-1168

Psicol. rev. (Belo Horizonte) vol.21 no.3 Belo Horizonte set. 2015

https://doi.org/DOI-10.5752/P.1678-9523.2015v21n3p464 

ARTIGOS

DOI - 10.5752/P.1678-9523.2015v21n3p464

 

Considerações a respeito do autogerenciamento da aprendizagem em estudantes de educação a distância

 

Considerations in respect to self-management of students education through distance education

 

Consideraciones sobre la autogestión del aprendizaje en los estudiantes de educación a distancia

 

 

José Maria Montiel*; Suselei Aparecida Bedin Affonso**; Stelio João Rodrigues***; Eliane Quinelato****

 

 


Resumo

Considerando que a autonomia dos estudantes, no que se refere à sua capacidade de autogerenciamento dos estudos, e o uso de estratégias de aprendizagem adequadas ao contexto formativo desempenham um papel fundamental para o sucesso da aprendizagem na modalidade de educação a distância, este estudo teve como objetivo conhecer o perfil dos alunos atendidos por essa modalidade de ensino, buscando caracterizar seus níveis de satisfação e percepção a respeito da estrutura dos curso, interações com professores e tutores, bem como sobre as características pessoais e estratégias cognitivas e meta cognitivas adotadas no processo de aprendizagem na EAD. Foi realizada uma pesquisa descritiva de caráter qualitativo, com base na construção e aplicação de uma escala de percepção docente em EAD em 202 estudantes de cursos de graduação dessa modalidade de ensino. A análise dos resultados evidenciou que, embora os alunos afirmem ter hábitos de estudo favoráveis à aprendizagem em relação à frequência e ao tempo dedicados ao estudo, estes não indicaram a adoção de estratégias de aprofundamento do conteúdo ou de monitoramento dos seus erros e acertos, compatíveis com o desenvolvimento do pensamento crítico e bom aproveitamento do curso.

Palavras-chave: Educação a distância. Autonomia do aprendiz. Aprendizagem colaborativa.


Abstract

Considering that the autonomy of the students regarding their capability for self-managing their own studies and that the use of strategies of learning accordingly with the formative context play a fundamental role in the success of learning via the Distance Education mode, this study had as objective to understand the profile of the students who attend to this education mode, trying to categorize their levels of satisfaction and perception about the structure of the course, interaction with teachers and tutors, as well about the personal characteristics and cognitive and metacognitive strategies adopted in the process of learning in the EAD (distance education). A descriptive research of qualitative character was made, starting from the construction and application of a scale of teacher perception in EAD with 202 students of courses of graduation in this education mode. The analysis of the results revealed that even though the students claim to have study habits that are conducive to learning regarding the frequency and time dedicated to the study, these same students did not indicate the adoption of strategies that involve the critical thinking about the content studied, such as monitoring their mistakes and successes, revisions or even the search of other sources of study to complement the content.

Keywords: Distance education. Learner autonomy. Collaborative learning.


Resumen

Considerando que la autonomía de los estudiantes con respecto a su capacidad de autogestión de los estudios y el uso de las estrategias de aprendizaje apropiadas para el contexto formativo desempeñan un papel clave en el éxito del aprendizaje en la educación a distancia, este estudio tuvo como objetivo identificar el perfil de los alumnos atendidos por este tipo de educación, tratando de caracterizar sus niveles de satisfacción y la percepción acerca de la estructura del curso, la interacción con profesores y tutores, así como sobre las características personales y cognitivas y estrategias cognitivas meta adoptadas en el proceso de aprendizaje en EAD. Se realizó una investigación descriptiva de carácter cualitativo descriptivo, basada en la construcción y aplicación de una escala de percepción docente en EAD en 202 estudiantes de cursos de grado de esta modalidad de enseñanza. El análisis de los resultados demostró que aunque los estudiantes afirman tener hábitos de estudio favorables al aprendizaje en relación con la frecuencia y el tiempo dedicado al estudio, éstos no indican la adopción de estrategias para profundizar en el contenido o para hacer un seguimiento de sus errores y aciertos, compatible con el desarrollo del pensamiento crítico y el buen aprovechamiento del curso.

Palabras clave: Educación a distancia. Autonomía del aprendiz. Aprendizaje colaborativo.


 

 

Introdução

Os avanços tecnológicos que vêm ocorrendo nas últimas décadas e a presença das tecnologias digitais, como a internet e os novos meios de comunicação em rede, na vida cotidiana têm contribuído para transformar as relações sociais. Castells (2008) e Lévy (2000) apontam o surgimento de uma cibercultura promovida pelas novas dinâmicas comunicacionais advindas dessas transformações. Nessa perspectiva, a modalidade de educação a distância (EAD) hoje se constitui em uma importante modalidade de ensino, capaz de complementar o sistema regular de ensino presencial, apoiando-se em práticas pedagógicas modernas, as quais dispõem de recursos tecnológicos que facilitam a comunicação entre professor e aluno, rompendo tempo e distância. Essa modalidade possibilita promover a interiorização e democratização do acesso à educação superior e atender às novas demandas formativas que surgem em ritmo acelerado.

Essa modalidade define-se como um modelo educacional pautado na mediação didático-pedagógica e nos processos de ensino e aprendizagem que ocorrem com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, pela interação entre estudantes e professores desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos (Decreto nº 5622, de 19 de dezembro de 2005). Com base nesses pressupostos, as dimensões tempo e espaço deixam de ser barreiras à aprendizagem e ganham flexibilidade. Uma combinação de tecnologias convencionais e modernas proporcionam ao aluno a possibilidade de estudar individualmente ou em grupo, em ambientes diversos, por meio de métodos de orientação e tutoria presencial ou a distância. Apesar de, nesse modelo de educação, poder ocorrer atividades presenciais específicas, como reuniões de grupo para estudo e avaliações, o grande desafio da metodologia está em encontrar a melhor maneira de apresentar os conteúdos a serem trabalhados, de forma a atender ao princípio da flexibilidade das dimensões espaço e tempo e da diversidade dos aprendizes, para que resulte no aprendizado efetivo do aluno.

Embora muitas instituições estejam aderindo ao empenho nacional de expansão e democratização do ensino superior, diante das grandes perspectivas de atendimento à demanda educacional oferecida pela modalidade EAD,

Se não houver o cuidado com o direcionamento da discussão dos projetos políticopedagógicos dos cursos para evitar elaboração de projetos com currículos inadequados ou com oferta de recursos didáticos de acompanhamento padronizados, que não possuem potencial de interatividade, ou que são descompassados das aulas veiculadas nas mídias, essa modalidade pode acabar legitimando um modelo de educação que nem sempre condiz com suas perspectivas teóricas (Lapa & Pretto, 2010, p. 79).

Nesse sentido, a EAD, dependendo da perspectiva que lhe seja atribuída, poderá contemplar em sua proposta pedagógica uma formação meramente pragmática e mercadológica ou uma formação integral e autônoma. Assim, um maior conhecimento acerca dos princípios que embasam a proposta deve ser usado como norteador de um trabalho de qualidade nesse âmbito. No Brasil, as pesquisas sobre o tema são relativamente recentes mas indicam aspectos que visam ao favorecimento da qualidade dos cursos EAD a partir da preparação dos recursos humanos e tecnológicos no delineamento do projeto dos cursos que vise a oferecer aos estudantes um acompanhamento adequado, tutoria e avaliação (Abbad, Zerbini & Souza, 2010).

Inúmeros aspectos vêm sendo incorporados nesses cursos visando a uma melhoria da qualidade dos recursos de aprendizagem, a saber, o uso de novas mídias, como o videotexto, tecnologias multimídia, hipertexto, redes de computadores, redes sociais, entre outras. Essas iniciativas caracterizaram o EAD on-line que é baseada em sistemas computacionais que oferecem suporte às atividades educativas favorecedoras da mediação da aprendizagem a partir de ambientes virtuais propícios. Semelhante à proposta presencial de educação, em que as interações situacionais sincrônicas e mediação do professor favorecem o aprendizado, no EAD, um dos desafios atuais tem sido explorar a interação social como favorecedora desse tipo de aprendizagem, ainda que mediada por recursos tecnológicos.

A aprendizagem está relacionada a um processo de interação, reflexão, discussão, crítica e ponderação que são facilitados pela interação social. Nesse sentido, uma proposta de educação a distância embasada pela colaboração em que estejam presentes a comunicação, troca de informações e trabalho em grupo visando à solução de problemas favorece a construção social do conhecimento e é um dos aspectos que vêm sendo desenvolvidos a cada dia no EAD (Anderson & Drom, 2011; Kenski, 2004).

Segundo Belloni (2009), as interações podem ser entendidas como "ações recíprocas entre dois ou mais atores onde ocorre a intersubjetividade, isto é, encontro de dois sujeitos, que pode ser direta ou indireta, mediada por algum veículo técnico de comunicação [...]" (p. 58). O ambiente virtual beneficiado pelas novas tecnologias de informação tende a favorecer a manipulação, transformação, circulação e estocagem de conhecimentos com base na estimulação do potencial cognitivo dos alunos, criando esse ambiente de aprendizagem que é considerado colaborativo, já que supõe a ativa participação e interação de seus atores (alunos, professores e tutores) (Linard apud Belloni, 2007; Amaral & Rosini, 2008).

Nesse contexto, cada membro é responsável pela sua aprendizagem e do restante dos elementos dessa rede de colaboração de aprendizagem, e as ferramentas visam a promover a autonomia dos estudantes quanto a espaço e tempo de estudo, mas também favorecer e estimular a construção de uma prática educacional voltada para o equilíbrio das necessidades dos estudantes e habilidades pessoais com a participação dos grupos, assegurando a troca de experiências, dúvidas e resultados.

Na educação a distância, devemos considerar que o estudante é sujeito ativo do processo e, portanto, protagonista na construção do próprio conhecimento. Com isso, este deve buscar informações com base em sua motivação para realizar os estudos necessários e construir seu conhecimento para garantir o cumprimento das atividades em tempo específico. Este estudo tem, portanto, o objetivo de investigar a configuração de um curso de graduação na modalidade EAD, sob a perspectiva de um ambiente colaborativo, buscando, mais especificamente, conhecer o perfil dos alunos atendidos por essa modalidade de ensino, investigando suas percepções, expectativas, avaliações e estratégias de aprendizagem ajustada a essa modalidade, buscando caracterizar os níveis de satisfação e percepção dos alunos sobre sua estrutura, professores e tutores, bem como sobre as características pessoais que estão imbricadas no processo de aprendizagem no EAD. Vale salientar que o trabalho aqui relatado faz parte de um projeto mais amplo de pesquisa que está em desenvolvimento e busca discutir vários aspetos do formato dos cursos de graduação oferecidos na modalidade EAD por uma instituição de ensino de grande porte.

 

Interatividade e autonomia: perfil de estudantes de curso EAD?

Apesar de o termo interatividade advir do contexto das novas tecnologias de informação e comunicação (NTIC), seu significado extrapola esse âmbito, estando vinculado à disposição para a interação, participação e intervenção (Silva, 1998). No EAD, interações em seus diferentes níveis, aluno, professor, tutor, pares, aluno-conteúdos, são imprescindíveis para a ressignificação do conhecimento, acompanhamento do curso, socialização do conhecimento e estratégias de estudo e formação da identidade do grupo (Jensen, 1998).

Para Tori (2008), a proposta EAD deve ser analisada em seus aspectos organizacionais, metodológicos e tecnológicos previamente ao seu grau de interatividade, já que este depende das tecnologias disponíveis e do modelo pedagógico em que está inserida. Nesse sentido, as teorias de aprendizagem norteadoras das práticas devem estar claras bem como as ferramentas. De um modo geral, o modelo EAD foi favorecido pelas ideias de Piaget, Vygotsky e Dewey quando destacam a importância da experimentação e interação no desenvolvimento do conhecimento, sendo os principais modelos teóricos adotados nas propostas educacionais a distância orientadas pela colaboração (Anderson & Dron, 2011).

Nesses termos, Silva (2003) indica que o ambiente on-line interativo favorece que o aprendizado ocorra pela construção do conhecimento baseada diálogo aberto que permite a participação e autoria de todos os envolvidos, não sendo centrado no professor e diferindo, portanto, do esquema clássico de comunicação em sala de aula. Além disso, o centro do modelo EAD é a autonomia dos estudantes, seja no sentido pedagógico, que reconhece o aluno como sujeito de sua educação quanto no que se refere à didática em que a responsabilidade e as necessidades de aprendizagem, bem como planejamento e estratégias são ditados pelo estudante (Peters, 2001). Nesse contexto, o ritmo de estudo, a maturidade, o interesse, conhecimentos prévios relacionam-se à autogestão do conhecimento e são tópicos de interesse para se delinear e implantar o modelo EAD (Silva, Shitsuka & Morais, 2013; Roesler, 2011).

Isso remete a uma das características do aluno que estuda no modelo EAD, exercer disciplina e autogestão de seus estudos para conseguir cumprir as ações pedagógicas requeridas para a disciplina. Nesse sentido, Behar (2008) esboçou algumas das características importantes para participar desses cursos: competência tecnológica, sobretudo internet, competência ligadas ao aprender em ambientes virtuais e uso de comunicação escrita. Com isso, os objetivos do plano pedagógico devem responder aos objetivos cognitivos (como usar e como compreender) e atitudes e valores.

Nesse sentido, estratégias de aprendizagem referem-se à processos conscientes usados pelos alunos para atingirem objetivos de aprendizagem, envolvendo cognitivas, metacognitivas e socioafetivas (Silva & Sá, 1997). Segundo Rabello,

As estratégias cognitivas envolvem a manipulação ou transformação do material a ser aprendido e correspondem a técnicas de estudo individuais utilizadas pelos alunos durante o estudo, a fim de facilitar o processo de aprendizagem. As estratégias sociais-afetivas, por outro lado, envolvem a interação com outras pessoas e o gerenciamento dos sentimentos relacionados à aprendizagem. A cooperação e o questionamento são exemplos desse tipo de estratégia, que ganham maior importância no contexto da EAD, dada a separação física entre alunos e professores. As estratégias de aprendizagem metacognitivas são também especialmente importantes para a EAD, por envolverem o pensar sobre os próprios processos de aprendizagem, o planejamento para a aprendizagem, a monitoração de atividades de aprendizagem, e a avaliação de quanto alguém aprendeu (Rabello, 2007, p. 36-37).

Neste sentido, Preti (2000) indica a importância de se considerar e avaliar o potencial dos meios de comunicação e informação, alinhando-os com a natureza dos cursos a distância, seus objetivos, bem como características dos estudantes, visando a fornecer ferramentas técnicas e pedagógicas a professores, alunos e tutores. Lowe (2005) indica que os índices elevados de evasão em cursos a distância tendem a ser maiores quando comparados com o ensino presencial, sugerindo que

Os aprendizes geralmente se deparam com a necessidade de habilidades de gerenciamento do tempo e do nível de estresse, o aumento da autodireção no estabelecimento de metas e adoção de estratégias para assumirem novos papéis e responsabilidades de ensino e aprendizagem, além da instigação de estratégias cognitivas e metacognitivas, entre outras. Mais frequentemente, esses alunos foram educados a serem recipientes passivos de informação, a competirem por notas em provas que requerem regurgitação de informação factual. Eles simplesmente não estão preparados para essa nova modalidade (Gibson, 1997 apud Lowe, 2005, p. 80).

Nesse sentido, essas ideias são reforçadas pelos estudos de Rabello que apontam que outra dificuldade muito comum é a falta de autonomia e de autodireção na aprendizagem. Muitos alunos exercem um papel passivo na aprendizagem, não porque preferem assim, mas porque não foram acostumados a exercer um papel ativo. A esse respeito destaca que "é um fato trágico que a maioria de nós saibamos apenas como ser ensinados; nós não aprendemos como aprender" (Rabello, 2007, p. 44). Seguindo os pressupostos anteriormente descritos, este estudo teve como objetivo descrever o perfil dos estudantes dos cursos de graduação na modalidade de ensino a distância de algumas unidades de uma instituição de ensino do Brasil, localizada em diferentes regiões do País, por meio da avaliação de um questionário de percepção discente, investigando suas expectativas e avaliações, buscando caracterizar os níveis de satisfação e percepção dos alunos sobre sua estrutura, interatividade, professores e tutores, bem como sobre as características pessoais que estão imbricadas no processo de aprendizagem no EAD.

 

Métodos

 

Participantes

Foram avaliados 202 estudantes matriculados em um curso de ensino a distância de uma faculdade do interior do Estado de São Paulo, sendo 75% do sexo feminino. As idades variaram de 18 a 64 anos com média de 34 anos (DP=8,73).

 

Instrumento

Escala de percepção discente do EAD (EPD-EAD)

O instrumento utilizado foi a escala de percepção discente do EAD (EPDEAD) (Montiel, Affonso, Rodrigues & Quinellato, 2014) com o pressuposto de avaliar a percepção dos alunos a respeito do modelo de graduação em EAD seja relacionada a um contexto específico e ou às consequências de seu envolvimento com o curso ao qual esteja matriculado. Outro aspecto envolvido do instrumento foi considerar características específicas nesse tipo de formação/educação. Assim, alguns indicadores foram propostos pensando-se no contexto educacional a distância e nas condutas e comportamentos que seriam esperados dos alunos nesta modalidade de ensino. Nesse sentido, as questões têm como pressuposto que o processo de aprendizagem deve ser eficiente e eficaz, e que a metodologia de ensino proposta deve ser fundamentada em um trabalho interativo e dialógico, que busca ser facilitador da aprendizagem e contribuir para o desenvolvimento da autonomia e protagonismo do aluno conforme descrição de Souza (2012).

O instrumento contém 18 categorias que demonstram o envolvimento com essa modalidade e condições para desenvolvimento do aluno independentemente no curso. Os grupos formados são escolha do curso, preparo anterior, estrutura física, curso, aulas, sistema de avaliação, dedicação ao curso, relação aluno– aluno, relação aluno–professor presencial, relação aluno-tutor virtual, relação aluno-tutor presencial, interatividade, rotina/hábitos de estudos, dificuldades encontradas e relação curso-trabalho. As questões propostas em cada grupo de itens descrevem percepções e condutas (estratégias de aprendizagem) no tange ao ensino a distância. Nesse sentido, essas condutas visam à produção de comportamentos e estratégias ajustadas a essa modalidade de ensino (EAD) possibilitando maior eficácia na aprendizagem. Nesse sentido, foram desenvolvidas 124 perguntas divididas em cada um dos 18 grupos de itens; por exemplo, o excesso de informação nos materiais dos cursos EAD, nem sempre contemplados nas teleaulas, dificulta o aprendizado; acredito que ter organização é fundamental para se ter um bom desempenho acadêmico, entre outras. As categorias de resposta foram apresentadas em uma escala Likert de quatro pontos, atribuídos valores de 0 a 3, respectivamente, sendo que os participantes deveriam escolher uma nota correspondente para cada pergunta.

 

Procedimento de aplicação

A aplicação do instrumento ocorreu de forma individual, realizada por meio de solicitações realizadas aos próprios alunos, e somente àqueles que autorizaram, por meio do termo de consentimento livre e esclarecido, participar do estudo foram submetidos à aplicação do instrumento.

 

Resultados

A análise das informações oferecidas pelos alunos que participaram deste estudo, respondendo às escalas de percepção, evidenciou que, embora o formato da proposta de educação a distância pesquisada se apresente coerente com a perspectiva de um ambiente colaborativo de aprendizagem, oferecendo um ambiente virtual e um desenho de curso que proporcione inúmeras oportunidades de interatividade entre os diferentes atores do processo educativo, essas interações virtuais entre alunos e professor virtual e alunos-alunos ainda não têm acontecido, na prática pedagógica cotidiana, com a frequência desejada ou necessária. Algumas hipóteses podem ser levantadas para explicar essa questão: falta de familiaridade com os recursos, dificuldade de gerenciamento do tempo de estudo, dificuldade em estabelecer vínculos, dificuldade de solicitar esclarecimentos por meio de um texto escrito, compreender a resposta do outro e ajustar suas expectativas quanto ao tipo de explicação oferecida, entre outras.

Se considerarmos que, dentro de uma perspectiva de formação colaborativa, para que ocorra uma aprendizagem realmente significativa e duradoura, é imprescindível que ocorram interações em vários níveis: do aluno com o professor/ tutor virtual, com os conteúdos e com os outros alunos, os dados sugerem que os estudantes em questão não estão garantindo que sua evolução e dificuldades sejam regularmente monitoradas nem proporcionadas com o recebimento de incentivos e orientação quanto ao progresso nos estudos. Os resultados obtidos indicam também que, embora os alunos afirmem ter hábitos de estudo favoráveis à aprendizagem em relação à frequência e ao tempo dedicados ao estudo, não indicaram a adoção de estratégia que envolva o pensamento crítico sobre o conteúdo estudado, como o monitoramento de seus erros e acertos, revisão ou mesmo busca de outras fontes de estudo para complementar o conteúdo. Grande parte dos estudantes, cerca de 40% deles, apontou que estudam nas vésperas das avaliações e utilizam o mesmo método de estudo para todas as disciplinas. Cerca de 30% dos alunos indicam também em suas respostas que não buscam resolução de dúvidas nem a correção das atividades realizadas e, ainda, para 60% deles, faltam tempo e motivação para realizar trabalhos e exercícios. Tais resultados confirmam as conclusões dos estudos de Rabello (2007), que também evidenciaram que o uso inapropriado de técnicas de estudo ou a não utilização de estratégias de aprendizagem adequadas podem ser vislumbrados como possíveis causas de insucesso na aprendizagem. Pudemos ainda identificar o estranhamento por parte de muitos alunos à metodologia de EAD, o que pode ser percebido no desconhecimento das habilidades e requisitos dessa modalidade educacional.

Além disso, outro fator levantado por alguns alunos entrevistados que pode nos ajudar a entender essa questão é o fato de que, quando questionados sobre os motivos que os levaram à escolha de um curso na modalidade EAD, cerca de 40% dos entrevistados apontaram como principal razão o fato de acreditarem que os cursos EAD são mais flexíveis e não necessitam de muitas horas de estudos. Tais dados corroboram os estudos de Carvalho (2007), que apontam que o aluno acredita que realizar um curso na modalidade a distância será mais fácil do que no ensino presencial regular e imagina que a tecnologia será uma importante aliada no desenvolvimento de sua aprendizagem. O maior problema, nesse momento, é que,

Sua história escolar é dentro de uma escola tradicional, onde a ênfase estava centrada nos processos mecânicos de memorização, repetição e padronização. Não existe, no histórico deste aluno, incentivo algum para a construção do conhecimento crítico e autônomo (Carvalho, 2007, p. 4).

Em relação às percepções dos alunos relacionadas à estrutura do curso e estratégias de aprendizagem ajustadas a essa modalidade, a análise dos resultados oferecidos pelo instrumento de avaliação sugere que essas percepções foram, de maneira geral, bastante positivas. Um aspecto muito interessante que se pode abstrair da análise da correlação dos fatores pesquisados é que alunos que tendem a se perceberem como participantes do processo de aprendizagem tendem a ter percepções positivas da modalidade (estrutura, tutoria, atividades, avaliação), independentemente do curso. Aqueles que atribuem ao tutor ou à estrutura do curso a responsabilidade pelo seu bom desempenho também conseguem manter bons níveis de satisfação. Por outro lado, os alunos que tendem a ter percepções negativas em relação a si mesmos no processo (seu grau de envolvimento, disponibilidade para estudo, utilização de estratégias metacognitivas de acompanhamento de seu processo de aprendizagem) também percebem, de maneira negativa, os outros elementos, sejam estes o curso, a estrutura física ou as relações no processo.

Ao se compararem as medidas extraídas dos fatores da escala de percepção discente do EAD (EPD-EAD) por sexo e idade, os resultados demonstram não haver diferenças por sexo, porém, em relação à idade, os dados obtidos evidenciam uma progressão das médias quanto à eficácia das estratégias de aprendizagem utilizadas no ensino a distância e em relação ao nível de satisfação do aluno com o curso, conforme o aumento da idade dos estudantes , levando-se à suposição de que pessoas mais velhas apresentam maior repertório comportamental quanto a estratégias de aprendizagem e um maior envolvimento com os estudos, o que os faz apresentar uma melhor percepção do curso, maior envolvimento pessoal e consequentemente maior satisfação. Em contrapartida, os mais jovens, por estarem vivenciando uma realidade distinta nesse sentido e outro momento no desenvolvimento psicológico, podem não apresentar os mesmos valores e motivações para esse tipo de curso, sentindose menosprezados ou diminuídos por não poderem fazer um curso em outra modalidade, o que pode afetar suas percepções. Há ainda o aspecto do repertório comportamental não ser tão bem desenvolvido, por ainda não serem maduros o suficiente. No entanto estas são hipóteses que devem ser submetidas a teste e convidam a novas investigações.

 

Considerações finais

A realização desta pesquisa-piloto permitiu o levantamento de algumas considerações iniciais que devem ser investigadas de forma mais detalhada, para maior aprofundamento. Os dados preliminares obtidos evidenciaram que a participação do aluno é essencial dentro de uma abordagem colaborativa, que valoriza a perspectiva da autonomia dos alunos nos processos em EAD. Para que ocorra aprendizagem efetiva em EAD, é fundamental que o aluno utilize as ferramentas de comunicação disponíveis, buscando espontaneamente novos conhecimentos e novas possibilidades de aprendizagem, não se limitando à realização das atividades obrigatórias. A motivação para a interatividade acontece com base nos vínculos afetivos que são criados com os diferentes atores: alunos, tutor presencial, tutor virtual e professor EAD. Diante disso, as interações em EAD necessitam ser pensadas de forma ampla, para preparar os alunos para as suas exigências e incentivar sua participação nas atividades interativas. Da mesma forma, faz-se necessário e urgente investir em, por exemplo, criação de sistemas tutoriais eficazes, apropriados a apoiar e promover o crescimento do aluno em cada uma das etapas do processo de ensino, com base em formação que habilite os profissionais que não terão contato físico com os alunos a incentivar sua participação, criando vínculos e mostrando-se presentes mesmo quando distante fisicamente.

Do mesmo modo, estratégias de aprendizagem adequadas, tais como o planejamento, o monitoramento das atividades de aprendizagem e a avaliação das aprendizagens e dificuldades, desempenham um papel fundamental para o sucesso da aprendizagem, tornando os alunos mais autônomos. Nesse sentido, faz-se importante pensar na adoção, pela instituição de ensino, de um treinamento de estratégias de aprendizagem no início da educação superior, presencial ou a distância, pois sua utilização pode favorecer em muito a aprendizagem. Nessa mesma perspectiva, conhecer melhor o perfil de aluno no que tange a características pessoais, condutas de estudos e estratégias cognitivas utilizadas que melhor se adaptem ao modelo de curso a distância, no sentido de obter maior eficácia de aprendizagem e satisfação com o curso, poderia ser interessante, uma vez que pode indicar habilidades e hábitos propícios à aprendizagem que podem ser alvo de um trabalho pedagógico inicial com as turmas no sentido de ajudar os alunos a desenvolver as competências necessárias para gerenciamento do tempo destinado ao estudo e para a autodireção no acompanhamento de suas metas de aprendizagem, proporcionando maiores níveis de satisfação e produção, o que aumentaria a avaliação desses cursos e seu impacto social.

 

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Texto recebido em 10 de junho de 2013 e aprovado para publicação em 15 de setembro de 2014.

 

 

* Doutor e mestre em Avaliação Psicológica em Contexto de Saúde Mental pela Universidade São Francisco, especialista em Diagnóstico e Triagem, psicólogo. Pesquisador colaborador do Laboratório de Psicodiagnóstico e Neurociências Cognitivas (Lapenc) - Unisal - Americana-SP. Pesquisador colaborador do Laboratório de Avaliação e Pesquisa em Saúde Mental e Personalidade (Labsamp) - Universidade Federal de Goiás (UFG), Faculdade de Educação. Atualmente é professor com dedicação exclusiva do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu - Psicologia Educacional, na Unifieo (Fundação Instituto de Ensino para Osasco). Endereço: Centro Universitário FIEO - Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu - Psicologia Educacional, Avenida Franz Voegelli, 300 – Vila Yara, Osasco-SP, Brasil. CEP: 06020-190. Telefone: (11) 3651-9999. E-mail: montieljm@hotmail.com.
** Doutora e mestra em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), especialista em Educação e Psicopedagogia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC Campinas) e graduada em Psicologia pela Docência de disciplinas relacionadas à área de Psicologia e Gestão Educacional no curso de Pedagogia da Faculdade Anhanguera de Campinas e responsável pelo Núcleo de Avaliação Institucional da Secretaria de Educação de Campinas-SP. Desenvolvimento de pesquisas nas áreas de educação continuada e educação a distância. Endereço: Rua João Lopes Vieira, 108, ap. 21, torre 1 - Vila Bella, Campinas-SP, Brasil. CEP: 13087-734. E-mail: suselei.affonso@aedu.com.
*** Pós-doutor em Educação pelas Faculdades EST de São Leopoldo-RS, doutor em Ciências Pedagógicas pela Universidad de La Habana, Cuba (o título de doutorado foi revalidado pela Universidade de Brasília como doutor em Educação), mestre em Psicopedagogia em Educação pela Universidad de La Habana, graduado em Ciências com habilitação em Biologia pela Universidade do Extremo Sul Catarinense. Atualmente é professor de Matemática na Prefeitura de Jaraguá do Sul-SC, professor Biologia na Secretaria de Estado de Santa Catarina, professor de Metodologia de Pesquisa Científica e Homem, Sociedade e Cultura na Faculdade Anhanguera Educacional e Faculdades Senai, professor convidado na Universidad Politecnica y Artística del Paraguay. Endereço: Rua José Emendoerffer, 1632 - Bairro Nova Brasília, Jaraguá do Sul-SC, Brasil. CEP: 89253-000. E-mail: steliojoao@uol.com.br.
**** Doutora e mestra em Estudos Literários pela Unesp (Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho), Araraquara-SP, graduada em Letras Português-Grego pela Unesp, tem habilitação específica para o Magistério. Coordenadora do Curso de Letras da Faculdade Anhanguera de Limeira-SP. Endereço: Rua Clarindo P. De Oliveira, 280 - Jardim Maria B. Modeneis, Limeira-SP, Brasil. CEP: 13482-231. Telefone: (19) 3451-8800. E-mail: eliane.quinelato@aedu.com.



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